Cine São Luiz no Recife: cinema, nostalgia e história. |
Abrindo nosso #FimDeSemana dedicado aos filmes indicados para uma vaguinha ao Oscar de Melhor Filme Internacional está o elogiado documentário de Kleber Mendonça Filho. O filme chamou atenção quando foi exibido no Festival de Cannes desse ano. A escolha do Ministério da Cultura garantiu ao filme projeção em sua carreira nos cinemas do país e agora ele também pode ser visto na Netflix. Kleber fez um filme bastante pessoal, nutrido diretamente de sua relação com o cinema, seja como espectador ou diretor de filmes. Ele inicia relacionando essa dualidade com o próprio apartamento que cresceu, imóvel financiado junto à Caixa Econômica pela mãe, professora de História, que fez várias reformas para deixar aquele espaço mais parecido com uma casa que servisse de lar para viver com seus dois filhos. Foi nesse espaço que Kleber realizou a maioria dos seus filmes, incluindo O Som ao Redor (2013) e Aquarius (2016), deixando que alguns dos relatos do diretor evidencie as inspirações para ambas as produções. Para além do apartamento, o diretor passa a contar histórias também sobre a vizinhança, ampliando sua lente para os arredores que incluía três grandes cinemas de rua (termo usado para especificar salas de cinema que não eram localizadas em shoppings ou galerias). É proposital que o cineasta, que também assume a narração, por vezes apareça diante da câmera, misture sua história pessoal com os cinemas de sua cidade e, por consequência, com os personagens que gravitaram em torno deles. Passando por projecionistas, donos de cinema estúdios, empresários e heróis locais, Kleber elabora mais do que uma viagem nostálgica, mas uma viagem no tempo que, não por acaso é habitada pelos fantasmas que dão título ao filme. São personagens que estão imortalizados em imagens presentes no longa, mas também destaca registros de acontecimentos, como a exibição de Tora! Tora! Tora! (1970) para militares durante a ditadura ou a construção do cinema para propagar a ideologia de uma Alemanha fascinada por seu führer. Kleber costura as imagens de forma bastante orgânica e fluente, ainda que possa parecer dispersa, a maneira como o cineasta tece suas considerações criam um mosaico pleno de sentidos - que nem sua narrativa monocórdia é capaz de atrapalhar. Algumas de suas reflexões sobre a relação entre cinema, tempo e espaço são muito interessantes, sobretudo quando ressalta a trajetória das salas de cinema como um registro histórico, seja das transformações sociais, dos sucessos de bilheteria, das relações das pessoas com a arte, com status ou poder. Fico pensando se os eleitores do Oscar irão perceber essas nuances na hora de votar no longa, se uma história apresentada como tão particular pode proporcionar uma leitura mais universal de um dos cinco melhores filmes internacionais do ano ou quiçá um dos melhores documentários (categoria que no Oscar possui ainda mais concorrentes por incluir longas de língua inglesa). Por fim, não posso deixar de registrar a curiosa cena final, uma espécie de anedota bem-humorada de que em tempos de culto exacerbado à imagem registrada por câmeras, alguém ainda possa se deixar invisível, ainda que tarde demais após a câmera já tê-lo capturado para a eternidade. Já era, fantasma...
Retratos Fantasmas (Brasil/2023) de Cleber Mendonça Filho com Kleber Mendonça Filho, Maeve Jinkins e Rubens Santos. ☻☻☻☻
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