A Família: enfrentando a queda do muro de Berlim.
A Alemanha durante muito tempo foi um retrato perfeito do período da guerra fria. No lado Ocidental, o capitalismo seguia seu rumo enquanto no lado oriental as pessoas abraçavam a causa comunista. É verdade que havia uma tensão representada pelo muro de Berlin e pelas pessoas que queriam atravessar de um lado para o outro. É nesse período que vive a camarada, comunista roxa Srª Kerner (Katrin Zab) que enquanto cria seus filhos, o atencioso Alex (o ótimo Daniel Brühl) e a maluquete Ariane (Maria Simon), leciona numa escola na Alemanha Oriental. Seu passatempo favorito é escrever cartas ao governo reclamando de pequenas irregularidades que presencia no seu cotidiano. No entanto, a vida do lado esquerdo do muro não é fácil com a mão pesada do Estado - que levou até o Sr. Kerner a ir para o outro lado e não voltar mais. Protestos juvenis são constantes e a repressão às vozes dissonantes costuma ser agressiva. Durante um desses embates, a Srª Kerner vê seu filho sendo agredido e o abalo emocional é tão forte que fica em coma por alguns meses. É durante o período em que está inconsciente que o muro de Berlin será derrubado e seu país viverá transformações as quais nunca imaginou. Imersos numa nova realidade que inclui variedades de produtos, franquias multinacionais, Coca-Cola, maior liberdade, pornografia e empregos privados (Ariane começa até a trabalhar num fast food e namorar o gerente)! Enquanto o mundo recebe outras configurações, Srª Kerner acorda, mas o médico diz para Alex que outro abalo emocional poderia ser fatal. Certo de que sua mãe não suportaria as mudanças de seu país, avesso ao socialismo que ela era fiel, Alex arma uma estrutura extraordinária para que ela pense que nada mudou. Para essa tarefa produz programas de TV (com a ajuda do amigo impagável Denis, vivido por Florian Lukas), inventa produtos que não são mais produzidos e pede a ajuda de todos os amigos e vizinhos para que façam a sua mãe pensar que nada mudou. O problema é quando um anúncio da Coca-Cola aparece ao fundo de sua janela, ou quando a senhora vê a estátua de Lênin sendo removida, ou ela querendo fazer uma visita à casa de campo, ou repara o fluxo de carros de sua janela... essas armações engenhosas de Alex fazem de Adeus, Lenin! um dos filmes mais fascinantes de todos os tempos. É verdade que tudo não passa de uma grande mentira que um filho conta para a mãe, embora seja por um motivo nobre, Alex sabe que no fundo também mente para si mesmo e quem o ajuda é porque também enfrenta dificuldades em lidar com todas aquelas mudanças. Becker em momento algum torna seus personagens em sujeitos sórdidos, pelo contrário, são de uma humanidade palpável (valorizada ainda mais pelo elenco espetacular). No fim das contas, o filme revela-se uma grande fantasia, o desejo de como a dualidade entre comunismo e capitalismo poderia ter tomado um outro caminho, aquele que todos os sonhadores militantes imaginavam ser possível. Adeus, Lenin! consegue dar forma ao sonho utópico que desmoronou junto com o muro, mas seu foco maior é na bela história de amor entre mãe e filho. Esse olhar especial - e de dentro de um dos fatos históricos mais importantes do século XX - desperta tanta simpatia que o longa acabou ficando de fora dos finalistas ao Oscar de filme estrangeiro (Hollywood se renderia a uma história alemã sobre comunismo? Jamais, melhor escolher outro filme sobre o holocausto...). Divertido, inteligente e sensível, a obra-prima de Wolfgang Becker (diretor nascido em Herner, na Alemanha Ocidental em 1954, formado em História, com especialização em História alemã e norte-americana) merece ser visto várias vezes com o mesmo sabor de novidade.
Adeus, Lênin! (Good Bye Lenin!/Alamanha-2003) de Wolfgang Becker com Daniel Brühl, Katrin Zab, Chulpan Khamatova, Maria Simon, Florian Lukas e Alexander Beyer. ☻☻☻☻☻
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