quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

KLÁSSIQO: Serpico

Pacino: como constuir um mito. 

Existem filmes que servem fundamentalmente para criar um mito do cinema. Al Pacino teve a sorte e o talento de encontrar alguns desses pelo caminho, seja pela participação na trilogia O Poderoso Chefão (1972, 1974 e 1990), no obrigatório Um Dia de Cão (1975) ou nesse Serpico (1973). Por sua atuação na biografia do policial de Nova York que enfrenta o esquema de corrupção de seus pares, o ator recebeu indicação a vários prêmios e muitos consideram que ele merecia aqui o seu primeiro Oscar das oito indicações que já recebeu (a estatueta só veio em 1993 com Perfume de Mulher). Colabora muito para a construção do filme, o talento de Sidney Lumet (1924-2011) na elaboração de uma história contada de forma seca e direta, num realismo que o tornou uma espécie de referência nesse tipo de filme (enxergo muito dele nos trabalhos de Ben Affleck, especialmente em Argo/2012). Desde o início, Lumet está interessado na construção de seu personagem, nas transições que atravessa conforme se depara com a corrupção da instituição em que confiou suas ambições - e que acreditava servir para proteger a população. Desde o início, Serpico está preocupado com a proximidade da polícia com a população, talvez por isso, aos poucos abandone o visual limpinho do início de carreira pelo aspecto quase ripongo das ruas. Com barba e cabelo cada vez maiores, além de roupas acima de qualquer suspeita, Serpico era quase um sujeito disfarçado enquanto seus companheiros de profissão eram discretos oficiais à paisana. As coisas começam a complicar quando ele descobre que vários colegas recebem tributos para não atrapalhar negócios ilegais na cidade. Essa prática renderia grandes montantes de dinheiro aos policiais, mas Serpico não aceitava essa prática. Seu incômodo perante a relação dos policiais com marginais acabam criando grandes conflitos do protagonista com os colegas, o que só piora quando ele efetiva denúncias contra eles. Se a carreira está em perigo, a vida amorosa parece nunca avançar perante as suas namoradas, sempre com uma visão mais séria do relacionamento do que Serpico possuia. Aos poucos,  Pacino revela as nuances de um personagem que torna-se cada vez mais de carne e osso durante a sessão. O ator tinha 33 anos quando o filme estreou, mas parece até mais novo nas cenas em que Serpico mostra-se entusiasmado com seu ingresso na carreira de policial. Gradualmente inquieto, o ator constrói uma aura de herói urbano sem afetação que  torna inevitável nossa identificação com esse personagem real que virou uma espécie de lenda nos anos 1960 e 1970. É interessante como Lumet segura nossa atenção nas cenas iniciais, quando o protagonista parece ter sofrido um atentado e, aos poucos, nos oferece um filme mais dramático do que policialesco. Quando descobrimos de onde surgiu o tiro que atingiu Serpico pensamos o quanto era acaso e o quanto era apenas o resultado de sua oposição ao mundo em que vivia. 

Serpico (EUA/1973) de Sidney Lumet com Al Pacino, John Randolph, Jack Kehoe e Cornelia Sharpe. ☻☻☻

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