Hathaway e McConaughey: aventuras num buraco de... minhoca?!
Em pouco mais de uma década, Christopher Nolan se tornou um desses diretores que chamam a atenção quando desenvolve qualquer projeto. Se levarmos em consideração que seu cartão de visitas era um longa contado de trás para frente (Amnésia/2000) e que anos depois reformulou a estética dos heróis da DC Comics para a telona com a trilogia Cavaleiro das Trevas de Batman (ao ponto de quem foge da fórmula, como o patético Lanterna Verde/2011, amargar severas críticas e bilheteria decepcionante) sabemos logo o motivo dos filmes do moço ser tão aguardados. Interestelar é o primeiro filme de Chris depois que se despediu da batcaverna, ao mesmo tempo que parece um irmão bastante próximo de A Origem (2010), seu único trabalho a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme. Enquanto A Origem utiliza a ficção científica para mergulhar em várias camadas do inconsciente, Isterestelar é o retorno do diretor ao gênero, mas dessa vez ele não mergulha nos segredos do ser humano (pelo menos, não explicitamente), mas em aventuras espaciais. Num futuro próximo nosso planeta enfrenta problemas sérios com a produção de alimentos, cada vez mais seca e com poeira constante, os humanos questionam o rumo de algumas coisas. Uma delas é que os produtores de alimentos merecem ser mais valorizados que engenheiros, assim como os gastos com explorações espaciais precisam ser deixados de lado, já que a prioridade é melhorar a vida na Terra, que está ameaçada de extinção. Por conta disso os livros de história foram revistos, a chegada do homem à Lua questionada e a NASA trabalha de forma clandestina. Nesse cenário conhecemos relatos de idosos sobre como nosso planeta mudou nos últimos anos, especialmente de Murphy (Ellen Burstyn) que conta a história de seu pai, o ex-piloto e fazendeiro Cooper (Mathew McConaughey) que cuidou dela e do irmão até partir para uma viagem espacial idealizada por Professor Brand (Michael Caine). Em instalações clandestinas, Brand descobriu indícios de planetas que poderiam ser colonizados por humanos, contra a vontade da então pequena Murphy (a ótima Mackenzie Foy), Cooper parte na expedição ao lado da filha de Brand (Anne Hathaway) e Romilly (David Gyasi). Esse é o início do filme e... tudo o que podemos mencionar para não estragar as surpresas que Nolan reservou no roteiro de seu irmão, Jonathan (em texto escrito originalmente para Steven Spielberg). Muito se fala sobre as referências ao clássico 2001: Uma Odisseia no Espaço/1968 de Stanley Kubrick (e tem mesmo, não apenas os silêncios, a lentidão dos movimentos no espaço, mas o próprio monolito que aparece transfigurado em mais um robô cool para a história do cinema). No entanto, o que marca a história é como ela relativiza mais do que tempo e espaço, ela relativiza nossas verdades. Tecnologia
ou alimentos? Engenheiros ou fazendeiros? Individual ou coletivo? Nessas dicotomias
alguns sentimentos se tornam tão constantes (e necessários) como a gravidade
para manter nossos pés no chão (ou não). Nolan nos esfrega o presente de nosso mundo destinado a virar pó (ou como bem lembrou minha querida amiga Marcela Paula: "do pó vieste a ao pó retronarás!") para situar sua obra. Em projetos de novos mundos que parecem uma Terra com defeito (muita água, ou muito frio...), o desespero da solidão, da distância do lar, da extinção mostra-se sempre presente e gerando reações adversas. Enquanto a vida no mundo segue seu rumo - e a solução parece cada vez mais distante - a aventura espacial parece destinada ao fracasso. Considero que às vezes o roteiro se perde em explicações desnecessárias, especialmente quando lembramos que as melhores obras de ficção científica (como de qualquer outro gênero) funcionam melhor quando servem de espelho para refletir o mundo aos olhos do espectador. Talvez por isso o diretor não esclareça quem foi que ajudou a NASA com o tal buraco de minhoca (também conhecido como buraco branco ou, numa linguagem leiga, "um atalho através do eixo espaço/tempo"), ou quais foram as informações dadas por um dos personagens para guiar a humanidade a desfecho que presenciamos. Para terminar, agradeço a Christopher Nolan por não fazer o filme em 3D - do jeito que está já gerou dor de cabeça na plateia, especialmente pela "pentadimensão", uma vertiginosa representação das três dimensões espaciais mesclada ao tempo e ao espaço, o que gera uma cena vertiginosa (que representa com maestria como o
agora mescla passado e futuro para quem consegue enxergar além da percepção
simplista do presente). Quem embarca na viagem e não perde tempo buscando defeitos irá perceber que Nolan acertou mais uma vez em fazer cinema espetacular sim, mas sem deixar de estimular a inteligência da plateia (e isso é mais raro do que você pode imaginar).
Interestelar (Isterstellar/EUA-2014) de Christopher Nolan com Matthew McConaughey, Anne Hathaway, Jessica Chastain, Mackenzie Foy, Michael Caine, David Gyasi, Wes Bentley, John Lithgow, Casey Affleck, Matt Damon e Ellen Burstyn. ☻☻☻☻
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