Olsen, Carrie e Natasha: ressentimentos em luto. |
A saúde de Vincent (Jay O. Sanders) sofreu um golpe severo e agora ele fica deitado em seu quarto ligado aos aparelhos, de lá, ele deve ficar um tanto decepcionado com as discussões de suas três filhas perante o infortúnio. Se antes ele tinha apenas a companhia de Rachel (Natasha Lyonne), agora suas outras meninas, Katie (Carrie Coon) e Christina (Elizabeth Olsen) também vieram para ajudar. Ou pelo menos deveria ser assim, a convivência das três após tanto tempo tem o efeito incômodo de que somente os ressentimentos guardados pela vida é capaz de proporcionar. Eu sei, você já deve ter se deparado com dezenas de filmes que partem de uma premissa parecida (o recente Tia Virgínia/2023 com vera Holtz bebe na mesma fonte), mas a diferença está na forma como o cineasta Azazel Jacobs resolve contar os conflitos presentes neste reencontro. Como tanto, ele o faz bebendo diretamente nos estereótipos para apresentar aquelas três mulheres para depois desconstruí-las aos olhos do espectador. Isso é material de sobra para o trio de atrizes que abraçaram o projeto. Se pelos olhos das irmãs, Rachel nos é apresentada como a irresponsável do trio, aos poucos sua postura arredia ganha novas camadas, especialmente pelo trabalho de Natasha Lyonne (que ficou conhecida por seus trabalhos em outras produções da Netflix como Orange is The New Black e Boneca Russa), que aqui repete alguns de seus trejeitos habituais para depois revelar a profundidade de sua personagem (que tem rendido comentários de que está cotada para o Oscar de coadjuvante no próximo ano). Talvez ela seja a que tem a história mais destacada pelo roteiro, afinal a trama avança conforme conhecemos um pouco dos detalhes da inserção de Rachel naquela família. A rigidez apresentada por Katie desde a primeira cena, deixa o trabalho de Carrie Coon um tanto amarrado pela amargura da personagem, tendo seu conflito com a filha ao telefone sendo praticamente esquecido a partir de certo ponto. O mais curioso é que sua preocupação como o pai se mistura com um certo desejo de que ele parta de uma vez para que ela tenha que ir embora dali - mesmo que seja para viver uma vida que, talvez ela mesmo não se dê conta, não a agrada. Já Elizabeth Olsen consegue oferecer até um certo ar cômico para sua personagem, que é fã de Grateful Dead, tem um passado hippie e procura ser zen entre o casamento, a criação da filha pequena e as rixas entre as duas irmãs. Sua serenidade parece cada vez mais uma máscara, assim como a rigidez de Katie é uma ilusão de controle. Misturar as três sob o mesmo teto durante o processo de luto é uma experiência para percebermos como as nossas emoções no luto podem facilmente transbordar para a vida do outro, sem que seja notado como tudo isso torna o processo ainda mais doloroso e difícil. Digo isso por experiência própria, já que após dois meses acompanhando meu pai no hospital antes de sua morte, presenciei e vivenciei situações inimagináveis que o filme me fez recordar (e imaginei onde eu estava com a cabeça quando resolvi assistir este filme). Quando as lágrimas já eram inevitáveis e a cena de despedida se instaura, tive aquela sensação de que a catarse diante de uma tela é necessária para que possamos seguir em frente. As Três Filhas tem lá seus tropeços (principalmente pela estranha sensação que estamos diante do material para uma peça de teatro), mas funciona principalmente pelo trabalho de suas atrizes em uma ambientação claustrofóbica que só aumenta o peso da morte que se aproxima. Acho que passará em branco nas premiações, mas merece atenção entre o catálogo da Netflix.
As Três Filhas (His Three Daughters / EUA - 2024) de Azazel Jacobs com Carrie Coon, Natasha Lyonne, Elizabeth Olsen, Rudy Galvan, Jose Febus, Jovan Adepo e Jay O. Sanders. ☻☻☻
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