domingo, 30 de setembro de 2018

N@ CAPA: Pôsteres Minimalistas

Setembro: verde e amarelo.

Como é de costume no blog, no mês de setembro existe uma semana somente com filmes nacionais no que chamo de Ciclo Verde e Amarelo. Por conta deste ciclo, a capa do mês de setembro foi composta de pôsteres minimalistas de alguns sucessos do cinema brasileiro. Eles estão disponíveis na internet e basta procurar no Google - e você encontrará outras versões e trabalhos feitos para outros filmes que não aparecem aqui. O mais interessante é como os ilustradores conseguem criar imagens a partir de uma ideia bastante evocativa sobre as tramas dos filmes. Durante a pesquisa encontrei até um pôster equivocado de O Auto da Compadecida (que confere roteiro e direção a Cláudio Torres e não para Guel Arraes)e vou ficar devendo a versão ampliada de Amarelo Manga (eu guardei todos no meu computador, mas devido a um problema técnico perdi todos os meus arquivos e não encontrei novamente o cartaz do filme de Claudio Assis):
















HIGH FI✌E: Setembro

Cinco filmes assistidos no mês de setembro que merecem destaque:

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4EVER: Angela Maria

13 de maio de 1929 ✰ 29 de setembro de 2018

Nascida Abelim Maria da Cunha,  Angela Maria gravou mais de 850 canções ao longo da carreira e se tornou uma das maiores vozes da música brasileira. Sem nunca abrir mão de seu estilo, ela consolidou em quase setenta anos de carreira um dos repertórios mais cultuados de nosso país. Filha de uma família de dez irmãos, liderados por uma dona de casa e um pastor protestante, ela adotou o nome artístico para não ser descoberta enquanto se apresentava nos programas de rádio da época. Com origem na cidade de Conceição de Macabu (RJ), Ângela trabalhou em várias fábricas antes de se mudar para Bonsucesso e chamar atenção como crooner no Rio de Janeiro. Suas primeiras gravações aconteceram em 1951 e em 1954 já era reconhecida nacionalmente. A cantora faleceu aos 89 anos de infecção generalizada e uma parada cardíaca. 

sábado, 29 de setembro de 2018

PL►Y: From Nowhere

Moussa (ao fundo): um rosto nas estatísticas. 

From Nowhere foi exibido em vários festivais indies nos Estados Unidos em 2016, foi muito elogiado e recebeu alguns prêmios (como o da audiência no badalado South by Southwest Film Festival) No entanto, o filme conseguiu apenas espaço nos cinemas americanos em 2017. Inédito nos cinemas brasileiros, From Nowhere é um belo filme sobre um tema bastante atual. O filme acompanha três adolescentes que são imigrantes ilegais nos Estados Unidos. Os três vivem no Bronx e estudam na mesma escola, assim como foram encaminhados ao mesmo advogado para regularizar a situação no país. Quando o filme começa, a conversa é bastante impessoal com o advogado Isaac (Denis O'Hare). Além de perguntar a história de cada um deles - e transparecendo indiferença com o que escuta - ele sugere que pesquisem problemas sérios em suas famílias (assassinatos, estupros, tráfico de drogas...) com o objetivo de sensibilizar os responsáveis pelo processo de imigração a deixa-los continuar na terra do Tio Sam. A partir daí conhecemos um pouco mais da realidade de cada jovem, descobrimos os detalhes que os levaram para além da fronteira tem mais nuances do que podemos imaginar. Vemos que Moussa (Malory McCree) migrou da República da Guiné quando ele e a irmã ainda eram crianças e ao chegar nos Estados Unidos a situação da família se tornou bastante complicada. Conhecemos a situação de Alyssa (Raquel Castro), uma jovem peruana que foi morar com a irmã e o cunhado americano (a irmã possui Greencard e por conta disso tem a situação estável), além de observarmos a  dura realidade de Sophie (Octavia Chavez-Richmond), que mora com familiares que não se importam muito com ela e a exploram cotidianamente. A vida desta jovem nascida na República Dominicana lhe garante uma certa revolta e falta de perspectiva - e por conta disso, ela comete pequenos furtos e não vê a extradição como o maior dos seus problemas. Além dos familiares dos três protagonistas, o filme ainda é costurado pelas orientações da professora Jackie (Julianne Nicholson), que está sempre disposta a ajudar os três alunos. Dirigido por Mathew Newton, o filme opta por uma narrativa bastante realista, quase documental, sem grandes floreios ou desvios narrativos e pulso firme. O resultado consegue ser bastante direto e sensível. Ao apresentar seus personagens como adolescentes comuns (em seus conflitos, romances e angústias), o diretor humaniza quem vive na ilegalidade e oferece ao espectador um olhar bastante humanista para a situação - e escorrega somente por não aprofundar o núcleo de Alyssa (que possui tão poucas cenas que existe até um desequilíbrio por conta disso), mas é um problema pequeno dentro da proposta do filme. Ainda que seja uma obra de ficção, From Nowhere confere rosto a quem costumamos ver somente como números em estatísticas sobre imigração. 

From Nowhere (EUA-2018) de Mathew Newton com Mallory McCree, Octavia Chavez-Richmond, Julianne Nicholson, Raquel Castro e Denis O'Hare. ☻☻☻☻  

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Combo: Super-Humanos

Aqui no blog eu até criei uma tag para brincar com alguns personagens comuns com super-poderes (Poderes Especiais, que sempre penso em retomar), mas alguns foram concebidos como super-humanos de verdade e não foi no cinema americano. Com tantos filmes de super-heróis, de vez em quando um diretor mais autoral resolve criar seu próprio personagem com super-poderes e nesta lista seguem cinco produções que merecem ser vistas: 

Sang-Ho Yeon se juntou à Netflix e fez seu próprio filme de super-herói. O personagem ganha seus poderes meio que por acidente e parte para ajudar a filha e um grupo de comerciantes perseguidos por um grupo de magnatas que pretendem fechar as lojas em que trabalham para construção de um grande empreendimento imobiliário. Embora o personagem defenda os oprimidos da história e o filme tenha bons efeitos especiais, este super-herói coreano perde pontos por apelar para algumas bobeiras ao longo da histórias, mas ainda assim, vale uma olhada. 

