sábado, 30 de abril de 2011

FILMED+: O Bebê de Rosemary


Farrow: testando seu amor materno.

É difícil escrever sobre um filme que lida mais com sensações do que qualquer outra coisa, mas mesmo assim vou tentar. Talvez meu filme favorito de Roman Polanski seja sua primeira aventura por Hollywood: O Bebê de Rosemary, adaptação do romance homônimo de Ira Levin e que deixa muita gente arrepiada até hoje. Um dos truques mais bacanas de Polanski é pintar o filme como um romance nos seus primeiros minutos mostrando o jovem casal cheio de esperanças e ambições se mudando para um prédio antigo e bem localizado em Nova York. Depois deste feito, a doce Rosemay Woodhouse (Mia Farrow, na atuação de sua vida) só pensa em engravidar, enquanto seu esposo, Guy Woodhouse (o diretor John Cassavetes) só pensa em se estabelecer enquanto ator. Tudo segue docemente, até que aspectos obscuros começam a atrapalhar a vida do casal. A começar pela morte de uma jovem moradora, que por consequência, gera a atenção cada vez maior do casal de velhinhos que mora ao lado. Não demora muito para Rosemary ouvir estranhas vozes, receber um colar com ervas fedorentas e ter pesadelos com o capeta. Entre estes acontecimentos Rosemary descobre que está grávida e aí que Polanski faz a festa com nossas percepções. Sem nunca revelar quem diz a verdade, o diretor conduz a trama nos deixando sempre desconfiados de sua protagonista. Será quem está em depressão? Será que ela está enlouquecendo com a gravidez? Para logo depois nos fazer desconfiar de todos ao seu redor. Aos poucos Rosemary se rende a impulso estranhos (como comer carne crua ou cortar o cabelo curtíssimo) e sua aparência parece cada vez mais doente - usando como desculpa o diagnóstico errado de gravidez de risco. Assim, nem a caridade vitamínica dos vizinhos é bem vista por ela. Aos poucos Rosemary começa a desconfiar que é vítima de uma conspiração e, para piorar, começa a desconfiar que seus vizinhos são satanistas que querem oferecer seu bebê ao coisa ruim. Entre delírios e impressões o filme caminha para o seu fim mexendo com o psicológico de sua personagem e do público. A trama serve para Polanski mostrar que é um mestre em causar tensão no público, seja com o ritmo lento de sua narrativa ou com as estranhas fantasias que parecem camuflar o lado mais obscuro do ser humano. Impossível ficar indiferente à cena final onde Mia se divide entre a maternidade e a repulsa por seu rebento (deitado no clássico berço das trevas).   O filme ganhou o Oscar de atriz coadjuvante (para a comicamente sinistra Ruth Gordon) e concorreu ao prêmio de roteiro adaptado - pelo que se vê a Academia sempre teve receios com filmes de terror.

O Bebê de Rosemary (Rosemary's Baby/1968 - EUA) de Roman Polanski com Mia Farrow, John Cassavetes, Ruth Gordon e Sidney Blackmer.
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DVD: Escritor Fantasma


McGregor: Um escritor em apuros políticos.  

Um longa-metragem de Roman Polanski é mais do que um filme, trata-se de um evento! E apesar de todo seu prestígio sempre rendem comparações com sua vida pessoal (foi assim com o assassinato de sua esposa Sharon Tate e O Bebê de Rosemary/1968 , com seu passado em campo de concentração e O Pianista/2002 e até sua relação com uma mulher décadas mais jovem e Lua de Fel/1992). Isto ficou ainda mais forte com a prisão do diretor sobre aquela confusão na década de 1970 nos EUA com uma garota menor de idade e o lançamento de O Escritor Fantasma, que ganha um aspecto ainda mais interessante quando nos damos conta que trata de um sujeito que procura escrever num ambiente quase carcerário e que é prejudicado por aspectos do passado. Deu para perceber Polanski  se bifurcar na trama?  O filme começa com o corpo de um escritor encontrado numa praia, o morto estava trabalhando na escrita das memórias do ex-primeiro ministro britânico Adam Lang (o irlandês Pierce Brosnan, que tenta se levar a sério ficando mais pançudo que nunca). Com sua morte, a editora acaba contratanto um ghost writer (Ewan McGregor que chegou a concorrer a alguns prêmios europeus por sua atuação) que terá a tarefa inglória de transformar o texto do primeiro ministro em algo digno de publicação sem ter seu nome divulgado. Desde o início ele percebe que se meteu numa encrenca, afinal, ao ser contratado já é assaltado levando um murro na cara. Logo, o cara é levado para uma casa no litoral para escrever ao lado dos assessores do ministro num regime cheio de restrições e controle - afinal de contas, já pensou no tipo de coisa que pode ter ali. Obviamente que o ministro quer ocultar seu lado obscuro e dar um trato mais romântico ao que a vida se encarregou de transformar em manchas supeitas (sua carreira como ator, sua entrada no partido, suas relações com o governo americano, seus crimes de guerra...). Polanski sabe lidar com esta estranha bolha em que insere o escritor. A casa luxuosa fica cada vez mais opressora e fria durante a sessão, não só pela decoração e tonalidades da fotografia, mas também pelas autações. Brosnan até que consegue criar um tipo escorregadio, mas o destaque vai mesmo para as mulheres que vivem ali. Um é a secretária do ministro vivida por Kim Cattrall - isso mesmo, a loura mais atirada de Sex & the City prova que tem mais do que porte para bancar a perua da série, contruindo uma mulher que transpira competência, talvez por isso consiga ser gélida e atraente na mesma proporção. A outra figura  feminina que chama a atenção é a esposa do ministro vivida por Olivia Williams, visivelmente tensa, ela parece muito mais preocupada com o rumo da situação de seu esposo do que ele próprio. Essas peças em cena alimenta o tom claustrofóbico que cresce até o aparecimento de um escândalo envolvendo tortura de terroristas. Curiosamente é neste pedaço que o filme perde o ritmo, caminhando cada vez mais para o óbvio em situações que parecem soltas na narrativa. Desde o início percebemos que é um filme de suspense comum, mas com a direção competente de seu diretor (que foi premiado em Veneza pelo trabalho). Mas se existe algo que deixou o filme muito abaixo das expectativas é sua horrenda edição. Em busca de dar agilidade à narrativa o resultado por vezes parece uma colcha de retalhos deixando a incômoda sensação de que o filme não respira, não deixa tempo para o expectador pensar sobre o que está vendo.  O filme não fez o sucesso esperado, mas quem se importa? São cenas geniais como a do bilhete percorrendo de mão em mão e a última cena com as folhas voando ao vento que fazem com que sempre esperemos a nova obra de Polanski (no caso, Carnage que conta com Jodie Foster, Kate Winslet, Christoph Waltz e John C. Reilly no elenco).

O Escritor Fantasma (The Ghost Writer/ França, Alemanha, Reino Unido - 2010) de Roman Polanski, com Ewan McGregor, Pierce Brosnan, Olivia Williams, Kim Catral, James Belushi e Timothy Hutton. ☻☻☻

sexta-feira, 22 de abril de 2011

DVD: Apenas uma Vez


 Girl & Guy: canções que tocam na alma.

Falando em musicais diferentes assisti dia desses a Apenas uma Vez, filme minúsculo em orçamento que ganhou o Oscar de melhor canção em 2008 e que prolongou um pouco mais a sua magia em quem o assistiu antes da cerimonia. Não, não se trata de um filme de feitiçaria, mas um filme independente feito na Irlanda e que sabe exatamente o que fazer para nos envolver numa história de amor simples mas surpreendentemente tocante, tendo momentos de doer na alma. O longa dirigido pelo músico John Carney (ex-The Frames) conta a história de um artista de rua (Glen Hansard, vocalista do The Frames e ator estreante) que ajuda o pai a consertar aspiradores de pó. Por essas duas tarefas ele acaba conhecendo uma imigrante Tcheka (Markéta Irglóva) que vende rosas para ajudar a mãe nas despesas da casa. Esse é o ponto de partida para uma relação que passa automaticamente do amigável, ao profissional num clima de romance que nunca chega ao momento que todos esperamos. Se ele (e desta vez eu não esqueci o nome do personagem, ele, assim como ela, não tem nome mesmo) utiliza os sentimentos contraditórios do fim de uma relação para escrever suas músicas. Ela também colabora com suas próprias angústias de estar várias milhas longe do esposo. O mais interessante do roteiro é a forma como aborda o nascimento de uma relação que será diretamente afetada pelos relacionamentos que viveram até aquele instante. Melhor ainda é a forma como comunicam seus sentimentos através de canções. Obviamente que entre uma canção e outra o amor entre o casal fica evidente e se intensifica cada vez mais à medida que surgem novas perspectivas profissionais e emocionais. Carney foi sábio em não enfeitar muito uma história que tem seus maiores méritos na forma singela como lida com seus personagens. Quase sem luz artificial, com câmera na mão (trêmula e quase documental) e atuações realistas, o diretor conseguiu criar um dos filmes românticos mais originais dos últimos anos. Também considero louvável a forma como consegue inserir as canções expressando os sentimentos de seus personagens com uma naturalidade de fazer corar filmes oscarizados como Chicago (2002). Sem criar subterfúgios para lidar com a vida cantante de seu casal protagonista, Apenas uma vez é uma pérola cinematográfica que mostra que boas ideias valem mais do que alguns milhões de dólares na hora de nos fazer lembrar da magia da sétima arte. Claro que nessa tarefa, as belas composições da trilha sonora ajudam muito!        

