segunda-feira, 30 de maio de 2011

CATÁLOGO: Entre Quatro Paredes


Wilkinson e Spassek: lar cheio de silêncio e fúria.

Todd Field era um ator que tinha como maior destaque o papel de pianista em De Olhos Bem Fechados (1999) ao lado de Tom Cruise. Eu sei que você não deve se lembrar do rosto dele, mas com certeza deve ter ouvido falar de seus méritos como diretor. Quando lançou Entre Quatro Paredes acho que ninguém esperava tanto sucesso com um drama intimista longo e repleto de silêncios. Claro que ninguém escala atores do porte de tom Wilkinson, Sissy Spacek e Marisa Tomei para deixar tudo passar em branco, mas Field era esperto o suficiente para saber que se tudo desse errado os atores estariam lá para segurar o filme. É exatamente este o maior mérito de Entre Quatro Paredes, seus atores. Field escolheu uma trama cheia de camadas e de alma explosiva, mas sem os atores que escolheu dificilmente o filme teria recebido as preciosas indicações aos prêmios que concorreu. Ainda ajudou muito nessa projeção do longa um acidente doloroso na história americana: os ataques de onze de setembro. O que uma coisa tem a ver com a outra? Eu explico. O filme de estreia de Field conta a história de uma família que busca superar a morte do filho, mas existe muito mais por debaixo disso, especialmente quando pensamos na força de sua trinca principal: o pai (Wilkinson, indicado ao Oscar de ator), a mãe (Spacek, ganhadora do Globo de Ouro e indicada ao Oscar de atriz) e a namorada viúva (Marisa, indicada ao Oscar de coadjuvante). A vítima é o jovem Frank (Nick Sathl, que por motivos desconhecidos nunca decola na carreira) que está cada vez mais apaixonado por Natalie, uma mulher mais experiente, divorciada e com filho para criar após um relacionamento complicado. Frank e Natalie fazem planos para o futuro e são incentivados pelo pai dele, enquanto a mãe não vê com bons olhos aquele relacionamento. A coisa só complica quando o ex de Natalie aparece e obriga a todos conviverem com sua presença agressiva e ameaçadora (cortesia de William Mapother, que vivia dando as caras em Lost), até que o inevitável a acontece e todas as expectativas morrem. É neste momento que o filme mergulha num silêncio, numa cadência arrastada que é propositalmente utilizada para exibir o vazio em que se tornou a vida daqueles personagens. O assassino é preso, mas enquanto o pai tenta seguir a vida naturalmente, a mãe torna-se cada vez mais calada e insatisfeita com os rumos que aquele romance gerou. Spassek torna palpável o silêncio de sua personagem como embalagem para a tensão e o ódio que abriga, nada é capaz de sanar a ausência do filho - e os ressentimentos pelo esposo e a ex-nora virão à tona quando descobrir que o assassino será libertado pelo bom comportamento. É neste momento que a fúria dos pais cresce e acontecimentos imprevisíveis guiam o filme até o final polêmico. Apesar dos maiores elogios terem ido para Spacek na época de lançamento, Wilkinson tem um papel fundamental para guiar nossas emoções até a última e desconcertante cena. O silêncio do quarto rumo ao amanhecer ilusta bem a sensação dos americanos quando viram o filme: um desejo de vingança pelas pessoas perdidas nas Torres Gêmeas. Pena que Field não era (ainda) um mestre na direção, capaz de gerar tensão a cada silêncio e palavra não dita e o que era para ser um crescente suspense melancólico pode se tornar um martírio para alguns. 