04 Tudo Sobre Vincent (2014) 
A produção ficou conhecida como o primeiro filme sobre um super-herói francês. Vincent é um homem tímido que tem sua força multiplicada quando está na água. Escrito, dirigido e estrelado por Thomas Salvador, o filme tem aquela cadência própria do cinema francês - o que pode deixar parte do público entediado. Vincent leva uma vida bem comum ao chegar em uma nova cidade. Trabalha na construção civil e se apaixona por uma colega de trabalho, mas um incidente revela sua habilidade especial. Para alguns críticos, o longa é mais um conto de fadas do que um filme de herói. 

03 O Rapaz Insivível (2014)
O cinema italiano também inventou um personagem com poderes para chamar de seu. Neste filme de Gabriele Salvatore nós somos apresentados a Gabriel, um adolescente não muito estudioso e apaixonado por uma garota da escola, mas que após uma festa de Halloween descobre ter a habilidade de ficar invisível - só falta agora controlar este poder. O filme utiliza bastante humor em sua história e perde um pouco da originalidade ao colocar o rapaz na mira de vilões que querem usá-lo para o mal. Simpático o filme tem o mérito de ser divertido e ter mais do que bons efeitos especiais. 

02 Thelma (2016)
Esta semana foi divulgado que o filme norueguês do diretor Joachim Trier ganhará uma versão americana a ser dirigida por Craig Gillespie. Sempre vejo com desconfiança os remakes americanos, mas vou torcer para que o resultado seja pelo menos interessante. O filme conta a história da jovem Thelma, que desde pequena sabe que não é igual às outras meninas. Uma tragédia familiar deixa seus pais ainda mais preocupados sobre o que destino reserva para a garota. Quando ela vai para a faculdade (e  enfrenta desejos proibidos para sua conservadora família), Thelma terá que tomar algumas decisões complicadas.

01 A Lua de Júpiter (2017)
O cineasta húngaro Kornél Mundruczó resolveu contar a história dos refugiados de uma forma diferente. Investindo em um personagem que é baleado ao tentar atravessar a fronteira da Hungria e ao invés de morrer recebe o miraculoso poder de voar, o filme mistura fantasia com elementos bastante realistas. Incompreensão, hipocrisias, oportunismo, religião, preconceitos, amizade e ameças de misturam numa narrativa bem conduzida por um dos diretores europeus que é sempre digno de atenção. Exibido em Cannes no ano passado, o filme foi o favorito de Will Smith (que não duvido de bolar uma versão americana para ele em breve).

PL►Y: Lua de Júpiter

Arian: olhando para o alto. 

Exibido no Festival de Cannes do ano passado, Lua de Júpiter dividiu opiniões pela abordagem que cria a partir de um tema atual: os refugiados. A começar pelo título - a tal lua se chama Europa, a única capaz de abrigar vida (e curiosamente neste ano, Júpiter que já era recordista em número de luas rendeu a descoberta de outras doze, num total de setenta e nove satélites naturais em sua órbita). O título metafórico fez com que algumas pessoas entendessem que a ideia era uma afirmação preconceituosa sobre os outros continentes não serem capazes de abrigar vida, uma interpretação bastante preguiçosa diante da analogia proposta à esperança de milhares de imigrantes que buscam  melhores condições e abrigo no velho continente (ainda que o filme deixe claro que a situação lá também pode ser bem difícil). O título também serve para oferecer as cores fantásticas que o diretor húngaro Kornél Mundruczó precisa para contar a história de um jovem imigrante que, ao tentar entrar na Hungria ilegalmente, é baleado e recebe o poder miraculoso de voar. Entretanto, o que poderia fazer de Aryan (Zsombor Jéger) um super-herói, dá espaço à angústia do rapaz reencontrar o pai que se perdeu na travessia da fronteira. Para isso, Aryan vai a um campo de refugiados em Budapeste e conhece Stern (Merab Ninidze), médico responsável pelo campo - e que facilita a entrada ilegal no país através do recebimento de propinas, mas que percebe na habilidade figura de Aryan a chance de ganhar mais dinheiro. Outra figura importante na história é o policial de fronteira Lászlló (Gyorgy Cserhalmi), que nem sempre cumpre o seu trabalho como deveria... não deixa de ser curioso que entre burocracias e hipocrisias, Aryan receba uma aura quase divina entre os demais personagens, há quem até o chame de anjo durante a história (afinal, ao invés de morrer ele passou a flutuar) e agregue conotações religiosas à sua existência enquanto o mundo ao seu redor mergulha no caos (e uma ameaça terrorista que aparece na história ressalta mais ainda esta sensação). Ao optar pelo realismo fantástico em um assunto tão sério, Kornél Mundruczó demonstra mais uma vez ser um cineasta de mão cheia. Assim como vimos em seu filme anterior, Deus Branco/2014 (outro com título controverso) ele demonstra bastante habilidade com uma câmera. O filme possui uma tensão envolvente e uma certa urgência que cresce ao longo da história, principalmente na relação que se instaura entre Stern e Ayra. Kornél utiliza bons ângulos e movimentos de câmera bastante eficientes na condução da história, além do bom uso dos efeitos especiais nos voos de Aryan, que são fascinantes em seu realismo bem mais contemplativo do que os vistos anteriormente no cinema - que contrasta com alguns movimentos vertiginosos bem empregados. Lua de Júpiter pode não alcançar todas as notas que deseja, mas utiliza a fantasia para inserir um milagre dentro de um mundo cada vez mais descrente e intolerante. 

Lua de Júpiter (Jupter Holdja / Hungria - Alemanha - França / 2017) de Kornél Mundruczó com Zsombor Jégerm, Merab Ninidze, Gyorgy Cserhalmi e Mónika Balsai. ☻☻☻☻

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

PL►Y: Novitiate

Margaret: entre a fé e o mundo. 

