quinta-feira, 19 de setembro de 2019

KLÁSSIQO: A Liberdade é Azul

Juliette Binoche: a beleza triste da liberdade. 

O cineasta polonês Krysztof Kieslowski filmava desde os anos 1960 e ao longo das décadas de trabalho se tornou uma referência mundial. Krysztof se tornou mais conhecido ao final dos anos 1980, quando lançou a série chamada O Decálogo (1988) composta por dez filmes de uma hora de duração inspirados nos dez mandamentos. A ideia deu tão certo que alguns episódios foram convertidos para longa metragens com grande sucesso, foi assim que Não Amarás (1988) e Não Matarás (1988) entraram em cartaz nas salas de cinema aqui do Brasil e tornou o cineasta ainda mais conhecido por seu estilo repleto de simbologias. O número de fãs por aqui aumentou ainda mais com o cult A Dupla Vida de Veronique (1990) e a posterior trilogia das cores, que ganhou prêmios em vários festivais ao redor do mundo e foi lembrada até no Oscar de direção. A trilogia inspirada nas cores da bandeira francesa ressalta ainda mais a habilidade do diretor contar histórias onde costura som e imagem com maestria. A primeira parte da trilogia, A Liberdade é Azul já demonstra que se inspirar nos ideais da Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade) não quer dizer que o cineasta opte pelos caminhos mais simples de suas temáticas. O filme já se inicia com um acidente  de carro que logo depois percebemos ter vitimado o esposo e a filha de cinco anos de Julie (Juliette Binoche), única sobrevivente do desastre. Devastada, Julie terá que viver sua dor sob os holofotes, uma vez que seu marido era um renomado maestro e compositor francês, chamando atenção da mídia francesa. O fato é que sem o esposo e a filha, Julie mergulha numa espécie de vazio, com o qual precisa lidar. Krysztof parte deste ponto para abordar a liberdade em sua forma mais radical. Sem o casamento, o compromisso com a filha, a responsabilidade do trabalho, a personagem começa a se desfazer de tudo o que lhe lembra a antiga vida, seja a casa que morava ou um cordão que simboliza uma religiosidade que parece já ter abandonado. Esta liberdade  por não ter amarras que aparece até certo ponto do filme é um tanto deprimente, mas se transforma quando a personagem aprende a lidar com sua nova situação. É curioso que um filme sobre um tema tão ligado à alegria (a liberdade) seja apresentado de forma tão triste pelo diretor. Talvez a ideia tenha nascido da ideia de que a fotografia em tons de azul no cinema está geralmente ligada à tristeza dos personagens - e aqui o diretor utiliza esta cor de forma belíssima. Os detalhes em azul aparecem todo tempo para emoldurar a atuação intimista de Binoche. Com poucos diálogos, a atriz foi elogiadíssima por sua interpretação, sendo indicada ao Globo de Ouro de melhor atriz dramática após ter levado para casa o César e o Prêmio em Veneza de melhor atriz. Kryzstof explora ao máximo o olhar melancólico da atriz , mas não perde a chance de pontuar momentos de esperança ao longo da história (repare os momentos em que a tela escurece e a cena poderia terminar, mas ela continua conforme a personagem digere sua dor). Outro grande momento do filme é a forma como a melodia composta pelo esposo falecido ganha sonoridade conforme as partituras aparecem na história, somente um gênio filmaria a música deste jeito. A Liberdade é Azul abre a trilogia das cores de forma um tanto hermética, mas talvez este seja um dos motivos para ser um filme bastante contundente. Ah,  fique atento na cena em que Julie entra no tribunal, aquela cena é do próximo episódio...

A Liberdade é Azul (Trois Couleurs: Bleu / França - 1993) de Krysztof Kieslowski com Juliette Binoche, Benoît Régent, Emanuelle Riva, Florence Pernel e Guillaume de Tonquédec. ☻☻

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