Apenas uma Vez (Once/Irlanda-2006) de John Carney com Glen Hansard e Markéta Irglóva. ☻☻☻☻

CATÁLOGO: Dançando no Escuro

Morse e Björk: o musical segundo Lars Von  Trier.

Sócio de carteirinha no Festival de Cannes, Lars von Trier sabe que não precisa ganhar prêmios no festival para garantir uma bela carreira internacional para seus filmes. Afinal, Dogville (2003) e Anticristo (2009) não precisaram ganhar a Palma de Ouro para se tornarem notícia em todo o mundo. Vale lembrar que Trier levou o maior prêmio do Festival para a casa com Dançando no Escuro, o musical mais esquisito que um cineasta já ousou fazer. O mais irônico e que sua linguagem acabou servindo de referência para outros filmes do gênero que não sabiam como adaptar o gênero para o público que não curte personagens cantarolando pelas ruas (como aconteceu com Chicago/2002, que mal consegue disfarçar a ideia chupada de Trier de que os números musicais acontecem na mente de sua protagonista). Dançando no Escuro além de ser aclamado como o melhor filme de Cannes no ano 2000, ainda foi lembrado na categoria de melhor atriz pelo desempenho esforçado da cantora islandesa Björk. A cantora é Selma, uma imigrante tcheka que trabalha como operária numa metalúrgica no EUA durante a década de 1960. A proletária guarda boa parte do seu pagamento para pagar uma cirurgia em seu filho, que assim como ela, está condenado por uma doença degenerativa a visão até que se torne totalmente cego. Este objetivo faz com que Selma viva de forma modesta, morando num trailer, com roupas gastas, resistindo aos apelos de uma admirador (Peter Stormare) e não atendendo a pedidos de seu filho (como, por exemplo, ter uma bicicleta). Para lidar com essa vida sofrida, a protagonista começa a imaginar que sua vida é um musical como aqueles produzidos na época de ouro de Hollywood e os quais assistia em sua terra natal.  Só que o musical da vida de Selma tem as músicas mais estranhamente (cortesia dos efeitos eletrônicos dos quais Björk é expert) tristes do gênero (destaque para a indicada ao Oscar e ao Globo de Ouro I've seen it all, onde canta as atrocidades que viu durante sua vida condenada à cegueira). O que não impede que sua situação piore cada vez mais. Nada no filme de Trier é posto ali de graça. Bom em lidar com simbologias, o diretor não coloca o senhorio de Selma como policial por acaso (David Morse, compentente como sempre) - e que ceda sempre aos apelos da esposa que quer ostentar uma vida mais luxuosa do que está ao alcance. Para o senhorio, não é nada demais roubar as economias de Selma para comprar um sofá desejado por sua esposa, pena que o incidente acarretará um acidente que levará Selma para a prisão. Trier constrói aqui um de seus maiores melodramas hardocores, com números musicais que parece dizer a todo instante o quanto é ridículo se iludir diante de uma realidade cada vez mais predatória. Para o diretor cinema está longe de ser diversão. Obviamente que se trata de mais uma de suas críticas ao modo de vida americano  e seu consumismo desenfreado, incapaz de perceber as angústias de quem apenas sobrevive entre as desigualdades sociais estabelecidas. Além dessa ideia recorrente na cinematografia do cineasta, outro fator que surpreendeu muita gente foi a total negação que o longa realizava do manifesto Dogma95 (aquele que proibia créditos iniciais, trilha sonora, uso de luz artificial...), afinal um musical é algo impensado dentro do movimento. Dançando no Escuro pode ser visto como uma grande provocação ao capitalismo ou um grande exercício de paciência para o expectador - não por acaso os americanos odiaram o filme. Nos idos do ano 2000, Cannes entendeu que Trier possui uma ousadia assustadora em conduzir suas narrativas, universalizando contextos e arrancando atuações inspiradas de suas atrizes. No entanto, seu trabalho com Björk foi o mais controverso, já que a cantora deixou bem claro que teve muita dificuldade em lidar com o processo diretivo de Trier (o chamando de "pornógrafo emocional") e as interferências que fazia em suas composições. Há quem diga que a islandesa não dá conta de carregar o filme até o fim, há quem considere sua atuação irretocável... bem, é o tipo de filme que se ama ou se odeia, portanto é melhor tirar suas próprias conclusões (nem que seja para lembrar que Björk foi à cerimônia do Oscar vestida de cisne e até botou um ovo)!

 Dançando no Escuro (Dancer in the Dark - Dinamarca/EUA/Islândia - 2000) de Lars Von Trier com Björk, David Morse, Catherine Deneuve, Peter Stormare e Cara Seymour. ☻☻☻☻

terça-feira, 19 de abril de 2011

CATÁLOGO: Além da Linha Vermelha

Sean Penn: A guerra poética de Terrence Malick. 

Terrence Malick é um diretor que por si só me chama a atenção. Pra começar é um diretor veterano conhecido pelo seu perfeccionismo e obstinação em tirar o papel os projetos que muitos diretores fugiriam sem pensar duas vezes. Talvez por isso, apesar de seus 42 anos de carreira, o cineasta tenha apenas cinco filmes no currículo (e já estou incluindo aí o aguardado A Árvore da Vida com Brad Pitt e Sean Penn, que promete começar sua carreira com chave de ouro em Cannes deste ano). Depois de um longo hiato em sua carreira (Terra de Ninguém é de 1973, Cinzas do Paraíso é de 1978 e vinte anos depois...) ele dirigiu Além da Linha Vermelha, um verdadeiro mamute de três horas de duração baseado numa obra que muitos consideravam inadaptável pela dezena  de personagens da narrativa de tom intimista. Ao ser lançado o filme foi indicado a Oscars importantes (filme, direção, roteiro adaptado entre outros) mas acabou ofuscado por outras obras que abordavam a guerra de forma mais frenética (O Resgate do Soldado Ryan) ou até cômica (A Vida é Bela). O Fato é que Além da Linha Vermelha é o filme de guerra mais poético que já vi. Longe da grandiloquência narrativa de Apocalypse Now (1979) ou do apelo pop de Platoon (1986), o filme abraça sem pudores o tom intimista da obra literária de James Jones, sendo assim capricha nos longos silêncios e lentos movimentos de câmera ao abordar os apuros de um grupo de fuzilieiros  em guerra no ano de 1942 num arquipélago do Oceano Pacífico na batalha de Gualdacanal. Ao invés de mostrar heróis, o filme prefere mostrar homens que temem o que está para vir, se angustiam com o que o destino lhes reserva e questionam o emaranhado de contradições que a guerra anuncia. Esta visão particular da guerra prefere expor menos sangue e explosões e mais a questão moral que os soldados vivenciam num campo de batalha. O elenco do filme impressiona, nomes como Nick Nolte, John Travolta, John Cusack e George Clooney aparecem em pequenas participações enquanto o centro da narrativa é a trajetória do soldado vivido por Jim Caviezel. Caviezel interpreta o soldado de sorriso bondoso que em meio aos horrores da guerra começa a questionar as motivações de toda aquela barbaridade. Emerge da atuação de Caviezel  o tom pacifista que parece ser a alma do interesse de Malick pela obra. Entre mortos e feridos, o diretor capricha no contraste daquela selvageria com as paisagens capturadas em belísssima fotografia (cortesia do indicado ao Oscar John Toll) que nos faz sentir pequenos diante de todo aquele azul e verde em contraste com tantos conflitos e aparentes diferenças com o inimigo. A contemplação que o diretor nos propões preenche os silêncios com nossas próprias reflexões diante de medos e inseguranças sobre a morte e os preconceitos num mundo que pertence a todos nós. Além de todo esse contexto, Malick ainda merece congratulações por virar do avesso as convenções do cinema americano sobre os filmes do gênero (muitos deles presentes em O Resgate do Soldao Ryan de Spielberg, que acabou levando o Oscar de direção daquele ano) e nos apresentar uma das sequências finais mais tristes e belas dos filmes de guerra. Depois do Urso de Ouro de Melhor Filme em Berlim/1999 por Além da Linha Vermelha, o diretor fez O Novo Mundo (2005) que recebeu pouca repercussão entre público e crítica, mas Mallick é um diretor que mesmo quando erra merece nossa atenção. 

