A dinamarquesa Lone Scherfig conseguiu um feito e tanto ao se tornar a responsável pelo filme mais simpático do movimento Dogma 95. Sua direção sensível em Italiano para Principiantes/2000 com seus seis personagens tentando se encontrar em uma vida marcada por opressões. O longa a tornou conhecida da crítica e dos produtores que perceberam sua capacidade de abordar temas delicados com leveza. No entanto, sua consagração absoluta veio com Educação (2009), filme que concorreu a três Oscars, Oscars (melhor filme, roteiro adaptado e rendeu a primeira indicação de melhor atriz da carreira de Carey Mulligan, se tornando um divisor de águas na carreira da atriz de Bela Vingança/2020). O sucesso do filme em língua inglesa a credenciou a tomar frente de produções cobiçadas como a versão para o cinema do best-seller Um Dia (2011). No entanto, não são poucos que acusam a cineasta de se repetir cada vez mais em seus filmes recentes. Vejamos o que ela faz neste Um Inverno em Nova York. Aqui ela retoma uma roteiro que segue vários personagens em seus dilemas - não poderiam faltar a sua protagonista bondosa que precisa se livrar de problemas e o tom moldado para ser adorável mesmo quando a coisa deveria ser um pouco mais, digamos, densa. O que poderia ser um caleidoscópio no melhor estilo Robert Altman, logo se torna um universo que gira em torno de Clara (Zoe Kazan), mulher casada com um sujeito agressivo que resolve fugir por Nova York enquanto o esposo a procura feito um louco. Ela acaba dependendo da bondade de outros personagens para não dormir nas ruas. Assim encontra um rapaz azarado quando o assunto é emprego (Caleb Landry Jones), a médica que participa de terapias de grupo para lidar com a rotina estafante (Andrea Riseborough), um estrangeiro cheio de amor para dar (Tahar Rahim), um advogado sem muita expressividade na história (Jay Baruchel) e um porteiro que precisa imitar sotaque alemão (Bill Nighy). Embora tenha alguns momentos tensos, o filme dá voltas em torno de si mesmo sem apresentar muita consistência aos personagens e os laços que os une tão repentinamente. Embora tenha um bom elenco, nenhum deles parece ter muito entrosamento com o outro em cena - quando na verdade este deveria ser o maior trunfo do filme. Embora seja repleto de boas intenções, as relações são bastante frias durante a sessão - e ainda precisam lidar com a forma rasa com que o roteiro trata temas complicados como violência doméstica e abuso infantil. A impressão é que nada pode estragar o tom otimista e a cadência simpática da narrativa que tem uma cota considerável de temas pesados para tratar. Ao exagerar no açúcar, o filme acaba rendendo menos do que deveria, especialmente por não aprofundar as tristezas de seus personagens e seus desdobramentos. Um Inverno em Nova York pode até ser agradável de assistir com sua bela fotografia e trilha sonora otimista, mas gera certo incômodo pela forma como se esquiva de tratar os temas a que se propõe. Este temor acaba rendendo um filme tão genérico quanto seu título em português (o original seria A Bondade de Estranho... não sei se faria grande diferença) e difícil de lembrar depois que termina.
Um Inverno em Nova York (The Kindness of Strangers / Dinamarca - Canadá - Suécia - França - Alemanha - Reino Unido - EUA / 2019) de Lone Scherfig com Zoe Kazan, Tahar Rahim, Andrea Riseborough, Bill Nighy, Caleb Landry Jones, Esben Smed, Jack Fulton, Finlay Wojtak-Hissong e Jay Baruchel. ☻☻☻
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