Emma e Jesse: contos entre a comédia e a tragédia. |
Depois de A Favorita (2018) li muitos comentários de que o cineasta Yorgos Lanthimos havia se vendido. Com Pobres Criaturas (2023) ganhando o prêmio máximo do Festival de Veneza os comentários só aumentaram. Juntas, as produções somam cinco estatuetas e impressionantes 21 indicações ao Oscar. Em comum, ambos premiaram suas atrizes principais junto à Academia, possuem um cuidado estético impressionante e voltagem dramática elevada conjugada com o senso de humor peculiar que Lanthimos ostenta desde que caiu no radar da Academia com seu Dente Canino (2009) na concorrência em Filme Estrangeiro em 2011. Yorgos não levou o Oscar para seu país, mas carimbou seu passaporte para Hollywood. Aquele filme se tornou um marco referencial sobre a estranha onda grega, ou o novíssimo cinema grego composto por filmes independentes com roteiro alinhado com a crise social e econômica do país. Com o orçamento miúdo para fazer filmes, os diretores investiram em um estilo econômico tanto na grana quanto nas interpretações minimalistas dos atores (que funcionam em contraste com as tramas que carregam as tintas no absurdo). O resultado colocou o cinema grego novamente no mapa cinéfilo mundial. Com os orçamentos robustos para brincar na terra do Tio Sam, os fãs mais radicais queriam que Yorgos permanecesse fazendo o mesmo cinema com restrições orçamentárias de antes. Eis que entre as filmagens de Pobres Criaturas, Lanthimos realizou um outro filme em esquema independente, com alguns atores do mesmo elenco e outros convidados, o resultado estreou no Festival de Cannes. O longa dividiu opiniões, mas rendeu o prêmio de atuação masculina para Jesse Plemons no início do ano. A trama é composta por três histórias que lembram muito os tempos de pindaíba do diretor, com histórias bizarras, cheias de metáforas sobre as relações humanas e (assim como o Sacrifício do Cervo Sagrado/2017) traz um toque de tragédia grega. Na primeira história um homem (Plemons) precisa executar uma tarefa para o patrão (Willem Dafoe), mas entra em uma crise de consciência que o faz repensar os limites da relação que existe entre os dois. Na segunda, um policial (Plemons) aguarda o retorno de sua esposa (Emma Stone) que desapareceu em uma expedição. Quando ela é resgatada, ele suspeita que não seja ela, o que gera situações que funcionam como um teste sobre a identidade daquela mulher. No terceiro, uma mulher (Emma Stone) é contratada por um milionário (Dafoe) para procurar uma pessoa capaz de curar doenças e ressuscitar os mortos, tudo por conta do filho do ricaço que está doente (Plemons). Não cabe contar muito para não estragar as surpresas de cada trama, mas existe aqui ecos da excitação mórbida de Kinetta (2009) , o primeiro filme autoral de Yorgos, e um tanto da devoção cega de alguns personagens que lembra o que vimos em Alpes (2011). Quem conhece a fase grega do diretor vai perceber várias semelhanças no desenho dos personagens, no entanto, o maio problema do filme não é essa repetição, mas a impressão de que é composto por três ideias que poderiam render três longas, mas que não conseguiram ser desenvolvidas para tal. Coladas em quase três horas de sessão, gera um certo cansaço de acompanhar as histórias carregadas do estilo absurdista do diretor em tramas que giram em torno da morte. Minha trama favorita é a primeira, a outras são apenas medianas. A sorte é que no streaming (o filme está no Disney+, pois é... tire as crianças da sala!) as três tramas podem ser vistas separadas e satisfazer os fãs até que o lançamento de Bugonia, o próximo longa do diretor, mais uma vez estrelado por Emma Stone. A relação entre os dois é digna de uma análise mais profunda, já que a atriz mostra-se bastante a vontade com as ideias do diretor, percebendo que a oscilação entre o drama e a comédia cai como uma luva para gerar boas (e complicadas) atuações . Particularmente considero o trabalho dela mais interessante do que o de Jesse Plemons por aqui, vale dizer que Dafoe e Margareth Qualley também estão bem em cena. Seja como for, Tipos de Gentileza é Lanthimos dizendo que debaixo de seus filmes mainstream ainda existe a mesma mente assustadora de antes.
Tipos de Gentileza (Kinds of Kindness/ EUA - 2024) de Yorgos Lanthimos com Emma Stone, Jesse Plemons, Margarteh Qualley, Joe Alwyn e Hunter Schafer. ☻☻
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