Booth e Thure: relacionamento complicado.
Recentemente o Brasil inteiro resolveu debater um tal beijo gay na novela das nove da Rede Globo. Curiosamente, foi no mesmo final de semana do tal falado beijo eu estava assistindo Deixe a Luz Acesa, premiado longa metragem dirigido por Ira Sachs, que assina o roteiro ao lado do brasileiro Maurício Zacharias. Se você ficou escandalizado com o tal beijo é melhor você nem passar perto do filme, já que o beijo é a coisa mais leve que você verá entre dois homens. Para os menos impressionáveis, Sachs conta uma história do amor bastante dolorida entre duas pessoas, que, por acaso, tem o mesmo sexo. A história abrange o relacionamento por dez anos, com suas idas e vindas, alegrias e problemas. No entanto, o diretor nunca perde de vista o universo que está em torno dos personagens. Na história, o jovem documentarista alemão Erik (Thure Lindhardt) passa as noites em busca de companhia através das linhas de bate-papo. A trama começa em 1998, ano em que ele conhece o editor de livros Paul (Zachary Booth). Paul tem namorada, mas parece estar disposto a sair do armário, conforme os encontros com Erik tornam-se mais constantes. Conforme tornam-se mais íntimos, Paul revela ser viciado em drogas e Erik revela-se viciado no parceiro. É interessante as cenas em que Erik parece tragar o namorado para si, numa espécie de transe que o faz tornar-se cada vez mais dependente da relação. Através dos anos, o fantasma da solidão está sempre rondando os personagens, não apenas os protagonistas, mas os amigos que cercam a dupla (especialmente a ótima Julianne Nicholson, que está em cartaz nos cinemas com Álbum de Família, e aqui vive a amiga que propõe a Erik ser pai do filho que espera gerar), essa sensação só é ampliada pela pesquisa que o documentarista realiza para contar a história do fotógrafo Avery Willard (1921-1999). A obra de Willard é um marco para o movimento GLBT e aqui serve de contraponto para os dilemas que o personagem enfrenta num relacionamento problemático com o parceiro, afinal, conforme Erik conquista reconhecimento, Paul parece afundar cada vez mais nas drogas pesadas. A escalação dos atores mostra-se um grande acerto, já que Thure Linfhardt está bem longe de ser o belo homossexual urbano que a maioria das produções quer mostrar. Thure faz do personagem mais rico do que podemos supor em suas oscilações entre o masculino, o feminino e o andrógeno que constitui sua personalidade. Sem a pretensão de ser um conto de fadas gay, o filme pode incomodar com sua sinceridade. Repleto de signos muito bem trabalhados (a videoinstalação no museu, os quartos habitados pelo casal, a rua onde se despedem apenas com um abraço), Deixe a Luz Acesa traz um retrato curioso sobre uma afetividade que ainda luta para se impor e ser vista como uma forma de ser, estar e sentir o mundo.
Deixe a Luz Acesa (Keep The Lights On/EUA-2012) de Ira Sachs com Thure Lindhardt, Zachary Booth, Julianne Nicholson, Sebastian La Cause e Paprika Steen. ☻☻☻
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