Lars e a namorada: delírios e solidariedade em dramédia independente.
Às vezes me surpreendo com os efeitos de atores certos sob uma boa direção num roteiro (que sem muito esforço) poderia ficar ridículo quando filmado. Este é o caso de A Garota Ideal, que aborda temas espinhosos com uma leveza impressionante. O filme é uma boa pedida para terminar o mês dos namorados que contou com a estreia de Namorados Para Sempre, também estrelado por Ryan Gosling. Pelo papel do problemático Lars, Ryan foi até indicado ao Globo de Ouro de melhor ator de comédia, foi mais do que merecido (e me atrevo a dizer que o rapaz tem aqui a sua melhor atuação). Ex-astro mirim do Clube do Mickey e alçado ao posto de queridinho das moçoilas com Diário de Uma Paixão (2004), o ator não tem pudores em se despir de vaidade para enfrentar personagens complexos e não necessariamente agradáveis. Neste filme dirigido por Graig Gillespie e com roteiro de Nancy Oliver (indicado ao Oscar), Gosling é Lars, um cara solitário de aproximadamente trinta anos que vive na garagem da casa do irmão (Paul Schneider). Apesar de trabalhar e freqüentar a igreja, Lars vive isolado do mundo, ao ponto de recusar os constantes convites da cunhada grávida (Emily Mortimer) para cafés da manhã ou jantares em família. Seus familiares começam a ficar preocupados com o seu isolamento, assim como os colegas de trabalho que notam a sua indiferença pelo interesse de Margo (Kelli Garner), a garota nova do trabalho. Quando as coisas parecem melhorar todos ficam surpresos quando Lars apresenta uma boneca como namorada - e de origem brasileira (!). A atitude de Lars é recebida com estranhamento por todos e só cresce conforme ele demonstra acreditar que a namorada é real com direito a ambições, problemas e pudores... dá para perceber que o roteiro segue por caminhos nunca óbvios na compreensão de seu protagonista. A namorada se apresenta como a forma de Lars se comunicar com o mundo, especialmente no que diz respeito a contar suas angústias a psicóloga (Patricia Clarkson) da boneca (é isso mesmo) e aos poucos descobrimos as dificuldades do personagem em lidar com sua trajetória familiar. Apesar da trama de cores estranhas o diretor soube criar um olhar extremamente solidário sobre seu personagem, nunca ridicularizando-o ou julgando sua postura (nem quando seu relacionamento com a boneca entra e crise e as discussões são inevitáveis) - e torna-se mais louvável o fato do filme nem arranhar a vulgaridade, mesmo com a boneca sendo uma autêntica sex doll (ou seja, uma boneca inflável melhorada). O resultado transpira humanidade numa história sobre solidão. Contribui muito para isso a atuação de todo elenco, mas dificilmente o filme teria fôlego sem o nome de mais complexos de sua carreira, sua atuação cheia de camadas demonstra todas as transformações internas dGosling no alto dos créditos. O ator alcança momentos realmente comoventes num dos personagense Lars. Assim como os outros personagens do filme, vale acompanhar Lars nesta jornada para conseguir se comunicar com o mundo e com suas próprias dores.
A Garota Ideal (Lars and the real girl/EUA-2007) de Graig Gillespie com Ryan Gosling, Emily Mortmer, Paul Schneider, Patricia Clarkson e Kelli Garner. ☻☻☻☻