Além da Linha Vermelha (Thin Red Line/EUA-1998) de Terrence Malick com Jim Caviezel, Sean Penn, Nick Nolte, Ben Chaplin, Woody Harrelson, Adrien Brody, John Cusack, Jared Leto, Woody Harrelson, Nick Stahl e John Travolta. ☻☻☻☻

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Cannes 2011


A Árvore da Vida: grande aposta para os prêmios deste ano.

Hummm... sempre me dá água na boca quando vejo a seleção do Festival de Cannes. Obviamente que tem sempre o pessoal da panelinha que adora lançar seus aguardados longas no festival mais badalado do mundo (este ano por exemplo tem Lars Von Trier, Woody Allen, Gus Van Sant, Nanni Moretti e Pedro Almodóvar, só para ficar nos mais conhecidos) e não tem jeito, trata-se ainda do festival mais influente do mundo (afinal deu fôlego para que produções como Wall Street - Money never SleepsBiutiful e Another Year chegassem até a época de ouro que se estendeu até o Oscar deste ano). O festival acontece do dia 11 ao dia 22 de maio. Hoje saiu a lista dos filmes que participarão do Festival e que prometem ser o assunto cinéfilo do ano,  dois filmes brasileiros serão exibidos: Trabalhar Cansa e Duelo antes da noite, mas estão fora de competição. Segue a lista para as apostas:

EM COMPETIÇÃO
La Piel Que Habito, de Pedro Almodóvar;
L’Apollonide, de Bertrand Bonello;
Drive, de Nicolas Winding Refn;
Ichimei, de Takashi Miike;
Le Havre, de Aki Kaurismäki;
Hanezu No Tsuki, de Naomi Kawase;
The Kid With The Bike, de Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne;
Melancolia, de Lars Von Trier;
Michael, de Markus Schleinzer;
Once Upon A Time in Anatolia, de Nuri Bilge Ceylan;
Parter, de Alain Cavalier;
Polisse, de Maiwenn;
Sleeping Beauty, de Julia Leigh;
La source des femmes, de Radu Mihaileanu;
This Must Be The Place, de Paolo Sorrentino;
A Árvore da Vida, de Terrence Malick;
We Have a Pope, de Nanni Moretti;
We Need To Talk About Kevin, de Lynne Ramsay.


UN CERTAIN REGARD
Restless, de Gus Van Sant;
The Hunter, de Bakur Bakuradze;
Halt Auf Freier Strecke, de Andreas Dresen;
Hors Satan, de Bruno Dumont;
Martha Marcy May Marlene, de Sean Durkin;
Arirang, de Kim Ki-duk;
Bonsai, de Cristian Jimenez;
The Day He Arrives, de Hong Sang-soo;
Et maintenant on va ou?, de Nadine Labaki;
Les Neiges du Kilimandjaro, de Robert Guediguian;
L'exercisce de l'etat, de Pierre Schoeller;
Loverboy, de Catalin Mitulescu;
Miss Bala, de Gerardo Naranjo;
Oslo, August 31st, de Joachim Trier;
Skoonheid, de Oliver Hermanus;
Tatsumi, de Eric Khoo;
Trabalhar Cansa, de Juliana Rojas e Marco Dutra;
Toomelah, de Ivan Sen;
The Yellow Sea, de Na Hong-jin.

HORS CONCOURS
Meia Noite em Paris, de Woody Allen (Filme de abertura);
Piratas do Caribe - Navegando em Águas Misteriosas, de Rob Marshall;
Um Novo Despertar, de Jodie Foster;
La Conquête, de Xavier Durringer;
The Artist, de Michel Hazanavicius.

SESSÕES DE MEIA NOITE
Wu Xia , de Peter Chan Ho-sun;
Dias de gracia, de Everardo Gout.

EXIBIÇÕES ESPECIAIS
Labrador, de Frederikke Aspock;
Le maitre des forges de l'enfer, de Rithy Panh;
Michel Petrucciani, de Michael Radford;
Tous au Larzac, de Christian Rouaud.

CINÉFUNDATION
Cagey Tigers, de Aramisova Famu;
Suu et Uchikawa, de Nathanael Carton Nyu;
A Viagem, de Simão Cayatte;
Befetach Beity, de Anat Costi;
The Agony and Sweat of the Human Spirit, de Jesse Damazo e Joe Bookman;
Bento Monogatari, de Pieter Dirkx;
Der Brief, de Doroteya Droumeva;
Duelo Antes da Noite, de Alice Furtado;
Drari, de Kamal Lazraq;
Salsipuedes, de Mariano Luque;
La Fiesta de Casamiento, de Gastón Margolin e Martín Morgenfeld;
L'Estate che non Viene, de Pasquale Marino;
Big Muddy, de Jefferson Moneo;
Al Martha Lauf, de Ma'ayan Rypp;
Ya-gan-bi-hang, de Son Tae-gyum;
Der Wechselbalg, de Maria Steinmetz

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Combo: Beijos

Para beijar, o ser humano movimenta 29 músculos (12 dos lábios e 17 da língua). Um beijo apaixonado pode significar a aplicação de uma pressão de 12 quilos sobre os lábios. Já um beijo dado em um bebê pode ser pesado em gramas. Uma pessoa troca, em média, 24 mil beijos (de todos os tipos, dos maternais aos apaixonados e até os roubados) ao longo de sua vida. Um beijo pode repassar 250 vírus e bactérias diferentes. Quando se beija alguém, resíduos de sua saliva permanecem em sua boca por 3 dias. As batidas do coração sobem, em média, de 70 para 150 vezes por minuto durante o beijo. Isso força o coração a bombear 1 litro de sangue a mais, pois as células pedem mais oxigênio para trabalhar. Os beijoqueiros sofrem menos de doenças do aparelho circulatório, do estômago e da vesícula. Diminuem também os casos de insônia e de dores de cabeça. Em cada beijo, os apaixonados trocam 9 mg de água, 0,7 g de albumina, 0,18 g de substâncias orgânicas, 0,711 mg de gorduras e 0,45 mg de sais. Se você pensa que, quando beija, só sua boca trabalha, está completamente por fora. Fique sabendo que todo o seu organismo entra em ação - além dos seus cinco sentidos paladar, olfato, audição, visão e tato entrarem na jogada. Os médicos e os psicólogos alemães concluíram que aqueles que beijam, faltam menos ao trabalho por motivo de doença do que aqueles que não beijam. Aqueles que beijam, também sofrem menos acidentes no trabalho, ganham 20 a 30 por cento a mais e vivem aproximadamente cinco anos a mais. O Dr. Arthur Sazbo, um psicólogo alemão, diz que a razão desta ótima fortuna é a energia positiva que o beijo passa para aqueles que beijam no começo do dia. Conseqüentemente, se você quiser ter mais dias felizes, saudáveis, ser bem sucedido, e viver mais, você deve beijar o seu amor antes que você vá trabalhar, todos os dias. Foram os Romanos que descobriram o beijo, mas Vaughn Bryant, professor do departamento de antropologia no Texas A&M, dita que o primeiro beijo erótico foi trocado aproximadamente 1500 A.C. na Índia. Antes desse tempo não há nenhuma evidência (tabuletas de argila, pinturas da caverna ou registros escritos) que indique o histórico do beijo. Bryant disse também que o ato de friccionar e pressionar os narizes e a troca das línguas entre amantes, se popularizou aproximadamente em 1500 a.C. Os Romanos beijavam-se cumprimentado uns aos outros, beijavam as vestes e os anéis de seus líderes e estátuas dos deuses mostrando sua submissão e respeito.  É um fato científico que beijar estimula nosso cérebro a produzir o oxytocin, um hormônio que nos dá aquela ótima sensação que sentimos ao beijar. Um estudo em 1997 na universidade de Princeton concluiu que nossos cérebros estão equipados com os neurônios que nos ajudam a encontrar os lábios de nossos amantes no escuro. Não é nenhuma novidade que muitos casais apreciam se beijar no escurinho do cinema! Talvez por isso alguns beijos do cinema tenham ficado tão célebres, aqui vai a lista dos cinco que ficaram na minha memória. Alguns por sua beleza outros pela polêmica que provocaram ao serem filmados:

5 Três Formas de Amar (1994) Lembro que ainda era um adolescente quando esse filme passou no cinema e causou escândalo pela forma como abordava o relacionamento de dois rapazes com uma garota numa universidade americana. A coisa toda começa quando a jovem Alex (Lara Flynn Boyle, que depois ficou famosa por casar com Jack Nicholson) tem seu sexo trocado numa ficha devido ao nome unissex e vai parar no dormitório masculino, ou melhor, no quarto do cerebral Eddy (Josh Charles que atualmente tem destaque no seriado The Good Wife) e do paspalho Stuart (Stephen Baldwin, no seu melhor papel no cinema). O trio vai se estranhar, se tornar amigo até e a tensão sexual cresce cada vez mais: a bela Alex gosta de John que... começa a olhar diferente para Stuart. A cena do beijo a três virou o símbolo desse filme que fez o relacionamento à trois soar mais pop do que nunca.


