A família Grant: o passado presente segundo Alexander Payne.
Pode-se dizer que um diretor amadurece quando começa a ficar sério? Se levarmos em consideração que Alexander Payne estreou fazendo chacota de grupos pró e contra aborto com Ruth em Questão (1996), Nebraska é a prova de que diretor tornou-se maduro. Ironicamente, seu novo filme é estrelado pelo pai (Bruce Dern) da estrela que interpretou Ruth (Laura Dern). Faz tempo que o diretor deixou o humor debochado de lado (precisamente com As Confissões de Schmidt/2002) e investiu numa mistura de comédia de costumes com dramas familiares que o tornou figura constantes nas premiações. O espectro de diretor indie permanece, mas agora ele é abraçado pelo mainstream. Essa sensação ficou latente em Os Descendentes (2011) e mesmo em Nebraska, com toda a estranheza que ele possa gerar. Embora Nebraska seja melhor que Os Descendentes, amargou bilheterias modestas apesar de todos os elogios que recebeu pelo mundo. Podem dizer que a culpa é da fotografia em preto e branco emoldurando uma narrativa contemplativa - que, infelizmente, o grande público perdeu o hábito de apreciar. Apesar do tom solene e dramático, há muito para rir no humor gerado pelo diretor. Bruce Dern (indicado ao Oscar) interpreta o distante Woody Grant, um senhor que acredita ter recebido um prêmio de um milhão de dólares e precisa ir do estado de Montana para Nebraska receber o prêmio. Ainda que o filho, David (o comediante Will Forte surpreendendo fora do Saturday Night Live) o alerte de que aquilo é apenas uma propaganda, Woody é irredutível em sua última chance de ficar milionário. Basta sua crença cega para que vá buscar seu prêmio, na cidade de Lincoln, ao lado do filho atencioso - este a contragosto da mãe, Kate (a inacreditável June Squibb, indicada ao Oscar de coadjuvante) e do irmão Ross (Bob Odenkirk, que também tem uma passagem pelo SNL no currículo). Pelo caminho, os dois irão reencontrar familiares e conhecer ter momentos em que David poderá conhecer um pouco mais da história de seu pai. Embora Woody sempre apareça meio fora do ar - quase sempre sem entender o que dizem para ele (seria o efeito de décadas de bebida alcoólica, efeitos de sua ação na Gerra da Coréia ou do Alzheimer ainda não diagnosticado?), a viagem serve para aproximá-lo do filho, que aos poucos descobre a história do pai. É engraçado que David fica surpreso ao perceber que seus pais tinham uma história antes de casarem e ter filhos. Das conquistas amorosas da juventude, passando pelos parentes oportunistas (que nunca acreditam quando David explica, inúmeras vezes, que não existe prêmio algum), Alexander Payne parece fazer um filme sobre a passagem do tempo. Dos erros, dos acertos, das escolhas, das renúncias que marcaram a vida de seu protagonista. Nesse sentido, a belíssima fotografia em preto e branco contribui bastante para criar esse olhar descolado sobre um tempo que já passou, mas que ainda assim, faz-se presente na trajetória da família Grant. As piadas estão sempre ali (disfarçadas no ritmo quase arrastado) que combina comédia, drama e uma certa poesia - essa sensação é muito forte quando Kate comenta sobre os conhecidos diante das lápides de um cemitério (como se olhasse um álbum de fotografias - e nem sempre ela tem coisas boas a dizer) ou quando visitam a casa em que Woody viveu durante a infância. Mas nenhuma das emoções geradas no espectador se compara ao último ato do filme, quando Woody atravessa a cidade que não costumava o tratar com cortesia e sente-se vitorioso numa realidade que somente ele enxerga. Com o final arrebatador - especialmente pela colaboração de Angela McEwan que vive a ex-namorada de Woody, que o perdeu para Kate. Ainda que possa não ser apreciado por muitos, Nebraska mostra que Alexander Payne não é apenas um ótimo diretor de atores, mas tornou-se um verdadeiro poeta no uso da imagem.
Nebraska (EUA-2013) de Alexander Payne, com Bruce Dern, Will Forte, June Squibb, Bob Odenkirk, Stacy Keach, Rance Howard e Angela McEwan. ☻☻☻☻
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