Rooney e Jason Segel: ficção científica sem química.
Recentemente em um evento nos Estados Unidos, o Netflix sofreu duras críticas pela forma como lança as produções que comprou os direitos de exibição. Ao privilegiar a exibição on demand, a carreira nos cinemas torna-se quase inviável - e a visibilidade da obra nas premiações torna-se quase improvável (vide o que aconteceu com Beasts of No Nation/2015 a primeira e muito elogiada produção cinematográfica Netflix). Neste quesito, a concorrente Amazon leva vantagem, já que lança o filme primeiro nos cinemas para tempos depois disponibilizar na rede. Amazon e Netflix estão sempre atentas nos festivais independentes para descobrir o que pode cair no gosto do público, mas se a Amazon acertou em cheio com Manchester à Beira Mar (2016) que levou dois Oscars importantes (ator e roteiro original) neste ano, a Netflix ainda mantém a mesma polêmica estratégia. O fato é que alguns diretores fazem questão de ver seu filme na tela de cinema, outros preferem ver a obra alcançar um público abrangente que dificilmente sairia de casa para ver um filme de pequeno orçamento no cinema (basta ver Já Não me Sinto em Casa Nesse Mundo que foi o grande premiado em Sundance neste ano e já podia ser visto mundialmente na Netflix poucas semanas depois). Alcançar um grande público deve ter sido o interesse do diretor Charlie McDowell com seu metafísico The Discovery "da/na" Netflix. O filme conta o impacto da descoberta de que existe vida após a morte. Desde a primeira cena um renomado cientista (Robert Redford) é confrontado por sua descoberta - que gera suicídios em escala mundial -, mas por mais que ele explique que não há nada de divino ou espiritual em sua descoberta, o efeito suicida num mundo desiludido é assustador. Milhões de mortes (ou "passagens", como dizem os personagens) depois, conhecemos Will (Jason Segel) que flerta com Isla (Rooney Mara), uma jovem estranha, que assim como Will irá se deparar com as novas pesquisas do cientista acerca da descoberta e ficarão cada vez mais confusos com o que irão encontrar. Quando uma ficção científica se propõe a ser existencialista ela tem grandes chances de se tornar um filme ainda mais interessante! No entanto, corre mais risco de errar quando se aproxima do final. Este é justamente o problema de The Discovery, filme que começa instigante e cheio de possibilidades, mas depois parece se enrolar em suas intenções, apresentando um resultado que pretende ser mirabolante mas que arremata tudo num desfecho manjado. McDowell já provou ser um diretor de ideias interessantes - e fã de histórias do melhor estilo Além da Imaginação (basta ver o bom As Complicações do Amor/2014), mas aqui ele tropeça no ritmo arrastado e um romance forçado que não ajuda a trama a seguir o caminho certo. Talvez o problema tenha sido a escolha de Rooney Mara para o papel de Isla, ela é de uma frieza incômoda e não consegue ter química com Jason Segel. Segel já provou dar conta de papéis dramáticos anteriormente (especialmente em O Fim da Turnê/2015 que lhe valeu indicação ao Independent Spirit), mas aqui tem pouco a fazer em cena quando a coisa perde o foco. O ponto de partida é interessantíssimo (e por isso mesmo atraiu bons atores para o projeto), mas faltou discernimento na hora de conduzir a trama que resulta confusa, especialmente ao abordar um cientista que se torna uma espécie de guru e outros personagens que nunca ganham o desenvolvimento merecido (como o irmão vivido por Jesse Plemons que fica pelo meio do caminho). Eu adoraria ter visto o filme explorar suas possibilidades ilimitadas sem ter cedido ao apelo manjado de um final "surpreendente".
The Discovery (EUA-2017) de Charlie McDowell com Jason Segel, Rooney Mara, Jesse Plemons e Robert Redford. ☻☻
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