Finn: labirinto de escolhas narrativas
O título de produção mais falada deste finalzinho de ano é Bandersnatch, o longa-metragem de Black Mirror lançado em formato inovador pela Netflix. O filme foi anunciado na véspera de seu lançamento no serviço de streaming e, cercado de mistério deixou os fãs ainda mais curiosos. O fato é que a narrativa de Bansdersnatch se constrói aos poucos, conforme o espectador realiza escolhas diante das opções que aparecem na tela. Cada escolha gera o acontecimento seguinte, por vezes leva você a lugar algum, em outras gera truques que fazem sua escolha não parecer relevante ou destina você para um dos vários finais que o programa preparou (e a mesma resposta diante de um encadeamento diferente pode levar para novos caminhos), o mais decepcionante é quando você sente que desviou demais da rota e precisa voltar. Este formato já foi utilizado antes no pífio Mosaic de Steven Soderbergh, que confiou tanto na inovação que esqueceu de criar uma história interessante. Nas mãos de Charlie Brooker, a ideia faz mais sentido, uma vez que o selo Black Mirror faz sucesso justamente por explorar nossa relação com a tecnologia e as obsessões que nascem dela. As escolhas que fazemos em Bandersnatch só nos fazem pensar no que poderia ter acontecido se seguíssemos uma escolha diferente - e a produção pode durar muito tempo em suas mãos. Pensando assim, parece até que somos um personagem da série. O filme é ambientado nos anos 1980 e conta a história de um jovem programador chamado Stefan ( o interessante Finn Whitehead de Dunkirk/2017) que trabalha em um game baseado num livro onde é o leitor que faz as escolhas do protagonista. Diante das inúmeras possibilidades que propõe, o projeto de Stefan se assemelha ao que vemos no filme e cria contornos de metalinguagem em vários momentos. Tudo daria certo se durante o trabalho, Stefan não perdesse o limite entre realidade e ficção. É interessante como um projeto tão ambicioso e cheio de possibilidades como Bandersnatch esgarça as próprias limitações do formato, já que as escolhas nem sempre geram uma história tão diferente como se espera (e a sensação de bater com a cara na porta ou chegar num ponto em que só resta retornar está longe de ser interessante). Da mesma forma, em termos de escrita, o roteiro precisa construir ganchos que se repetem para costurar o que não se sabe se o espectador viu anteriormente - o que por vezes torna um programa repetitivo. Em termos de atuação, o melhor trabalho é o de Finn, que está brilhante em cena, costurando nossas escolhas com uma desenvoltura realmente convincente. Em três horas eu cheguei no fim da linha algumas vezes, encontrei três finais diferente e já vi na internet que outras pessoas descobriram outras cenas e desfechos. Não consegui desbravar todos os finais e possibilidades do filme, que se parece cada vez mais um jogo com seus níveis diferentes e outros mais secretos. Bandersnatch pode não ter explorado todas as possibilidades que tinha em mãos (será que os pontos mais sombrios ficam pelo meio do caminho mesmo?), mas mantém a curiosidade do espectador por um bom tempo diante do que oferece.
Bandersnatch (EUA-2018) de David Slade com Finn Whitehead, Craig Parkinson, Alice Lowe, Will Poulter e Jonathan Aris. ☻☻☻☻
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