quarta-feira, 23 de março de 2011

FILMED+: WATCHMEN

Watchmen: Heróis lidando com seus próprios vilões internos.

Acho que nenhum filme que eu citar no FILMED+ é tão odiado quanto Watchmen. Porém, sei que o filme tem uma cota considerável de fãs (a maioria deles na Europa onde o filme virou sucesso de bilheteria, enquanto o resto do mundo o rejeitou). Tanto amor e ódio é mais do que compreensível quando pensamos que o filmé é baseado na mais cultuada HQ de todos os tempos, a obra-prima de Alan Moore e David Gibbons, sendo a única história em quadrinhos presente na lista da revista Time sobre as maiores obras da língua inglesa. Obviamente que tanto culto à obra impressa se reverteria em mesma medida em marketing e decepção para os fãs quando o filme ficasse pronto. Talvez por isso a adaptação da saga de Comediante & Cia tenha demorado tanto para ganhar as telas. Na época em que o Batman (1989) de Tim Burton fez sucesso, os estúdios ficaram coçando as mãos para adaptar Watchmen - mas graças aos deuses do cinema a versão estapafúrdia proposta à Terry Gillian não saiu do papel. No século XXI sobravam rumores envolvendo nomes como Darren Aronofsky e Paul Greengrass, mas ambos não tiveram fôlego para tocar um projeto com tamanho nível de complexidade, expectativas e cobranças do estúdio. Acostumados ao cinema independente isso é totalmente compreensível. Foi um fã da série em quadrinhos que topou a empreitada com medo dos estragos que poderiam fazer à uma obra tão cultuada. Zach Snyder havia saído do sucesso de 300 (2006) de Frank Miller e mergulhou de cabeça no universo paralelo criado por Miller e Gibbons, fazendo um filme visualmente irrepreensível e que está longe de ser um filme de herói comum. A maior ousadia do diretor talvez seja condensar a trama de doze gibis revistas em quase três horas de projeção (dizem que havia uma cópia com quatro horas que era a versão integral, mas que acabou virando uma espécie de lenda). O filme procura ser bem fiel à trama original e muitos até a criticam por isso. Num mundo onde os heróis existem de verdade, Richard Nixon foi reeleito várias vezes, tendo até envolvimento com a lei Keane que proibe que os heróis usem máscaras se não possuírem sua identidade revelada. Com isso poucos se registram (como Comediante), outros se aposentam (como o Coruja) e alguns continuam atuando às escondidas (como Rorschach). É com o assassinato de Comediante (Jeffrey Dean Morgan, numa atuação competente que merecia atenção nas premiações) que a trama começa sob a suspeita de que alguém quer acabar os heróis. O problema é que atribuem essa suspeita à personalidade paranóica de Rorschach (Jackie Earle Haley digno de uma segunda indicação ao Oscar de coadjuvante). O filme acompanha a trajetória desses personagens em clima de filme noir e descasca seus heróis sem pudores. Afinal, o que se passa na cabeça de um herói? Uma pessoa que coloca uma máscara e sai por aí espancando bandidos? Será um psicopata como Comediante? Um semi-deus como Dr. Manhanttan (Billy Crudup)? Ou uma herdeira (Malin Ackerman) de uma heroína com pretensões de tornar-se atriz como Spectral (Carla Gugino)?  Um covarde impotente que nem sabe muito bem o que se tornou com o passar dos anos como o Coruja (Patrick Wilson)?  Será que a solução é capitalizar o prestígio e se tornar um capitalista que ganha dinheiro apregoando a paz mundial enquanto alardeia ser o homem mais inteligente do mundo como Ozymandias (Matthew Goode)? A trama conta em flashback a história dos heróis americanos entrelançando com fatos da história dos EUA (a abertura do filme é antológica ao som de Bob Dylan) e nos revela os danos que anos de combate ao crime pode causar - sem perder de vista a noção pura de heroísmo que brota na mente de todo garoto (afinal, é isso que Spectral e Coruja representam). Sem abrir mão dos momentos mais escabrosos do gibi e outras polêmicas (como a nudez radioativa de Manhattan) o filme é muito bem sucedido ao romper com o maniqueísmo entre mocinhos e bandidos, mostrando que o nosso maior inimigo pode estar em nós mesmos. Fora isso, tem aquele verniz político que toda trama de herói que chega aos cinemas quer. Mesmo tendo alterado o final (mas não em sua essência), Watchmen é um filme que será redescoberto com o tempo, pode escrever!

WATCHMEN - O Filme (Watchmen/EUA-2009) de Zack Snyder com Jackie Earle Halley, Patrick Wilson, Jeffrey Dean Morgan, Malin Akerman, Matthew Goode e Carla Gugino. ☻☻☻☻☻

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