Levant: papéis diferentes ao longo do dia.
Leos Carax não é um diretor fácil de se gostar. O cineasta francês é mestre em criar histórias surreais e, com isso, despertar incômodo na plateia. Foi assim desde a sua estreia em 1984 com Boy Meets Girl, mas ele se tornou tornou mundialmente conhecido com Os Amantes de Pont Neuf (1991), que ficou um bom tempo em cartaz nos cinemas brasileiros. Geralmente seus trabalhos são selecionados para o Festival de Cannes, geram controvérsia e pode até sair premiado após ser vaiado. Foi mais ou menos isso que aconteceu com o radical Holy Motors, que dividiu opiniões ao disputar a Palma de Ouro e gerou insultos a Carax de que era autoindulgente, arrogante e presunçoso, mas foi ganhou o Prêmio da Juventude daquele ano. Tanta raiva se explica em um filme que parece feito para demonstrar como o moço tem domínio pleno de qualquer tom de narrativa que queira realizar. Feito para ser uma enorme costura de retalhos, o filme agrada por sua originalidade e capacidade de gerar várias interpretações. Depois de uma enigmática introdução envolvendo pessoas em uma sala de cinema, o filme segue a rotina de Oscar (o versátil Denis Levant) que começa o dia entrando em uma enorme limusine e recebe vários trabalhos para o dia. O veículo se mostra um enorme camarim, onde ele se transforma em vários personagens ao longo do dia. Em seus trabalhos ele se transforma em duende ensandecido, pai em conflito com a filha, um assassino, músico, um idoso doente, um homem que encontra um amor do passado, além de um sugestivo trabalho de captura de movimento, assim ele se reinventa ao longo do dia, sempre guiado por sua fiel motorista (Edith Scoob) que às vezes o resgata de cena quando o trabalho é exaustivo demais. Nestes trabalhos ele encontra uma modelo famosa (Eva Mendes), um sósia (o próprio Denis Levant) e a cantora Kylie Minogue (boa atriz, hein!) num momento comovente. Assim, a narrativa também joga com momentos dramáticos, de suspense, de terror, fantasia, musical e até de comédia, promovendo um verdadeiro passeio pelos gêneros cinematográficos. Holy Motors pode parecer uma grande loucura, mas em momento algum se perde ou se torna monótono, pelo contrário, sua intensidade cresce até o final com um diálogo inusitado de como as pessoas hoje não se arriscam mais. Entre as várias leituras do filme, já ouvi dizer que é uma fantasia sobre viver na realidade ou uma crônica sobre as máscaras que usamos cotidianamente. Seria uma outra dimensão? Um jogo? Um mundo paralelo? Ou apenas o dia repleto de trabalho de um ator bastante ocupado (repara o diálogo sobre ele nunca saber onde estão as câmeras). O fato é que Holy Motors entra para a lista dos filmes mais estranhos e originais que você já viu. Você pode gostar se entrar no clima desta deliciosa provocação e, se tudo parecer apenas uma doideira, imagina que é um sonho (ou pesadelo). David Lynch deve adorar esta sandice!
Holy Motors (França - 2012) de Leos Carax com Denis Levant, Edith Scoob, Eva Mendes, Kylie Minogue, Michel Picooli, Zlata e Leos Carax. ☻☻☻☻
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