quinta-feira, 12 de junho de 2025

CICLO DIVERSIDADESXL: Toda Terça-Feira

Tilda e Del:  conflitos entre seres em transição. 
 
Faz algum tempo que Billie (Tilda Cobham-Hervey) vive com  a mãe (Del Herbert-Jane), no entanto, a mãe está prestes a começar seu processo de redesignação sexual, já que recentemente se percebeu como transexual e começará uma série de tratamentos e acompanhamentos para esta mudança. Com isso, Billie vai morar com pai (Beau Travis Williams) e firma um acordo de encontrar a mãe toda terça-feira. O filme da diretora Sophie Hyde passa então a estruturar sua narrativa ao longo de um ano desses encontros, num total de 52 dias organizados quase episodicamente ao longo de quase duas horas de filme. Embora a mãe, que agora passa a se reconhecer como James, tenha apoio dos outros personagens da trama, o processo de transição não é apresentado de forma didática ou fácil ao espectador, cada mudança física, no tom de voz, efeitos hormonais, cirurgias, uso de próteses convive então com as relações entre os personagens e as descobertas que fazem ao longo do caminho. Poré, estes elementos não fazem com que o foco recaia somente sobre James, mas também sobre Billie, que precisa lidar com os novos parâmetros de convivência com sua mãe e suas próprias descobertas sexuais na adolescência e sua efervescência hormonal de dezesseis anos de idade. A estrutura fragmentada do filme causa algum estranhamento no início, mas conforme a trama e os arcos das personagens avançam, o filme se torna cada vez mais robusto, principalmente por James ter que lidar com alguns efeitos colaterais de seu processo de transição e a descoberta de que o mundo não espera que ela vença seus desafios para que outros apareçam no caminho. Aos poucos o filme se torna um turbilhão de situações. A relação com a filha torna-se cada vez mais complicada, especialmente quando Billie se envolve em um triângulo amoroso com um casal de colegas da escola. Este envolvimento lhe coloca em busca de descobertas, mas também a insere em uma situação perigosa envolvendo registros em vídeo dos encontros entre eles. Estes registros em vídeos ressalta as referências documentais do filme, que apresenta um tom realista do início ao fim, especialmente pela forma como lida com os recortes semanais da vida daqueles personagens. Acontece tanta coisa durante o filme que em determinado momento me surpreendi ao notar que não havia chegado na metade de sua duração! A produção utiliza uma montagem ágil, por vezes crua e um tanto áspera na abordagem daquele ano na vida dos personagens. Alguns dias (que são enumerados) rendem cenas mais longas, outras mais curtas, algumas leves, outras densas, envolvendo o espectador em uma montanha-russa surpreendente de situações.  Em tempos de algo tão equivocado como Emília Perez (2024), Toda Terça-Feira se torna um antídoto com sua abordagem mais humanista e realista sobre a transsexulidade  (e imaginar que o filme foi lançado há mais de dez anos). Muito do mérito do filme fica por conta de Tilda e Del, respectivamente na pele de filha e mãe, ambas compõem retratos contundentes de personagens em transição em momentos distintos de suas vidas e o impacto que uma tem na realidade da outra. A complexidade com que o filme aborda suas temáticas lhe valeu um Urso de Cristal no Festival de Berlim em 2014 e elogios quando foi exibido no Festival Mix Brasil do mesmo ano. Um filme pouco conhecido, mas que merece atenção e está em cartaz no Filmicca.  
 
Toda Terça-Feira (52 Tuesdays - Austrália / 2013) de Sophie Hyde com Tilda Cobham-Hervey, Del Herbert-Jane, Imogen Archer, Sam Althuizem, Beau Travis Williams e Mario Späte. ☻☻☻☻  

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