segunda-feira, 31 de julho de 2017

N@ Capa: Atrizes Duplicadas

Posando para Andrew Walker

O fotógrafo Andrew H. Walker já ilustrou nossa capa de março com sua proposta de retratar como um artista é diante e fora da mídia. Espantando a mesmice daquelas fotos tradicionais de artistas em festivais, ele propôs esta ideia a 51 artistas presentes no Festival de Toronto - 2016. O resultado é tão intrigante quanto divertido. Neste mês o destaque de suas lentes foi totalmente feminino. Outras fotos deste trabalho de Walker ainda aparecerão até o fim do ano aqui no blog. Neste mês de férias que vai acabando eu também resolvi fazer diferente e destaquei meus trabalhos cinematográficos favoritos das atrizes que já apareceram aqui no diáriw: 












HIGH FI✌E: JULHO

Cinco filmes assistidos no mês de julho que merecem destaque:

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4EVER: Jeanne Moreau

23 de janeiro de 1928 ✰  30 de julho de 2017

Filha de um barman francês e uma bailarina britânica, Jeanne Moreau foi um verdadeiro ícone do cinema. Teve formação de atriz clássica no renomado Conservatório e ganhou fama no Teatro Nacional Popular na França. Moreau atuou em mais de cem filmes, muitos são clássicos absolutos cultuados até hoje - como Ascensor para o Cadafalso (1958), Amantes (1958), A Noite (1961), Jules e Jim (1962) e Trinta Anos esta Noite (1963). Ela trabalhou com os maiores nomes do cinema europeu, ganhando vários prêmios (BAFTA, César, melhor atriz em nos Festivais de Veneza, Cannes, Berlim...). Em 65 anos de carreira, ela atuou até no cinema brasileiro (com Joanna Francesa/1973 de Cacá Diegues)! Jeanne também ficou conhecida como cantora, roteirista e diretora de cinema. Por sua postura de mulher forte e até rebelde contra a rotina, muitos a consideravam a versão francesa de Bette Davis. Não foi divulgada a causa da morte. 

PL►Y: O Clã

Os Puccio: atrocidades no porão. 

Sinto certa inveja quando vejo os filmes argentinos. Sempre fico impressionado com as qualidades do cinema dos hermanos, a capacidade de criar narrativas com roteiros bem elaborados, atuações intensas e cortes precisos na ilha de edição, não que no Brasil não existam alguns poucos filmes que sejam assim mas... O resultado disso é que todo ano algum filme argentino impressiona por sua bilheteria astronômica entre o público do país. Em 2015 foi a vez de O Clã de Pablo Trapero superar as bilheterias do oscarizado O Segredo dos Seus Olhos (2009) e do badalado Relatos Selvagens (2014), o filme bateu recordes (um deles foi de em dez dias ser visto por um milhão e meio de espectadores) o que, realmente, não é para qualquer um. O filme conta a história real da família Puccio, uma família aparentemente normal, mas que praticava sequestros milionários no início da década de 1990 - mantendo suas vítimas por dias aprisionadas no porão até que o resgate fosse pago em vão, já que matavam seus reféns para evitar o risco de serem descobertos. O mentor desta família era o pai, Sr. Arquímedes (um assustador Guillermo Francella), que ganhova a vida como mentor de vários crimes quando era agente do serviço de inteligência da mais recente ditadura militar do país (1976-1983). O patriarca utilizava sua vasta experiência e conhecimento para driblar a polícia e os investigadores com muito jogo de cintura. Entre um sequestro e outro, o filme se concentra na relação do pai com o primogênito, Alejandro (Peter Lanzani) que se tornou até famoso ao integrar o time de rúgbi argentino. A relação entre os dois é o grande fio condutor da trama - sendo vivida em menor intensidade entre os outros herdeiros dos Puccio - já as herdeiras e a mãe parecem saber o que está acontecendo mas evitam maiores conflitos e envolvimentos. Trapero investe curiosamente numa narrativa pop para esta trama criminal. As cores são intensas, a música (curiosamente de hits em inglês) e  uso de um humor cruel geral (propositalmente) desconforto na plateia. O roteiro, embora não seja muito elaborado (apenas intensifica os conflitos entre pai e filho entre os sequestros que começam a desandar) consegue ser valorizado pelo excelente trabalho do diretor, especialmente na construção do horror palpável dos vizinhos e amigos que não imaginavam que aquela família fosse capaz de cometer tamanhas atrocidades. Guillermo Francella está sensacional como o pai desta família macabra! Seu olhar fixo e gélido (como se estivesse sempre à espreita) provoca arrepios e o faz bem diferente de sua simpática participação em O Segredo dos seus Olhos e de toda sua carreira como comediante. A cena da discussão final entre pai e filho e o último ato de Alejandro são verdadeiras aulas de cinema, onde cada detalhe é tira o fôlego do espectador. O mais curioso é que ainda que trate de uma história ocorrida há mais de vinte anos, O Clã ainda fala muito sobre várias famílias engravatadas que cometem crimes com a serenidade de quem come um pacote de jujubas - e aparecem com a mesma cara de pau todos os dias nos telejornais. 