Entre Quatro Paredes (In The Bedroom/EUA-2001) de Todd Field com Sissy Spacek, Tom Wilkinson, Marisa Tomei, Nick Stahl e William Mapother. ☻☻    

Ladies & Gentlemen: MARISA TOMEI

A ítalo-americana Marisa Tomei é natural de Nova York, onde nasceu no dia 04 de dezembro de 1964 sendo filha de uma professora de inglês e um advogado. O início da carreira não foi nada fácil tendo participado de produções de gosto duvidoso - como o, hoje clássico, Vingador Tóxico (1985). Com a carreira iniciada em 1984 a coisa quase desandou de vez quando se meteu a fazer a filha de Sylvester Stallone no péssimo Oscar, Minha Filha quer Casar! (1991) pelo qual concorreu ao Framboesa de Ouro. Talvez por tantos tropeços a crítica e o público tenha se rendido à sua atuação em Meu Primo Vinny (1992), onde faz a perua esteticista esposa de Joe Pesci. Em uma atuação impagável, Marisa é peça fundamental no caso estapafúrdio que move a trama, onde num depoimento inacreditável (e quilométrico) ela rouba a cena. Apesar do sucesso e dos prêmios que foram do MTV Movie Awards (e atriz revelação) e o Oscar (de atriz coadjuvante) uma coisa muito estranha aconteceu... jovem e desconhecida do grande público a maldição do Oscar caiu sobre Marisa. Contracenar com Christian Slater em Coração Indomável (1993) não ajudou e sua boa atuação em O Jornal de Ron Howard (1994) passou em branco. Nem adiantou bancar a heroína romântica ao lado de Robert Downey Jr em Só Você (1994) e depois do fiasco de A Família Perez (1995) a atriz buscou refúgio em produções independentes. Algumas modestas e com bom resultado como Escrito nas Estrelas (1995) onde faz a mãe solteira amiga de Gena Rowlands (é o filme mais simpático de Nick Cassavetes) - outras investidas foram espinafradas pela crítica como o episódico Grande Hotel (1995). Entre altos e baixos merece destaque sua pequena e marcante atuação como missionária em Bem Vindo a Sarajevo (1997) de Michael Winterbotton, que dava ideia de que por debaixo da casca de comediante se escondia uma bela atriz dramática. Os estúdios reencontraram Tomei depois de vários anos em Do que as Mulheres Gostam (2000) onde fez uma das coadjuvantes que tem o pensamento lido por Mel Gibson. Sorte que depois daquela palhaçada, Marisa percebeu que a sua vida não era uma comédia e topou participar do filme de estreia na direção de Todd Field. Entre Quatro Paredes (2001) foi uma das maiores surpresas da década passada e cravou cinco indicações ao Oscar (filme, roteiro adaptado, ator, atriz e atriz coadjuvante para Marisa). Ela está perfeita como a namorada de Nick Stahl que acaba gerando o seu assassinato. Pela tristeza de sua atuação, a atriz foi indicada ao Oscar mais uma vez na categoria de coadjuvante e começou a calar a boca dos maledicentes. Talvez para relaxar - e ganhar alguns trocados -ela mergulhou em mais uma punhado de comédias modestas como O Guru (2002), Alfie (2004) e Motoqueiros Selvagens (2007). Mas são nos dramas que Marisa Tomei ganha muitos pontos, basta ver sua atuação como a esposa adúltera de Phillip Seymour Hoffman em Antes que o Diabo Saiba que você está Morto (2007) último filme de Sidney Lumet e O Lutador (2008) de Darren Aronofsky que lhe rendeu outra indicação ao Oscar de atriz coadjuvante (pelo papel da stripper que pisa no coração de Mickey Rourke), por estes papéis, a atriz é constantemente lembrada como uma das mais sexys de Hollywood.  Depois de ter lançado a dramédia Cyrus no ano passado, a atriz está em cartaz com o morno O Poder e a Lei com Matthew McConaghey mas tem boas promessas para lançar. Uma delas é Salvation Boulevard onde divide os créditos com nomes de peso como Jennifer Connely, Pierce Brosnan, Ed Harris e Greg Kinnear numa trama de conotações religiosas. A outra promessa é Amor a Toda Prova estrelada por Steve Carrel, Emma Stone, Ryan Gosling e Julianne Moore. Marisa pode respirar aliviada, com um Oscar na estante e outras duas indicações no currículo não precisa provar mais nada a ninguém.

Meu Primo Vinny: piadas maldosas sobre o Oscar na estante.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

DVD: Cyrus

Hill, Tomei e Reilly: Há um passo dos filmes de terror!

