Thalles Cabral: conto de uma breve vida.
Era uma vez um adolescente de Porto Alegre que gostava de ficar no quarto a maior parte do tempo escrevendo, compondo músicas e fazendo desenhos. Fã da banda inglesa Radiohead, sua sonoridade era visivelmente inspirada na banda, da mesma forma que seus desenhos eram marcados pela influência dos traços de clipes e álbuns da banda. De grande sensibilidade, o rapaz tinha material suficiente para lançar um álbum que chegou às lojas em 2007 e alcançou o mercado internacional conquistando ótimas resenhas. Sob o nome de Yonlu, o jovem Vinícius Gageiro Marques ficou conhecido e teria uma carreira promissora se não houvesse terminado com a própria vida aos dezesseis anos em 26 de julho de 2006. Uma história bastante sombria e que se tornou ainda mais assustadora pela participação do garoto em salas de bate-papo sobre suicídio na internet. Diante de um material tão sinistro, o filme de Hique Montanari poderia se tornar insuportável se não optasse por uma narrativa que foge do realismo, abraçando as músicas, textos e desenhos do menino para contar a história. O filme acerta ao recriar o quarto do menino como cenário, apresentando aquele como seu universo criativo ao mesmo tempo que um local de isolamento. Sem muito traquejo social, Yonlu parece não ter amigos na escola e mesmo o diálogo com seus pais se mostram distantes e artificiais. A internet se tornou sua maior fonte de contato com outras pessoas, pena que o guri não tinha filtro para as novas companhias. São nas conversas online que o filme tem seus traços mais bizarros, com pessoas que surgem sem nome, escondidas por trás de desenhos obscuros e que motivam o rapaz a mergulhar cada vez mais em sua depressão. Em contraponto a isto, o filme perpassa a narrativa com uma encenação de entrevista com falas psiquiátricas baseadas no profissional que acompanhou o rapaz desde criança - mas estas partes ficam meio desengonçadas perante o universo imaginário que se vê na tela. Percebe-se que o diretor as utiliza para gerar um "equilíbrio" com os discursos pró-suicídio que alguns personagens apresentam, mas diante das opções narrativas apresentadas até ali, não me pareceu uma opção muito bem sucedida. Fora isso, o filme se torna hipnótico justamente pelo jeito diferente com que conta as angústias do menino, utilizando sua arte para retratar sua intensidade e angústias (e as temáticas se repetem incansavelmente na metade para o final). O ator e cantor Thalles Cabral, responsável por encarnar o protagonista tem uma atuação quase teatral, o que deixa o filme com um sabor ainda mais descolado da realidade. É fácil perceber que Yonlu se torna um filme brasileiro bastante inventivo e criativamente incomum, ao mesmo tempo que fomenta uma discussão considerada tabu e que sempre gera polêmicas. Um filme poético, mas feito para incomodar.
Yonlu (Brasil/2017) de Hique Montanari com Thalles Cabral, Leonardo Machado, Liane Venturella e Nelson Diniz. ☻☻☻
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