Tim e Cristofer: questão de confiança.
O mexicano Michel Franco ficou famoso por seu segundo longa-metragem, Depois de Lúcia (2012), sobre uma adolescente que sofre bullying na escola e encontra uma solução - que tem consequências drásticas. O diretor demonstrava uso certeiro dos silêncios e uma certa ausência de esperança na humanidade, além de deixar evidente que não faria filmes para você olhar enquanto come pipoca ou fazer hora até comer pizza com os amigos. Franco quer causar desconforto na plateia e colocá-lo exatamente na posição de seus personagens, ou pelo menos, em uma proximidade incômoda. Afinal, que tipo de diretor contaria a rotina de um enfermeiro que trabalha cuidando de pessoas doentes a domicílio? Durante o filme, David (Tim Roth) será responsável por cuidar de uma mulher soropositiva, um homem que sofreu AVC, uma paciente que faz sessões de quimioterapia e um adolescente com paralisia cerebral. No início, o roteiro parece apenas retratar o cotidiano deste personagem sem maiores surpresas, mas aos poucos, revela um pouco mais deste protagonista de poucas palavras e de personalidade mais interessante do que podemos supor. No início, sua vida pessoal parece totalmente preenchida pelos pacientes, ao ponto dele mencioná-los como se fossem pessoas de sua família (esposa, irmão...), havendo o peso de que ainda que procure manter distanciamento dos pacientes, ele é a pessoa mais confiável por perto. Esta relação dos pacientes com o enfermeiro é um dos pontos mais interessantes do filme, já que cada personagem irá desenvolver uma cumplicidade única com ele (e o caso mais notável é o arquiteto vivido por Michael Cristofer, que está excelente como um sujeito que revela mais a David do que aos seus próprios parentes). No entanto, este envolvimento por vezes tem um preço alto. Curiosamente é nesta afeição que David retoma alguns pontos de sua própria vida que ainda precisam ser tratados. A partir de determinado ponto, o roteiro passa a costurar de forma mais evidente a história do protagonista com as suas ações e a atuação de Tim Roth se torna ainda mais impressionante. Famoso por suas parcerias com Quentin Tarantino, Roth nunca se tornou um grande astro de Hollywood, mas é de um talento ímpar que já fez todo tipo de personagem em mais de cem trabalhos no cinema e na televisão. Aqui ele faz muito realizando o mínimo em cena, sem dúvida um grande desafio - vale lembrar que Roth foi indicado ao Independent Spirit de melhor ator pelo papel. Muitos percebem no cinema de Michel Franco semelhanças com o estilo do austríaco Michael Haneke (de Amor/2012, A Fita Branca/2009, A Professora de Piano/2001 e outros filmes árduos), talvez por isso, Franco pegue elementos do universo Hanekiano e o traduz através de um filtro bastante pessoal. Duro e sensivelmente bem construído (tanto que ao ser exibido no Festival de Cannes2015, o filme levou para casa o prêmio de Melhor Roteiro), Chronic é uma verdadeira pérola feita de chumbo.
Chronic (México / França - 2015) de Michel Franco com Tim Roth, Michael Cristofer, Elizabeth Tulloch, Maribeth Monroe, Tate Ellington, Robin Bartlett e Joe Santos. ☻☻☻☻
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