Os Fumari: comercial de margarina disfuncional. |
O cineasta José Eduardo Belmonte ganhou reconhecimento por dramas densos do porte de Meu Mundo em Perigo (2007) e Se Nada Mais der Certo (2008), mas em suas obras mais recentes resolveu enveredar por caminhos mais palatáveis. Agora ele se rende ao suspense criado no livro de Raphael Montes, reconhecido como o mestre da literatura de mistério brasileiro (é de sua autoria o sucesso que rendeu o sucesso Bom Dia, Verônica da Netflix). Uma Família Feliz conta a história de uma família aparentemente perfeita e, para início de conversa, o diretor escolheu um casal de atores por considerá-los o Ken e a Barbie do Brasil, no caso, respectivamente Reynaldo Gianecchini e Grazi Massafera. Obviamente que ao longo da carreira os dois já demonstraram dar conta de personagens complexos, além de ser bastante populares entre o público. No filme, ele é Vicente e ela é Eva. Os dois moram em um casarão confortável num condomínio fechado com as duas filhas. Ele não tem problemas com o trabalho e ela está grávida e permanece produzindo bonecas realísticas (aquelas que dão arrepios). No entanto, conforme a trama avança você percebe que nem tudo é perfeito - e não me refiro ao fato de uma das meninas enfrentar um agressivo tratamento contra o câncer. Algumas situações estranhas começam a acontecer com as crianças da casa e as suspeitas recaem sobre Eva, que jura ser inocente. A situação da personagem piora cada vez mais ao longo da história e as interpretações de Grazi e Reynaldo são fundamentais para manter o suspense, o problema é que a abertura do filme já fornece uma ideia ao espectador do que se passa e o resto do filme tentamos entender como chega àquela situação do início. Neste jogo de aparências e suspeitas, o filme de vez em quando se enrola nas pistas falsas que oferece ao espectador, mas o desfecho "surpreendente" pode deixar algumas pessoas chocadas. A necessidade do filme sempre se reinventar para prender a atenção cansa um pouco, já que não consegue escapar muito de algumas convenções do gênero, mas funciona graças ao trabalho do casal principal que oferece à produção a sensação de vermos um comercial de margarina disfuncional. No entanto, entre o casal protagonista, Massafera é a que mais surpreende ao dar conta de uma personagem que mantém internalizada uma índole que impossibilita ao espectador confiar plenamente em todas as acusações que sofre ao longo da sessão (e a cultura do cancelamento segue implacável!). Ao mesmo tempo, Gianechini precisa oferecer o mesmo, mas seu personagem possui menos, passando sem muita sutileza entre homem de família exemplar ao marido acusador e suspeito ao longo do filme. Uma Família Feliz se torna um suspense nacional eficiente, deixa aquele nó na garganta na cena final, mas quase estraga tudo com a cena pós-crédito com os sobreviventes ao lado de uma bandeira nacional. Sim, existe uma ironia sobre a família tradicional brasileira, mas do jeito que aparece soa um tanto deslocado quando descobrimos o que de fato acontece ao longo da história.
Uma Família Feliz (Brasil - 2024) de José Eduardo Belmonte com Grazi Massafera, Reynaldo Giannechini, Luiza Antunes, Juliana Bim, Guenia Lemos e Maureen Miranda. ☻☻☻
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