Michael e Sarah Polley: reverenciando a história da família.
Sarah Polley é uma atriz canadense que já trabalhou em vários filmes queridos pela crítica (entre eles Exótica/1994 e O Doce Amanhã/1997, ambos de Atom Egoyam, Vamos Nessa/1999 de Doug Liman e Minha Vida sem Mim/2003 de Isabel Coixet), mas apesar de todo o respeito conquistado diante das câmeras é atrás delas que Sarah parece mais confortável. Foi em seu segundo longa metragem que abordou as dores do esquecimento em Longe Dela (2006) e conseguiu arrancar uma performance memorável de Julie Christie (indicada ao Oscar de Melhor Atriz), além de conseguir para si uma indicação ao careca dourado de roteiro adaptado. Chega a ser impressionante que enquanto lançava a crise no casamento de Entre o Amor e a Paixão (2011), ela terminava de lapidar esse documentário que explora uma temática bastante pessoal. Num primeiro momento, tem-se a impressão que a diretora reuniu a família para falar sobre sua mãe, Diane. No início existe grande hesitação de todos os envolvidos, o pai (intrigado com as câmeras presentes no estúdio onde ele grava a narração do filme), os dois irmãos (Mark e John), as duas irmãs (Suzy e Joanna), os amigos da família... Sarah tem dificuldades de dar forma ao que ela não gostaria que fosse apenas uma jornada egocêntrica em sua intimidade. As cenas aleatórias dão a impressão de que a ideia da cineasta ainda procura uma forma - e quando a encontra toda a desconfiança da plateia é quebrada. O que vemos através das entrevistas é a forma como todos nos apresentam a matriarca Diane. Uma atriz de uma energia contagiante, que contaminava toda a família, mas existem pistas de que existe um segredo que todos evitam revisitar num primeiro momento. A constituição da família Polley é exposta para o público com todas as suas alegrias, tristezas, elos, aspirações e tropeços. Do dia em que Diane conhece Michael Polley numa peça de teatro, a chegada dos filhos, a crise no relacionamento, além das tentativas de Diane ser reconhecida como atriz (e a forma como as dores de ter perdido a guarda dos filhos do primeiro casamento - John e Suzy) marcará seus atos futuros. É como se aos poucos a diretora construísse uma grande colagem sobre aqueles personagens que giram sobre a órbita de sua mãe, até o momento em que revela o motivo de todo esse cruzamento de narrativas: a suspeita de que Sarah não seria filha de Michael Polley. É visível como esse fato é doloroso para a família, sobretudo para a forma como a vivenciam - é Mark que consegue expressar de forma mais tocante as angústias de sua mãe, ainda que não a isente de reprovações. Mais emocionante que a jornada da diretora em busca do pai biológico, são as cenas onde os personagens precisam se deparar com uma dolorosa verdade, que no fundo, não parece fazer tanta diferença assim. Sarah cria um filme sensacional, onde revela que um documentário pode ser única e somente o cruzamento de versões sobre o passado, mas isso não impede que seja rico e crie impressões universais de como uma família forja a construção da identidade de seus sujeitos. Além disso, o encadeamento das entrevistas mostra-se fundamental para que conheçamos Diane como um ser humano e não um ser mítico, além disso tem a memorável cena final (a primeira gravada para o documentário) onde Michael Polley confronta as intenções (in)conscientes da filha. Ele reage de forma deliciosamente humana aos sentimentos que passaram na cabeça da diretora durante toda a feitura do filme. Histórias que Contamos é um documentário simples sobre pessoas comuns, mas realizado no capricho com cenas reais entremeadas com atores representando os personagens quando jovens. Sem os moralismos e ressentimentos que costumam aparecer nesse tipo de fime, Sarah Polley realizou outro grande trabalho, que prima, sobretudo, pela sinceridade.
Histórias que Contamos (Stories We Tell/Candá-2012) de Sarah Polley com Michael Polley, Sarah Polley, John Buchan, Suzy Buchan, Mark Polley, Joanna Polley, Harry Gulkin e Anne Tait. ☻☻☻☻
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