Cassino Royale: química poderosa entre Eva e Craig.
Parecia que o público mal tinha se acostumado com Pierce Brosnan na pele do agente
007 e a temporada do ator na série já chegava ao fim. Cogitavam os nomes de vários astros para o papel de James Bond, os mais conservadores decretavam Clive Owen como favorito, mas os produtores indicavam que queriam alguém mais jovem - e os nomes de Henry Cavill, Ewan McGregor e Gerard Butler apareciam nas especulações ao lado de Hugh Jackman (um tanto enfraquecido por sua fama como o mutante Wolverine). Quando noticiaram que o louro Daniel Craig era o escolhido a imprensa ficou pasma. Quem não conhecia o ator - que ganhava prestígio aos poucos com atuações sólidas em filmes modestos como
Recomeçar (2003),
Nem Tudo é o que Parece (2004) e
Confidencial (2006) - estranhou por ele estar fora dos padrões de beleza da franquia. Com seu tipo
sisudo germânico, Craig sabia exatamente que sua carreira mudaria ao embarcar na milionária franquia aos 38 anos. Quando
Cassino Royale (2006) estreou, o diretor Martin Campbell (que já reformulou a série em
007 contra Goldeneye/1995) demonstrou que James Bond chegava a um novo ponto de partida. Mais sério e menos fantasioso, o filme podava os exageros do personagem ao longo de décadas de sucesso, sua vida sexual era menos explorada, assim como seus apetrechos mirabolantes surgiam mais discretos. Ficou clara a ideia de criar uma nova essência para o personagem. Daniel Craig investiu numa personalidade de Bond em início de carreira, ainda aprendendo a se tornar um agente secreto dentro de uma organização a serviço do governo britânico. Baseado no livro homônimo de Ian Fleming, o filme apresenta Bond evitando um ataque terrorista no aeroporto de Miami e se aproximando de Verper Lynd (Eva Green, que com seus olhos intensos criou a
bond girl mais complexa de todos os tempos), Vesper é uma agente do Tesouro inglês que tem a missão de frustrar as ações do terrorista Le Chiffre (o bom Mads Mikkelsen) que pretende conseguir fundos para sua organização nas mesas do cassino do título. Campbell investe numa narrativa mais lenta, com poucas (e elaboradas) cenas de ação, mas investe forte na tensão entre Bond e Vesper - o que transforma o clímax do longa ainda mais intenso. Com Daniel Craig provando que era o agente mais em forma da história da franquia (e Campbell explora ao máximo sua musculatura) numa atmosfera mais sóbria, o filme se tornou a maior bilheteria de 007.
Quantum of Solace: nome confuso, trama idem.
Com a nova cronologia estabelecida ancorada num 007 mais vulnerável - especialmente após a decepção provocada por seu relacionamento com Vesper Lynd - o diretor Marc Forster foi uma escolha inusitada para dirigir o novo filme:
Quantum of Solace (2008). O cineasta de filmes indicados ao Oscar (fez
A Última Ceia/2001 que oscarizou Halle Berry e
Em Busca da Terra do Nunca/2004 que indicou Johny Depp) demonstra alguns tropeços na condução do filme, a maior delas é optar por cenas de ação uma atrás da outra, sem que o espectador tenha compreendido de fato o que está acontecendo. A edição de cortes rápidos também não ajuda a notar que o filme parte exatamente de onde terminou o filme anterior: James Bond procurando o dinheiro roubado pela organização de Le Chiffre no filme anterior. Enquanto tenta exorcizar o fantasma de Vesper Lynd de sua vida, Bond não consegue confiar em ninguém ao seu redor e passa a se relacionar com o sexo oposto de forma apenas superficial. Não por acaso ele se envolve com a agente Strawberry Fields (Gemma Aterton) enquanto se aproxima do escorregadio Dominic Greene (Mathieu Almaric) - sujeito que banca o filantropo quando na verdade possui interesses políticos nada lisonjeiros. No caminho de Bond ainda surge a amante de Dominic, a belíssima Camille Montes (Olga Kurylenko) que também tem uma história a passar a limpo dentro da trama. Camille é um belo ponto de reflexão sobre a fase emocional do agente 007, já que é muito mais agressiva que Vesper Lynd, dona de uma sexualidade notável, mas ainda assim, Bond não se envolve amorosamente com ela. A ideia funciona como um elo forte entre o casal que se une numa missão perigosa. Outra personalidade feminina forte que ganha destaque na trama é M (Judy Dench), com contornos maternais diante do seu agente favorito a personagem recebe mais elementos interessantes na trama.