O Clã (El Clan / Argentina - 2015) de Pablo Trapero com Guillermo Francella, Peter  Lanzani, Lili Popovich e Ranco Masini. ☻☻

4EVER: Sam Shepard

05 de novembro de 1943 ✰ 27 de julho de 2017

Filho de professores, Samuel Shepard Rogers nasceu no estado americano de Ilinois e passou parte de sua infância mudando para bases militares quando o pai era oficial. Somente anos depois a família se estabilizou na California. Sam se formou em agricultura e tinha planos de se tornar veterinário até que seu envolvimento com o teatro se tornou cada vez mais intensa. Ele começou a escrever peças e ter algum prestígio na década de 1970, mas sua estabilidade foi alcançada na década seguinte, quando se tornou um respeitável dramaturgo e ator de teatro e cinema. Sam foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante por sua participação no clássico Os Eleitos (1982) e atuou em mais de 60 filmes, entre eles o recente Álbum de Família (2013) ao lado de Meryl Streep e Destino Especial (2016) com Michael Shannon. No entanto, recentemente seu papel de maior destaque foi na série Bloodline (2015-2017). Sam faleceu no dia 27 de julho, mas foi divulgada somente agora pela família sem maiores detalhes sobre as causas. Shepard foi casado entre 1982 e 2011 com a atriz Jessica Lange, com quem teve dois filhos. 

domingo, 30 de julho de 2017

Na Tela: Dunkirk

Dunkirk: Nolan vai para a guerra. 

Ainda que Christopher Nolan tenha em seu currículo três indicações ao Oscar (pelos roteiros de Amnésia/2000 e  A Origem/2010 - pelo qual também concorreu ao prêmio de Filme do Ano), existe uma certa mágoa com a Academia que perdura desde que o seu magnífico O Cavaleiro das Trevas (2008) ficou de fora das categorias de filme e direção. Se com Interestelar (2014) muita gente já viu sinais de desgaste na criatividade do moço, com Dunkirk ele quer mostrar que é um diretor maduro, capaz de revisitar um drama de guerra histórico com personalidade e estilo bastante próprios. Feito em proporções épicas em todos os quesitos técnicos, Dunkirk é um espetáculo para se apreciar na telona, com som ensurdecedor e toda a sorte de sons e recursos de que o cinema possui para se tornar uma experiência verdadeiramente imersiva (sem 3D, por favor). Houve gente que reclamou do som alto do filme, que a cada explosão ou zunido de avião parece transportar o espectador para dentro da Operação Dínamo, mais conhecida como a evacuação de Dunquerque - onde os aliados da Bélgica, Império Britânico e França esperavam ser resgatados após serem cercados pelo exército alemão no início da Segunda Guerra Mundial. O resgate ficou conhecido por todas as atribulações que  geraram uma verdadeira batalha no litoral franco-belga. Trata-se de uma conhecida história de derrota que Nolan transforma em uma trama sobre sobrevivência. Desde a primeira cena o diretor já insere o espectador nos horrores da guerra com o jovem soldado Tommy (Fionn Whitehead) vê seus amigos serem mortos um a um quando ruma para o litoral. Chegando lá ele percebe que as coisas não serão muito fáceis se quiser chegar em casa. Em melhor situação não está o piloto Farrier (Tom Hardy) que em meio aos problemas com seu avião terá que proteger quem aguarda o resgate no litoral ou até mesmo Sr. Dawson (Mark Rylance) que parte com o filho, Peter (Tom Glynn-Carney) e um amigo deste, George (Barry Keogahn que em breve aparecerá no premiado The Killing of a Sacred Deer) para ajudar no resgate das tropas com seu barco particular de fim de semana. Com esses três núcleos, Nolan mostra histórias de anônimos que se envolveram numa operação com tudo para dar errado, mas que era a única chance de regate dos soldados que já haviam perdido a batalha. No entanto, o filme não se preocupa em contar a história pessoal de cada personagem, pelo contrário, os coloca logo em situações limite e, por isso mesmo, imprevisíveis. Assim, Nolan contrapõe os conflitos macros da narrativa com os pequenos conflitos das relações humanas em sua generosidade e mesquinharias. Os efeitos especiais e sonoros são uma atração a parte e compõem boa parte do espetáculo que o filme se propõe. Se em Amnésia (2000) o diretor brincava com a edição para reproduzir o efeito na mente do espectador, para depois abusar dos efeitos especiais e movimentos de câmera em  A Origem para alcançar o mesmo efeito, aqui ele utiliza uma sonoridade avassaladora  para deixar o espectador tão atordoado como seus personagens. Admiro a capacidade do diretor querer causar vertigens na plateia com todo som e fúria da guerra, mas poderia ter utilizado menos a trilha sonora constante (que em alguns momentos está sobrando em cena). Provavelmente Dunkirk será lembrado nas premiações, mas não é a obra-prima que Nolan gostaria que fosse - tenho a impressão que parte de sua alma ficou perdida na ilha de edição, afinal de contas, sua montagem mesclada das três histórias em tempos distintos serve mais para confundir do que envolver a plateia. Houvesse seguido uma narrativa mais linear, Dunkirk talvez  tivesse um efeito ainda mais impactante no espectador que sente-se meio perdido nos pedaços que precisa juntar. Pode se dizer que Dunkirk exacerba todas as características que os críticos do diretor sempre apontam: é grandiloquente, megalomaníaco, ambicioso, pretensioso mas também é a obra mais imersiva e séria de um diretor que já não precisa provar mais nada para ninguém. 

Dunkirk (Reino Unido/França/EUA/Países Baixos - 2017) de Christopher Nolan com Fionn Whitehead, Mark Rylance, Rom Hardy, Barry Keoghan, Cillian Murphy, Tom Glynn-Carney, Jack Lowden e Kenneth Brannagh. ☻☻

§8^) Fac Simile: Lily Collins

Lily Jane Collins
Passeando por Los Angeles nosso repórter encontrou Lily Collins em um badalado restaurante. A atriz está em alta depois de sua indicação ao Globo de Ouro por Exceção às Regras/2016 de Warren Beatty e colhe elogios por sua atuação como a jovem vítima de anorexia no recente To The Bone (no Brasil: O Mínimo para Viver). Nosso repórter convenceu a filha de Phil Collins a responder cinco perguntas nessa entrevista que nunca aconteceu:

§8^) Em primeiro lugar parabéns pelo seu trabalho em To the Bone, foi difícil perder muito peso e perceber que ficou a cara da Rooney Mara?

