sábado, 6 de maio de 2017

Na Tela: Eu, Daniel Blake

Dave, Hailey e as crianças: presos no labirinto da burocracia. 

Muitos brasileiros tem a imaginação tão fértil que acreditam que nos países desenvolvidos não existem pobres e que tudo funciona às mil maravilhas. Talvez por serem alimentados por noticiários tendenciosos, filmes e seriados que vendem um maravilhoso mundo cor de rosa, muitos imaginem de que os pobres nestes países tiraram  a sorte grande. Não é bem assim. Quem já viu vários filmes sobre o desemprego no mundo globalizado pós-crise já sabe que o cinto aperta em qualquer um que não tem dinheiro para pagar as contas, seja aqui no Brasil, nos Estados Unidos, na França, na Inglaterra... Ken Loach é um dos diretores que sempre procuram demonstrar em seus filmes que existem menos afortunados também na Europa. Por vezes seu discurso soa panfletário demais e mais do que incômodo, gera certo descontentamento pela repetição quase esquemática d suas histórias. Por conhecer a obra do diretor, eu já imaginava como iria terminar o aclamado Eu, Daniel Blake desde que o filme foi anunciado como um dos concorrentes no Festival de Cannes do ano passado (de onde saiu não apenas com a Palma de Ouro de Melhor Filme, como também recebeu o prêmio ecumênico do Festival). Ainda que seja ambientado na Inglaterra, o filme conta uma história que nós brasileiros teremos identificação imediata: um  homem comum preso no labirinto da burocracia governamental. O personagem do título é um senhor de 59 anos que foi afastado do trabalho por conta de problemas de saúde, no entanto, seu médico considera que ele não está pronto para voltar ao trabalho após a licença, mas o perito considera que ele está pronto para voltar. A partir deste impasse o personagem se vê numa teia burocrática que ninguém parece entender muito bem, mas que parece ter o objetivo de que ele demore mais ainda a resolver sua pendenga trabalhista - e sobreviver quase que por mágica sem dinheiro. Entre atendentes e cadastros online, Daniel (vivido por Dave Johns) conhece uma mãe solteira chamada Katie (a ótima Hailey Squires), que tenta ajeitar a vida com os dois filhos em meio ao desemprego e ser enviada para uma casa longe de onde costumava viver. Os personagens desenvolvem uma grande amizade, que os fortalece mas que também se torna dolorosa quando os dramas de ambos parecem sem solução. Se Dave Johns tem uma  boa atuação, a novata Hailey rouba várias cenas e foi lembrada em várias premiações. Embora toque em temas desagradáveis, Loach apresenta uma narrativa envolvente e que nos aproxima sempre de Daniel e Kate. A atmosfera realista fortalecida pelas boas atuações, trazem a sensação de que estamos diante de uma história real que se desenvolve, quase que por acaso, diante de uma câmera. Poucas vezes o diretor conseguiu atingir um trabalho tão envolvente diante de suas ideologias. Eu, Daniel Blake é um filme a que se assiste um tanto atônito, justamente por trazer uma história tão próxima da realidade de tantas pessoas ao redor do mundo - e que ninguém parece, de fato, se importar. 

Eu, Daniel Blake (I, Daniel Blake / Reino Unido - França - Bélgica / 2016) de Ken Loach com Dave Johns, Hailey Squires, Briana Shann e Sharon Percy. ☻☻☻☻

Nenhum comentário:

Postar um comentário