4 Diário de Uma Paixão (2004) O filme de John Cassavetes é baseado em mais um livro de Nicholas Sparks. Nele está reunido todos os clichês favoritos do autor: diferentes classes sociais, encontros e desencontros, doenças, redenção, perdão e o amor puro. A menina rica (Rachel McAdams) se apaixona por um pobretão (Ryan Gosling) e entre bons e maus momentos acabam se separando. O mais curioso da trama é que a história é contada por um velhinho (James Garner) à uma velhinha num (a supermãe de Cassavetes, Gena Rowlands) azilo - até que descobrimos que o casal maduro é o mesmo casal jovem que conhecemos na história. O filme poderia ter passado em branco não fosse pela força com que Gosling e McAdams defendem seus personagens em suas qualidades e defeitos. Sem falar que o beijo poderoso dos dois na chuva deu força até para os dois engatarem um romance na vida real! Ah, o amor... 
  
3 O Segredo de Brokeback Mountain (2005) Ang Lee tinha feito o pior filme de sua vida quando topou dirigir Hulk (2003) para a Fox. Afinal o mostrengo verde foi uma catástrofe em todos os sentidos - tanto que até hoje anda cambaleando para gerar filmes (a próxima tentativa será no filme dos Vingadores, agora encarnado pelo indicado ao Oscar Mark Rufallo). Como o diretor taiwanês iria se safar do maior fiasco de sua carreira? Ora, fazendo um filme sobre cowboys gays!!! O mais incrível é que o filme foi o mais falado de 2005 graças à razão e sensibilidade de Lee - sendo o ganhador de vários prêmios com sua narrativa melancólica sobre um amor proibido num mundo de preconceitos. Jack Twist (Jake Gyllenhall) e Ennis Del Mar  (Heath Ledger) se conheceram nas montanhas cuidando de ovelhas. Saem dali, casam com mulherem e têm filhos, mas escondem do resto do mundo o que sentem um pelo outro - e quando alguém descobre o escândalo é inevitável. Acho que todo mundo ficou tão surpreso quanto a esposa de Ennis (Michelle Williams) quando viu a fúria do beijo que os dois trocam no quintal.

2 Homem Aranha (2002) O beijo mais marcante do filme pipoca americano do século XXI está sem dúvida no primeiro Spider Man sob a batuta de Sam Raimi. O herói da Marvel ganhou uma versão altamente fiel em sua primeira aventura na telona. Tobey Maguire estava perfeito como Peter Parker e todo mundo torcia para que seu romance com Mary Jane (Kirsten Dunst). Como era de se esperar o maior rival do rapazinho com cara de nerd acabou sendo seu alter-ego aracnídeo... pelo menos entre um apuro e outro com o Duende Verde (Willem Dafoe) papai do melhor amigo (James Franco) que só serve para atrapalhar, o cara conseguiu esse beijo antológico pendurado de ponta cabeça na chuva. Um beijo tão bacana que só poderia ser baseado no herói de maior apelo teen das HQs e que vai dar trabalho para a nova versão do herói no cinema inventar algo tão genial. 

1 A Um Passo da Eternidade (1954) Mesmo quem nunca viu o filme de Fred Zinnemann já viu uma centena de vezes a cena em que Burt Lancaster e Debora Kerr dão aquele mega-beijo entre a areia e o mar numa praia em preto e branco. Tem alguma ideia melhor para o primeiro lugar deste combo? Pode parecer óbvio (e é mesmo) mas a força desta cena é mais forte do que o próprio filme que conta o cruzamento de várias vidas num campo do exército americano no Havaí. A que chama mais atenção é a do sargento Warden (Lancaster) que causa escândalo ao assumir o caso que tem com a esposa (Kerr) de seu superior. Agora imaginem o beijão em trajes sumários numa telona nos idos de 1954! A coisa foi tão séria que o filme ganhou oito Oscars - ganhou o de atores coadjuvantes (Donna Reed e Frank Sinatra) e perdeu o de ator e atriz (Lancaster e Kerr). Ninguém se beija numa praia em trajes de banho impunemente...

Menções honrosas: A bela & o príncipe  (A Bela Adormecida - 1959); Keira Knightley & James McAvoy (Desejo e Reparação - 2007); Macaulay Culkin & Anna Chlumsky (Meu Primeiro Amor - 1991); Dustin Hoffman & Anne Bancroft (A Primeira Noite de Um Homem - 1967); A Dama & o Vagabundo (Idem - 1955). Agradecimentos à http://www.vocesabia.net/ciencia/as-principais-curiosidades-do-beijo/

terça-feira, 12 de abril de 2011

DVD: Comer, Rezar, Amar


Javier & Julia: Talentos demais numa trama de menos.

Eu nem sei por onde começar a escrever sobre Comer, Rezar, Amar. Vou começar do começo, trata-se da adaptação do best seller da escritora Liz Gilbert, que após a crise pós-divórcio resolveu viajar e se recuperar dos altos e baixos do relacionamento. Sendo assim foi para a Itália desfrutar das belas paisagens e das massas, depois à Índia para encontrar a paz espiritual e depois foi para Indonésia encontrar com um guru e de quebra conhecer um brasileiro que poderia fazer acreditar novamente no amor. A mulherada caiu de amores pela obra e sua transformação em longa metragem era inevitável. O filme foi feito no capricho escalaram Julia Roberts para protagonizar, o criador de seriados (ousados como Glee e Nip/Tuck) Ryan Murphy para dirigir. Pediram aos indicados ao Oscar James Franco, Viola Davis, Richard Jenkins, além do (oscarizado) espanhol Javier Bardem e Billy Crudup para dar apoio ao elenco. Mas no fundo, apesar de tantos talentos, bela fotografia, locações deslumbrantes e roteiro simpático o filme é vazio. Não sei se é culpa do livro ou no meio do caminho esqueceram de perceber se no fundo queriam contar a história de uma mulher que precisa aprender que não são as coisas que conferem sentido à sua vida, mas sim, que sua vida dá sentido às coisas. Deu para entender? Vou tentar ser menos filosófico. Após o divórcio, a escritora Elizabeth Gilbert (Julia Roberts) acaba se envolvendo com um jovem ator (Franco) que adaptou sua obra para uma peça de teatro-cabeça. Talvez por perceber que ele capta a essência de seu livro (e portanto estaria apto a captar seus anseios) acaba engatando um romance com ele. Logo as diferenças começam a surgir e apresentá-la às delícias da meditação não são suficientes para segurar a relação. Ela acaba viajando para lidar melhor com seus problemas. Na Itália parece se libertar da culpa de saborear uma bela macarronada e várias fatias de pizza – o que a ajuda a lidar com o fato de que os homens não se importam tanto assim com um pneuzinho, ou até dois. Depois vai para Índia atrás de um equilíbrio interior que acredita ser alimentado por uma sala de meditação ou uma guru mundialmente famosa. Nesse momento começa a perceber que boa parte dos problemas que percebe em sua vida não passa de xiliques, principalmente ao conhecer Richard (Jenkins). Quando acha que finalmente encontrou seu equilíbrio ela parte para Indonésia atrás de um guru conhecido e encontra uma nova chance de amar. Para nós brasileiros a coisa fica meio esquisita quando vemos o espanhol Javier Bardem num português sofrível, mas o cara é bom ator em qualquer idioma. Sem querer desmerecer a atuação de Julia Roberts (que mais uma vez encarna uma personagem de best seller atrás de uma indicação ao Oscar) ela não consegue disfarçar o quanto sua personagem tem problemas sérios em lidar consigo mesma, especialmente quando ama. Essa insegurança em lidar com as emoções quase esgotam suas chances de ser feliz até o que se anuncia. No fim da sessão sobra pouco para lembrar além da embalagem do filme (belas locações, fotografia e trilha sonora caprichadas) - eu, por exemplo,  só lembro daquela pizza saboreada pela personagem. É um romance aguado com açúcar, mas talvez seja isso mesmo que as pessoas procuram ao assisti-lo, mas sinceramente, uma ficha técnica dessas merecia muito mais. Sorte mesmo teve Javier, que se tornou amigo de Julia, que acabou realizando um jantar para conseguir uma vaga para o espanhol na categoria de Melhor Ator no Oscar deste ano. Mas isso já é outra história...