Filmes que abordam religião são sempre complicados, já que qualquer conflito pode fazer com que pareçam ofensivos ou ganhar o rótulo de polemizar a fé de outros. É realmente uma linha tênue, mas a diretora Margarett Betts consegue manter o equilíbrio em Novitiate - o que lhe valeu o prêmio especial de melhor diretora estreante no Festival de Sundance de 2017. Novitiate conta a história de Cathleen (Margaret Qualley), uma adolescente que decide ser freira e surpreende a mãe agnóstica (a ótima Julianne Nicholson) com a decisão. Ambientado nos anos 1960, quando algumas reformas estão prestes a ser instauradas, o filme dispensa o cinismo e as ironias e procura apresentar os sacrifícios feitos por estas mulheres ao escolherem viver isoladas num convento e viver através da fé em Deus. Obviamente que os conflitos existem, sejam motivados pela mão severa da Madre Superiora (Melissa Leo em mais uma vilã para a coleção) quanto pela insegurança das noviças que ainda estão cheias de dúvidas com relação à escolha realizada. Betts consegue transmitir estes sentimentos complicados na construção de uma narrativa simples, correta e segura, que demonstra admiração a estas mulheres e compreensão às fraquezas que possam aparecer. A própria Cathleen não sabe explicar muito bem o motivo de ter escolhido se tornar freira - ainda que pareça ser a mais segura do grupo. Ainda que gire em torno da jovem protagonista, outras noviças ganham destaque na história em seus conflitos pessoais. Entre silêncios, orações e penitências, os dias passam sempre com desafios e algumas despedidas. Ainda que tenha umas três cenas que possam gerar polêmica, o filme acerta no tom de mostrar que aquelas falhas são humanas e podem definir o rumo das personagens. Além de segurança na narrativa, a cineasta realiza um belo trabalho com seu elenco majoritariamente feminino. A novata Margaret Qualley está  bastante correta ao encarnar os conflitos internos da personagem, enquanto Melissa Leo cria uma das melhores megeras com causa que já apareceram neste tipo de filme. Julianne Nicholson tem poucas cenas, mas se destaca com os vários sentimentos que sua personagem possui (incompreensão, negação, solidão, preocupação...) e quem também apresenta um bom momento é Dianna Agron, atriz que ficou famosa como a líder de torcida Quinn da série Glee e que está bastante madura como a freira de mente mais aberta do convento. Embora alguns espectadores possam ficar desconfortáveis quando o filme lida com a sexualidade das moças, Novitiate é um retrato interessante de um período de grandes transformações para as freiras ao redor do mundo.

Novitiate (EUA-2017) de Margarett Betts com Margaret Qualley, Melissa Leo, Julianne Nicholson, Dianna Agron, Liana Liberato, Eline Powell, Morgan Saylor e Rebecca Dayan. ☻☻☻☻

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

PL►Y: Assassinato no Expresso do Oriente

Branagh e seu elenco: nova versão de um clássico da literatura (e do cinema). 

Na época do lançamento eu fiquei bastante curioso com o resultado desta nova versão do clássico livro de Agatha Christie - que já possui uma versão consagrada no cinema com direção de Sidney Lumet. Assassinato no Orient Express (1974) fez sucesso de público e crítica ao ponto de conquistar seis indicações ao Oscar (incluindo roteiro adaptado, ator/Albert Finney e atriz coadjuvante/Audrey Hepburn. O elenco era repleto de estrelas (contava ainda com Lauren Bacall, Ingrid Bergman, Jaqueline Bisset, Sean Connery, Anthony Perkins, Vanessa Redgrave...) e tinha aquela atmosfera de suspense carregada até chegar ao final enigmático. Esta nova versão também é cheia de estrelas, repleta de efeitos especiais e figurinos caprichados, mas infelizmente Kenneth Brannagh não é Sidney Lumet (mas... quem é?). Ele faz até um filme eficiente, mas que está bem longe de ser tão envolvente quanto a versão cinematográfica anterior. Percebe-se o cuidado com a produção (esteticamente ele enche os olhos) e a modernização da narrativa (especialmente na edição e movimentos de câmera), mas por pouco as peças que se encaixam não descambam para o melodrama. Brannagh também é responsável por encarnar o protagonista, o melhor detetive do mundo, Hercule Poirot (e dono de um dos maiores bigodes do cinema), tarefa que realiza com bastante coerência - especialmente no final, em que suas conclusões necessitam muito da autenticidade de sua interpretação. O diretor/ator está acompanhado de um elenco de respeito, com vários nomes consagrados (com Oscar e tudo) e artistas em ascensão revelados nos últimos anos, no entanto, o elenco soa até desperdiçado como passageiros suspeitos de ter cometido o que o título anuncia. Os depoimentos são apressados, o uso de flashback é excessivo e alguns desdobramentos são pouco aproveitados. Enquanto o livro costura (ou cria um emaranhado narrativo) os fios com habilidade, na tela, os depoimentos transformam o filme numa verdadeira colcha de retalhos um tanto desbotados - já que existe pouco destaque para a maioria do elenco.  Obviamente que alguns se salvam, como Michelle Pfeiffer e os novatos Daisy Ridley e Noah Gad (confesso que sou cada vez mais fã dele), outros... não tem a mesma sorte (oscarizadas inclusive). O final se embola também um pouco mais do que devia, mas deixa espaço para que o detetive Poirot possa protagonizar outras versões de livros de Christie no cinema. Assassinato no Espresso do Oriente funciona como passatempo, mas se tiver a chance veja o filme de 1974 e entenda um pouco mais de minha decepção. 

Assassinato no Expresso do Oriente (Murder on the Orient Express / EUA - Malta / 2017) de Kenneth Branagh com Kenneth Branagh, Michelle Pfeiffer, Judi Dench, Penelope Cruz, Willem dAfoe, Noah Gad, Johnny Depp, Daisy Ridley, Olivia Colman, Sergei Polunin e Tom Bateman. ☻☻

Pódio: Ben Mendelsohn

Bronze: o tio malvado
Paul Benjamin Mendelsohn começou a carreira na TV australiana em 1984 aos quinze anos. Só depois de vários trabalhos no cinema e na televisão que o ator chamou atenção do mundo todo neste drama criminal. Aqui ele faz o vilão de uma família que é uma verdadeira quadrilha! Se você quer saber o motivo do ator sempre aparecer encarnando vilões em grandes produções de Hollywood, aqui está o motivo - só o olhar fulminante já assusta quem está por perto. Pelo papel do estranho tio Andrew, o ator ganhou vários prêmios e convites para filmes que só aumentaram o seu prestígio - e o firmaram como um dos melhores do cinema atual. 

Prata: o irmão problemático. 
2º Bloodline (2015-2017)
Já em alta no cinema americano, Ben fez uma ótima escolha ao aceitar o convite para participar desta série criada pela Netflix. Mendelsohn interpreta Danny, o problemático primogênito da família Rayburn. Quando ele retorna para sua cidade natal para celebrar os 45 anos do hotel da família, alguns segredos obscuros correm o risco de serem revelados - e aumenta a tensão entre Danny e seu irmão. A série teve três elogiadas temporadas e rendeu-lhe o Emmy de melhor ator coadjuvante em série dramática. A sua atuação também lhe valeu sua primeira indicação ao Globo de Ouro na mesma categoria. 

