Servillo: a eterna busca pela essência.
O jornalista Jep Gambardella (Toni Servillo) acaba de completar 65 anos e continua respeitado no meio em que trabalha, ainda que há décadas não tenha lançado seu aguardado segundo livro. Seu círculo de amigos é formado por intelectuais, artistas e endinheirados que desfrutam das badalações que a cidade de Roma oferece a quem possa bancar um estilo de vida que está longe de ser comum. No entanto, em meio a tantos artifícios, Jep contempla um certo vazio. Uma espécie de vácuo que denuncia o quanto uma existência pode ser superficial - ainda que tenha uma embalagem deslumbrante. Ao ser exibido no Festival de Cannes, A Grande Beleza foi considerado uma atualização de A Doce Vida (1960) de Federico Fellini, uma vez que Jep parece calcado no personagem de Marcello Matroiani vagando entre a nostalgia e o tédio que o presente lhe proporciona. Para Jep e seus amigos o mundo parece uma grande coluna social de jantares e eventos, mas entre um drinque e outro algumas reflexões aparecem como verdadeiros cortes de navalha. Jep encontra-se com artistas que se levam a sério demais (embora estejam apenas recheados de clichês), leitores que problematizam demais o que leem e pessoas que sentem o peso de uma existência desorientada. Parece cabeça demais? Nem tanto. O cineasta Paolo Sorrentino tem uma facilidade incrível de comunicar suas ideias com imagens e aqui ele explora vários contrastes enquanto a câmera acompanha o protagonista em suas andanças e encontros, seja com uma amigo que tenta conquistar uma roteirista arrogante, uma stripper que já passou dos quarenta anos, uma amiga que não percebe o quanto o filho está perturbado, um cultuado aplicador de botox, uma girafa ou até uma verdadeira divindade encarnada... "É tudo um truque", diz um dos personagens no meio do filme e A Grande Beleza trata o mundo como tal, um truque, com momentos trágicos, cômicos e até belamente surreais (a visita dos flamingos é sensacional!), momentos que talvez só façam parte de uma casca que esconde o que está por dentro (ou será que está apenas oco?). Toni Servillo (ator favorito do diretor) transpira um charme humano irresistível de seu personagem, o que eleva as preocupações de Jep (sobre o vácuo em que as identidades se tornaram no século XXI) para outro nível. Entre o narcisismo e o exibicionismo alimentados pelo individualismo, cada vez mais forte, o filme constrói um painel instigante de personagens e situações em busca de um sentido - que remete diretamente ao título. Ganhador de 53 prêmios internacionais (incluindo o Oscar e o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro), A Grande Beleza se equilibra no grande desafio de abraçar uma plasticidade pomposa enquanto disfarce da vacuidade. Se visto somente pela aparência o filme será pura futilidade, mas se perceber o que ele possui na essência, verá o motivo dele ser considerado uma obra-prima.
A Grande Beleza (La Grande Bellezza / Itália-França - 2013) de Paolo Sorrentino com Toni Servillo, Carlo Verdone, Sabrina Ferilli, Girogio Pasotti, Luca Marinelli e Isabella Ferrari. ☻☻☻☻☻
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