Vera, George e Anna: os dilemas de ser descartável.
Eu nunca entendi muito bem porque as pessoas gostavam tanto de Amor sem Escalas quando o filme foi lançado. No início eu pensava que o título mal ajambrado me atrapalhava - já que não tem relevância nenhuma diante da história (ok, tem um romance na trama, mas ele é apenas secundário diante da proposta). Com a crise econômica batendo à porta da economia americana, o terceiro filme de Jason Reitman beneficiou-se de ser lançado na hora certa ao girar em torno de um Conselheiro de Transição de Carreria, que nada mais é do que o nome pomposo daquele sujeito que é contratado por empresas que precisam enxugar a folha de pagamento, cabe ao CTC a antipática tarefa de demitir funcionários. Quando Ryan Bingham (George Clooney) aparece no filme, sua função é sujar as mãos no lugar dos empresários que não querem enfrentar reações como desdém, desespero, choro, ameaças... no início do filme, conseguimos sentir a energia pesada de quando a corda arrebenta do lado mais fraco do sistema. O difícil vem depois, quando precisamos gostar de Ryan Bingham. Sorte que Reitman conta com George Clooney, o melhor galã de Hollywood para esse tipo de serviço. Com seu estilo espirituoso ele até nos faz esquecer do seu trabalho desagradável, ele possui técnicas específicas e um discurso mais humano que pode fazer o funcionário recém demitido até pensar naquele momento como algo bom, ou seja, o momento para recomeçar (ainda que sem futuro garantido). Diante da profissão, Bingham vive em aeroportos e hotéis (o que o faz desenvolver a mania de colecionar milhas aéreas) e sua vida muda quando duas mulheres cruzam o seu caminho. Uma delas é Alex (Vera Farmiga, indicada ao Oscar de coadjuvante), que vive uma rotina bastante parecida com a de Bingham e, diante da identificação imediata, começam a marcar encontros através de seus aparatos tecnológicos. A outra é Natalie (Anna Kendrick, também indicada ao Oscar de coadjuvante e muito elogiada na época), uma jovem recém-formada que torna-se parceira de Bingham e que torna o processo de demissões ainda mais impessoal através do uso de videoconferências. Na dinâmica entre os três personagens, o que se vê é o retrato de um mundo marcado pela indiferença e descartabilidade das relações humanas no século XXI - algo que o protagonista temerá tanto em sua vida profissional quanto pessoal diante da presença da laoura e da morena que entram na sua vida. Ivan Reitman descasca os personagens diante do roteiro inteligente de Sheldon Turner, mas tenho a impressão que o filme não decola. Indicado a seis Oscars (Filme, diretor, ator, atrizes coadjuvantes, roteiro), a produção é realmente caprichada, o elenco é competente, a direção é coerente, o roteiro é bem escrito mas acho que os personagens em si, são tão superficiais em sua essência que não consegui me relacionar com nenhum deles. É o tipo de filme que um distanciamento temporal pode me fazer perceber nele a pérola que todos anunciavam, ou então, concretizar (minha impressão) de que foi superestimado pela crítica. No entanto, as qualidades do longa são visíveis, especialmente na condução de Jason Reitman para temas bastante contemporâneos. Talvez no futuro, a filmografia do moço sirva de coletânea das angústias presentes na primeira metade do século XXI (sobretudo, na recorrente temática da solidão).
Amor Sem Escalas (Up in The Air/EUA-2009) de Jason Reitman com George Clooney, Vera Farmiga, Anna Kendrick, J.K. Simmons, Jason Bateman, Melanie Linskey e Zach Galifianakis. ☻☻☻
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