Gena e Gene: elaborado roteiro dramático de Woody Allen.
Depois dos prêmios de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977), Woody Allen deixou claro que seus dias de provocar apenas risos estavam ficando para trás. O próprio diretor ressalta que depois dos trabalhos com Diane Keaton estava cada vez mais interessado no olhar sobre as relações, especialmente sob a ótica feminina. Nesse período, Allen também estava fascinado pela obra do sueco Ingmar Bergman e não teve pudores em ser um tanto amargo ao abordar como três irmãs lidavam com o divórcio dos pais em Interiores (1978). Desde então o diretor passou a alternar produções cômicas com outras mais sérias. A Outra foi lançado dez anos depois dessa guinada em sua carreira e não empolgou muito a crítica ou o público, mas trata-se de uma obra bastante instigante, especialmente pela excelente atuação de Gena Rowlands. O nome em português não é digno do que o diretor quer abordar aqui, preferindo apelar pelo que há de mais trivial na mente do espectador. Talvez por isso, o filme possa surpreender ainda mais. O título original, Another Woman (Outra Mulher) oferece muito mais nuances à história da escritora e professora de filosofia Marion (Rowlands). Ela é a personagem madura que narra o filme e nos oferece um panorama curioso sobre aquele momento em que coloca a vida em perspectiva. Marion é casada com um médico renomado, Ken (Ian Holm) e não se incomoda de ter que lidar com a filha do primeiro casamento dele, a adolescente Laura (Martha Plimpton), mas precisa de um tempo de concentração para escrever seu novo livro. Ela começa a se incomodar quando percebe que é vizinha de um psicólogo e que consegue ouvir as confidências dos pacientes dele. Aquilo não lhe parece interessante até que começa a ouvir as consultas de uma mulher grávida (Mia Farrow) e infeliz com o casamento. Enquanto mergulha em suas impressões sobre a desconhecida, a protagonista começa a ficar mais atenta aos comentários das pessoas que estão ao seu redor. Sendo assim, os diálogos que tem com o esposo, com a entiada, com a melhor amiga (Blythe Danner), com a cunhada (Frances Conroy) - que precisa lidar com o divórcio - , com o irmão (Harris Yulin) - que quase não tem mais contato com ela -, com uma amiga que se tornou atriz ou com o amigo do marido (Gene Hackman) que flertava com ela passam a desconstruir a autoimagem que Marion tinha de si mesma. As certezas passam a se dissolver entre memórias e revelações que aos poucos aparecem no roteiro mostrando que uma vida que parecia tão cômoda e segura não era tão unidimensional quanto parecia. Solene e quase arrastado, A Outra mostra os méritos de Woody Allen como roteirista de drama, já que em nenhum momento o filme deixa de ser revelador. Apesar de subestimado, o filme ainda merece ser conhecido pela maestria com que o diretor lida com as imagens e as palavras diante do espectador.
A Outra (Another Woman/EUA-1988) de Woody Allen com Gena Rowlands, Mia Farrow, Ian Holm, Blythe Danner, Frances Conroy e Gene Hackman. ☻☻☻☻
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