Lily [risos] Sério? Você foi o primeiro a me dizer isso! Agradeço ao elogio, isso foi um elogio não foi [risos]? To the Bone foi um trabalho bastante complicado de fazer, não apenas pela dieta insuportável que fiz, mas por lidar com alguns sentimentos complicados sobre a imagem que tem de si mesmo. O mais assustador não foi parecer com a Rooney Mara, mas ver pessoas me elogiando pela magreza e perguntarem o que eu estava fazendo para definhar tão rápido. O culto à magreza é uma coisa realmente assustadora!

§8^) Você já teve problemas com sua aparência antes do filme?

Lily Sim, claro! Acho que todo mundo tem aquele momento em que acha que poderia perder algumas medidas, mas é um problema quando se torna um exagero obsessivo e começa a afetar a saúde. Tudo bem perder peso por se alimentar melhor ou praticar exercícios, mas perder peso porque você sempre acha que está acima do peso é algo realmente doentio. Hoje eu me olho no espelho e fico bastante satisfeita com o que vejo. 

§8^) Como foi ser indicada ao Globo de Ouro por um fracasso retumbante como Exceção às Regras? 

Lily Foi... surpreendente, quando todo mundo estava massacrando o filme eu só pensava no que eu havia me metido! Quando o Globo de Ouro lembrou de mim foi um daqueles momentos em que você diz "Ufa! Me safei"! Mas hoje em dia as pessoas sempre são muito severas com tudo! Eu fiz uma pequena participação em Okja e acompanhei toda aquela polêmica sobre a Palma de Ouro em Cannes e o fato do filme também ser  da Netflix... eu só pensava que fazer filmes deveria ser algo muito mais simples e louvável, afinal, trata-se de um filme lindo e se foi feito para o cinema ou para streaming é realmente tão relevante assim? Antes eu sofria com isso, mas meu pai me explicou que a arte é assim mesmo, irá sensibilizar alguns e causar ódio em outras pessoas. Foi com ele  que aprendi que devo fazer a minha parte bem feira, quanto a opinião dos outros eu não tenho controle. 

§8^) Além de ícone da música seu pai também fez alguns trabalhos como ator, tem algum que você gosta mais?

Lily Sim! Gosto muito dele como o dono de sauna gay bigodudo de E a Vida Continua (1993). Aquela voz e trejeitos... sempre que eu vejo eu imagino ser outra pessoa. 

§8^) Eu sempre imagino que ele cantava Against All Odds para você dormir...

Lily Que isso... essa ele cantava para minha mãe [risos]! Eu gostava quando ele cantava Hold on My Heart do Genesis mas depois eu passei a pedir para ele cantar You'll be in my Heart que eu achava que ele escreveu para mim e não para o filme do Tarzan! Ontem mesmo ele cantou um pedacinho no telefone... ser filha do Phil Collins tem suas vantagens. 

§8^) E como é ser dona de uma das sobrancelhas mais robustas do cinema?

Lily [risos] Uma? Na verdade são duas [gargalhadas]! Sei lá, nunca pensei nisso! Mas sempre que vejo as do Lee Pace eu fico imaginando como seria se tivéssemos um filho juntos! 

Na Tela: O Mínimo para Viver

Lily: a vida na balança. 

Nos últimos tempos se tornou comum fazer filmes bem humorados sobre temas sérios, só a temática de jovens com câncer rendeu dois que colheram boas críticas e sucesso de público - me refiro a 50% (2011) e A Culpa é das Estrelas (2014). Agora chegou a vez da Netflix lançar seu filme engraçadinho sobre um tema sério: To the Bone tem como protagonista uma jovem vítima de anorexia e, ao ser protagonizado por adolescentes, sempre busca equilibrar drama e bom humor. O resultado rendeu críticas pela forma como apresenta a doença, mas, ao meu ver, o filme da diretora estreante Marti Noxon alcança seus objetivos. Penso que a ideia nunca foi ser didático sobre o tema (e existem trocentos materiais por aí sobre o tema), não se trata de um documentário, mas um longa de ficção. Vale destacar que ainda que seja recheado com humor mordaz, existem momentos em que os perigos da anorexia ficam claros, sem perder de vista a relação da internet com este perigoso distúrbio alimentar. O filme conta a  história de Ellen (Lily Collins), adolescente diagnosticada com anorexia e que alcançou algum sucesso na internet com seus desenhos sobre o tema no tumblr. No entanto, a fama lhe trouxe um efeito colateral que agravou ainda mais seu quadro, motivo pelo qual a madrasta procurou tratamentos alternativos para evitar que o corpo de Ellen chegasse ao colapso. É assim que a personagem conhece o doutor Beckham (Keannu Reeves em um bom momento) que irá lhe convencer a fazer um acompanhamento intensivo numa casa - junto com outras pessoas de sua idade  - que precisam melhorar o relacionamento com a alimentação. São nos personagens que compartilham aquela casa que a diretora (que também assina o roteiro) nos insere num mundo bastante particular e assustador. Da mulher grávida (Leslie Bibb) que precisa se alimentar para manter o bebê, passando pela garota que esconde uma sacola mal cheirosa embaixo da cama, o filme utiliza seus personagens para mostrar que os distúrbios alimentares são bem mais complicados do que a tentativa de se enquadrar em padrões estéticos. O filme também evita buscar justificativas fáceis para a anorexia, mas no caso de Ellen demonstra como o mais importante é o relacionamento dela consigo mesma - afinal o pai nunca está presente, a mãe é autocentrada demais para perceber o que acontece com a filha e a madrasta, por mais bem intencionada que seja, às vezes fala demais. Sorte que outro paciente, o expansivo Luke (Alex Sharp), cruza o seu caminho e mostra para Ellen que viver a vida com leveza é fundamental (e ele não está falando de quilos). A relação entre Ellen e Luke faz lembrar a forma como as obras de John Green lidam com temas sérios para os chamados young adults - o que deve ter sido a maior inspiração de Marti Noxon para construir o filme. Neste aspecto, Lily e Alex merecem destaque pela química que constroem em cena. O casal nascido no Reino Unido se destacam entre o bom elenco. Lily prova que dá conta de fazer papéis complicados, sabendo ser cômica e comovente sem exageros, já Alex marca aqui sua promissora estreia em filmes. O rapaz (de 28 anos) já se tornou o mais jovem ganhador do prêmio Tony em 2014 por sua atuação na Broadway e em breve estará no aguardado How to Talk to Girls at Parties de John Cameron Mitchell (ou seja, é um nome para se ficar de olho). O Mínimo para Viver (nome horroroso para o bom sugestivo título em inglês - "Até o Osso") sabe que a comédia serve para desarmar o espectador na abordagem de temas sérios e aqui utiliza o senso de humor para aproximar o público e fazê-lo pensar nos efeitos devastadores da anorexia. 

