Fassbender: melhor papel em muito tempo. |
Um assassino profissional (Michael Fassbender) planeja meticulosamente cada detalhe de seu novo serviço. Ele fala longamente com o espectador em um fluxo de pensamentos contínuo que nos faz imaginar que ele seja um dos melhores do ramo. Não sabemos quem é o seu alvo ou o motivo para que alguém tenha encomendado a sua morte, mas diante das reflexões deixadas pelo profissional, isso pouco importa. Só que nem tudo corre como o planejado e o protagonista sofre as consequências de seu erro, no entanto, ele está longe de querer ser um alvo e planeja se livrar da retaliação que se aproxima. Só David Fincher é capaz de dar conta de um fiapo de roteiro manjado desse de forma majestosa e elevar a produção ao state of the art de encher os olhos. Além disso, faz a boa ação de trazer Michael Fassbender novamente para o cinema após uma abstinência de quatro anos sem filmar - seus últimos trabalhos foram X-Men Fênix Negra (2019) e Boneco de Neve (2017), o que deixa claro que fazia tempo que ele não tinha um bom material em mãos. O ator alemão está perfeito na pele do metódico assassino (que conforme Isabela Boscov ressaltou muito bem em sua análise, traz muito do próprio David Fincher no perfeccionismo que se exige a cada serviço), mesmo nos momentos mais dramáticos de seu personagem, o ator precisa fazer pouco para expressar o que está sentindo. Acho que a esta altura não é preciso chover no molhado e dizer que Fassbender é um dos atores mais interessantes do cinema mundial (patamar alcançado já em 2008 quando interpretou Bobby Sands em Fome/2008), ele que mantém o filme de pé por duas horas aparecendo em praticamente todas as cenas e nos convencendo de que você não gostaria de ver aquele sujeito na rua. Claro que Fincher dá ao filme um tratamento visual perfeito, gélido e um tanto asséptico, mas que desmonta quando a violência invade a tela e o protagonista precisa enfrentar os seus algozes. Aqui ele ressalta mais uma vez sua inspiração no mestre Alfred Hitchcock, especialmente nos minutos iniciais em que parecemos ver uma variação de Janela Indiscreta (1954) para o século XXI. Bom também é ver a habilidade com que o cineasta escolhe cada peça de seu elenco. É um deleite ver Tilda Swinton quase em um monólogo perante seu parceiro de cena ou a briga planejadamente desajeitada entre o profissional e seu inimigo Bruto (Sala Baker). Porém, seria covardia não ressaltar os trabalhos de cada artista que aparece em cena, todos com chance de ficar na memória do espectador, não importa o pouco tempo que fique em cena (e isso inclui a brasileira Sophie Charlotte em um papel pequeno, mas de destaque no estofo emocional do personagem principal). O Assassino é uma das produções que a Netflix guarda para a temporada de ouro do ano, mas o longa deve passar longe das premiações. Feito no capricho mas sem o apelo "sério" do filme anterior do cineasta, Mank/2020 que também foi feito para Netflix, concorreu a 10 Oscars e foi lembrado somente em design de produção e fotografia. Pensando que o protagonista de O Assassino pode ser inspirado em Fincher e sua relação com o trabalho, seu longa anterior pode ser visto como o ambicioso serviço meticulosamente planejado para ganhar o Oscar, mas que se revelou um tiro que errou o alvo. Este seu novo serviço mira apenas no espectador e acerta em cheio (agora bem que a Netflix poderia se animar e convidar Fincher para fazer uma terceira e última temporada de Mindhunter).
O Assassino (The Killer / EUA - 2023) de David Fincher com Michael Fassbender, Tilda Swinton, Sophie Chartlotte, Charles Parnell, Arliss Howard, Kerry O'Malley, Emiliano Pernía, Gabriel Polanco e Sala Baker. ☻☻☻☻
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