Paul: quebra-cabeça da memória.
Diretores que deixam a animação para lidar com atuações de carne e osso costumam tropeçar ao não perceber que alguns recursos narrativos podem funcionar melhor num universo de fantasia. A crítica tem assistido Attila Marcel com grande desconfiança, afinal, marca a estreia em longa metragem live-action do cineasta Sylvain Chomet com atores de verdade (antes ele havia dirigido uma das histórias de Paris, Eu Te Amo/2006). Chomet lida com um filme cheio de referência, nem sempre costuradas com a competência de quem criou animações inesquecíveis como As Bicicletas de Belleville/2003 e O Mágico/2010. O filme conta a história de Paul (Guillaume Goix), um pianista mudo que vive com duas tias idosas desde que seus pais morreram de forma inexplicável. As esquisitices de Paul remetem aos de Amélie Poulain (2001), mas a culpa é mesmo do cuidado exagerado de suas tias Annie (Bernadette Lafont, musa da nouvelle vague falecida em 2013) e Anna (a veterana Héléne Vincent), que parecem guardar um segredo sobre a morte dos pais do moço. Atormentado por pesadelos e cansado de viver tocando piano em saraus e aulas de dança, Paul encontra na estranha vizinha Madame Proust (Anne Le Ny) algumas respostas para seus dilemas - vale ressaltar que as respostas estavam o tempo todo escondidas em sua memória. Chomet desenvolve assim uma espécie de quebra-cabeças sobre a identidade de Paul. Esse mergulho nas memórias do personagem tem alguns momentos interessantes e outros nem tanto. As cenas onde consegue desvendar um pouco mais da personalidade agressiva de seu pai - o lutador que dá título ao filme (que por sua vez é inspirado numa canção) - até funcionam em seu exagero caricato, mas o filme não deveria investir em cenas que parecem um musical pobre. Quando os personagens começam a cantar nos pensamentos do protagonista o efeito é o mesmo do chá misterioso que Madame Proust oferece a Paul. É melhor quando aparece uma banda de sapos nos momentos mais inusitados, ou a própria cantora da canção título. Existem outras passagens que remetem às animações de Chomet (o jantar que termina com cerejas em licor, a competição de música ao final da sessão, a casa cheia de plantas de Madame Proust, ou a cena da briga entre senhoras mostrado somente em sombras). Talvez se fosse uma animação, o filme seria mais harmônico, em live action parece um primo menos exuberante do cinema de Jean Pierre Jeunet ou uma versão pobre de Wes Anderson. No entanto, a história do rapaz que busca respostas sobre sua origem ainda pode encontrar fãs graças à ingenuidade fantasiosa que permeia todo o filme.
Attila Marcel (França-2013) de Silvayn Chomet com Guillaume Goix, anne Le Ny, Bernadette Lafont e Héléne Vincent. ☻☻☻
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