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O mito: as obsessões de um cineasta. |
David Robert Mitchell ganhou prestígio com o terror A Corrente do Mal (2014) que lhe garantiu lugar entre os melhores filmes daquele ano e uma preciosa indicação na categoria de melhor direção no Independent Spirit Awards (em que o filme também concorreu em melhor fotografia e montagem). Todo o sucesso aconteceu pela forma diferente com que o cineasta contava uma história em que a morte se tornava uma doença sexualmente transmissível (e que você deveria passar para outra pessoa o mais rápido possível, caso quisesse continuar vivo). O mais interessante é que ao assistir recentemente ao primeiro longa-metragem do diretor, você consegue perceber várias das mesmas inquietações dos personagens daquele hit do terror. Em O Mito Americano da Festa do Pijama o diretor apresenta um grupo de jovens que estão às voltas com várias festas que acontecem na mesma noite, uma delas ocorre até na escola. São adolescentes que estão com os hormônios à flor da pele, o que aguça a libido, mas que também carrega as cores das inseguranças em ser aceito por um grupo ou encontrar alguém que demonstre algum interesse por você. Como o título anuncia com sua pompa de dissertação de mestrado, Mitchell parece lidar com uma pesquisa de campo com mais de uma dezena de personagens, resultando em algo que parece o que Robert Altman faria se focasse sua lente astuta em um temática adolescente. No entanto, o senso de humor discreto e irônico que brotam de algumas situações (como o rapaz que reencontra duas irmãs gêmeas de seus tempos de escola e afirma estar apaixonado pelas duas), deixam a sensação que o filme quer se afastar ao máximo possível do humor que acostumamos a ver em filmes sobre adolescentes. Ele aqui é tão seco que parece funcionar como um anti-humor. Por vezes a impressão é que Mitchell fez uma verdadeira colagem de todos os personagens dos filmes de John Hughes e resolveu retirar todo o apelo pop daquelas clássicas comédias juvenis dos anos 1980. O ritmo é arrastado, os diálogos às vezes parecem caminhar para lugar algum e o resultado de cada cena é propositalmente disperso. No entanto, o diretor filma seus personagens (defendido por um elenco desconhecido eficiente) com bastante carinho, fazendo com que a maioria das cenas soem improvisadas como a vida. O fato do filme ser ambientado nos subúrbios de Detroit aumenta ainda mais a sensação de um certo desalento com as longas estradas, quarteirões e fábricas abandonadas que parecem ilustrar um passado que não serve mais aos desejos daqueles personagens que tem a vida toda pela frente. No final das contas, apesar dos vários personagens e diferentes anseios a serem trabalhados, o resultado consegue ser bastante coerente e até simpático. É interessante perceber que Mitchell depois se aventurou por filmes completamente diferentes deste aqui, criando narrativas mais complexas. Embora tenha se perdido um bocado em O Mistério de Silver Lake (2018), ele permanece fiel às suas obsessões enquanto cineasta. O diretor anda sumido desde então, mas seu novo projeto, Flowervale Street (com Anne Hathaway e Ewan McGregor), está previsto para estrear em 2026.
O Mito Americano da Festa do Pijama (The Myth of the American Sleepover / EUA - 2010) de David Robert Mitchell com Marlon Morton, Claire Sloma, Amanda Bauer, Brett Jacobsen, Mary Wardell, Jade Ramsey, Nikita Ramsey e Annette DeNoyer. ☻☻☻
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