Winslet e Wilson: as verdadeiras crianças do filme.
Com a ideia de que nem todo adulto deixou de ser criança, o escritor Tom Perrotta deve ter escrito seu livro mais conhecido (e lançado no Brasil) Criancinhas. No entanto, o livro está longe de ter como foco personagens de pouca idade e sim três personagens que cresceram em tamanho, mas que possuem grande dificuldade de assumirem as responsabilidades e consequências da vida adulta. Dois desses personagens viverão um caso extraconjugal e o outro é um pedófilo (existe ameaça maior à infância) que ronda a vizinhança. Sarah (Kate Winslet, indicada ao Oscar) é a estudante de literatura que se tornou uma dona de casa insatisfeita após terminar o seu mestrado. Casada com um homem mais velho que prefere passar o tempo em sites pornográficos do que ficar perto dela e da filha. Talvez por existir essa relação distante com o esposo, Sarah não faça a mínima ideia de como lidar com a maternidade - e sua filha se aproveita da situação se tornando uma pequena tirana profissional. Para passar o tempo, Sarah passeia com a filha no parquinho e se dedica a apreciar, ao lado das outras mães, o pai bonitão da vizinhança: Brad (Patrick Wilson, indicado para o papel pela própria Kate) - o qual apelidam carinhosamente de O Rei do Baile. Brad vai todo dia ao parquinho com seu filho e também possui frustrações. É advogado formado e desempregado - por ainda não ter sido aprovado no exame da Ordem. Por isso dedica seu tempo a cuidar do filho enquanto sua bela esposa se dedica ao trabalho de documentarista bem-sucedida (acrescente a isso o fato dela ser interpretada por Jennifer Connely e perceberá que a mulher beira a perfeição). Mas a relação de Brad com a esposa também não é das melhores, já que muitas vezes ele parece apenas o filho mais velho dela - já que ainda precisa de alguém para regular seus afazeres, despesas e rumos. Ah, e sexo - com o filho dormindo entre os dois na cama de casal - anda rareando. Talvez por suas semelhanças Brad e Sarah acabam engatando um romance proibido (e que ganha conotações quase adolescentes) que tenta ser mantido em segredo - apesar das indiscrições de ambos. Um representa para o outro a fuga de uma vida de inércia, ainda que esta fuga comprometa a família que (mesmo aos trancos e barrancos) conseguiram construir. Se o adultério já mostra que só a casca de tranquilidade da vida suburbana é perfeita, esta perfeição é ainda mais prejudicada pela presença de um recém liberto pedófilo: Ronald (Jackie Earle Haley - que ironicamente era um ator mirim esquecido que retomou a carreira em grande estilo com uma indicação ao Oscar por sua atuação neste filme). Ronnie volta a morar com a sua mãe e que causa grande rebuliço entre os vizinhos - que em crises de histeria coletiva promovem algumas das cenas mais interessantes do filme. Com uma história dessas é notável a evolução de Todd Field em contar esta história cheia de nuances com um punhado de personagens complexos. Em momento algum o diretor desvia nossa atenção para algo irrelevante, cada cena tem sua razão de ser na construção de uma espécie de crônica sobre o crescimento e a dificuldade de tomar as rédeas de si mesmo e de seus desejos. Neste processo as simbologias ganham importância ainda maior (a casa repleta de relógios e bibelôs de criança, o balanço vazio, a discussão sobre Madame Bovary, o pânico na piscina, o jogo de futebol com os homens do bairro, os skatistas, o maiô vermelho, o calor e a chuva) e é justamente este cuidado em construir um universo que pareça tão similar ao que nos acostumamos a ver todos os dias que faz de Pecados Íntimos um filme tão especial. Para além do adultério, Field esplora a dificuldade de se tornar adulto através de rupturas (ilustrada belamente no desfecho da trama, que muitos consideram moralista - mas que indica um novo rumo aos personagens, ainda que tudo pareça estar do mesmo jeito). O Oscar e o Globo de Ouro deram várias indicações ao filme, mas deixaram de fora a atuação de Patrick Wilson, que veio da Broadway e que lida com maestria um personagem difícil. Pecados Íntimos é o meu filme americano favorito de 2006.
Pecados Íntimos (Little Children/EUA-2006) de Todd Field com Kate Winslet, Patrick Wilson, Jennifer Connely, Jackie Earle Haley, Noah Emmerich, Phyllis Summerville e Jane Adams. ☻☻☻☻☻
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