Ouro: o amigo asqueroso. 
Já acostumado a encarnar vilões variados (incluindo de Rogue One no mesmo ano), Ben relatou que encarnar Ray foi uma das escolhas mais difíceis de sua carreira. O ator encarna um homem maduro que namorou uma menina de treze anos (!!), filha de um amigo. O tempo passou, a garota cresceu (e agora é vivida por Rooney Mara) e o reencontra para passar a história a limpo. Tenso e cheio de entrelinhas, o filme funciona muito pela ambiguidade que exala do trabalho do ator, que joga o tempo inteiro com o tom escorregadio de um personagem asqueroso - mas dotado de um charme perigosíssimo.

PL►Y: Gente de Bem

Mendelsohn: em busca de hábitos estáveis. 

Nicole Holofcener despontou no cinema independente com Walking and Talking/1996 (que no Brasil recebeu o enganoso título de Amigas Curtindo Adoidado), a acolhida no Festival de Sundance e a simpatia do público fez com que alguns críticos a classificassem como o Kevin Smith de saias. Nunca entendi muito bem esta comparação, mas passado 22 anos, a carreira de Smith empacou e a de Nicole vai muito bem, obrigado. O melhor é que seus filmes ficaram mais interessantes com o passar do tempo e a maturidade somada à experiência adicionaram mais camadas às histórias sobre personagens comuns em dramas cotidianos temperados com um senso de humor bastante espirituoso. Exibido no festival de Toronto deste ano, Gente de Bem é baseado no livro de Ted Thompson e esta adaptação se desenvolve bem de forma quase automática, até que nos damos conta de que somente uma tragédia é capaz de fazer algumas pessoas acordarem de sua anestesia. O foco está sobre Anders Harris (Ben Mendelsohn, num papel bem mais simpático do que costuma fazer), um homem que é apenas a sombra das promessas de um futuro promissor. Divorciado e um tanto perdido, ele não consegue ter um bom relacionamento com o filho, Preston (Thomas Mann) e a ex-esposa, Helene (Eddie Falco) - esta sempre que o vê parece soar um alarme interno de que algo errado irá acontecer. Enquanto a vida de Helene segue normalmente, a de Anders estagnou (e ele nem lembra direito o motivo de ter pedido o divórcio). Esta sensação só piora depois que o casal se reencontra na festa promovida na casa de Sophie (Elizabeth Marvel) e Larry (Josh Pais), ocasião em que a inadequação de Anders o faz se aproximar do filho do casal de amigos, o adolescente Charlie (Charlie Tahan), o ponto de partida para uma série de equívocos, mas também de uma certa cumplicidade entre os dois. A narrativa segue os tropeços de seu protagonista e evidencia que não existem grandes dramas na vida daqueles personagens, todos vivem em casas confortáveis, não possuem problemas financeiros, mas precisam lidar com a proximidade das drogas - que funciona como uma fuga deste microuniverso que anseia perfeição. Embora a narrativa seja leve e despretensiosa, Holofcener fala aqui de um vazio que não se preenche com relações sexuais ocasionais, drogas variadas, lojas gigantescas ou enfeites de natal, algo mais relacionado com os sentimentos daqueles personagens.  O título Gente de Bem deixa claro que não existem vilões nesta história, embora alguns personagens pudessem ser vistos assim sob um olhar mais severo. Por outro lado, o original "A Terra dos Hábitos Estáveis" soa mais irônico e provocador com o que vemos na tela - afinal, a estabilidade plena existe? Holofcener descasca a relação cruzada entre os personagens e faz lembrar aqueles filmes americanos do início do século que apresentavam os conflitos camuflados do conforto suburbano do Tio Sam. Com sensibilidade e a ajuda de atores dedicados (que funcionam muito bem em conjunto), o filme pode até surpreender, especialmente porque, embora morte, violência e adultério apareçam perto do último ato, a cineasta destaca a esperança no rumo de seus personagens. Em tempos sombrios, isto não é pouca coisa. 

Gente de Bem (The Land of Steady Habits/EUA-2018) de Nicole Holofcener com Ben Mendelsohn, Eddie Falco, Charlie Tahan, Thomas Mann, Connie Briton, Elizabeth Marvel e Josh Pais. ☻☻☻☻

terça-feira, 25 de setembro de 2018

.Doc: Heaven Adores You

Elliott Smith: vida e obra de um astro indie. 

Para a grande maioria dos cinéfilos, a lembrança que existe do cantor Elliot Smith é a sua apresentação no Oscar por conta da indicação ao prêmio de melhor canção à Miss Misery do filme Gênio Indomável (1997) de Gus Van Sant. Antes do reconhecimento da Academia, Smith já alcançava algum sucesso perante o público indie, mas a carreira ganhou grande projeção com o filme que consagrou Matt Damon e Ben Affleck. A indicação lhe garantiu contratos com grandes gravadoras, shows em espaços cada vez maiores e um certo desconforto do artista perante a fama. Com o número de fãs aumentando, o artista faleceu em 2003 com duas perfurações no peito - a autópsia não soube definir a causa. O mistério em torno da morte tornou Elliott ainda mais lendário e este documentário de Nickolas Rossi é composto por algumas cenas de arquivo do artista e muitas entrevistas de pessoas que conviveram com ele. Desde os depoimentos dos integrantes de sua primeira banda fica-se a sensação de que Elliott era um artista único, de grande sensibilidade, capaz de construir músicas sobre personagens em melodias profundamente emocionais. Sua obra mostrou-se cada vez densa e inventiva, tanto que do início da carreira para os anos seguintes, sua sonoridade mudou bastante. Elliott não buscava fama, seu maior comprometimento era com a música, mesmo quando saiu de Portland para Nova York (e depois para Los Angeles), o cantor estava preocupado em manter sua essência intacta. É interessante ouvir os entrevistados comentando que muitas vezes ele era confundido com um um escritor por estar sempre escrevendo. Os relatos ficam ainda mais interessantes quando o cantor se viu indicado ao Oscar e fez questão de passar pelo tapete vermelho com a namorada. Aquela situação foi para ele um reconhecimento e serviu para alimentar ainda mais sua criatividade e, infelizmente, aproxima-lo do uso de drogas pesadas. Heaven Adores You pontua os trabalhos do artista, seus álbuns, músicas e vídeos e se torna um pouco cansativo somente por abusar do uso de imagens de paisagens, que, embora casem bem com as canções criadas pelo artista, torna-se um recurso um tanto desgastado lá pela metade do filme. O filme (que demorou quatro anos para ficar pronto) serve para conhecer um pouco mais de Elliott, mas está longe de trazer um retrato definitivo da carreira deste artista que ainda merece ser redescoberto. 

