domingo, 22 de fevereiro de 2015

Na Tela: Selma

David (ao centro): marchando pelos direitos civis. 

O maior mérito de Selma, longa metragem dirigido por Ava Duvernay, é o seu não contentamento em ser uma cinebiografia do ícone Martin Luther King. É triste que ainda exista uma tensão racial gigantesca no sul dos Estados Unidos e no período em que ocorreu a luta pelos direitos civis a situação ainda era pior por ser legitimada pelo governo, que com sua postura de ficar em cima do muro presenciava massacres movidos pelo preconceito como se nada estivesse acontecendo. Em 1965 uma minoria da população negra americana tinha direito a voto - e a reivindicação por um processo mais justo para tornar-se eleitor era visto como uma grande ameaça pelos governantes locais, especialmente no estado do Alabama. O filme conta as tentativas de realizar a histórica marcha da cidade se Selma para Montgomery pelo direito de votar. A ideia era que ao longo daquela dezena de quilômetros, as pessoas se sensibilizassem com a população negra de uma terra que já alardeava a democracia como seu bem mais precioso (no entanto, essa democracia era bem demarcada pela população branca). Num cenário pouco amistoso, o pastor Martin Luther King Jr (uma ótima atuação de David Oyelowo) organiza a marcha em Selma, mas enfrenta problemas com o governador Geroge Wallace (Tim Roth) em suas tentativas de conter as intenções de King e seus seguidores. A situação não é melhor com o presidente Lyndon Johnson (Tom Wilkinson) com diálogos que nunca avançam e sua postura de esquivar-se de uma situação insustentável. A narrativa pontua as ações de Martin como se formassem um dossiê sobre sua postura (sendo público e notório como J. Edgar Hoover o considerava uma grande ameaça para o país), ao mesmo tempo que retrata manifestações pacíficas que eram tratadas com brutal violência pela polícia por comprometer o status quo. Selma carrega nas tintas de um embate de violências simbólicas que culminam em agressões físicas para manter o que está instituído, mas sem perder de vista os personagens que tem em mãos. Portanto, existem cenas emocionantes que nem precisavam da câmera lenta e da trilha sonora para comover a plateia, as situações falam por si só. Assim,  não interessa se Oprah Winfrey (que também assina a produção ao lado de Brad Pitt) tem um papel pequeno, mas desenvolvido com muita emoção ou se o desconhecido Oyelowo incorpora o mito e o homem que se esconde por trás dele, um dos maiores méritos do filme é conseguir humanizar os personagens que viveram num período complicado sem cair no excesso. Bem produzido (embora pudesse ter uns quinze minutos a menos), o filme levantou algumas polêmicas sobre o retrato de situações que nunca aconteceram - e que podem ter comprometido sua campanha para o Oscar (que lhe atribuiu apenas duas indicações: Melhor Filme e Canção Original), no entanto, a essência de sua mensagem está ilesa, afinal, é sempre bom lembrar que os direitos conquistados não foram gentilezas de governantes, mas fruto de lutas alimentadas com sangue, suor e lágrimas de pessoas que fizeram a diferença, mesmo que soubessem que não viveriam para ver toda a mudança que desejavam. 

Selma (EUA-2014) de Ava Duvernay com David Oyelowo, Carmem Ejogo, Oprah Winfrey, Tim Roth, Tom Wilkinson, Giovani Ribisi e André Holland. ☻☻☻

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