Lily e Alex: compatriotas de talento. 

O Mínimo para Viver (To the Bone/EUA-2017) de Marti Noxon com Lily Collins, Alex Sharp,  Carrie Preston, Keanny Reeves, Liana Liberato, Lily Taylor, Leslie Bibb, Maya Eshet e Brooke Smith. ☻☻

sábado, 29 de julho de 2017

PL►Y: Una

Rooney e Ben: remoendo o passado.

Una é uma jovem que mora com a mãe, trabalha num escritório sem muita importância e não tem namorado. Faz sexo com rapazes que acabou de conhecer em alguma balada. Una sente que a sua vida está estagnada por não ter se recuperado do seu relacionamento com Ray, que era amigo do seu pai, tinha namorada e cujo desenlace da relação foi parar nos tribunais. Una era uma garota de treze anos manteve encontros sexuais com Ray - e, por mais estranho que pareça, Una está disposta a reencontrá-lo e passar a história a limpo. Baseado na polêmica peça Blackbird de David Harrower, a estranha Una cai como uma luva no estilo um tanto anestesiado de Rooney Mara, afinal a personagem ainda se sente presa ao relacionamento abusivo que a marcou profundamente. Por outro lado, quando ela encontra Ray o que vemos é Ben Mendelsohn criando um personagem bastante complexo. O ator australiano faz o que parece ser impossível com um personagem que poderia ser apenas repulsivo, já que ele consegue lhe imprimir charme e nuances que são capazes de confundir o espectador sobre sua versão da história. Quando Una aparece no trabalho de Ray, ela e o espectador estão tão certos do quão condenável é a índole daquele homem que torna ainda mais interessante o quando o filme tenta subverter nossas impressões sobre ele, especialmente pelos rumos que sua vida seguiu desde então. O diretor Benedict Andrews (que antes tinha no currículo somente uma edição do National Theatre no Reino Unido com Um Bonde Chamado Desejo estrelado por Gillian Anderson) age corretamente ao deixar sua dupla de atores livre para construir a tensão com os diálogos ásperos sendo bastante convincentes como um casal fadado ao desastre (seja no passado ou no presente). Vale destacar que as idas e vindas da narrativa são usadas de forma bastante eficiente, mostrando causa e efeito de determinados acontecimentos na vida dos protagonistas e nunca simplifica o que existe entre os dois - o que torna a obra ainda mais controversa, mas nada que resista ao último ato que deixa o público diante do quão monstruoso Ray pode ser em sua atração por crianças. É verdade que o filme derrapa quando se torna excessivamente descritivo, já que existem cenas que já são capazes de revelar o quão dolorido e desagradável foi tudo o que aconteceu, ou quando a essência teatral do texto fica evidente diante da câmera, mas ainda assim o filme desperta sensações realmente divergentes na plateia. No entanto, o maior mérito do filme é evocar referências (do clássico Lolita a MeninaMá.com/2005 ou até mesmo Dúvida/2008) e virá-las do avesso, rendendo um material ainda mais interessante para os seus atores. Rooney pode ainda não ser a grande atriz que dizem que ela é - mas ela tem mérito em conseguir bons papéis entre os trabalhos em que basta sempre fazer a mesma cara esquisita -, porém em seu duelo com Mendelsohn existem momentos arrepiantes, principalmente porque o filme ousa "humanizar" um sujeito execrável, o que torna tudo ainda mais assustador. 

Una (Reino Unido/EUA/Canadá - 2016) de Benedict Andrews com Rooney Mara, Ben Mendelsohn,  Ruby Stokes, Riz Ahmed e Tara Fitzgerald. ☻☻☻

Na Tela: Eu Não Sou Seu Negro

Baldwin: resgate de uma figura histórica. 