Comer, Rezar, Amar (Eat Pray Love/EUA-2010) de Ryan Murphy com Julia Roberts, Javier Bardem, Viola Davis, James Franco, Billy Crudup e Sophie Thompson. ☻☻ 

segunda-feira, 11 de abril de 2011

DVD: Bananaz

Gorillaz: a melhor banda virtual de todos os tempos.

O Gorillaz pode não ser um de meus grupos favoritos, mas devo admitir que seus álbuns são recheados de algumas das melhores sacadas que a música pop produziram durante a primeira década do século XXI. Fora isso ainda tem o acréscimo de ser a melhor banda de desenho animado de todos os tempos (afinal de contas quem está no páreo? Não consigo me lembrar de niguém). Tanto prestígio rendeu até uma apresentação no Grammy dos macaquitos ao lado da Rainha do Pop. Enfim, acho que o Gorillaz não precisa provar mais nada a ninguém. Desde o surgimento da banda, o documentarista Ceri Levy juntou material para a realização de um documentário com a ambição de explorar o processo criativo por trás deste achado pop. Por sete anos, o diretor perseguiu os cabeças do projeto, no caso Damon Albarn (do Blur) que é a principal voz da banda (no caso o personagem 2D) e Jamie Hewlett (criador da HQ Tank Girl), dono do traço estiloso dos personagens, clipes e conceito por trás dos membros da banda. O filme passou em alguns festivais, fez algum sucesso, mas nada que garantisse a estréia do filme nas telonas em terras brasileiras. Talvez porque o filme se concentre e mais em Albarn e Hewlett do que nos personagens animados (no caso o vocalista teen 2D, o sombrio Murdoc, a garota Noodle e o bateirista perseguido por fantasmas Russel), mostrando as dificuldades da dupla em lidar com a fama de personagens que soterram suas próprias personas públicas. Mesmo assim, é interessante. Apesar da questão que a dupla faz de parecer alheia ao mundo pop (o que deve ser uma piada, já que eles fazem questão de aparecer no mundo pop), destilando o típico humor mordaz britânico e exibindo o visual desleixado que lhes é comum, podemos ver por debaixo de tudo isso um pouco das motivações que deram forma ao Gorillaz. Das piadinhas com estereótipos pop, da mistura de ritmos, do flerte com o sombrio e referências musicais (de Buena Vista Social Club à De La Soul) temos a impressão que para o Gorillaz tudo é possível musicalmente, já que são personagens de desenho animado e encarnados por diferentes músicos. Se você não se empolgar com o filme de uma hora e meia de duração (que segue a banda em premiações da MTV, programas de rádio, shows inusitados - e afinal de contas o que aconteceu com o dente de Damon Albarn?), o DVD tem a vantagem de trazer extras (de mais de uma hora) sobre o processo de criação de algumas das melhores canções da banda. Se o documentário não serviu para colocar a banda entre as minhas favoritas, pelo menos alimentou ainda mais minha admiração por seus criadores - por mais que eles se esforcem em parecer mais desbocados do que geniais.

Hewlett e Albarn: mentes por trás das macaquices sonoras.

Bananaz (Reino Unido/2008) de Ceri Levy com Damon Albarn, J. Hewlett, Dennis Hooper e Ibrahim Ferrer. ☻☻☻

DVD: Enterrado Vivo

Reynolds: Carregando seu primeiro filme nas costas.

Ano passado testaram os nervos da platéia com dois filmes parecidos. Se 127 Horas levou James Franco à indicação de melhor ator no Oscar por ficar com o braço preso debaixo de uma rocha sozinho na tela por noventa minutos, Ryan Reynolds não conseguiu indicação a prêmios, mas mostrou que é um ator de recursos dramáticos consideráveis em Enterrado Vivo. Reynolds interpreta um caminhoneiro americano que vai trabalhar no Iraque e acaba dentro de uma caixa de madeira a sete palmos debaixo da terra. Com isso os terroristas esperam conseguir alguns milhões de dólares por sua vida. A premissa é assim, simples, mas o desenrolar da história explora mais possibilidades do que se imagina quando vemos o personagem preso ali apenas com um isqueiro e um celular.   O diretor Rodrigo Cortés judia da platéia sem mostrar uma tomada externa sequer (ousadia que Danny Boyle não topou em seu 127 horas), tudo se passa dentro daquele caixote de madeira num clima claustrofóbico e angustiante. Aos poucos vamos conhecendo a história daquele sujeito comum que se meteu na maior enrascada de sua vida - e o pior, depende cada vez mais de esferas burocráticas para se safar. É nesta parte que o filme se torna melhor do que outras tentativas de fazer mais com menos, já que explora nuances pouco comuns sobre as construtoras americanas que atuam no Iraque e suas relações impregatícias, ou até mesmo as negociações da embaixada pela vida do sujeito. Além disso sobra alfinetadas até nas cunhadas e atendentes de telemarketing! O filme tem um cenário de pouco mais de pouco mais de um metro cúbico, a luz é fruto do isqueiro e da luz do celular (o que colabora para o tom sombrio que a narrativa) e tudo converge para o trabalho do único ator em cena: Ryan Reynolds. Ele pode não ter conquistado prêmios, mas depois de sua atuação neste filme (e no filme do Lanterna Verde prestes a estrear) sua carreira parece ter chegado a outro patamar. Até o final sem concessões é notável como os poucos recursos não limitaram a criatividade da produção neste thriller competente.

Enterrado Vivo  (Buried/EUA-2010) de Rodrigo Cortés com Ryan Reynolds. ☻☻☻

domingo, 10 de abril de 2011

FILMED+: A Rosa Púrpura do Cairo


Jeff Daniels e Mia Farrow: O galã e a cinéfila romântica.

Enquanto cinéfilo devo começar dizendo que cinema é a minha droga. Uso para me desligar do universo por algumas horas e me embrenhar por histórias que não são as minhas, mesmo que algumas sejam muito semelhantes. Tem gente que fuma, tem gente que bebe, cheira ou faz sexo umas dezoito vezes por dia. Eu não, eu assisto filmes. Claro que não chego a ser como a personagem de Mia Farrow em A Rosa Púrpura do Cairo, um dos filmes mais geniais de Woody Allen. Afinal de contas, eu sei que por mais realista que um filme possa parecer, ele é um filme. E isso serve até para os documentários. Mia é Cecília, uma garçonete de espelunca maltratada pela vida e pelo marido beberrão. A sociedade na época também não era das melhores - já que os EUA atravessavam a Grande Depressão com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York em 1929.  A cidade que vemos em tantos filmes de Allen é mostrada nesse ar decadente que incentiva ainda mais a fuga da realidade da qual Cecília desfruta sempre que vai ao cinema - mesmo que seja para ver pela quinta vez seu filme favorito: A Rosa Púrpura do Cairo. É nesta quinta vez que acontece algo inusitado, o personagem do filme, Tom Baxter (Jeff Daniels, que nasceu para o papel) sai da tela para encontrar-se com Cecilia. O fato pega à platéia e aos outros personagens do filme de surpresa, já que sem ele o filme não pode continuar. Baxter e Cecília irão viver um relacionamento incomum e ela aprenderá algumas lições: o galã nunca se fere ou se despenteia, ele é simplesmente perfeito, romântico e gentil! E ainda é capaz de ser levado à um prostíbulo por acidente e sair de lá ileso. Ou seja, um sujeito que só existe nos filmes. Mas, enquanto Cecília terá que dar satisfações ao marido, Baxter terá que fugir da polícia, dos produtores do filme e até do ator que o interpreta. É quando o ambicioso ator Gil Shepherd (o mesmo Daniels) aparece que Allen coloca suas unhas de fora. Nunca perdemos de vista que Baxter é um personagem interpretado por Shepherd, portanto o ator não parece digno de confiança em seu plano de fazer Baxter voltar para a tela. Apenas Cecília, inebriada por ser admirada por dois homens, não percebe que criador e criatura são pessoas distintas. Além desta trama surreal, Allen ainda tece comentários sobre as relações das pessoas com o cinema. Além da alienação proporcionada à Cecília (da qual ela toma consciência no momento mais indevido) existem os que vêem nos filme um produto como outro qualquer, além de ter aqueles que não "pagam ingresso para ver pessoas conversando na tela". No fundo da trama existe o tema real do filme: a experiência quando assistimos um filme é somente nossa. O que vemos, sentimos ou refletimos são frutos de nossa interação com uma obra que até então não nos pertencia. Talvez por isso, mesmo depois de aprender sua lição da forma mais dolorosa, Cecília volte à sala escura para viver mais uma aventura pessoal.

