Foïz e Duvauchelle: amantes em um quadrilátero amoroso.
Filmes que abordam a temática sexual costumam ser muito mais interessantes quando não se contentam em mostrar os personagens sentindo prazer (senão, ficam reduzidos à filmes pornôs metidos a besta). As produções costumam ser muito mais ricas quando mostram que o sexo envolve muito mais aspectos do que o puramente uma relação física supõe. O francês Para Poucos consegue despertar interesse ao partir do que é uma fantasia para muitos casais e mostrar os sentimentos que podem surgir desta aventura. O ponto de partida é o flerte que começa a existir entre Rachel (Marina Foïs) e Vincent (Nicolas Duvauchelle), ela trabalha numa joalheria e ele encomendou uma peça personalizada para a esposa. Entre os dois fica claro que existe algo mais do que relacionamento profissional. Os dois acabam programando um jantar onde levarão seus respectivos conjuges, Franck (Roschdy Zem) e Teri (Élodie Bouchez). Conversa vai, conversa vem, os dois casais começam a demonstrar interesse pelo parceiro do outro, iniciando mais do que uma amizade: uma história de amor a quatro. Enquanto Rachel aprecia a agressividade de Vincent, Teri demonstra admiração pelo romantismo de Franck, de forma que os relacionamentos que se estabelecem entre os quatro preenchem, ao menos no início, as necessidades de todos. Temos que reconhecer que a tarefa escolhida pelo diretor Antony Cordier não é nada simples, já que utiliza a temática da troca de casais para aprofundar temas mais profundos como cumplicidade, traição, adultério, fidelidade, ciúme, auto-estima e insatisfação. Nesse processo, acho interessante como Rachel se envolve emocionalmente com Vincent enquanto poda o relacionamento do esposo com Teri com um conjunto de regras que parecem satisfazer somente a sua necessidade de evitar que o esposo sinta por Teri o mesmo que ela sente por Vincent. São regras tão tolas que somente a cabeça que alguém que se vê dividido entre sentimentos contraditórios acharia que funcionaria para evitar o inevitável. Enquanto a amizade colorida do quarteto prossegue, eles parecem habitar um universo paralelo (especialmente quando se refugiam numa casa no campo e se banham em... farinha!) , mas a relação se torna o vício para alguns e um incômodo para outros. Questões como a necessidade de estarem sempre por perto ou até a quebra das fronteiras de onde começa um lar e termina o outro começam a afetar a harmonia do quarteto - os filhos dos casais por exemplo se misturam, mas nunca parecem ter uma relação entre si, mesmo que a proximidade dos pais os obrigue a conviverem - e o desconforto traz a tona um segredo de Rachel. Durante boa parte da sessão, Cordier realiza um belo trabalho, em momento algum o filme soa vulgar ou gratuito, mesmo quando aparece a intimidade entre os casais ou as conversas sobre as diferenças entre um parceiro e outro, o diretor consegue guiar os seus atores para que tudo soe natural, e por isso mesmo, seus personagens não parecem fantoches sexuais, mas pessoas comuns que se envolveram num relacionamento que os leva a questionar se é possível amar duas pessoas ao mesmo tempo. Embora bem cuidado, o filme tem dois momentos que poderiam ter ficado de fora, como a noite em que Rachel assume outras facetas de sua sexualidade ao lado de Teri ou o desfecho onde tudo pareceu fruto de uma grande conspiração. São dois aspectos que podem ser considerados até interessantes para alguns, mas que rompe o equilíbrio com que os personagens mergulham num conjunto de descobertas que nem imaginavam no início e proporciona à trama um desfecho apressado e insatisfatório para o que vimos até ali.
Para Poucos (Happy Few/França-2010) de Antony Cordier com Marina Foïs, Élodie Bouchez, Nicolas Duvauchelle e Roschdy Zem. ☻☻☻
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