Heaven Adores You (EUA-2014) de Nickolas Rossi com Elliott Smith, Jon Brion, Larry Crane, Tony Lash e Joanna Bolme. ☻☻☻ 

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

PL►Y: Sierra Burgess é uma Loser

Shannon: comédia romântica de caminhos tortos. 

Parece que o cinema adolescente redescobriu a fórmula do cinema teen de John Hughes de vez. Em Com Amor, Simon (2018) muita gente percebeu a referência explícita às obras do autor de Clube dos Cinco (1985) e Curtindo a Vida Adoidado (1986). A moda ficou ainda mais evidente em Para Todos os Garotos que Já Amei (2018), onde referências a Gatinhas e Gatões (1984) são faladas várias vezes. Produzido pela Netflix, Sierra Burgess é uma Loser vai pelo mesmo caminho e se beneficia um tantinho por subverter alguns preceitos do gênero. Sierra (Shannon Purser) é a inteligente filha de um escritor renomado (Alan Ruck, mais conhecido como o melhor amigo de Ferris Bueller) e de uma mulher beldade local (Lea Thompson, uma das queridas dos anos 1980), fato que na fase crítica que é a adolescência não ajuda muito a filha fora dos padrões. Desde a primeira cena, o filme deixa claro que Sierra não veste manequim 38 e com o passar do tempo aprendeu a lidar com os comentários maldosos das colegas da escola com bastante sabedoria. Sierra já conhece as regras do ambiente escolar americano, mas algo muda quando uma mensagem de celular a faz cair de amores por um cobiçado rapaz das redondezas - jogador do time de uma escola rival. É assim, meio que por acaso, que Sierra e Jamey (Noah Centineo) se apaixonam pelas conversas por telefone e, tudo muda quando ela descobre que Jamey pensa que aquele número de celular é de Veronica (Kristine Froseth, versão teen de Shirley Manson), uma das líderes de torcida mais antipáticas da escola. Este é o ponto de partida para uma verdadeira farsa se instaurar. Sierra e Venonica irão se aproximar e se tornarão cúmplices para enganar rapaz. Em tempos de politicamente correto criar um filme em torno de uma mentira é algo realmente ousado! Li algumas críticas condenando o filme pelas ações das personagens e não entendo como serão escritos os roteiros no futuro, já que todos os personagens precisam ser exemplos, impecáveis de boa conduta - como se todo ser humano o fosse -  sinceramente, existem filmes com adultos fazendo coisas muito piores estreando todo final de semana. Além do mais, filmes não são instrumentos de educação moral, mas é muito saudável que sejam pontos de reflexão sobre o que vemos na tela e sua presença no mundo real. Também lamento informar, que as ações do personagem não alteram as qualidades cinematográficas do filme, pelo contrário, pode até ressalta-las pela forma como o diretor aborda temas delicados (em contraste basta ver como o desastroso 13 Reasons Why é realizado para entender como não deve fazer este tipo de coisa) Tanto Sierra como Verônica tem ações questionáveis, mas isso as torna humanas e bastante próximas de adolescentes que metem os pés pelas mãos por considerar que se a intenção é boa vale tudo, bem, não vale - e as duas irão perceber isso no desfecho. Ajuda muito para o filme funcionar o elenco adolescente liderado por Shannon Purser, que ficou famosa com a rápida participação como a Barb de Stranger Things - e aqui  prova que pode carregar um filme nas costas com incrível tranquilidade. Dosando humor e drama adolescente, boa trilha sonora e uma irresistível nostalgia, Sierra Burgess é uma Loser é outro filme que deixaria Hughes orgulhoso. 

Sierra Burgess é uma Loser (Sierra Burgess is a Loser / EUA - 2018) de Ian Samuels com Shannon Purser, Noah Centineo, Lea Thompson, Alan Ruck, Kristine Froseth, RJ Cyler e Loretta Devine. ☻☻☻

PL►Y: A Canção do Elefante

Dolan e Greenwood: jogos psicológicos. 

Elephant Song teve uma das sessões mais disputadas no Festival Internacional de Cinema de São Paulo em 2014, mesmo assim, não obteve atenção dos distribuidores suficiente para chegar às telas de nosso país. Uma pena, já que se trata de um thriller psicológico interessante e que se tornou um dos filmes mais vistos no Canadá em seu ano de lançamento. O filme é ambientado em uma clínica psiquiátrica no ano de 1966, onde os funcionários estão inquietos com o desaparecimento de Dr. Lawrence (Colm Feore), que não aparece para trabalhar desde sua última conversa com o jovem paciente chamado Michael (Xavier Dolan). Diante da situação, a clínica considera que um dos seus administradores, Dr. Green (Bruce Greenwood) é a pessoa mais indicada a conversar com o rapaz e descobrir o paradeiro do tal médico. Sob várias advertências da enfermeira Peterson (Catherine Keener), Green se encontra com Michael e não parece intimidado com o jovem que está diante dele. Um tanto perdido por ter esquecido os óculos naquela manhã, Green aceita até um acordo com o paciente, que inclui não ler o relatório médico sobre seu quadro psiquiátrico. Bem articulado (e obcecado por elefantes) o rapaz argumenta que não seria justo conversar com alguém que já possui uma visão prévia sobre ele e, portanto, sua credibilidade já começaria abalada antes da conversa. A partir deste ponto, Michael conta tantas versões sobre seu relacionamento com Dr. Lawrence que Green acredita ter um verdadeiro escândalo iminente em mãos. No entanto, sempre existe a suspeita de que tudo pode ser uma fantasia e que as verdadeiras intenções do rapaz estão ocultas. O diretor Charles Binamé cria uma dinâmica bastante rica para sustenta o duelo entre médico e paciente. Enquanto Bruce Greenwood é pura introspecção (e Catherine Kenner segue o mesmo caminho), Xavier Dolan (que se tornou mais conhecido como diretor prodígio e que aqui aparece atuando pela última vez) opta por criar um personagem inquieto, de sorriso nervoso e de prosa pouco confiável. Dolan concebe um personagem que parece saído do Asilo Arkham de Gotham City,  há tantos trejeitos, olhares e timbres de voz em Michael que tudo funciona como disfarce para sua alma torturada (que se revela naquela bela cena do quarto, onde ele está solitário, contemplando melancolicamente a luz que entra pela janela). Embora sua concepção teatral seja evidente (afinal, era uma peça que ganhou adaptação pelas mãos do mesmo autor, Nicolas Billon) e com alguns elementos que poderiam ser mais explorados (como a relação entre o médico e a enfermeira), Binamé cria cenas que fazem toda a diferença na construção do filme - e não estou falando da narrativa atravessada por depoimentos sobre o que aconteceu na clínica. Enquanto espectadores, embarcamos na proposta e nos surpreendemos com o final - onde o comportamento mais perigoso de Michael de revela de forma bastante coerente com o que vimos por todo o filme. A Canção do Elefante é uma grata surpresa. 