Existem comédias românticas que poderiam muito render verdadeiros filmes de terror. Comecei a pensar nisso quando vi Kate Hudson  fazendo tudo errado com o coitado do Matthew McConaghey em Como Perder um Homem em dez Dias (2003), recentemente Zooey Deschannel virou a garota dos pesadelos de qualquer rapaz apaixonado ao desprezar a afeição de Joseph Gordon-Lewitt em 500 dias com Ela (2009). Outro filme que acaba de entrar para esta lista macabra é Cyrus, comédia romântica independente que tem dois nomes que me chamam a atenção há tempos. Um é John C. Reilly (o qual já detalhei um pouco da carreia aqui) o outro é Marisa Tomei, que parece ficar mais bonita e carismática a cada ano que passa (afugentando de vez aquela piada ofensiva sobre ter ganho um Oscar por engano pelo papel em Meu Primo Vinny/1992). A ideia dos diretores/roteiristas de Cyrus é bem simples: John (Reilly) é um homem divorciado há sete anos e está sensibilizado com  o casamento da ex (Catherine Keener) até que encontra seu par ideal, Molly (Marisa) - bela morena, simpática e divertida. Após uma noite de amor existe a promessa de que um compromisso se aproxima. Poderia ser só mais um filme de homem que encontra a mulher ideal e juntos tentam superar as mágoas que os fizeram amadurecer e blábláblá, mas o filme mete no roteiro um elemento surpresa: Cyrus, o filho dela (o gorducho Jonah Hill, que me surpreendeu num papel sério). Cyrus tem 21 anos, planos de se estabelecer enquanto artista de música eletrônica (embora suas composições mais assustem do que animem) e um relacionamento quase doentio com a mãe. Oops! Acho que falei demais. O fato é que Cyrus, apesar de crescido ainda não cortou o cordão umbilical - e ele nem sente que faz a vida de ambos tropeçar nesta ligação a todo instante. O rapaz tem tanta intimidade com a mãe que no primeiro momento, John fica desconfiado de que pode estar diante de uma relação incestuosa. Depois começa a desconfiar que Cyrus pode estar sabotando o namoro que parecia tão promissor... depois... é melhor eu não contar senão estraga. A ideia de alguém querendo sabotar a relação de um casal não é nova, mas a dupla de diretores consegue injetar originalidade (e muita estranheza) ao colocar um filho crescido como vilão. O filme se aprofunda através das entrelinhas da relação entre os três personagens que precisam andar com as próprias pernas e caminha para um final que não sabemos muito bem qual vai ser (lembre-se é um filme independente).  Jay Duplass e Mark Duplass se arriscam numa direção que pretende ser invisível, atuações naturalistas, câmera na mão, tremidinhas, zooms mal disfarçados e alguns enquadramentos onde vemos o foco se ajustar - beira o documental e traz sensação de que somos penetras naquele universo (que pode ser a casa do vizinho). O fato de ser tão despretensioso em contar a história de pessoas comuns rendeu vários elogios para o filme (e como diria Caetano: de perto ninguém é normal), mas não se surpreenda se daqui há alguns anos aparecer um filme de terror com trama parecida...

Cyrus (EUA-2010) de Jay & Mark Duplass com John C. Reilly, Jonah Hill, Marisa Tomei, Catherine Keener e Matt Walsh. ☻☻☻

DVD: O Garoto de Liverpool


Kristin e Aaron: maiores trunfos na versão adolescente de Lennon.

