segunda-feira, 30 de março de 2020

PL►Y: Dois Papas

Anthony e Jonathan: diferenças em pauta. 

Eu não sou católico, mas acho que qualquer pessoa que respeita religião reconhece que a cena do Papa Francisco concedendo a benção Urbi et Orbi extraordinária diante da basílica de São Pedro, no Vaticano, diante do vazio foi de arrepiar em tempos de Corona Vírus. A imagem é de uma força incrível, emociona, faz chorar e parecia coisa de cinema. Ela até poderia constar no filme Dois Papas do brasileiro Fernando Meirelles caso o filme fosse lançado posteriormente. O longa lançado ao final do ano passado pela Netflix foi lembrado nas indicações a prêmios na temporada de ouro, sobretudo pelo trabalho excepcional de seus protagonistas: Jonathan Pryce e Anthony Hopkins.  O mais legal é que se me perguntassem quem seriam os atores ideais para viverem Francisco e Bento XVI, eu também escolheria os dois atores! A começar pela semelhança física e a segunda por conta do talento inquestionável de ambos (tanto que ambos foram lembrados no Oscar deste ano, respectivamente como melhor ator e ator coadjuvante). Embora seja inspirado em uma história real, fica evidente que o filme criou muito sobre as conversas que existiram entre Bento XVI e Francisco, no filme estas conversas transcendem o catolicismo. Fala-se de fé, de política, de medos, de crescimentos, culpa, extremismos... é um filme que através dos diálogos entre duas personalidades conhecidas aborda questões muito atuais sobre o mundo que vivemos, sem perder de vista os marcos históricos que se relacionam com ambos (e por isso mesmo o roteiro também foi lembrado no Oscar). Se o mundo hoje vive um momento político altamente polarizado, tenso e marcado por discursos radicais, Bento e Francisco são sujeito que sabem exatamente a que ponto isso pode chegar, seja na Europa ou na América Latina. É neste ponto que o filme se enriquece, justamento por lançar uma perspectiva histórica sobre o mundo que temos hoje e os fantasmas que de vez em quando voltam a assombrá-lo. Notável também é o respeito que o texto apresenta em torno dos personagens, algo fundamental para que o filme funcione através de diálogos acerca de visões de mundo tão diferentes (um mais liberal e outro de viés mais conservador).  Mais do que dois papas, o filme apresenta uma espécie de dois lados da mesma moeda, seja da igreja, seja do mundo e os caminhos que seguem por vezes convergindo e por vezes se afastando. O filme é um grande acerto de Fernando Meirelles que andava desanimado depois da fria recepção do seu gélido caleidoscópio 360 (2012) e aquela ideia estranha que foi condensar a excelente série Som e Fúria (2009) em um filme que não foi visto por ninguém. Aqui ele demonstra mais uma vez domínio narrativo e uma preocupação com a estética  num casamento perfeito e, me arrisco a dizer que este é o seu filme mais maduro até agora - sem falar que aquela deliciosa cena durante os créditos finais é um verdadeiro achado! Sensacional! Mais um filme que em 2019 soube retratar a realidade em que vivemos (ao lado de Parasita e Coringa). 

Dois Papas (Two Popes / Reino Unido - Itália) de Fernando Meirelles com Jonathan Pryce, Anthony Hopkins, Juan Minujin, Luis Gnecco e Cristina Banegas. ☻☻

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