Naura e Domingos: paixão violenta.
Falecido no mês passado, Domingos Montagner era um astro em ascensão não apenas na televisão mas também no cinema. Somente em 2016 ele estrelou três filmes (em todos com atuações elogiadas), dois deles como protagonista em papéis bem diferentes das novelas em que atuou. Em Vidas Partidas ele tem a tarefa complicada de dar vida a um marido pai de família que se torna cada vez mais abusivo numa história de violência doméstica. Ambientado no Recife da década de 1980 (o que a achei mais curioso é que o filme possui uma ótima reconstituição de época mas ignora completamente o sotaque dos personagens pernambucanos) a história gira em torno do relacionamento entre Graça (Naura Schneider) e Raul (Montagner), um casal apaixonado e aparentemente feliz ao lado das duas filhas. No entanto, desde a cena tórrida inicial percebemos que quem é que manda no casamento (que pode ser visto quase como uma prisão pelas cenas iniciais). Aos poucos a passionalidade da relação torna-se mais intensa e Raul mostra-se um verdadeiro brucutu. Movido pelo ciúme e problemas com a própria autoestima (já que a esposa que lhe consegue um emprego na faculdade) o marido começa a ser cada vez mais agressivo. O filme aproveita a situação para apresentar como a justiça do período mostrava-se extremamente tendenciosa e machista, conferindo verdadeira posse do marido sobre a esposa, fechando os olhos para os abusos sofridos pela mulher e até colaborando para que ela permanecesse num ambiente cada vez mais hostil para que seus direitos não fossem ainda mais lesados - parece estranho, mas a ideia era essa mesmo. Nos anos 1980 não existia a conhecida Lei Maria da Penha (sancionada em 07 de agosto de 2006) Naura está eficiente como a esposa que come o pão que o galã amassou, mas é Montagner que rouba a cena como esposo que caminha entre a sedução e agressão com uma desenvoltura assustadora - e isso faz a diferença quando o longa abandona a sutileza e vai do drama ao filme de tribunal para logo depois descambar para um verdadeiro filme de terror. Pena que o estreante Marcos Schechtman escorrega nas transições entre os gêneros que abraça, mas seu estilo duro consegue manter o interesse do espectador na história de um casal que caminha cada vez mais para a ruína. Vale mencionar que a primeira vez que ouvi falar do filme foi com em uma conversa com meu colega Guilherme Guaral, ator (e professor) que já apareceu em vários filmes nacionais e vive aqui uma espécie de cúmplice do protagonista marrento.
Vidas Partidas (Brasil/2016) de Marcos Schechtman com Naura Schneider, Domingos Montagner, Nelson Freitas, Milhem Cortaz e Guilherme Guaral. ☻☻☻
Vidas Partidas (Brasil/2016) de Marcos Schechtman com Naura Schneider, Domingos Montagner, Nelson Freitas, Milhem Cortaz e Guilherme Guaral. ☻☻☻
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