Penso que Aaron Johnson tem se empenhado em se tornar o astro adolescente mais cool da atualidade (ele completa 21 anos mês que vem). Como se não bastasse ter encarnado o Kick-Ass em pessoa no ano passado, chegou mais tarde aos cinemas outro filme do rapaz com apelo pop inegável. Em O Garoto de Liverpool o rapaz encarna ninguém menos do que John Lennon nos primórdios de sua paixão pela música. Obviamente que o apelo do vocalista dos Beatles é irresitível, seja quando a história lida diretamente com a sua banda (Os Cinco Rapazes de Liverpool de 1994) ou quando arranha em sua história (Capítulo 27 de 2007), isso para não mencionar os filmes estrelados pelo quarteto. Johnson pode não parecer fisicamente com Lennon (olhos azuis? lábios carnudos? bíceps inchadinhos?), mas sua escolha para o papel mostra-se um dos acertos deste filme de Sam Taylor Wood (ao contrário do que parece trata-se de uma mulher e que engatou um relacionamento com Aaron, com quem hoje tem uma filha. Mesmo sendo 23 anos mais velha que o mocinho). O outro acerto (e este de proporções descomunais) foi a escalação de Kristin Scott Thomas para ser a tia controladora do Beatle. Menos do que uma biografia, o filme procura especular as influências que John sofreu para compor a sua persona artística. Logo de início sabemos que foi criado entre a alegria do tio e o controle da Tia Mimi (Kristin) e Wood tem uma capacidade incrível em desvendar essa relação dentro de casa em poucas cenas, já que o tio falece e temos a dimensão exata da educação britanicamente controladora que Mimi obteve e que procura proporcionar ao sobrinho. É nesse período em que a alegria do lar se vai com o tio que Lennon aprofunda o relacionamento com a mãe (Anne Marie Duff). Sua mãe é mostrada como a grande influência para que John canalizasse sua irreverência e ousadia para a música (tanto que a primeira música que Lennon canta foi escrita por ela). Paralela a esta camada familiar o filme conta o início dos Beatles, do momento em que o jovem protagonista percebe que não é um músico tão bom e começa a ter influências da amizade com o jovem Paul McCartney (Thomas Brodie-Sangster que apareceu em Brilho de Uma Paixão e se mostra um ator bem confiável) que se apresenta como um ponto de equilíbrio para o momento de transformação que o rapaz atravessa. O Garoto de Liverpool poderia ser um filme brilhante se mostrasse maior vigor no equilíbrio entre essas inflluências sobre Lennon, mas o resultado consegue ser apenas simpático. Estão lá a resistência aos óculos, a admiração a um ídolo (Elvis Presley), os namoros, as travessuras (como surfar num ônibus), as briguinhas... tudo capaz de causar  identificação na platéria teen, mas parece pouco. As atuações são bacanas (Kristin chegou a estar cotada como coadjuvante nas premiações e o filme quase entrou nos indicados ao Globo de Ouro de comédia/musical), a trilha sonora é bacana e conseguimos ter alguma noção (já que o filme possui muitas fantasias) sobre a pouco falada adolescência de Lennon, mas falta força. Seja como for, o filme cumpre menos do que promete, mas ainda assim consegue ser interessante, principalmente pelas atuações da veterana Kristin e do novato Aaron que procuram dar vida própria ao filme. Obviamente que os fãs vão repudiar (apesar do filme ser baseado nas memórias da mãe de Lennon), os mais xiitas estavam doidos para ver uma história que estavam cansados de conhecer, mas ainda assim, o filme merece uma olhada.

O Garoto de Liverpool (Nowhere Boy/Inglaterra-2010) de Sam Taylor Wood com Aaron Johnson, Kristin Scott Thomas, Anne Marie Duff, Thomas Brodie-Sangster e David Morrissey. ☻☻☻ 

terça-feira, 24 de maio de 2011

CATÁLOGO: Sr & Srª Smith

Jolie e Pitt: os efeitos de uma pipoca no microondas!