A Rosa Púrpura do Cairo (The Purple Rose of Cairo/EUA-1985) de Woody Allen, com Mia Farrow, Jeff Daniels, Dianne Wiest e Danni Aielo. ☻☻☻☻☻

DVD: Tudo Pode dar Certo


Evan e Larry: Casal incomum com o (mau) humor de Woody Allen.

Há alguns anos houve uma greve de roteiristas que deixou Hollywood muito preocupada. Projetos foram adiados, outros cancelados, o calendário de estréias nos cinemas e na Tv foi alterado e as cerimônias de premiação sofriam com ameaças de boicote. No meio desta manifestação, os roteiristas americanos se mobilizaram para não escrever uma linha sequer. Enquanto tudo isso acontecia, Woody Allen sentia a necessidade de manter sua rotina de lançar um filme por ano e resolveu tirar da gaveta um roteiro que dificilmente sairia do papel se não fosse a sua greve de escrita. O resultado desta empreitada é Tudo Pode Dar Certo, filme que não foi bem nas bilheterias americanas apesar de ser um dos mais acessíveis já realizados pelo diretor e marcar seu retorno à Nova York após cinco anos por bandas européias. Apesar de ter marcas da época em que foi escrito (década de 1970) o filme segue o caminho que o diretor optou no seu longa de sucesso anterior (o aclamado Vicky Christina Barcelona, 2008) e o posterior Você vai encontrar o homem dos seus sonhos (2010), nos três o diretor analisa a lógica (ou ausência dela) nas relações amorosas contemporâneas. Em Tudo Pode Dar Certo o protagonista é o ranzinza Boris Yelnikoff (Larry David, um dos criadores do seriado Seinfeld e ator da série Segura a Onda), um físico já indicado ao Nobel que amarga um divórcio e o fato de mancar por conta de uma tentativa de suicídio mal sucedida. Boris tem uma visão pessimista do mundo e nisso sobra piadas para todos os lados (incluindo a eleição de Barack Obama, o modo de vida republicano, a música atual e seus pequenos alunos de xadrez), afinal de contas ele é um gênio num mundo de “invertebrados”!  Sua vida vê uma expectativa de mudança quando conhece a doce Melody Celestine (Evan Rachel Wood, ótima como sempre e mais magra que de costume), que acredita ser uma mendiga vinda do sul do país e destinada a ser prostituta. Num  surto de bondade, Boris permite que a mocinha divida o teto com ele e apesar da rabugice do velhote uma amizade acaba brotando. Este casal incomum que se forma é apenas o prato de entrada bem humorado de uma trama onde Allen mostra outras formas de relacionamento amoroso. Melody e Boris se entendem num equilíbrio entre o pessimismo da vida vivida de um idoso e as expectativas de uma jovem de vinte e um anos. Quando entra em cena os pais de Melody, Allen amplia seu olhar aguçado sobre as relações. Apesar de extremamente conservadora e republicana, a sogra (Patrícia Clarkson, que virou a musa de Allen em seus filmes mais recentes) descobre que tem talento para a fotografia e viver um casamento à três depois que o marido a traiu com a amiga. Já o sogro acaba assumindo um lado que vinha hesitando há tempos. Bem humorado e – acreditem, até - otimista o filme tem vários bons momentos e ainda parece fazer várias auto-homenagens aos filmes de Allen (é inevitável a comparação com Manhattan/1979, a vida à três do recente Vicky Christina Barcelona/2008, o mau humor de Descontruindo Harry/1997 , as lagostas em toda a parte de Noivo Neurótico Noiva Nervosa/1977, o figurino feminino de Poderosa Afrodite/1995 temperado com a visão de que um filme é um universo paralelo ao nosso de A Rosa Púrpura do Cairo/1985). No fim das contas Allen parece estar em sua fase mais romântica, afinal argumenta que não interessa os bons motivos que fizeram você mergulhar num relacionamento, se você pensou neles a coisa já se tornou racional demais e portanto destinada ao fracasso. Allen parece afirmar que o amor é algo a ser sentido e não pensado - mesmo que você consiga listar todas as razões pelas quais ama alguém. Atenção para Henry Cavill que interpreta um admirador de Melody, ele será o novo Superman.

Tudo Pode dar Certo (Whatever Works/EUA-2009) de Woody Allen com Larry David, Evan Rachel Wood, Patricia Clarkson e Henry Cavill. ☻☻☻

4EVER: Sidney Lumet

(25 de junho de 1924 - 09 de abril de 2011)

Sidney Lumet foi um dos diretores de maior influência no cinema americano, principalmente quando se queria tensão em cena. É o nome que assina clássicos como 12 Homens e Uma Sentença (1957), Um Dia de Cão (1975), Rede de Intrigas (1976), O Príncipe da Cidade (1981) e O Veredito (1982), que lhe renderam indicações ao Oscar, além de Sérpico (1973) e Um Crime no Expresso do Oriente (1974)Depois de muito tempo sem chamar atenção em seus filmes realizou o ótimo Antes que o Diabo Saiba que Você  Está Morto (2007) - onde mostra a ruína de uma família a partir da ambição de dois irmãos com um elenco formado por Phillip Seymour Hoffman, Ethan Hawke, Albert Finney e Marisa Tomei numa trama que sinalizava novo fôlego para sua carreira. O diretor que recebeu um Oscar honorário em 2005 por sua obra faleceu vítima de um linfoma.   

quinta-feira, 7 de abril de 2011

CATÁLOGO: Mistérios e Paixões


Peter Weller: processo criativo regado à inseticida.

David Cronenberg nunca foi um dos meus dieretores favoritos da década de 1980. Sempre me pareceu que queria mais criar cenas nojentas do que despertar qualquer outra sensação nos espectadores, debaixo de tanta geleca seus filmes me parecebem bem frios. Apesar de datar desta época clássicos (?) como Gêmeos - Mórbida Semelhança (1988), A Mosca (1986), A Hora da Zona Morta (1983)  e Videodrome (1983), Cronenberg só mostrou que queria ser levado a sério  na década seguinte quando lançou a adaptação de Almoço Nu romance tido como anadaptável de Willian Burroughs. Ao ver o filme percebemos que a leitura não deve ser das mais fáceis, mas o trabalho de Cronenberg demonstra a maturidade de quem anos depois criaria obras progressivamente mais sólidas como o pouco visto Existenz (1999), o subestimado Spider (2002) e os cultuados Marcas da Violência (2005) e Senhores do Crime (2007). A versão do diretor para a obra de Burroughs só chamou minha atenção quando o vi na posição 446 (em ordem alfabética) da lista da publicação de 1001 Filmes para ver Antes de Morrer, ou melhor, quando me dei conta de que  o Naked Lunch  mencionado era o filme que vi por R$ 5,90 numa loja de departamento sob o título Mistérios e Paixões (1991). Deixando toda essa saga de lado trata-se de um filme difícil de se ver. Não que seja chocante ou confuso em demasia, mas porque parece girar em torno de sensações que dependem muito do envolvimento da platéia para que funcione. Ok, todo filme precisa disso, mas existem aqueles que se você não embarcar na proposta não aguenta nem quinze minutos. Cronenberg investe pesado numa atmosfera noir (ou neo-noir como diz alguns cinéfilos) e nisso a trilha jazzy esquisita ajuda, assim como as roupas do protagonissta Bill Lee (vivido pelo ex-Robocop Peter Weller). Apesar do cara trabalhar como exterminador de insetos ele se veste como Dick Tracy e quer ser escritor na Nova York de 1956. Mas a vida de Lee não é fácil, logo no início sabemos que ele teve problemas com a polícia e que, assim como sua esposa (Judy Davis, a qual confesso nutrir uma paixão há tempos), está cada vez mais viciado no pó amarelo utilizado como inseticida. Esse vício fará Bill embarcar em delírios cada vez maiores. Nada faz muito sentido no filme, ou melhor, tudo faz sentido no filme quando percebemos que se trata de uma metáfora sobre o vício de escrever. Lee não faz a mínima ideia do que quer escrever, mas está sempre datilografando sua história - que vai do nada ao lugar algum baseado em frases que vez por outra perpassam seu cotidiano incomum. Esse foco no processo de escrita já foi abordado diversas vezes (e no mesmo ano os manos Coen criaram o celebrado Barton Fink que tem semelhanças com este aqui) mas em nenhuma delas foi utilizado alguns dos efeitos especiais mais nojentos do cinema. Ao ficar curtindo o barato que o tal pó amarelo dá, Lee começa percebe que as máquinas de escrever são insetos anabolizados e que disputam tanto a sua atenção quanto anunciam que Lee é alvo de uma grande conspiração (que envolve até a sua esposa que é acusada de ser uma centopéia espiã!). Mas que tipo de conspiração? Não faço a mínima ideia e Cronenberg não faz muita questão de dizer que angústia é essa que o protagonista tem de ficar achando que todo mundo quer prejudicá-lo (e com isso impossibilitá-lo de continuar seu livro). Como as coisas ainda não estão confusas o suficiente, o diretor colocar uma série de personagens misteriosos em cena que são suspeitos das tramóias anunciadas. No meio do caminho existe a Interzone, Inc. (que produz derivados de insetos mas que parece mais um código para dizer que o personagem está no meio do caminho entre a inspiração e a escrita) e um pó negro utilizado para acabar com o vício no pó amarelo. Como já disse antes, o diretor não tem a preocupação de explicar muito as coisas, prefere deixar tudo no ar, cheio de mistério e com pouca explicação e o desfecho parece girar em torno de Cloquet (Julian Sands) um sujeito muito esquisito que cruza o caminho de Bill Lee. Não é para todos os gostos, mas apresenta boas ideias para quem quer escapar dos filmes que parecem cópias de outros que vimos no ano passado. Porém, falta há Cronenberg aquele estilo que torna o estranho tão sedutor quanto o de David Lynch.  

