domingo, 28 de fevereiro de 2021

#FDS Robert Altman: Assassinato em Gosford Park

Os anfitriões e seus convidados: a parte de cima.

Sou daquelas pessoas que quando saem os indicados ao Oscar, procuro ver todos, especialmente na categoria de melhor filme. Confesso que às vezes alguns se perdem pelo caminho e outros eu não faço muita questão de assistir. Esta implicância boba foi o que fez com que eu demorasse uma eternidade para assistir Assassinato em Gosford Park de Robert Altman. Eu até comecei a vê-lo há alguns anos, mas confesso que dormi logo no início e nunca mais o retomei. Se me perguntarem o motivo de tanta bobagem eu diria que é a mistura de fatores: um professor que eu não gostava ter recomendado, aquela estética de filme inglês chato e o longa ter ganho o Oscar de roteiro original enquanto eu torcia para Os Excêntricos Tenenbaums do Wes Anderson (que concorria ao lado dos queridos Amnésia, O Fabuloso Destino de Amélie Poulain e o polêmico A Última Ceia). Neste mês encontrei com ele novamente em um destes finais de semana chuvosos e confesso que o azar de não ter visto o filme antes é todo meu, ou então, tentando ser otimista, não deixa de ser um pouco de sorte já que talvez não tivesse apreciado a obra como ela deveria em outros tempos. O fato é que Assassinato em Gosford Park é brilhante em sua proposta e bastante beneficiado pela direção precisa de Robert Altman em um dos seus melhores trabalhos. Se em outros tempos ele já apontou sua câmera para mundos bastante particulares como a guerra (M.A.S.H/1970), a música country (Nashville/1975) e até a indústria da moda (Prét-à-Porter/1994), aqui seu foco é sobre a aristocracia inglesa e seus empregados. Altman mais uma vez utiliza seu status de bom diretor para escalar um elenco impressionante com a nata do cinema inglês para encenar, uma fachada de pompa e elegância que esconde relações não tão bonitas assim, na mansão do lorde William McCordle (Michael Gambon) e sua esposa Sylvia McCordle (Kristin Scott-Thomas). Estamos aqui nos anos 1930 e os amigos irão comparecer à propriedade para um final de semana com jantares, momentos de caça e um bocado de tédio. Junto de todo os convidados chegam seus empregados, que ficarão na parte baixo da casa, sendo responsáveis para que tudo funcione corretamente. Os empregados passam a ser chamados pelo nome de seus patrões e tem seu lugar de importância entre o grupo medida pelo título de nobreza do patrão. O roteiro de Julian Fellowles (baseado numa ideia de Altman e do ator Bob Balaban) constrói então uma engrenagem de relacionamentos interessantíssima de dois mundos distintos, mas paralelos e que se cruzam em momentos bastante reveladores. São destes cruzamentos que nascem os grandes segredos do filme - e não me refiro ao assassinato que acontece quando já passa da metade de sua duração. Por trás daquele mundo de aparências existem histórias um tanto sórdidas sobre patrões e empregados, sejam estas de poder, de gênero, abuso ou afetividade. Existe aqui um humor tão refinado quanto cáustico e pedante  (geralmente transformados em um deleite por Maggie Smith - indicada ao Oscar de atriz coadjuvante). Entre segredos, traições, interesses e egos inflados, existem momentos mágicos como aquele momento ao som do piano ou aquele em que o espectador mais esperto descobre que a discreta governanta vivida por Helen Mirren (também indicada ao Oscar de atriz coadjuvante) construiu toda sua eficiência em antecipar as necessidades de quem se encontra na casa. A ideia é tão boa que Julian Fellowes investiu nela mais uma vez com tom diferente na cultuada série Dowton Abbey (2010-2015). Também lembrado nas categorias do Oscar de filme, direção, figurino e cenografia, a produção aborda as relações de seus personagens de forma tão minuciosa que não envelheceu com o passar do tempo, além de comprovar que Altman era um mestre quando o assunto era explorar vários personagens de um microcosmo e universaliza-lo num equilíbrio impressionante. Coisa de gênio.

Os empregados: a parte de baixo. 

Assassinato em Gosford Park (Gosford Park / EUA - Itália - Reino Unido / 2001) de Robert Altman com Kelly MacDonald, Maggie Smith, Michael Gambon, Clive Owen, Helen Mirren, Emily Watson, Kristin Scott Thomas, Eileen Atkins, Jeremy Northam, Bob Balaban, Tom Hollander, Ryan Phillipe, Richard E. Grant, Charles Dance, Camilla Rutherford, Sophie Thompson e Stephen Fry. ☻☻☻☻

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