Foi só eu que percebi ou mais alguém se deu conta de que enquanto o coração de Brad Pitt chorava ter perdido o prêmio de ator em Cannes (para um galã francês), um dos seus últimos filmes pipoca era exibido na Globo? Pode ser tudo uma coincidência arquitetada pelos astros, mas foi o suficiente para eu ficar gastando meus neurônios em análises sobre o ator. Lembro quando na época de O Aviador (2004) o cara elogiava Leonardo DiCaprio por sua busca de papéis cada vez mais relevantes. Eu sabia que aquela frase marcava um novo rumo na carreira do senhor Jolie. Nos últimos anos o cara se empenhou um bocado para ser considerado um ator respeitado. Foi então que fez Babel (2006 - indicado ao Globo de Ouro de coadjuvante), O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford (2007 - premiado como melhor ator em Veneza), Queime Depois de Ler (2008 - que poderia ter lhe rendido uma indicação ao Oscar de coadjuvante), O Curioso Caso de Benjamin Button (2008 - indicado ao Oscar de Melhor Ator), Bastardos Inglórios (2009 - em que acabou ofuscado pelo desconhecido Christoph Waltz) e Árvore da Vida (que deve lhe render algumas indicações importantes, senão, o primeiro Oscar). Pitt não é bobo, e sabia que após as cenas de ação de Senhor & Senhora Smith e a proximidade dos cinquenta anos (nasceu em 1963) era melhor arranjar ser reconhecido como ator do que apenas dar dinheiro para os estúdios. O que isso tem a ver com Senhor & Senhora Smith? Muita coisa. O filme é uma dessas produções feitas para bombar no verão americano, arrastando multidões para os cinemas e saciar a fome de ver astros bem produzidos, efeitos especiais e cenas de ação de tirar o fôlego. A grande diferença é que em meio a tudo isso o filme tem a sorte danada de contar com um diretor do naipe de Doug Liman (que é muito mais saboroso quando não se leva a sério) e um casal do porte de Brad e Angelina Jolie, ou seja, seres capazes de defender um roteiro bem humorado (mas que beira a bobeira) com muito estilo. O filme acabou criando uma polêmica danada por conta dos boatos do caso entre os dois (na época, como todo mundo sabe, ele era casado com Jennifer Aniston)  que logo se mostrou mais concreto do que as negações diziam. Pois é, estou admitindo que gosto muito do filme e que assisto a todas as reprises a que tenho acesso. A trama sobre o casal de assassinos profissionais que desconhece a profissão um do outro tem momentos muito bem sacados. Obviamente que não prima pela lógica (e sua parte final é um bocado sem desconfiômetro em colocá-los em meio à uma conspiração malajambrada), mas dá para dar boas gargalhadas partindo da premissa batida de que podemos estar casados com um estranho. Imagine em que discutem a relação sem os tiros e temos ali um casal como qualquer outro. Ou então tire a perseguição de carros do momento cheio de revelações que vemos um momento de pura comédia (dá para conter o riso quando ela admite que contratou um ator para ser seu pai no casamento? Ou quando revela que é judia?). Esqueça toda a casca de filme de ação e percebemos que o casal Smith  é responsável por uma das melhores comédias românticas do século XXI! A coisa funciona tão bem que até Jolie parece ser uma boa comediante - não vou nem falar de Brad, já que já teve sua cota de gargalhadas em filmes como Snatch (2000) e os filmes da série Onze Homens e um Segredo. Após ver-se como Sr. Smith (uma gíria inglesa para operário), Pitt deve ter visto que era hora de ser levado a sério e tem enfrentado personagens cada vez mais complexos. Sem dúvida em meio às explosões e o gosto da saborosa pipoca que o filme lembra, Pitt deixou de se contentar com o Globo de Ouro por Os 12 Macacos (1995) e sua única indicação ao Oscar (e mesmo assim de coadjuvante) por este filme. Nessa busca por reconhecimento colabora ainda mais o fato de que na estante de casa tem a estatueta da patroa por Garota, Interrompida (1999). Neste ano, mais uma vez, Pitt quer provar que merece outro enfeite destes em casa, sendo que desta vez quer seu nome gravado nele. 