A Canção do Elefante (Elephant Song / Canadá - 2014) de Charles Binamé com Bruce Greenwood, Xavier Dolan, Catherine Keener, Carrie-Anne Moss, Colm Feore e Larry Day. ☻☻☻☻

domingo, 16 de setembro de 2018

MOMENTO ROB GORDON: Diretores Canadenses

Embora o Canadá tenha uma cinematografia sólida (são mais de 900 filmes lançados ao ano, para se ter uma ideia no Brasil foram lançados 158 títulos no ano passado), são poucos os diretores do país que conseguem reconhecimento fora de lá. A década de 1970 revelou o nome de David Cronenberg e Ivan Reitman, a década seguinte trouxe James Cameron e Denys Arcand. Os anos 1990 foram marcados pela ascensão de Atom Egoyam (que nasceu no Egito e cresceu no Canadá), Neil LaBute e Alexander Payne. O século XXI trouxe novos nomes que chamam cada vez mais atenção do público e de Hollywood que está atenta ao talento dos vizinhos. Este Momento Rob Gordon é para lembrar cinco diretores que se destacaram no cinema canadense do século XXI (em ordem alfabética: 

Denis Villeneuve
Denis começou a fazer curtas-metragens nos anos 1990 e seu primeiro longa foi lançado em 1998 (32 de agosto na Terra), mas ninguém deu muita atenção. Seus segundo trabalho, Redemoinho (2000) chamou mais atenção em festivais e foi até lançado nos cinemas brasileiros. A guinada em sua carreira aconteceu com Politécnica (2009), a impressionante reconstituição de uma trágica história canadense. Desde então o diretor só cresceu em prestígio. Com Incêndios (2010) foi indicado ao Oscar de filme estrangeiro, carimbando seu passaporte para Hollywood fazer Os Suspeitos (2013). Para quem achou que ele perderia seu tom autoral, ele fez a adaptação de O Homem Duplicado (2013) calcado na obra de José Saramago. Depois o diretor viu Sicario (2015) ser indicado a três Oscars e A Chegada concorrer a oito (lhe rendendo a primeira indicação ao prêmio de direção). Se ano passado Blade Runner 2049 não foi o blockbuster que esperavam, a crítica e os fãs do primeiro filme (lançado em 1982) não reclamaram, pelo contrário, o colocaram em várias listas de melhores lançamentos de 2017. Seu próximo passo é repaginar Duna para o cinema depois da desastrosa versão de David Lynch (lançada em 1984). 💟Meu Favorito: Blade Runner 2049

Jason Reitman 
O filho do veterano Ivan Reitman, Jason começou a fazer curtas no final dos anos 1990, mas seu primeiro longa foi lançado em 2005. Obrigado por Fumar serviu de excelente carta de apresentação do jovem diretor que tinha um humor bastante mordaz para falar de temas complicados. Ele aparece umais benevolente em Juno (2007), revelando a roteirista Diablo Cody para o mundo - e viu seu filme concorrer a quatro Oscars (incluindo melhor diretor). O sucesso se repetiu com Amor sem Escalas (2009), um filme que tinha como pano de fundo a crise econômica americana. O longa concorreu a seis Oscars (incluindo melhor filme, colocando Jason mais uma vez no páreo de diretor -além de concorrer como melhor produtor e roteirista). Jason se juntou à Cody mais uma vez com o ácido Jovens Adultos (2011) e escorregou quando filmou o drama Refém da Paixão (2013), um filme que nem parece ser dele. Ainda bem que ele voltou ao seu tom habitual com Homens, Mulheres e Filhos (2014) abordando a influência tecnológica nas relações. Em 2018 ele lançou Tully, mais uma parceria com Diablo Cody e em breve estreia The Front Runner, estrelado por Hugh Jackman -  ambos devem aparecer no Oscar e fazer suas pazes com a Academia. 💟 Meu favorito: Obrigado por Fumar 

Jean Marc-Vallée
Jean começou a  fazer filmes nos anos 1990, mas foi consagrado mesmo quando lançou seu quarto longa: C.R.A.Z.Y (2005) sobre um menino que descobre a homossexualidade. O filme impressionou público e crítica, além de fazer sucesso em festivais por sua abordagem bem-humorada da história que tinha em mãos. O resultado lhe valeu o convite para filmar o filme de época A Jovem Rainha Vitória (2009), que concorreu a três Oscars técnicos (levou o de figurino). Embora fosse convencional demais, o filme tornou o nome de Vallée conhecido, o que chamou ainda mais atenção para o seu projeto canadense seguinte: Café de Flore (2011) - que confirmou seu caráter imprevisível para escolher projetos. Ele voltou para Hollywood para filmar o sucesso Clube de Compras Dallas (2013) que premiou Matthew McConaughey e Jared Leto no Oscar (além de concorrer ao Oscar de em mais quatro categorias, incluindo melhor filme). O filme tornou Vallée em darling dos artistas, tanto que Reese Witherspoon o escolheu para dirigir Livre (2014) - que valeu a ela e Laura Dern indicações ao Oscar. Se Demolição (2015) é o maior tropeço de sua carreira, pode-se dizer que ele foi redimido logo em seguida com seus trabalhos para HBO: Big Little Lies se tornou a minissérie mais aclamada (e premiada) de 2017 (tanto que se tornará série com uma nova temporada). Recentemente ele levou ao ar Sharp Objects, que chamou atenção pelo tom hipnótico impresso à narrativa do livro de Gillian Flynn. Depois de tanto trabalho ele irá somente assinar a produção executiva da nova temporada de Big Little Lies em 2019 💟 Meu Favorito: Big Little Lies.