Mistérios e Paixões (Naked Lunch/EUA-Canadá/1991) de David Cronenberg com Peter Weller, Judy Davis, Ian Holm, Joseph Scoren e Julian Sands. ☻☻

domingo, 3 de abril de 2011

CATÁLOGO: A Época da Inocência


Pfeiffer e Lewis: o desejo esmagado por uma sociedade conservadora.

Perdido em um canal de tv aberta sem grande público era exibido A Época da Inocência, um dos filmes mais inusitados de Martin Scorsese (o outro é o budista Kundun  de 1997). Scorsese ficou famoso na década de 1970 por fazer filmes recheados com muita violência, talvez por isso essa sua aventura pelo filme de época com toda a pompa e circunstância ficou em minha memória como um marco do cinema da década de 1990. Foi um desses filmes em que eu assisti ao lado de amigos e que todos me olharam com cara esquisita. Dizem que é parado, arrastado... será que os tontos não percebem a violência do filme de Scorsese? Pois é, ela permanece ali só que desta vez de forma mais sutil - e auxiliada pelo romance publicado por Edith Warthon ganhadora do pulitzer. Além dessas assinaturas ilustres, não é sempre que podemos ver um filme com os talentos de Daniel Day Lewis, Michelle Pfeiffer e Winona Rider no auge do estrelato. O filme conta a história de um romance fadado ao fracasso no fim do século XIX. A industrialização nos Estados Unidos crescia a todo vapor e a sociedade nova-iorquina já dava traços de que seria uma referência mundial. Os ideais progressistas modificavam a vida social e ao mesmo tempo se deparava com um protestantismo cada vez mais conservador. Neste mundo em transformação Scorsese conta com detalhes um triângulo amoroso na alta sociedade burguesa. Newland Archer (Lewis) é um advogado em ascenção em Nova Iorque e está noivo da inocente May (Rider, indicada ao Oscar de coadjuvante pelas nuances que tornam sua personagem mais esperta do que parece), prima da Condessa Olenska (Pfeiffer, lindíssima), uma americana de origem francesa que amarga a má reputação criada pelo seu divórcio. Olenska cria polêmica por seus vestidos ousados e hábitos inaceitáveis para a época (como iniciar uma conversa com um homem). A atração de Archer (e a nossa) por uma mulher tão fascinante será inevitável. Além de iluminar a tela, a presença de Michelle serve para manter sempre em mente o contraste do filme com outro longa protagonizado por ela: As Ligações Perigosas (1988). Enquanto Ligações era repleto de luxúria, Scorsese segura todo o desejo de seu filme com atuações sutis que deixam em evidência como as convenções sociais sufocam a atração que nasce entre Archer e a condessa. O filme só poderia ser um pouco mais curto (tem 130 minutos) e ter enxugado a narrativa em off, mas nada que prejudique a apreciação. Com a ajuda de um trio de atores perfeito, o filme capta o microcosmo de uma sociedade em transformação que esmaga os sujeitos com gestos polidos, mas igualmente agressivos.    

A Época da Inocência (The Age of Inocence/EUA-1993) de Martin Scorsese, com Daniel Day Lewis, Michelle Pfeiffer, Winona Rider e Richard E. Grant. ☻☻☻☻

DVD: Querida Wendy

Jamie Bell: um dandi armado e pacifista.

O filme é de 2005, mas somente neste ano me deparei com Querida Wendy, que logo me chamou atenção pelos seus créditos. O elenco é encabeçado por Jamie Bell (o eterno Billy Elliot, que continua crescendo como ator) e conta ainda com outros queridinhos indies (Bill Pulman, Alison Pill e Mark Webber), mas o que conta pontos mesmo é o roteiro escrito por Lars Von Trier e a direção assinada por Thomas Vinterberg. Acho que já disse que sou fã de Trier, já de Thomas nem tanto - já que todo crédito alcançado com Festa de Família (1998) o cara jogou no lixo com O Dogma do Amor (2003). Os dois cineastas dinamarqueses foram alguns dos fundadores daquele movimento Dogma95 que proibia a utilização de luz artificial, trilha sonora, efeitos especiais e outros truques. O filme até que funciona bem, o problema é quando uma velhinha resolve visitar sua prima e o filme sucumbe a uma série de situações improváveis, dignas de quando Trier perde as estribeiras. A Wendy do título é uma arma comprada por engano por um jovem pacifista chamado Dick (Bell). Ele pensava que era uma arma de brinquedo, a qual daria para o neto de sua babá. Diante da situação ele tenta devolver a arma, mas não podendo receber o dinheiro de volta acaba ficando com ela. Dick é um solitário e fica mais ainda quando o pai morre e tem que se virar sozinho, mas desde o início de seu relacionamento com Wendy sente-se mais seguro. Não vai demorar muito para que Dick funde um grupo de jovens deslocados da cidadezinha para cultuar armas de forma pacifista (!?) - ou seja, estudam suas características, poder de destruição, as batizam com nomes de pessoas e praticam tiro ao alvo frequententemente. Este clube, o qual chamam de Clube dos Dandis, parece formar cavalheiros de algum faroeste teen surreal. Todos do grupo dão adeus aos seus problemas de auto-estima quando começam a portar armas de fogo. Não precisa ser muito esperto que existe algo de doentio na relação desses jovens com suas armas, desde a atribuição dos nomes ou de características humanas (que causa identificação das mesmas com seus donos). O que era uma brincadeira fica cada vez mais estranho. Com a chegada de Sebastian (o tal neto da babá) a estrutura do grupo se abala e o ciúme começa a aparecer (afinal Dick parece gostar tanto da única menina do grupo quanto de sua arma de estimação). Até este ponto tudo bem, os excessos parecem contruir uma fábula atemporal sobre a perda da inocência, a paixão por armas ou a falsa sensação de segurança que provoca, mas quando o grupo resolve ajudar uma velhinha a atravessar a praça central da cidade o filme descamba para um estapafúrdio conflito com a polícia local. Todo mundo que conhece Trier sabe que ele adora apontar para as feridas estadunidenses, mas seu olhar crítico muitas vezes é ingênuo demais. Basta ver a paranóia dos adultos do filme sempre com medo de uma gangue saquear algo no meio de uma cidade perdida no mapa. Ao mesmo tempo o crime cometido pela velhinha em praça pública não consegue ser menos do que gratuito e desnecessário para uma trama que descamba para um faroeste adolescente. Essa face teen da trama é ainda temperada pela excessiva utilização das músicas da banda Zombies e dos recursos narrativos moderninhos que vinterberg utiliza na trama. Apesar das referências às obras de Trier (a cidade lembra muito Dogville e a ideia do racismo de Manderlay aparece quando o único jovem com ficha na polícia é negro) o filme passa de crítica inteligente ao belicismo para um desfecho em que deixa de tratar seus personagens como pessoas e os tranforma em alvos ambulantes.  Mas talvez o uso de armas reduza tudo a isso mesmo.

Querida Wendy (Dear Wendy/Dinamarca-EUA/2005) de Thomas Vinterberg, com  Jamie Bell, Bill Pulman, Mark Webber, Alison Pill, Chris Owen, Michael Angarano e Danso Gordon. ☻☻

CATÁLOGO: 24 Horas para Morrer


Brody e Tierney: perdendo o fôlego num roteiro mal escrito.

