domingo, 13 de março de 2022

Na Tela: Spencer

 
Kristen: elogiada e indicada ao Oscar. 

Embora nos últimos tempos Kristen Stewart tenha feito papéis desafiadores, considero que nada se compara à coragem de quando topou encarnar a princesa Diana em Spencer. Desde que passou o alvoroço da saga Crepúsculo, a atriz buscou amadurecer como atriz com ajuda de diretores renomados de diferentes nacionalidades. A dica de que estava no caminho certo veio quando se tornou a  primeira americana a levar um César (o Oscar francês) por seu trabalho em Acima das Nuvens (2014) de Olivier Assayas. Quando o chileno Pablo Larraín a escolheu para viver o maior ícone da família real britânica nas últimas décadas, a curiosidade cinéfila ficou atiçada. Larraín já havia feito algo semelhante quando se juntou à Natalie Portman para viver a icônica Jaqueline Kennedy nos dias que se seguiram ao assassinato de seus esposo, John. Quem viu Jackie (2016) sabe que o diretor curte criar tramas em torno de um recorte bastante específico, em que história real e ficção se mesclam para construir um retrato cinematográfico de uma personagem real. Aqui ele vai ainda mais longe ao construir uma espécie de fábula que soa como uma Cinderela às avessas. Com visual estilizado e uma sucessão de cenas que tem o fio condutor a tensão de sua conhecida protagonista, Larraín oferece à Kristen o desafio de viver uma personagem ainda viva no imaginário mundial e que recentemente já rendeu uma atuação memorável (de Emma Corrin na Série The Crown) aos interessados. Não por acaso, Kristen não tenta ser a imitação perfeita de Diana. Ela capricha no sotaque (um tanto acelerado), na postura tímida e no olhar para evocar a lembrança que temos de Lady Di, mas preenche o seu trabalho com o que toda a especulação em torno da vida da princesa junto à família real tinha de desconfortável. A trama se passa durante a última celebração natalina de que Diana participou. Os personagens falam o tempo inteiro de sua instabilidade, da perseguição da mídia, fala-se de amantes, mostra cenas de bulimia, automutilação, tendências suicidas, alucinações... resultando em um retrato denso da princesa que por vezes soa exagerado. Se mantivermos em mente que trata-se de uma obra de ficção, o resultado é aceito com maior facilidade, embora,  Larraín deseje o incômodo da plateia diante do que apresenta. Não existe uma história propriamente com começo, meio e fim,  talvez exista até um esboço na busca de Diana por sua identidade de solteira. É desta parte que surge do nome da família no título, o casaco velho de seus pai, a antiga propriedade da família que sempre lhe desperta atenção, mas quando se revela é um mausoléu. Esta necessidade de encontrar novamente a si mesma funciona como uma espécie de fuga da realidade que a rodeia com suas tradições, austeridade e rotinas sufocantes. Diana tem poucas cenas com a família real, algumas com os filhos e dois diálogos com o então marido e torna-se interessante como ela tem mais cenas com os criados do que com a nobreza ao longo do filme. Pelo trabalho, Kristen recebeu sua primeira indicação ao Oscar ao tornar convincente a angústia da personagem sem recorrer as seus maneirismos histrionicos tão criticados. No entanto, o fato do filme não seguir uma linha para o desenvolvimento da personagem pode lhe custar a estatueta já que, por vezes, o filme parece uma colagem de situações aleatórias sobre Diana. Quem também merecia uma indicação é Johnny Greenwood, o guitarrista do Radiohead, que criou uma trilha sonora excepcional para os tormentos da personagem em um dos natais mais estranhos da história do cinema. Como Johnny foi lembrado  pela trilha de Ataque dos Cães, o tio Oscar está perdoado. 

Spencer (Reino Unido / Alemanha / EUA / Chile - 2021) de Pablo Larraín com Kristen Stewart, Timothy Spall, Jack Nielen, Freddie Spry, Jack Farthin, Sean Harris, Stella Gonet e Sally Hawkins. 

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