Sarah Polley
Sarah começou a carreira como atriz aos seis anos de idade. Desde então fez mais de cinquenta trabalhos diante das câmeras, ganhando destaque nos filmes de Atom Egoyam (Exótica/1994 e O Doce Amanhã/1997). Depois de estudar cinema e realizar alguns curtas, Sarah fez seu primeiro longa-metragem com o doloroso Longe Dela (2006) - drama sobre o amor de um casal tentando resistir ao Alzheimer. A abordagem sensível (e a atuação premiada da veterana Julie Christie, que foi indicada ao Oscar) destruíram qualquer suspeita sobre seu novo campo de trabalho - e ela ainda recebeu uma indicação ao Oscar pelo roteiro adaptado da obra de Alice Munro. Após várias entrevistas ele mencionou ter mais prazer em trabalhar como diretora de cinema, tanto que seu último trabalho como atriz foi em Trigger (2010). Em 2011 ela lançou Entre o Amor e A Paixão (2011) que colheu elogios pelas atuações de Michelle Williams e Seth Rogen. Em seguida ela lançou seu filme mais pessoal, o documentário Histórias que Contamos (2012), onde reflete sobre a própria família de forma surpreendente - e o resultado é sensacional. Atualmente seus últimos trabalhos foram como roteirista - ela assinou o texto da minissérie Alias Grace (2017) e a adaptação de Quem é você, Alasca? para a minissérie que deve estrear em breve. 💟 Meu Favorito: Histórias que Contamos 

Xavier Dolan 
Dos presentes nesta lista, Xavier é o mais cult - e o mais precoce. Famoso desde os cinco anos na TV canadense, aos vinte ele decidiu ser cineasta. Foi quando dirigiu Eu Matei a Minha Mãe (2009) que lhe rendeu três prêmios no Festival de Cannes. Depois ele lançou Amores Imaginários (2010), onde narra um triângulo amoroso fadado ao fracasso. O filme deu ao diretor outro prêmio em Cannes e o consagrou como um dos queridos do Festival - depois ele ainda ganhou a Queer Palm com Laurence Anyways (2012), por contar por quase três horas a história de um personagem transexual. Querendo respirar novos ares, Dolan lançou seu filme seguinte no Festival de Veneza. Tom Na Fazenda (2013) é a adaptação da peça de Michel Marc Bouchard e provou que o diretor sabia criar narrativas diferentes. Tenso, o filme não levou o Leão de Ouro, mas ganhou o prêmio da crítica e ainda é considerado um dos trabalhos mais impressionantes do ator/diretor. De volta a Cannes com Mommy (2014), Xavierreafirmou a influência pop em seu trabalho e ganhou o prêmio do júri. Seu filme seguinte, É Apenas o Fim do Mundo é adaptação da áspera peça de Jean-Luc Lagarce - e dividiu opiniões em Cannes - mas levou o Grande Prêmio do Júri e do Júri Ecumênico. O filme ainda concorreu a seis categorias no César (ganhando de melhor ator, diretor e edição - estes dois últimos para Xavier). Seu novo filme é A Vida e Morte de John F. Donovan, seu primeiro filme como diretor em Hollywood (além disso ele deve aparecer como ator nos aguardados Boy Erased e IT2) 💟 Meu Favorito: Tom na Fazenda 

CATÁLOGO: Politécnica

O pensamento nas trevas: uma triste história canadense. 

Dez anos antes da tragédia naquela escola americana de Columbine, houve uma situação semelhante na cidade canadense de Montreal. Era dezembro de 1989 e um aluno armado chocou o mundo - com o acréscimo de uma carta em que ele tentava explicar suas motivações. A situação demonstrou como uma pessoa comum pode esconder uma mente perturbada - que se torna ainda mais perigosa com uma arma nas mãos. O então desconhecido Dennis Villeneuve sabia que enfrentaria polêmicas ao recontar esta história em seu terceiro longa. Em Politécnica as informações sobre as vítimas foram alteradas e filmado em preto e branco, Villeneuve apresenta uma precisão cirúrgica ao reconstituir o massacre, ousa ao tentar desvendar um pouco mais da psique do atirador (um rapaz que parece colecionar frustrações e que explode ao perder sua vaga de emprego para uma garota da escola). Não darei detalhes sobre a carta que o moço escreve, mas vale destacar como atribuir a causa de seus problemas a um grupo específico de pessoas é combustível para uma situação catastrófica. Villeneuve faz um belo trabalho com o elenco e provoca arrepios pelo tom realista que consegue imprimir, seja nas cenas mais triviais como nas mais agressivas. O cuidado com que ele acompanha os atores com a câmera é notável, assim como os enquadramentos que mostra um mundo que virou de cabeça para baixo (literalmente). O bom trabalho de edição sabe exatamente o momento em que deve mais sugerir do que mostrar (e assim ampliar o horror na plateia), sabe também como terminar de contar uma parte da história e retomá-la pela ótica de outro personagem. Estes cuidados tornam o filme menos hermético do que Elefante (2003) de Gus van Sant, que conta uma história parecida (e ganhou a Palma de Ouro em Cannes no ano de seu lançamento) e que sempre rendeu comparações. Ambos tem uma narrativa multifacetada, momentos de pura contemplação e aquela maneira peculiar de filmar os alunos caminhando por longos corredores. São filmes bastante incômodos, mas Politécnica ainda consegue ser mais claro em seus objetivos e fez Denis Villeneuve chamar atenção para além de sua terra canadense. Hoje consagrado (e com uma indicação ao Oscar por A Chegada/2016), fica evidente que aqui o diretor buscava construir seu estilo próprio. Insatisfeito com o resultado de seus dois filmes anteriores (32 de Agosto na Terra/1998 e Redemoinho/2000), Denis demonstra saber exatamente o que desejava fazer aqui. O filme é tenso, enxuto e preciso, um passo decisivo na carreira de um cineasta que lançou em seguida o ainda mais premiado Incêndios (2010) - filme que merecia ter ganho o Oscar de filme estrangeiro em 2011. Em comum com este, Politécnica já demonstrava a preocupação do diretor com um mundo repleto de personagens que não conseguem conversar sobre as suas angústias. O filme recebeu 11 indicações ao Genie Awards (O Oscar canadense) e foi premiado com nove estatuetas, incluindo filme, diretor e roteiro. 