Não deixa de ser interessante que no ano em que três fortes concorrentes ao Oscar de Melhor Documentário abordavam a tensão racial na terra do Tio Sam, acabasse sendo premiado a obra que abordava um negro sendo acusado de assassinato ("O.J.: Made in America", na verdade uma série documental da ESPN).  Se somente filmes estivessem concorrendo (o que irá acontecer no ano que vem), provavelmente o documentário Eu Não Sou Seu Negro de Raoul Peck teria levado o prêmio para casa (derrotando o outro favorito, 13ª Emenda de Ava DuVernay). O filme é interessantíssimo ao conjugar imagens com a narrativa do escritor James Baldwin sobre políticas raciais nos EUA - e o mais assustador é que Baldwin está morto há quase três décadas, mas o seu discurso permanece tão atual quanto antes. O texto que escutamos é inteiramente extraído de trabalhos do escritor, principalmente dos meados da década de 1970, quando ele tentava esboçar um livro sobre o impacto sofrido pelas mortes de Medgar Evers, Martin Luther King e Malcolm X na comunidade afro-americana e como as utiliza para exemplificar uma cultura forjada sobre a ideia de uma supremacia branca. Existe uma riqueza de material histórico tão grande no filme que é impossível não rever alguns conceitos que temos sobre o que está por trás da maioria das produções culturais americanas. Passando por cenas de entrevistas, filmes e programas de televisão, as palavras de Baldwin (lindamente defendidas pela voz de Samuel L. Jackson na narrativa que emoldura todo o filme) nos leva a uma jornada incômoda ao epicentro do racismo. Da luta pelos direitos civis, passando pelo discurso de ódio quando uma jovem negra ousou estudar numa escola "para brancos" o que vemos é um mundo onde o preconceito era legitimado e vivido sem pudores - e que provavelmente muita gente sente falta. Além de trazer um ensaio histórico sobre a questão racial bastante relevante, o filme faz ainda o favor de resgatar uma figura histórica que andava esquecida. Nascido em Nova York em agosto de 1924, James Arthur Baldwin se tornou reconhecido como dramaturgo por suas obras tornarem palpáveis os dilemas  sociais, psicológicos, sexuais e raciais dos personagens. James perdeu o pai para as drogas e viu a mãe se casar com um pastor que sempre lhe tratou com bastante rigidez, o que não impediu que aos dez anos ele sofresse abuso sexual praticado por dois policiais de Nova York. Toda as dores da experiência de vida do escritor ajudaram a construir seu olhar bem-estruturado, coerente e até benevolente sobre os conflitos das relações humanas - o que fica evidente nos textos utilizados neste documentário. Nas cenas em que aparece, Baldwin nunca parece agressivo ou irredutível, pelo contrário, bem articulado e com uma clareza de ideias impressionante, Eu Não Sou Seu Negro retrata com perfeição sua perspectiva sobre um dos problemas que ainda persiste até hoje na sociedade americana - e que parece se fortalecer em todo o mundo a cada dia. Analisado como cinema, a obra de Raoul Peck causa arrepios pela parceria perfeita entre suas ideias e a obra do escritor, como se os dois houvessem planejado este projeto meticulosamente por anos. Suas imagens caem como uma luva às palavras de Baldwin que geram análises contundentes sobre cultura e política social. Dinâmico e bem estruturado, o filme tem o grande mérito de revelar uma grande complexidade na estrutura do discurso racista e o que ele tenta esconder em suas entranhas ideológicas mais ocultas. 

Eu Não Sou Seu Negro (I Am Not Your Negro/EUA-2016) de Raoul Peck com Samuel L. Jackson, James Baldwin, Harry Belafonte e Dick Cavett. ☻☻☻

quarta-feira, 26 de julho de 2017

PL►Y: Gênios do Crime

Kristen e Zach: um grande assalto abestalhado. 

A comédia Gênios do Crime deve trazer o grupo de ladrões mais cretino da história do cinema. O que torna o filme mais interessante é que foi inspirado na história real de David Ghantt, um guarda de carros blindados da companhia Lomis Fargo que se tornou responsável pelo roubo de 17 milhões de dólares de bancos variados que estavam em poder da companhia. Curiosamente, Ghantt não ficou com um centavo do dinheiro enquanto se escondia em cidades da América Latina. Trata-se de uma história tão absurda que o diretor Jared Hess não hesita de fazer chacota da coleção de personagens um tanto abestalhados que tem em mãos. Talvez por conta dos exageros (mas o que esse povo esperava do diretor de Napoleon Dynamite/2004 e Nacho Libre/2006 ?) o filme foi muito mal nas bilheterias americanas, conseguindo uma distribuição bastante problemática ao redor do mundo - o que não ajudou em nada a sua carreira internacional. Disponível agora no Netflix, talvez seja a hora de assistirmos ao filme sem tanta severidade e apreciar o bom elenco num roteiro que beira o absurdo. Zach Galifianakis (com seu jeito sem noção habitual) vive David Ghantt e convence como um sujeito que entra numa furada sem se dar conta do que está fazendo. O "gênio do crime" em questão é Steve Chambers (Owen Wilson), amigo de Kelly Campbell (Kristen Wiig), colega de trabalho pela qual David tem uma quedinha. Kristen consegue dar algum charme personagem, tornando compreensível como um sujeito feito David se apaixonaria por ela, ainda mais se levarmos em conta a comicamente estranha na noiva de David encarnada por Kate McKinnon. Se Kate nunca prima pela sutileza, aqui seu humor fora de órbita ajuda  a entender que todo mundo na história tem realmente os parafusos um tanto frouxos. Completam o elenco Jason Sudeikis (como um assassino profissional desencanado) e a dupla Leslie Jones e Jon Daly na pele dos agentes do FBI responsáveis por descobrir o paradeiro do dinheiro roubado. Investindo num besteirol com reconstituição de época breguérrima (o filme se passa em 1996), o filme demonstra que o humor do diretor Jared Hess continua fugindo do lugar comum e, por isso mesmo, pouca gente se identifica com seu senso de humor bastante peculiar. Definitivamente o diretor não quer problematizar nada, reinventar o humor americano, ser levado a sério ou parecer sofisticado, sua intenção é apenas divertir com um bom elenco de comediantes diante de sua câmera e sua linguagem narrativa bastante própria. 