Sr. & Srª Smith (Mr. & Mrs. Smith/EUA-2005) de Doug Liman com Brad Pitt, Angelina Jolie, Vince Vaughn e Adam Brody. ☻☻☻ 

segunda-feira, 23 de maio de 2011

10+ Cannes 2011

O Festival de Cannes sempre aponta filmes que prometem dar o que falar durante o ano e geralmente lhes dá fôlego até a temporada de Ouro do cinema. Em 2010 foi no Festival que os críticos colocaram primeiro os olhos em Blue Valentine, Biutiful e Trabalho Interno que conseguiram figurar entre as apostas para a cerimônia do Oscar de 2011. Dentre tantos filmes exibidos destaquei dez que devem fazer cinéfilos de todo mundo salivar e ainda dar conta de figurar entre os mais premiados do ano:

10 O Abismo Prateado Podem me chamar de patriota ou cinéfilo tupiniquim deslumbrado, mas fiquei extremamente feliz quando um bando de críticos começou a se perguntar por que o novo filme de Karim Aïnouz (Madame Satã/2002) não foi selecionado para a Mostra Competitiva de Cannes. Muitos consideraram a atuação de Alessandra Negrini irrepreensível e digna de ser lembrada pelo júri. Para nós o filme baseado na canção Olhos nos Olhos de Chico Buarque promete ter um poder ainda mais devastador. O longa conta a história de um casal que chega ao fim da vida a dois. No meio do caminho está o filho de 14 anos do casal e a vontade dela entender o que aconteceu. Tudo é muito marcado pelo não dito, pelas entrelinhas e emoções da personagem. O filme promete fazer bonito quando passar por aqui e - quem sabe - ganhar fôlego em terras estrangeiras.

9 Era uma vez em Anatolia O filme teve uma campanha boca à boca tão poderosa que acabou empatando no Grande Prêmio do Festival (uma espécie de segundo lugar) com o novo trabalho dos badalados irmãos Dardenne (O Menino da Bicicleta não figura na lista por me soar como os outros da dupla). Assinado pelo cineasta turco Nuri Bilge Ceylano filme é baseado em um fato real e opta por um estilo que lembra as narrativas de Tchekov. A trama gira em torno da investigação sobre o aparecimento de um corpo em uma tranquila cidade turca - o que pode ser o indício de um crime. Nada é muito claro para os policiais, o médico e o promotor que acompanham o caso. Por meio do filme o diretor procura provocar uma reflexão muito bem vinda sobre a burocracia, a civilização e a barbárie. Apesar de difícil para a maioria do público, o potencial de um filme assim não deve ser subestimado.

8 We need to talk about Kevin Tilda Swinton era uma das mais cotadas para o prêmio de Melhor Atriz do Festival, mas com as críticas negativas ao filme de Lynne Ramsey sua força foi se perdendo. O filme conta a história de uma família que precisa lidar com o massacre ministrado pelo filho na escola em que estuda. A voltagem da atuação de Swinton e a verve estilística diretora foram muito elogiadas, mas uma pedra no ano de We need é o novo filme de Roman Polanski (Carnage, que deve estrear por aqui com o nome horroroso de O Senhor da Carnificina) que dever ser exibido em Veneza e que também trata de pais com filhos em... conflito com seus coleguinhas. Parece haver um duelo para este ano (e no filme de Polanski, Swinton ainda terá dois pesos pesados para derrotar na disputa por uma vaga em premiações: Jodie Foster e Kate Winslet). Curiosamente o ator John C. Reilly atua nas duas obras!

7 This Must Be the Place O filme do italiano Paolo Sorrentino era um dos favoritos aos maiores prêmios do Festival, mas acabou levando o prêmio de consolação ecumênico do Festival. Apesar de todas as críticas positivas, isso revela mais do que se imagina. O fato de ter Sean Penn com visual de roqueiro vocalista do The Cure deve ter ofuscado os outros predicados do filme sobre um roqueiro judeu cinquentão que resolve se vigar do oficial nazista que maltratou seu pai (com quem não falava há décadas). A pergunta que ficou o ar é se as platéias mais conservadoras vão engolir o filme de temática pesada e apelo pop. Se o pessoal entrar no clima o filme pode ser um sucesso, senão o filme deve virar cult e render indicações apenas para o seu astro nas futuras premiações.