Politécnica (Polyrechnique / Canadá - 2009) de Denis Villeneuve com Maxim Gaudette, Sébastien Huberdeau, Karine Vanasse, Martin Watier, Evelyne Brochu e Pierre Yves-Cardinau. ☻☻☻☻

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

PL►Y: Gabriel e a Montanha

Gabriel: humano em suas contradições. 

O economista Gabriel Buchman estava prestes a cursar o doutorado nos Estados Unidos quando decidiu concretizar o sonho de conhecer o continente africano. Sua justificativa era subir montanhas famosas do continente. O ano era 2009 e, após ficar dezenove dias desaparecido, o corpo de Gabriel foi encontrado sem vida, abrigado debaixo de uma rocha. Na época o rapaz foi retratado como um herói, mas sob a ótica do cineasta Fellipe Barbosa (amigo de infância de Gabriel), ele é apresentado como alguém cheio de contradições e, por isto mesmo, interessante. Gabriel (vivido por João Pedro Zappa) era um rapaz rico e inteligente que se afastou de todo mundo para se aventurar por um território desconhecido com sua mochila e sandálias de pneu. Particularmente não gosto da primeira parte do filme, especialmente pela distância que existe entre o que Gabriel diz e o que ele faz (e o registro quase documental torna ainda mais difícil perceber o jogo que o diretor está construindo), mas a coisa melhora quando aparece Cris (Caroline Abras), a namorada de Gabriel. No encontro entre Cris e Gabriel percebi que tudo que o que me incomodava no personagem era propositalmente construído, afinal, por mais que negue, Gabriel não é mais do que um turista que mantém o seu distanciamento do universo que o cerca. Em alguns momentos ele é tão cheio de si que se torna incapaz de notar o quanto se julga superior às pessoas que estão ao seu redor - sobretudo os seus guias locais. Isto não significa que Gabriel seja um personagem insuportável, pelo contrário, torna-se mais humano e curioso por estar cego diante da imagem que construiu para si mesmo (e sua reflexão sobre estudar a pobreza do terceiro mundo com doutorado em Los Angeles é só um indício de que algo não se encaixava). É verdade que em alguns momentos o roteiro fica frouxo e existem aquelas cenas que parecem improvisadas, mas Fellipe Barbosa mantem o domínio da jornada do protagonista de forma bastante emocional. A simpatia de Zappa torna fácil compreender o fascínio que Gabriel provocava nas pessoas e a opção por colocar diante das câmeras as pessoas que cruzaram o caminho dele nesta jornada (que também colaboram com depoimentos em off) torna o filme ainda mais real perante o retrato que constrói. Com belas paisagens valorizadas pela fotografia, o filme não deixa de ser uma jornada de autoconhecimento, ainda que o protagonista não perceba isto.  

Gabriel e a Montanha (Brasil/França - 2017) de Fellipe Barbosa com João Pedro Zappa, Caroline Abras e Alex Alembe. ☻☻☻

Na Tela: Custódia

Léa e Denis: relacionamento abusivo. 

No início de Custódia vemos um casal diante de uma juíza num embate sobre  a custódia do filho mais novo - a primogênita já é maior de idade e já deixou claro que não quer contato com o pai, mas o destino do pequeno Julien (Thomas Gioria) ainda é um tanto incerto. O menino até escreveu uma carta em que argumenta que gostaria que o pai jamais se aproximasse deles novamente, no entanto, a advogada de Antoine (Denis Ménochet), argumenta o quanto a criança pode ter sido influenciada pela mãe e como aquele homem sente falta do filho. Diante da juíza, a ex-esposa de Antoine, Miriam (Léa Druker) é discreta e visivelmente preocupada com o que pode acontecer diante do veredito. A cena é longa, bem dirigida e a montagem transparece a exata medida da tensão que perpassa a relação daquele casal, exibindo também que algumas questões permanecem ocultas. São estas que conduzem o filme quando ele se ampara no drama para ganhar forma de suspense. Diante da logística que Miriam organiza para evitar contato com Antoine, percebemos que os fins de semana do pai com Julien serão uma porta de entrada forçada para a vida de Miriam - e teremos certeza do quão agressivo e abusivo Antoine pode ser. Em seu filme de estreia, o francês Xavier Legrand demonstra pulso firme com um retrato da realidade de muitas mulheres que evitam denunciar os abusos sofridos no casamento. A angústia dos personagens transborda da tela e para construir esta atmosfera o trabalho dos atores é fundamental. O grandalhão Denis Ménochet é uma bomba relógio e consegue dosar cada momento do personagem rumo ao descontrole absoluto - e o efeito de sua atuação é ampliada ainda mais pela vulnerabilidade do prodígio Thomas Gioria, um ótimo ator mirim que carrega a densidade de um menino que tenta evitar um desastre cada vez que vê o pai por perto. A atriz Léa Druker também consegue dosar as ambiguidades de sua personagem, que nunca sabe muito bem como agir diante do ex-marido, embora o roteiro não lhe ofereça muito a dizer, ela consegue dar corpo e alma à personagem de forma bastante realista. O único problema é Mathilde Auneveux, que vive a filha mais velha do casal, a personagem está um tanto alheia a tudo o que acontece (mas o problema talvez seja do próprio roteiro e não da atriz), mas este é um pequeno tropeço num filme que se sustenta muito bem ao longo de seus noventa minutos. Custódia foi concebido inicialmente como um curta-metragem premiado chamado Avant que de tout Perdre (2013),  estrelado pelo mesmo casal de atores. O curta funcionou tão bem que foi indicado ao Oscar de curta-metragem e agora se tornou um longa de respeito. Custódia recebeu o prêmio de Melhor Estreia no Festival de Veneza2017, assim como o prêmio de melhor diretor do Festival. 

Custódia (Jusqu'à la garde / França - 2017) de Xavier Legrand com Denis Ménochet, Léa Druker, Thomas Gioria, Mathilde Auneveux e Florence Janas. ☻☻☻☻