Gênios do Crime (Masterminds/EUA-2016) de Jared Hess com Zach Galifianakis, Kristen Wiig, Owen Wilson, Jason Sudeikis, Kate McKinnon, Leslie jones, Jon Daly e Mary Elizabeth Ellis. ☻☻☻

quarta-feira, 19 de julho de 2017

10+: Scarlett Johansson

Scarlett Ingrid Johansson nasceu em Nova York no ano de 1984 e começou a carreira aos dez anos ao lado de Elijah Wood em O Anjo da Guarda. Acumulando 22 anos, Scarlett é uma das atrizes mais bem sucedidas de sua geração, atuando em filmes independentes ou de grandes estúdios com a mesma desenvoltura. Indicada a quatro Globos de Ouro e premiada por seus trabalhos no teatro, só falta o Oscar lembrar que a moça ainda não teve uma indicação à estatueta até agora. A seguir, minhas dez atuações favoritas da atriz:

#10 Vicky Cristina Barcelona (2008) de Woody Allen
Terceira parceria com Allen (ofuscada por Penélope Cruz). 

#09 Ghost World (2001) de Terry Zwigoff
Antes de ser musa, Scarlett era uma adolescente cool. 

#08 Diário de uma Babá (2007) de Shari Springer e Robert Pulcini
Ela encontra pela segunda vez o Capitão América!

Pena que ela aparece pouco como a diva aquática de Hollywood!

E aí, Marvel? Quando sai o filme solo da Viúva Negra?

... ou: como ter uma ótima atuação sem aparecer em cena!

#4 Sob a Pele (2013) de Jonathan Glazer
Triste alienígena perdida na Terra. 

#03 Match Point (2005) de Woody Allen
Brilho na primeira parceria com o cultuado diretor. 

#02 Encontros e Desencontros (2003) de Sofia Coppola
Musa introspectiva de Coppola filha. 

#01 Moça com Brinco de Pérola (2003) de Peter Webber
Belíssima (re)criação da obra de Johanees Vermeer.

PL►Y: A Vigilante do Amanhã

Pitt e Scarlett: a verdade do vilão. 

Não há como negar que Ghost in The Shell (1995) é um filme absolutamente cult. O clássico anime inspirado na obra de Shirow Masamune inspirou vários filmes de ficção científica (incluindo Matrix/1999) e vivia rodeado de boatos de que teria uma versão em carne e osso, mas ninguém tinha coragem de tirar o projeto do papel. Eis que a estrela Scarlett Johansson declarou ter interesse em ser a protagonista que os estúdios logo deram forma ao filme. Nem vou entrar na discussão sobre whitewashing - por tornar brancos personagens japoneses, porque acho que todo mundo sabe o motivo maior de Scarlett estar no alto dos créditos junto com outros atores americanos. A ideia poderia ser até aproveitada na história sobre identidade e tudo mais, porém, curiosamente, o maior problema do filme é que ele não sabe se abraça a obra que se inspira ou se torna um filme de ação americano. Dirigido por Rupert Sanders, o filme é um deleite visual, pena que não veio acompanhado com um roteiro à altura. Ele perde um tempo danado extraindo o básico da história original e explicando tudo o que acontece diversas vezes, girando a narrativa em torno do mesmo ponto cansativamente. Sendo assim, falta suspense e mistérios para instigar o espectador a acompanhar a jornada de Major (Scarlett) até o fim. Major Miria Killian é uma android com cérebro humano - resultado de um noto tipo de  experiência dos laboratórios Hanka, um modelo que está prestes a ser bastante difundido na tentativa da humanidade lidar com a sua fragilidade. O ponto principal seria os dilemas de Miria em lidar com um corpo diferente do corpo que habita e os sacrifícios que precisa fazer para viver em sua nova forma. Paralelo a isso, ela precisa encontrar um hacker que ameaça a humanidade ao poder controlá-los graças às partes tecnológicas que possuem. Trata-se de uma ideia genial, que faz ainda mais sentido com o fascínio que a tecnologia exerce sobre os seres humanos (que utilizam celulares a todo instante como se fossem partes de seus corpos e mentes), mas o filme decepciona por trazer soluções simplistas para algo que poderia ser muito mais explorado. Nem adianta colocar a premiada Juliette Binoche para dar credibilidade ao que o roteiro diz, ou colocar Michael Pitt em visual impressionante para ser um vilão que se revela mais parecido com Major do que ela imagina. Ironicamente quanto mais a protagonista se aproxima de sua origem, mais a história se distancia do que poderia ter sido. O resultado acaba sendo uma ficção científica  superficial em sua necessidade de tiros e explosões a cada vinte minutos, assim, A Vigilante do Amanhã é um belo espetáculo visual, mas disperso e esquecível - e a culpa nem é de sua estrela. Talvez um diretor mais arrojado (escalar o responsável pelo pífio Branca de Neve e o Caçador/2012 nunca me pareceu uma boa ideia) teria feito toda a diferença, somente ele poderia deixar Batou (o bom ator dinamarquês Pilou Asbaek) tão de lado na história... A Vigilante do Amanhã se distancia bastante do anime e parece mais um remake feminino futurista do Robocop/1987 original - e, mesmo assim, sai perdendo. 

Batou (Pilou Asbaek): de lado. 

A Vigilante do Amanhã (Ghost in the Shell/EUA-2017) de Rupert Sanders com Scarlett Johansson, Juliette Binochhe, Pilou Asbaek, Michael Pitt, Chin Han, Takeshi Kitano e Peter Ferdinando. ☻☻

terça-feira, 18 de julho de 2017

PL►Y: A Chefa

Melissa e Kristen: graça com o mundo dos negócios.

