quinta-feira, 7 de março de 2019

Na Tela: Querido Menino

Pai, filho e a família: drama pela metade.

Após sofrer com o vício do filho em metanfetamina o jornalista David Sheff resolveu exorcizar suas desventuras em um livro. Quando chegou às livrarias, Querido Menino chamou atenção pela sinceridade com que o pai descrevia a tristeza perante a impotência de ver o filho mergulhar no mundo das drogas. Ao mesmo tempo, sua preocupação com o primogênito rendia a negligência de sua atual esposa e filhos menores enquanto vagava pelas ruas atrás do filho que entrava e saia de reabilitações rotineiramente. Escolher adaptar um material destes para o cinema é um grande desafio, uma vez que o foco não está sobre o usuário, mas na família que está ao redor dele. Este foi o desafio aceito pelo diretor belga Felix Van Groenigen, que escalou Steve Carrell para viver David e o badalado Thimothée Chalamet para encarnar Nic. A maior parte do público irá estranhar a não menção das motivações de Nic para se render ao vício. É proposital que o filme não apresente aquele momento fatídico em que o personagem é apresentado às drogas, ou que ele tenta justificar sua atração pela metanfetamina, no lugar disso, o espectador verá o rapaz oferecendo um baseado para o pai, uma conversa em que o patriarca confessa ter experimentado drogas na adolescência ou aquela cena em que David usa ópio mara se aproximar das sensações vivenciadas pelo filho. Outros vão procurar pistas nos tempestuosos diálogos do David com a ex-esposa (Amy Ryan) ou se indagar sobre algum amigo que poderia ter influenciado o comportamento do menino. Ao negar respostas fáceis, Querido Menino incomoda pelas lacunas que opta em deixar pelo caminho, afinal, o roteiro não se baseia somente no livro do pai, mas também no livro do filho (Cristal na Veia), que foi lançado quase simultaneamente ao livro de David. O que poderia tornar a narrativa mais rica se torna decepcionante, afinal, muito do livro de Nic ficou de fora, já que o rapaz detalha mais um pouco a jornada naquele mundo sombrio. Em ambos o relato não possui nada de glamouroso ou apológico, o que vemos é o sofrimento de um rapaz que perdeu o controle de uma vida promissora e levando junto quem está ao seu redor. Existem momentos realmente dolorosos no filme, especialmente quando David se rende à impotência e percebe que não existe mais o que fazer ou quando o fim de Nic parece próximo no chão de um banheiro, no entanto, o olhar unilateral história deixa a narrativa um tanto morna, como se faltasse um pedaço da história, ou melhor, do próprio Nic. Em Cristal na Veia, Nic relata como problemas relacionados à autoestima, à ausência de objetivos e preocupações demasiadas com beleza, fama e vida fácil o tornaram mais vulnerável às drogas, em Querido Menino o que Nic aponta a todo instante é o peso da expectativa do pai sobre ele. Embora o final de Querido Menino seja esperançoso, a jornada de Nic é bem mais complicada, incluindo fome, prostituição e recaídas constantes. Em termos de narrativa, infelizmente Groeningen não lembra em nada a abrasividade do excelente Alabama Monroe (2012), oferecendo uma narrativa bastante convencional, a sorte é que ele tem um ótimo elenco em mãos. Chalamet está bastante convincente e mereceu ter sido indicado ao Globo de Ouro de coadjuvante pelas oscilações do personagem. Carrell também tem bons momentos (desde que não grite, ainda considero seu tom agudo ainda é um problema quando interpreta dramas), assim como Maura Tierney na pele da discreta madrasta. Se houvesse um equilíbrio na hora de conjugar as duas obras em que se baseia, Querido Menino teria se tornado um filme poderoso sobre a devastação das drogas, do jeito que está, alcança somente metade das suas intenções. 

Querido Menino (Beautiful Boy/EUA-2018) de Felix Van Groeningen com Steve Carrell, Thimothée Chalamet, Maura Tierney, Amy Ryan e Timothy Hutton. 

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