Hannibal: Lecter encontra uma Clarice diferente.
Depois de O Silêncio dos Inocentes ter se tornado uma obra prima, obviamente que todo mundo queria ver (e lucrar) mais um pouco com o personagem canibal Hannibal Lecter (personificado com perfeição por Anthony Hopkins no filme de 1991), a começar pelo criador do personagem, Thomas Harris. Harris havia criado Dr. Lecter para ser coadjuvante em uma série de livros policiais. O primeiro deles era Dragão Vermelho, que publicado em 1981 virou filme dirigido por Michael Mann cinco anos depois. Sob o nome de Manhunter o filme não empolgou nas bilheterias, ainda que contasse com um elenco eficiente, a começar por Brian Cox que vivia o canibal que auxiliava o FBI em investigações (que no filme era chamado de Lektor), mas que tinha lá suas pendengas com o agente especial Will Graham (William Petersen). Independente da repercussão do filme, Harris utilizou Lecter posteriormente no sucesso editorial O Silêncio dos Inocentes, que chegou às livrarias em 1988. Hollywood ficou de olho no potencial do livro e resolveu passar a borracha no filme anterior e criar um universo próprio para a nova obra. Nascia um clássico do cinema, que dita referências para os filmes e séries de suspense até hoje. Com a consagração de Lecter e a agente Clarice (imortalizada por Jodie Foster nas telonas), Harris buscou inspiração para criar um livro que abordasse as entranhas de um dos maiores vilões do cinema. Assim, foi lançado em 1999 o aguardado livro Hannibal. Para quem esperou tanto tempo, a obra mostrou-se decepcionante. Talvez por estar fascinado pelo seu personagem, Harris foi criticado pelas descrições indigestas e a agressividade presente em seu novo livro. Desde o início começou a ser anunciada uma continuação para o sucesso de 1991, mas, diante do conteúdo da nova obra, Jonathan Demme e Jodie Foster não se mostraram interessados a se envolver. Hollywood se viu com um abacaxi nas mãos e convidou Ridley Scott (que anunciava seu retorno ao topo com Gladiador/2000) para dirigi-lo. Com Hopkins dentro do projeto, restava encontrar uma atriz à altura do desempenho colossal de Jodie. O convite foi para Julianne Moore. O resultado chegou aos cinemas em 2001 coberto de expectativas e disposição de gerar bilheterias milionárias. A bilheteria não decepcionou, mas quem esperava um filme à altura do anterior teve que se contentar com uma trama mal costurada e de gosto duvidoso.
Dragão Vermelho: hora de reciclar.
Enquanto Hopkins tentava dominar o personagem, sua colega de elenco tinha que dar conta de uma Clarice endurecida e com menos nuances que a anterior. Essa diferença até que convence na mudança física da agente, que se mostra mais cansada com um FBI burocratizado e massacrante - enquanto Lecter é considerado um dos dez assassinos mais perigosos do mundo. Lecter e Starling tem poucas cenas juntos e sobram cenas grotescas com vísceras e cérebro à mostra enquanto um vilão mal explicado (vivido por Gary Oldman) quer se vingar há tempos do amigo canibal. Longe de ser memorável, o filme serviu apenas para reencontrar os personagens anos depois, o problema é que o passar do tempo lhes fez muito mal. O problema da franquia estava instalado! O próprio autor, o cinema e o público (que deu a Hannibal uma bilheteria maior que o filme anterior) entenderam que esse era o mundo do personagem, com muito sangue e carnificina, deixando para trás o que era mais bacana: o jogo psicológico traiçoeiro entre os personagens e o público. Cientes de que o filme havia passado dos limites, mas sedentos de bilheteria robustas, convidaram Brett Ratner para baixar o tom na refilmagem de Manhunter, agora devidamente batizado de Dragão Vermelho - tal e qual o livro que lhe deu origem. Lançado em 2002, Dragão Vermelho fez sucesso, ainda que modesto se comparado aos filmes anteriores. Lecter voltava a ser coadjuvante e Will Graham (agora vivido por Edward Norton) vivia uma espécie de Clarice Starling de calças que precisava lidar com suas pendengas pessoais com o canibal enquanto buscava o assassino do título (vivido por Ralph Fiennes). Apoiado por um bom elenco (que ainda contava com Emily Watson e Harvey Keitel), Dragão Vermelho era um filme modesto, mas que consegue entreter o público melhor do que a versão anterior do livro. Apesar disso, os fãs percebiam que nenhum outro filme conseguiria chegar ao nível de O Silêncio dos Inocentes. Assim, Anthony Hopkins disse não voltar a personificar o famoso personagem. Diante disso, os fãs mais ferrenhos queriam mais Hannibal em cena e Thomas Harris teve a brilhante ideia de voltar à juventude do psiquiatra erudito e psicótico. Lançado em 2006, o livro Hannibal Rising, contava a infância e adolescência do personagem. Assim sabemos que o personagem enfrentou os horrores dos últimos dias da Segunda Guerra Mundial na Lituânia, perdendo os pais na guerra e a irmã caçula num ataque de soldados canibais (?!). Hannibal cresce e busca vingança, torna-se estudante de medicina e se envolve com a viúva oriental de seu tio.
A Origem do Mal: Hannibal meio francês.
Se a história já parecia perder de vista o personagem que conheciamos, a coisa ficou mais complicada quando escolheram o francês Gaspard Ulliel para viver o personagem no cinema na versão lançada em 2007. Diante de nenhuma semelhança de Ulliel com Hopkins o filme parecia anunciar um reinício para o personagem. A fraca atuação de Ulliel só evidencia como Harris perdeu o poder sobre o personagem, já que ao invés de ser um dos vilões mais celebrados do cinema, Hannibal torna-se quase um herói numa trama estapafúrdia. Nem podemos culpar o diretor Peter Webber que tinha pouco a fazer com a trama desengonçada. Diante da decepção geral de público e crítica, o personagem parecia engavetado por um bom tempo. Em 2013 os detentores dos direitos do personagem perceberam que não podiam deixar um sujeito tão interessante de lado e lançaram a série Hannibal, que aos poucos encontra o tom mais acertado do que as últimas produções do canibal na telona.
Manhunter - Caçador de Assassinos (EUA-1986) de Michael Mann com William Petersen, Brian Cox, Kim Greist, Joan Allen e Stephen Lang.
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O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs) de Jonathan Demme com Anthony Hopkins, Jodie Foster, Scott Glenn e Ted Levine.
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Hannibal (EUA-2001) de Ridley Scott com Anthony Hopkins, Julianne Moore, Ray Liotta e Gary Oldman.
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Dragão Vermelho (Red Dragon - EUA/2002) de Brett Ratner com Edward Norton, Ralph Fiennes, Emily Watson e Anthony Hopkins.
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Hannibal - A Origem do Mal (Hannibal Rising/EUA-2007) de Peter Webber com Garspard Ulliel, Gong Li e Rhys Iphans. ☻
Cox, Hopkins, Ulliel e Mikkelsen: as faces do mal. |
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