Melissa McCarthy foi indicada ao Oscar de coadjuvante por sua atuação em Missão Madrinha de Casamento (2011), uma pérola da comédia grosseira (que também concorreu ao prêmio de roteiro original) que fez um enorme sucesso (e de vez em quando ainda assisto as reprises). Depois disso, Melissa abraçou a causa do estilo e utiliza sua habilidade de criar tipos e graça do humor físico para manter o pique de protagonizar dois filmes por ano. Em alguns casos a comediante parece repetitiva e a parceria com o marido - o ator/diretor Ben Falcone nem sempre ajuda -  como foi o caso deste A Chefa. Massacrado pela crítica o filme fez algum sucesso nos Estados Unidos, mas deve ter soado o alarme na carreira da atriz (já que aqui no Brasil ele saiu direto em DVD). Embora não traga muita novidade ao currículo da atriz, o filme pelo menos oferece a oportunidade da atriz criar um dos seus tipos mais interessantes na pele da magnata Michelle Darnell. Darnell é um monstro dos empreendimentos, ganhando muito dinheiro nos negócios e em palestras motivacionais cheios de pirotecnia. Porém, ela está prestes a entrar em uma má fase, condenada à prisão, toda sua fortuna vai por água abaixo. Claro que ela vai querer dar a volta por cima - mas poderá contar somente com a  ajuda da ex-secretária, Claire (Kristen Bell) e a pequena Rachel (Ella Anderson), filha de Claire. As três vão acabar se juntando e descobrindo que apesar dos pesares, Claire ainda tem um cifrão no lugar do coração. Ou não? Dirigido por Falcone, o filme tem problemas de ritmo e em alguns momentos erra o tom na tentativa de forçar risadas (como nos tombos insistentes de Michelle), mas o filme tem lá sua graça. Para começar Melissa está divertida fazendo as caras, bocas e trejeitos em sua personagem sempre de gola alta, sendo um verdadeiro amálgama dessas figuras que tentam nos fazer acreditar que todos podemos ser milionários, basta "nunca desistir do seu sonho"! Sei. Todo mundo reconhec que a atriz não tem pudores quando está diante de uma câmera, ou com uma caneta na mão, já que ela também assina o roteiro ao lado do esposo. Sem dar bola para o politicamente correto, ela cria relações que fogem do corriqueiro ao colocar Peter Dinklage como vilão (e antigo affair de Michelle) - que tem como comparsa o grandão Timothy Simons (1,92m), o Jonah Ryan de Veep. Além disso, coloca a cobiçada Kristen Bell fazendo par com o fofo Tyler Labine numa química deliciosa. Não satisfeita, ela cria cenas de puro nonsense como a do clareamento nos dentes, a luta das bandeirantes e a invasão no hotel de luxo. Diante disso, entendo todas as reclamações sobre o filme, mas não posso negar que as risadas foram inevitáveis. 

A Chefa (The Boss/EUA-2016) de Ben Falcone com Melissa McCarthy, Kristen Bell, Peter Dinklage, Ella Anderson, Tylor Labine, Kathy Bates, Timothy Simons e Kristen Schaal. ☻☻☻

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Na Tela: Nunca Me Sonharam

Educação no Brasil: ainda em sua longa jornada.

É sempre curioso como a sociedade repete para si que a educação é fundamental para melhoria da situação de um país. No entanto, poucos se perguntam que educação é essa que se oferece para os alunos. O Brasil é um país de proporções continentais e com uma diversidade que acompanha essa proporção gigantesca. Trata-se de uma diversidade não apena de cores, credos, culturas, mas também de condições econômicas, déficits e sonhos. Nunca Me Sonharam é um documentário sobre alunos do Ensino Médio de diversas localidades. Por sorte ele não pretende ser didático, defender uma corrente educacional ou massacrar mais uma vez a escola pública. O filme de Cacau Rhoden escuta principalmente jovens comentando suas opiniões sobre a realidade que observam e desejam com a escola que possuem. O resultado impressiona por apresentar a distância que existe entre suas angústias e o ensino, muitas vezes fornecido em uma estrutura precária repetindo que eles são responsáveis pelo futuro do país. E quem seria responsável pela educação desses responsáveis pelo futuro? Estes não seriam mais responsáveis ainda pela degradação dos recursos destinados à vastidão de alunos que dependem do Ensino Público? Nunca Me Sonharam evita posicionamentos partidários, mas apresenta entrevistas contundentes (também com educadores, psicólogos, psicanalistas, mães de alunos) que repetem que algo está errado, ou pelo menos, não se encaixa no discurso que é propagado (muitas vezes demagogicamente sobre a educação em nosso país). Imagino o trabalho enorme que Cacau teve para deixar o filme pronto, escolher as melhores falas de seus entrevistados e costurar sua narrativa documental sem perder o foco na dificuldade que a maioria das escolas possuem em criar uma sintonia com seus alunos. Sintonia esta importantíssima para o processo de ensino-aprendizagem e formação de seus estudantes. Manter o foco deve ser o mais difícil, já que a escola está sempre entrecortada por tantos fatores (estigmas, crises econômicas, políticas, sociais, o acesso à informação, a violência, cortes de verbas...) e uma juventude tão cheia de informação - o que potencializou ainda mais a indecisão, a ansiedade e a insegurança perante o mundo que lhes apresentam. Sorte que no meio do desespero, o filme apresenta iniciativas de quem conseguiu repensar sua prática e conseguiu driblar obstáculos com doses consideráveis de criatividade e esperança. A obra comove por ser dolorosamente real ao dar voz a pessoas que geralmente são silenciadas nas propostas educacionais, mas como documentário assusta por ser mais um sobre a educação brasileira em que se percebe que pouca coisa mudou nos paradigmas escolares nas últimas décadas. Imagino Cacau reencontrando seus entrevistados em 2027 e mostrando que futuro eles conseguiram construir. Imagino que todos terão muito trabalho para consertar o caos que vivenciamos nos últimos anos. Diante de todas as dificuldades que vemos retratadas no filme, desejar boa sorte e repetir bordões politiqueiros não é suficiente - e faz tempo... 