Adrien Brody foi o mais jovem a ganhar o Oscar de melhor ator (29 anos), o feito foi conquistado em 2003 pelo excelente O Pianista de Roman Polanski. Apesar de ter trabalhado com diretores badalados depois do prêmio (Peter Jackson, M. Night Shyamalan e Wes Anderson) a maioria de seus filmes permanece se concentrando no mercado independente e - apesar de estar no novo filme de Woody Allen - sua carreira permanece seguindo um linha reta sem grandes surpresas ou desafios como ator. Dia desses vi um de seus primeiros filmes a chegar por aqui, o thriller 24 Horas para Morrer, um nome bem mais elaborado para o que os EUA preferiu chamar de Oxygen. Ironicamente falta fôlego à empreitada. Ainda que seja curioso ver Brody posando de vilão o filme não passa de um amontoado de clichês e reviravoltas desprovidas de sentido. Brody interpreta (pois é, apesar de toda ruindade do filme o cara já era bom ator) um sequestrador, que enterra viva a esposa de um ricaço local e se não lhe darem a quantia exigida não dirá onde ela se encontra. Por esse ponto de partida já se sabe que o marido não pode pedir ajuda aos policiais -  mesmo assim ele pedirá e como essa parte da entrega do dinheiro é logo no início sabemos que tudo vai dar errado até o final previsível. O mais engraçado é a tentativa do roteirista transformar o filme numa coisa mais psicológica ao forçar uma identificação entre o bandido e a policial que o persegue. Como o texto não ajuda a coisa não melhora com a escolha da marrenta Maura Tierney para o papel feminino de destaque. Maura está péssima e chega a dar pena a sua incompetência em lidar com os conflitos de sua personagem que não quer "ser perfeita" e trai o marido (que por acaso é seu chefe) com um amante esquisito (Peter Coyote) que lhe deixa marcas de cigarro pelo corpo. Para completar ela ainda passou por problemas com bebida - talvez por isso a atriz tenha passado boa parte do filme com cara de ressaca. Ver Maura e Brody se revirando com um roteiro de situações batidas e mal escritas chega a ser uma ofensa - e as cenas de perseguição sonolentas não empolgam nem zumbis.  E a estranha sensação de que está faltando cenas na trama? Foi só eu ou mais alguém percebeu vestígios de um relacionamento entre Brody e seu comparsa? Existem ainda outras situações que o roteiro joga e logo abandona para evitar maiores polêmicas. É muita ingenuidade pensar que acompanhamos o filme só para saber se a tal madame será encontrada com vida (apesar dela ser vivida por Laila Robins, que em poucos minutos rouba a cena) é está ideia simplista de cinema o que mais prejudica o filme. Lá pelas tantas só esperamos que em meio ao desatre geral o final seja convincente. O problema é que até chegar nele o filme da uma guinada pior atrás da outra. Ou seja, se ver este filme mofando numa prateleira de locadora  ou numa reprise televisiva é melhor escolher qualquer outra coisa para ver. Sorte que depois do Oscar, Brody pode passar por roteiros menos humilhantes para pagar suas contas, já Maura Tierney desistiu de se esforçar para mostrar que pode ser estrela de cinema.

24 Horas para Morrer (Oxygen/EUA-1999) de com Adrien Brody, Maura Tierney e James Naughton. #

sexta-feira, 1 de abril de 2011

COMBO: Dia da Mentira

Só me dei conta que era primeiro de abril quando um amigo havia dito que meu DVD de Réquiem para Um Sonho fora vitimado por seu aparelho que se rebelou (talvez chocado com o filme) e queimou com cabos, tomadas e disco! Acho que meu amigo ficou com tanta pena de minha reação que me lembrou que era o dia da mentira! E meu DVD estava intacto... Em homenagem a este dia patético preparei uma listinha com os meus mentirosos favoritos do cinema.

5 O Mentiroso (1997) é Fletche Reedee (Jim Carrey), advogado que sabe disstorcer as palavras ao ponto do inocente parecer culpado e o culpado se tornar a criatura mais pura da face da terra. Mulherengo e arrogante seu lado humano aparece de vez em quando ao se encontrar com o filho, fruto de um casamento  já terminado. Quando papai Reedee não vai ao aniversário de seu filhote ele nem sabe que o ingênuo pedido de seu filho irá comprometer sua carreira. O moleque pede para que o papai não minta mais. Deste ponto em diante, Fletcher não consegue mais segurar seus comentários, desde os mais sinceros, indelicados ou cretinos. Uma ideia tão bacana que foi copiada recentemente por Ricky Gervais no agressivo A Invenção da Mentira, Gervais nem se havia dado conta que parte do sucesso deste filme do careteiro Carrey é devido à carga sentimental que aparece no roteiro. Menos que um filme sobre a mentira, trata-se de um filme sobre a verdade.

4 O Talentoso Ripley (1999) Único vilão declarado da lista, Tom Ripley foi uma criação da escritora Patricia Higsmith, que recebeu outras versões para o cinema, mas nenhuma tão polêmica quanto esta dirigida por Anthony Minghella. Ripley (Matt Damon numa interpretação tão convincente que quase acabou com sua carreira) é um rapaz pobre que ao ser confundido com o aluno de uma escola para grã-finos vê a chance de mudar de vida. Ripley recebe a missão de convencer o rico Dickie Greenleaf (Jude Law, indicado ao Oscar de coadjuvante) a voltar para a América. Tarefa que seria muito simples se Tom não quisesse ser Dickie - ao ponto de cometer assassinatos e outros crimes. A grande diferença desta versão de Ripley são as conotações homossexuais impressas no roteiro belamente escrito por Minghella, onde o autor sobrepõe duas fontes de preconceito das quais o protagonista foge: ser pobre e ser gay. Ainda no elenco estão Gwyneth Paltrow, Cate Blanchett e Phillip Seymour Hoffman.

3 O Casamento de Muriel (1994) Minha mentirosa favorita é a australiana Muriel Heslop (Toni Collete, a loura da foto, no papel que a revelou para o mundo). Gorda, cafona e desajeitada, a filha de um político mal humorado precisa levantar sua auto-estima. Ela pensa que somente um casamento poderá salvá-la da vida sem graça ao lado de sua família. Ao reencontrar Rachel (a não menos estupenda Rachel Grifiths) uma colega de escola, Muriel verá que a vida tem muito mais a oferecer do que a promessa de casamento com um galã. Até aí nada demais, mas para fugir para Sidney e recomeçar, Muriel terá que inventar uma série de mentiras (ao ponto de roubar até dinheiro de sua família, fingir que irá se casar para experimentar vestidos de noiva pela cidade e mentir para que um atleta ganhe o greencard). No fim das contas ela irá descobrir que o melhor casamento que deve ter é consigo mesma (e com muita música do ABBA!).

2 O Desinformante (2009) Ninguém entende de contar mentiras num filme como Matt Damon, não importa se é um mentiroso dramático ou cômico! Ele emplaca outro mentiroso na lista, conseguindo a medalha de prata pelo filme estapafúrdio (baseado numa história real, claro) dirigido por Steven Soderbergh. Baseado no livro de Kurt Eichenwald, o filme conta a história de Mike Whitacre que se torna informante do FBI sobre um provável caso de formação de cartel para o preso de lisina. O problema é que as investigações apontam que Whitacre era o sujeito mais perigoso com que lidavam, estando metido em fraudes, desvio de dinheiro e até mentiras sobre sua vida familiar. Apesar do roteiro confuso, Matt Damon arranca risadas e assusta com sua atuação sobre o mentiroso compulsivo mais famoso da história dos EUA. Repare na minuciosa reconstituição de época (que contamina até os créditos e a fotografia) e na irônica trilha sonora. No fim das contas, Whitacre acabou sendo preso, solto e se tornou presidente de uma empresa!!!

1 Adeus, Lenin! (2003) O filme alemão mais adorável de todos os tempos (e de maior sucesso no Brasil) gira em torno de uma nobre mentira de proporções inimagináveis. Alex (o ótimo Daniel Brühl) é filho de uma professora comunista roxa (Kathrin Sass) da alemanha oriental. Um dia ao vê-lo apanhar numa manifestação ela acaba entrando em coma. A senhora ficará assim por um bom tempo, sem presenciar a queda do muro de Berlim. Enquanto o mundo alemão se transforma com a unificação e a rotina de uma sociedade capitalista, a matriarca repousa até o dia em que acorda. Prevenido de que a mãe não pode sofrer grandes emoções, Alex acaba criando uma mentirinha de que tudo no país continua como antes - inclusive o muro de Berlim permanece intacto. O problema é que esta mentirinha inocente se amplia para alunos, vizinhos, programas de TV e até a Coca Cola! Brilhante trabalho de Wolfgang Becker que fez sucesso em todo mundo com a visão carinhosa de um mundo feito de utopias.