Bright e Kidman: amor impossível.
O diretor inglês Johnatan Glazer colheu elogios quando exibiu seu novo longa no Festival de Veneza (o terror Under The Skin protagonizado por Scarlett Johansson), mas ele ainda encontra dificuldades em sua distribuição - o que não impediu que ele concorresse a quatro prêmios (incluindo melhor diretor e atriz) no British Independent Film Awards no ano passado. No entanto, sempre existem aqueles que consideram o trabalho do diretor pretensioso e vazio. Devo dizer que não pertenço a esse grupo. Glazer foi responsável por alguns dos clipes mais interessantes da década de 1990 (incluindo o clássico "Rabbit in your headlight" do Unkle) e foi para o cinema disposto a contar histórias de um jeito ousadamente estiloso, apresentando um capricho incomum entre os cineastas independentes ingleses. Em 2014 faz exatos dez anos que ele lançou Reencarnação, drama intimista estrelado por Nicole Kidman (que foi indicada ao Globo de Ouro pelo papel). O título em português motivou uma campanha que vendia o filme quase como um filme de terror, quando a ideia do diretor era fornecer ao espectador uma espécie de enigma. Nicole vive Anna, que após dez anos da morte do esposo ainda tenta reconstruir a vida. Depois de anos de hesitação, ela aceita o pedido de casamento de Joseph (Danny Huston), agradecendo sua paciência e compreensão em esperar por ela. Eis que surge em cena o moleque de dez anos (vivido pelo soturno Cameron Bright) que além de ter o mesmo nome do falecido, Sean, ainda diz ser a reencarnação do próprio. O que poderia ser uma brincadeira de mal gosto, começa a incomodar Anna e seus familiares, já que o garoto persiste na afirmação devidamente abastecido de informações íntimas da vida do casal. Glazer dá conta da história através de longos silêncios e ritmo lento, que permite ao espectador preencher as lacunas de dúvidas e indagações. Menos interessado em discursos religiosos e mais em mostrar o impacto do menino na vida dos personagens, o diretor busca mostrar o que se passa na cabeça dos personagens (com a ajuda de belos zooms), especialmente de Anna (existem várias cenas em que podemos ver a tempestade sentimental da personagem, destaque para a cena dela caminhando entre a multidão e a antológica cena na orquestra, onde apenas vemos o rosto da personagem sendo corroído por dúvidas). Há quem fique frustrado com o desfecho do filme, ou até mesmo com a inibida forma como Glazer apresenta a possibilidade de um romance improvável entre Anna e o pequeno Sean, no entanto, o filme funciona de forma bastante elegante com a fotografia cheia de marrom, sombras e dourado embalada por uma trilha sonora que lembra tristes canções de ninar. Cada cena, em seus movimentos próprios, cria uma narrativa envolvente que mescla drama e suspense com maestria numa história onde o passado inibe que o futuro aconteça. Além de contar com a impecável atuação de Nicole, o filme ainda se beneficia de um bom grupo de coadjuvantes que inclui Lauren Bacall (como a matriarca da bem nascida família de Anna), Alison Elliott, Peter Stormare e uma surpreendente Anne Heche na pele da dona de um segredo perigoso. Apesar do fracasso de bilheteria nos EUA, o filme fez sucesso nos cinemas brasileiros e colheu elogios pelo conteúdo provocador tratado de forma tão envolvente.
Reencarnação (Birth/EUA - Reino Unido - Alemanha/2004) de Johnatan Glazer com Nicole Kidman, Danny Huston, Cameron Bright, Lauren Bacall, Anne Heche, Peter Stormare e Alison Elliot. ☻☻☻☻
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