Nunca me Sonharam (Brasil/2017) de Cacau Rhoden ☻☻☻

domingo, 16 de julho de 2017

4EVER: Martin Landau

20 de junho de 1928 ✰ 16 de julho de 2017

Martin Landau nasceu no Brooklyn em Nova York, começando sua carreira artística como cartunista e ilustrador no jornal New York Daily News, mas o rapaz queria mesmo era ser ator! Ele começou a fazer teatro em 1951 e oito anos depois já podia ser visto na TV. O seu primeiro trabalho no cinema foi em Os Bravos Morrem de Pé (1959) e no mesmo ano ele apareceu em Intriga Internacional de Alfred Hitchcock. No entanto, continuou seus trabalhos televisivos em várias séries importantes - Além da Imaginação (em 1954 e 1969), Os Defensores (em 1964), O Homem da U.N.C.L.E. (em 1966) e protagonizando a antológica Missão:Impossível  por três temporadas (1966 até 1969). Nos anos 1980 ele se dedicou mais ao cinema, conseguindo sua primeira indicação ao Oscar em Tucker (1988) na categoria de ator coadjuvante, categoria em que seria indicado mais duas vezes - por seu trabalho com Woody Allen em Crimes e Pecados (1989) e sendo premiado seis anos depois por sua inesquecível recriação de Bela Lugosi em Ed Wood. Landau participou de quase duzentas produções e seu último papel marcante foi em Memórias Secretas (2015) de Atom Egoyam. O ator faleceu aos 89 anos de causas naturais após ser hospitalizado. 

PL►Y: Buddymoon

David e Flula: amigos dentro e fora da tela. 

Buddymoon é um dos inúmeros filmes independentes de pequeno orçamento que são vistos em alguns festivais do gênero, rendem risadas, algumas críticas simpáticas, tem uma distribuição minúscula e fica por isso mesmo. Para o caso de você cruzar com o filme em algum lugar, vale a pena conferir esta empreitada dos atores David Giuntoli (da série Grimm) e Flula Borg (que assinam o roteiro) ao lado do diretor Alex Simmons. Simmons pega uma ideia simples e a conduz com uma fluência impressionante, alcançando um resultado divertido e até sensível em seus oitenta minutos de duração. A história gira em torno de David (Giuntoli), um ator que acaba de terminar o relacionamento com a noiva quando estavam prestes a se casar e viajar em lua de mel. David é um atua desde pequeno, mas ainda busca reconhecimento (e pode conseguir ao ser escalado para viver o explorador William Clark pelo qual tanto aguarda). Triste com a maré de azar que atravessa, o amigo alemão Flula (Borg) o convence a fazer a viagem de lua-de-mel ao lado dele, afinal, tudo já está pago e resta apenas aproveitar. A maior parte do filme é sobre os dois amigos convivendo enquanto seguem uma quilométrica trilha até o hotel em que o casal ficaria hospedado. Pelo caminhos os dois conversam, brigam e enfrentam algumas situações divertidas. Com David sendo o amigo bonitão e Flula na pele do amigo bobalhão, o filme até parece que irá cair no velho clichê dos amigos diferentes que se complementam (pelo menos aqui eles se equilibram), mas o longa evita algumas armadilhas com ideias criativas (e antes que você comece a rir de Flula querendo gravar sons da natureza para criar uma  música, lembre-se que o Franz Ferdinand tentou fazer o mesmo para o seu segundo CD e não funcionou - e aqui o final reserva uma surpresa para os incrédulos). Entre peças que um prega no outro, consumo de cogumelos, encontros com lobos e uma confusão entre os reais Lewis e Clark com o relacionamento de Lois e Clarke (das HQs), Alex Simmons cria um belo bromance - aquele subgênero de filmes sobre amizades masculinas. No entanto, o que impressiona mesmo é a capacidade do diretor em soar sincero em cada cena que apresenta para a plateia, tão sincero que você até esquece que está vendo um filme. 

Buddymoon (EUA-2016) de Alex Simmons com David Giuntoli, Flula Borg e Claire Coffee. ☻☻☻

4EVER:George A. Romero

04 de fevereiro de 1940 ✰ 16 de julho de 2017

Nascido no Bronx em 1940, George Andrew Romero tinha pai cubano e mãe lituana. Admirador de filmes de terror desde pequeno, Romero ficou famoso por criar um estilo próprio dentro do gênero. Após se formar em 1960 ele começou a fazer curtas e comerciais para a televisão, mas foi em 1968 que chamou atenção ao dirigir A Noite dos Mortos Vivos, filme que é cultuado até hoje como um marco para os filmes de horror. Com o filme, Romero colocou os Zumbis entre os grandes monstros da história do cinema, criando vários outros filmes de temática semelhante e servindo de inspiração para todos os que fizeram filmes  de zumbi depois dele.  Depois de uma pausa na carreira em 1993, ele retornou em 2000 com A Máscara do Terror e criou uma nova trilogia sobre mortos vivos com Terra dos Mortos (2005), Diário dos Mortos (2007) e Ilha dos Mortos (2009). Em seus filmes podem ser percebidas críticas ao militarismo, ao consumismo e até aos conturbados anos 1960.  Romero faleceu no Canadá em consequência de um câncer de pulmão.