quinta-feira, 20 de março de 2014

KLÁSSIQO: Adeus, Meninos

 
Fejto e Manesse: amizade em risco. 

Recentemente lançado em Blu-Ray no Brasil, eu não poderia deixar de comentar um dos filmes mais aclamados do diretor Louis Malle. Lembro que quando assisti o filme pela primeira vez o considerei superestimado. Lento e arrastado, o filme ainda deve ser um desafio para muitos cinéfilos que estão acostumados com o ritmo de narrativa mais ágil, no entanto o filme prende a atenção pelo tema que aborda e ficar na memória, sobretudo, pelo seu final. É justamente por conta desses dois fatores que o filme cresceu no meu conceito quando soube que se tratava de uma história real, mais do que isso, a história aconteceu com o próprio diretor que resolveu exorcizar um fantasma de seu passado ao revisitar o drama de infância mostrado em Adeus, Meninos. Dirigido, escrito, produzido e lançado por Malle em 1987, o filme ganhou o Leão de Ouro em Veneza pela temática provocadora que indaga ao espectador se um ato de crueldade seria menos cruel por ser praticado (acidentalmente?) por criança. Não precisa de muito esforço para perceber que o cineasta francês precisou de muita coragem para contar a história do menino judeu que se refugia num colégio interno carmelita na França durante a Segunda Guerra Mundial. Com o conflito instaurado, a França é dividida em nazistas e colaboracionistas (cidadãos franceses que ajudam os alemães) contra os opositores (que poderiam ser chamados de "resistência" quando atuavam clandestinamente) e cidadãos comuns. Nesse contexto, o menino Julien (Gaspard Manesse), filho de uma família rica, é enviado, junto com o irmão mais velho para o colégio interno onde as aulas são organizadas e ministradas por padres cristãos. Nesse quesito, o filme consegue retratar com perfeição a rotina do internato, com suas regras de conduta e a convivência entre os alunos dentro daquele universo bastante conservador, sufocante e, ao mesmo tempo, seguro. Não por acaso, o filme pode parecer tedioso ao espectador, já que somos apresentados à essa rotina de forma bastante realista e contida. O cotidiano da instituição recebe novos ares quando o diretor do local, Padre Jean (Philippe Morier-Genoud) aceita quatro novos alunos, sendo que um deles, Jean Bonnet (Raphael Fejto) chama a atenção de Julien. Jean tem a mesma idade de Julien, mas mostra-se tão inteligente quanto discriminado pelos colegas. Conforme os dois meninos se aproximam, Julien percebe que o menino guarda um segredo que poderá comprometer o universo quase paralelo que o internato se tornou durante os tempos de guerra, especialmente quando nazistas aparecem na instituição. A cena em que um simples olhar trai as intenções dos personagens é bastante marcante, ainda que tratada com a mesma desenvoltura introspectiva de toda a narrativa. Sem melodramas, é visível como o diretor evita o melodrama em nome de uma reconstituição "imparcial" de suas memórias de infância, no entanto, além da cena final (que torna o título bastante doloroso), existe uma belíssima cena de crianças brincando num bosque que me lembrou, salvo as devidas proporções, as intenções de Michael Haneke em A Fita Branca (2009) e até de O Menino do Pijama Listrado (2008). Louis Malle faz um filme difícil de assistir, mas bastante contundente nas questões que propõe ao espectador. Ou seja, nada como crescer e amadurecer seu olhar sobre uma obra de arte.  Vale lembrar que o filme foi indicado ao Oscar de filme estrangeiro e de roteiro original. 

Adeus, Meninos (Au revoir les enfants/França-Alemanha/1987) de Louis Malle com Gaspard Manesse, Raphael Fejto, Francine Racette, Peter Fitz e Irène Jacob. ☻☻☻☻

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