Marcel é uma pequena concha de dois centímetros que vive com sua avó, Connie, em uma casa vazia. Os dois moram ali contando apenas um com o outro para lidarem com os desafios do dia a dia desde que os moradores foram embora e, por algum motivo, a comunidade de conchas em que viviam partiu para um lugar desconhecido. Eis que a casa é alugada para curta temporada e um jovem documentarista resolve registrar o cotidiano de Marcel e postar na internet e, quem sabe, ter notícias sobre o paradeiro da comunidade perdida da dupla. O problema é que o discreto Marcel se assusta com a fama e todas as pessoas que passam a rodear sua casa, o que só aumenta os motivos de reflexão da pequena conchinha sobre a vida e o mundo dos seres humanos. O fato é que Marcel, A Concha de Sapatos é um dos filmes mais fofos dos últimos tempos! Não bastasse a caprichada técnica de stop-motion que dá vida aos dois personagens principais (que após um dia de trabalho da equipe, gerava apenas cinco minutos de filme - o que fez com que toda a produção demorasse sete anos para ser concluída), o filme também envereda por um olhar bastante bem vindo sobre a produção de um documentário, dos apuros que os personagens vivem sem intervenção do cineasta (como o dia em que um esquilo invade a casa) aos diálogos em que Marcel indaga sobre a vida do rapaz (que prefere não falar de sua vida), assim, o longa também flerta com um exercício de reflexão sobre o próprio gênero que pretende retratar a realidade enquanto ajuda a construí-la a partir do olhar de seu autor. O autor no caso é Dean Fleisher Camp que demonstra uma sensibilidade gigante de apreciar as pequenas coisas sob o olhar de seu meigo protagonista, gerando cenas que nos fazem pensar na vida e, de vez em quando, sentir aquela lágrima escorrer sem pudores. Marcel já era conhecido por seus curtas na internet e aqui amplia-se seu universo com louvor. Outro destaque do filme fica por conta do registro vocal de Jenny Slate, que mais uma vez (com seu timbre inconfundível) prova ser uma atriz com pendores dramáticos tão relevantes quanto seus dotes cômicos (não lembro se comentei certa vez que sonhei que ela ganhava um Oscar de coadjuvante por um filme de época). Jenny também escreveu o filme ao lado do diretor e Nick Paley, o que colabora muito para que ela deixe ainda mais encorpada a alma da conchinha. Já a voz da vovó ficou por conta de Isabella Rossellini que também tem momentos comoventes na produção. Feito para derreter corações, tanto empenho foi reconhecido com uma indicação ao Oscar de Melhor Animação, mas perdeu para outra animação com elaborado trabalho de stop-motion, o Pinóquio de Guillermo del Toro. Sinceramente, acho pouco. Os dois filmes tiveram que se contentar com uma indicação e mereciam maior reconhecimento (ambas deveriam ter sido lembradas em direção, montagem, fotografia, direção de arte, roteiro adaptado e até em Melhor Filme). A Academia precisa rever seus conceitos urgentemente com o gênero (assim como nossos distribuidores que não permitiram que o filme estreasse nos cinemas brasileiros, o lançando diretamente para aluguel digital). Este verdadeiro tesouro está foi recentemente adicionado ao TelecinePlay.
Marcel, A Concha de Sapatos (Marcel, the Shell with Shoes on / EUA - 2022) de Dean Fleisher Camp com Jenny Slate, Dean Fleisher Camp, Isabella Rossellini, Joe Gabler, Rosa Salazar, Thomas Mann e Lesley Stahl. ☻☻☻☻☻
Nenhum comentário:
Postar um comentário