Quantum of Solace foi criticado por não ser tão interessante quanto o anterior, mas foi foi o segundo filme da história de James Bond em arrecadação mundial. O roteiro (escrito pelo mesmo trio Neal Purvis, Robert Wade e Paul Haggis) tem o mérito de deixar os filmes do agente mais amarradinha e criar a base para a intensidade alcançada em
007 - Operação Skyfall (2012) celebrado como o melhor filme da série.
Skyfall: o melhor Bond da história!
O inglês Sam Mendes foi agraciado com a unanimidade da crítica por
Skyfall, considerado o melhor filme do personagem. Tudo funciona com perfeição, da cena de abertura (embalada pela canção de Adele ganhadora do Oscar), passando pelo vilão vivido por Javier Bardem (como um espelho distorcido do próprio Bond), a intensificação da personalidade de M (Judy Dench) à frente de uma agência num mundo de inimigos incertos e... o retorno às origens familiares de James Bond. Acostumado a filmes dramáticos, Mendes construiu um filme que ousa ser mais do que apenas um longa de ação - e a própria cena de abertura é uma desconstrução, já que o herói começa baleado por sua
bondgirl da vez (Naomie Harris), que depois ainda colocará uma navalha no pescoço dele (quando o público espera que os dois tenham cenas de alcova). O premiado diretor de
Beleza Americana (1999) retomou o personagem com
007 contra Spectre (2015) e sabia que tinha um grande desafio em mãos. Não sei quanto a vocês, mas quando ouvi a música de abertura na voz de Sam Smith (que inexplicavelmente ganhou o Oscar por ela) percebi que o filme estaria um nível abaixo do anterior.
Spectre tem cenas de ação bem executadas enquanto amarra todos os filmes com Craig na pele do agente a uma mesma organização:
Spectre. Enquanto busca informações sobre o misterioso grupo, Bond depara-se com um vilão que conhece há mais tempo do que imagina (vivido por Christoph Waltz). Waltz tem dois Oscars no currículo, mas não consegue escapar da repetição ao encarnar o sádico ressentido Blofeld. No quesito b
ondgirl não há o que reclamar, Monica Belluci tem uma ponta charmosa e Léa Seydoux vive Madeleine - a chance de redenção de Bond perante sua vida amorosa (e o desejo de uma aposentadoria). Sem Paul Haggis no roteiro,
Spectre parece o filme mais tradicional 007 da fase atual, embora traga Ralph Fiennes na pele de M, ofereça mais destaque à genialidade de Q (Ben Whishaw) e resgate Moneypenny (Naomie Harris), o grupo deixa o filme com cara de equipe de
Missão Impossível. Embora Daniel Craig seja o sexto ator a viver o agente 007, seu jeito truculento (vestido com ternos impecáveis feitos sob medida) já deixou sua marca num dos personagens mais rentáveis do cinema. Atravessando uma década na pele do agente, dizem que o estúdio ofereceu cem milhões de dólares para Daniel Craig voltar à série, mas alegando que Bond é um misógino que não acrescenta nada em sua vida (além do ator já ter 48 anos e problemas no joelho), Craig se despediu de forma bastante digna do papel.
007 - Cassino Royale (Casino Royale / Estados Unidos - Reino Unido - Alemanha / 2006) de Martin Campbell com Daniel Craig, Eva Green, Mads Mikkelsen, Judi Dench, Giancarlo Gianini e Jeffrey Wright. ☻☻☻
007 - Quantum of Solace (Quantum of Solace/ Estados Unidos - Reino Unido / 2008) de Marc Foster com Daniel Craig, Mathieu Almaric, Olga Kurylenko, Judi Dench, Giancarlo Gianini, Jeffrey Wright e Gemma Aterton. ☻☻
007 - Operação Skyfall (Skyfall / Estados Unidos - Reino Unido / 2012) de Sam Mendes com Daniel Craig, Javier Bardem, Judi Dench, Ben Whishaw, Ralph Fiennes, Naomie Harris e Albert Finney.
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007 Contra Spectre (Spectre / Estados Unidos - Reino Unido / 2015) de Sam Mendes com Daniel Craig, Christoph Waltz, Ralph Fiennes, Léa Seydoux, Naomie Harris, Ben Whishaw e Dave Bautista.
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