Mads e Kim: amigos até que a polícia os separe.
Nicholas Windign Refn tornou-se mundialmente conhecido quando ganhou o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes/2009 pelo seu trabalho em Drive. O filme protagonizado por Ryan Gosling tornou-se um dos filmes mais cult dos últimos anos, sendo badalado em vários países e indicados a vários prêmios. Mas quem curtiu a violência física e psicológica de Drive pode saborear a trilogia que o tornou conhecido especialmente na Europa, a série de filmes Pusher. Enquanto seu novo filme - o controverso Só Deus Perdoa (2013) - não chega por aqui, a trilogia serve como passatempo. Pusher é o típico filme de macho europeu, com palavrões, homens mal encarados, mulheres que não tem medo de cara feia, drogas, bebida, prostitutas e explosões de violência que podem assustar os estômagos mais sensíveis. No entanto, o que vale é a angústia que transborda da tela quando seus personagens se veem numa espiral de situações que podem levá-los ao limite. Esse laço, tão abstrato quanto estilístico é o que une os três filmes da trilogia, mais do que o recurso de aprofundar personagens coadjuvantes do primeiro longa nos dois seguintes. Vendo o primeiro filme de 1996, tenho a impressão que o diretor procurava ainda uma assinatura. Os trinta primeiros minutos onde conhecemos o cotidiano dos amigos Frank (Kim Bodni) e Tonny (Mads Mikkelsen) são quase insuportáveis, os diálogos soam improvisados, as piadinhas não funcionam muito bem e tudo o que entendemos é que os dois tem envolvimento com o tráfico e a cobrança de viciados fiadores. As coisas seguem assim até Frank cair numa investigação policial e precisar se livrar da droga que deveria vender para o dono do tráfico da região, Milo (Zlatko Buric). No entanto, mesmo se livrando dela terá que pagar o que deve e começa a peregrinação atrás de quem deve dinheiro para ele de forma cada vez mais enérgica. A tensão compromete a amizade com Tonny e sua atração nunca assumida pela garota de programa Vic (Laura Drasbaec). Até o final da sessão, Frank terá que decidir os rumos de sua vida que está em risco. Contar mais do que isso estragaria a concepção cada vez mais agressiva que o filme oferece sobre o submundo das drogas. A câmera trêmula e a fotograifa escura aumenta menos a tensão do que a atmosfera impressa pelo diretor numa violência que cresce gradualmente, calcada especialmente nas emoções do personagme principal - e isso se revela como a grande força dos três filmes da trilogia. Apesar do sucesso, o segundo filme foi lançado somente em 2004 e retoma o personagem Tonny que é deixado para trás no meio do primeiro filme.
Tonny: relação Freudiana com o pai.
Pusher II é o quarto filme de Refn (entre os dois ele dirigiu Bleeder/1999 - também protagonizado por Kim, Mads e Zlatko - e Fear X / 2003 com parte do elenco americano) e é notável seu desenvolvimento como diretor ao retomar esse universo violento. Ao invés de investir em cenas que parecem soltas, Refn aprofunda nas relações de Tonny com o pessoas do seu passado. Seja com o pai envolvido com desmonte de carros, amigos ou uma ex-namorada que afirma ter um filho dele. Como era de se esperar, a trama sobre Tonny começa utilizando as referências do personagem no filme anterior, ou seja, sua sexualidade aguçada (que pode chocar algumas pessoas pela naturalidade como a cena com as prostitutas é mostrada) e a autoconfiança que é descontruída aos poucos, conforme o diretor se afasta no bocado de tristeza que emana do personagem. Apesar de ter outra trama sobre drogas perdidas que devem ser pagas à Milo, Pusher II é especialmente sobre a relação de Tonny com o pai e toda a sensação de que Tonny é um inútil para quem está por perto. Tudo o que o protagonista faz não funciona como ele esperava e acaba gerando descontentamentos contínuos até a magnífica cena em que seu pai o humilha pela última vez. Mads está excelente em cena, especialmente nas mais dolorosas para Tonny. Vale lembrar que Pusher foi a estreia em longa metragem de Mads, desde sua estreia ele atuou em outros doze longas até reencontrar Tonny. Para ele, Refn cria um filme melhor que o anterior, num tom dramaticamente invejável para o gênero. Mesmo com a violência sempre presente de forma mais sútil (e por isso mesmo, mais forte em suas explosões), Pusher II é o meu favorito da série - mas não é para os fracos. Há cenas fortes e que refletem bem a referência de Refn nos longas (o escritor Hubert Selby Jr., autor das obras que deram origem aos americanos Noites Violentas no Brooklyn/1989 e Réquiem para um Sonho/2000). Com a repercussão da retomada da franquia, um novo filme foi lançado no ano seguinte. Em Pusher 3 a câmera se fixa na vida particular do traficante Milo (mais uma vez vivido por Zlatko Buric) que agora frequenta os Narcóticos Anônimos enquanto tenta organiza a festa de 25 anos de sua filha. Talvez para mostrar que consegue elaborar outras atmosferas, Refn mostra lentamente como um dia tranquilo ruma para o abismo.
Zlatko: a dura vida de traficante decadente.
Existe um tom mais cômico nesse filme, seja pela comida ruim que atrapalha os planos do personagem, seja por receber um carregamento errado num dia em que tudo deveria dar certo ou por perceber como o sujeito mais ameaçador de toda a trilogia fica completamente inerte perante as vontades da filha (que, por acaso terá de se meter nos negócios do pai). Conforme o filme avança, Milo mostra-se um personagem mais complexo do que imaginávamos, uma espécie de Poderoso Chefão decadente perante os concorrentes mais jovens e destemidos que deve lidar. Refn mostra que o mundo não pertence mais ao personagem que ficava no encalço de Frank no primeiro longa. Ironicamente, dessa vez é ele que precisa se livrar do mesmo problema que o levava a atormentar os protagonistas anteriores. A violência explícita quase não aparece nessa terceira parte, mas quando aparece é mais devastadora que nos outros da trilogia. Anda que exista sempre uma forte tensão na narrativa, existe uma explosão somente quando Milo tem que se confrontar com os interesses de outro traficante local. No entanto, quando Milo encontra personagens do filmes anteriores, lembramos que ele não é tão dócil como aparenta aqui. Pusher 3 soa mais irônico e maduro que os filmes anteriores, mas não me convence como longa que encerra os trabalhos de Refn nesse universo. A presença de personagens dos filmes anteriores (como Radovan vivido pelo grandalhão Slavko Labovic) deixa claro que a ideia de aprofundar a história de coadjuvantes em suas múltiplas dimensões pode ser uma ideia útil para futuras obras do diretor. Curiosamente, Milo voltou a aparecer em 2012 num longa chamado Pusher (2012) filmado na Inglaterra e dirigido pelo espanhol Luis Prieto e que tem a maior cara de remake do original de 1996. No entanto, o filme parece não ter agradado os apreciadores desse universo marginal criado por Nicholas Winding Refn.
Pusher I (Dinamarca/1996) de Nicholas Winding Refn com Kim Bodni, Mads Mikkelsen, Zlatko Buric, Laura Drasbaec e Slavko Labovic. ☻☻☻
Pusher II (Dinamarca/2004) de Nicholas Winding Refn com Mads Mikkelsen, Zlatko Buric, Leif Sylvester, Kurt Nielsen e Karster Schroder. ☻☻☻☻
Pusehr 3 (Dinamarca/2005) de Nicholas Winding Refn com Zlatko Buric, Marinela Dekic e Slavko Labovic. ☻☻☻☻
me recomenda mais alguma coisa nessa pegada?
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