6 Driver O dinamarquês Nicolas Winding Refn já havia chamado atenção em Cannes com sua trilogia Pusher (disponível em DVD por aqui), mas nada se compara ao que o destino preparado para Driver. Pra começar, a trama sobre um motorista (Ryan Gosling) que faz bicos de dublê e serviços para marginais criou uma grande repercussão por se tratar de um filme de ação que mostra uma cadência autoral como há muito não se via no gênero - e o prêmio para o diretor só comprova ainda mais essa sensação. O filme promete fazer bonito entre a crítica e nas bilheterias (o que pode lhe dar fôlego para figurar na memória dos votantes nas premiações). A presença da queridinha Carey Mulligan também deve ajudar.

5 Melancolia Lars Von Trier mostrou que não sabe mesmo controlar a própria língua após as brincadeiras sobre nazismo na coletiva de seu filme. Sorte que o júri do festival era sereno o suficiente para perceber que Melancholia foi uma das raras unanimidades do Festival. A força narrativa da história sobre o fim do mundo anunciado pela colisão de um planeta com a Terra é o motor para um conflito instigante entre o ceticismo, os sentimentos e a ciência. Impossível não se identificar com as angústias de a noiva protagonista que vê os rumos de seus planos alterados pela catástrofe eminente. Por este papel Kirsten Dunst foi lembrada pela atuação precisa (que saiu ilesa das polêmicas de Lars). O elenco conta ainda com Charlote Grainsburg e Kiefer Sutherland e se as pessoas se prenderem às qualidades do filme ele deve ser um dos destaques do ano.

4 Le Havre O filme do finlandês Aki Kaurismaki foi consagrado pela Federação Internacional dos Críticos de Cinema e com isso garantiu uma plataforma de admiradores respeitável para seu filme. Considerado por muitos como uma obra hilariante, o filme retrata a vida de um engraxate que ajuda um menino africano que é imigrante ilegal na região  da Normandia. Além da apreciação da crítica o filme possui outros fatores que devem ajudar em sua carreira mundial: o tom bem humorado numa história comovente, a presença de uma criança no centro da narrativa, um protagonista de trabalho humilde e principalmente retratar uma situação que merece cada vez mais a atenção num mundo globalizado: o tratamento dado aos imigrantes. Vendo essas características em perspectiva acho que La Havre merecia estar até no pódio desta lista!

3 Meia-Noite em Paris Fazia tempo que Woody Allen não era tão celebrado por um filme. Foi em Cannes que Match Point (2005) e Vicky Christina Barcelona (2008) foram predestinados ao sucesso. Algo em maior escala foi anunciado para seu novo longa, uma alegoria sobre o efeito de Paris sobre um escritor vivido por Owen Wilson. Misturando realidade e fantasia o diretor retoma o clima bem humorado e otimista que parecia ter perdido nos últimos anos. Além disso, o filme tem no elenco a primeira dama francesa Carla Bruni e a estrela Marion Cotillard (o que chama ainda mais a atenção dos marmanjos). O longa ainda promete um pouco de ouro na vida de Rachel McAdams (já era mais do que na hora) no papel da namorada de Wilson.

2 A Pele que Habito Filme de Pedro Almodóvar e sempre filme de Almodóvar, né não? Se seus fãs ao redor do mundo já garantem a bilheteria o que dizer do apelo gigantesco de depois de quase vinte anos ele se reencontrar com um de seus astros favoritos: Antonio Banderas. Banderas ainda deve seguir o mesmo caminho de Penélope Cruz (que ganhou o status que tem hoje ao voltar às suas origens almodovarianas em Volver/2006) e reencontrar o rumo de sua carreira no papel de um cirurgião com sede de vingança. Não empolgou? Agora imagina que se trata de um filme de terror! Pelo que se viu em Cannes a maioria amou e poucos odiaram essa investida do diretor. Mesmo assim, o Prêmio da Juventude o considerou o melhor da competição.

1  Árvore da Vida Eu não queria ser óbvio, mas tem como? Pra começar o lançamento de um filme de Terrence Mallick (que em quarenta anos de profissão está apenas em seu quinto filme!!!) já é um evento! Levando em consideração que no elenco existe Brad Pitt sedento de reconhecimento (como o pai dominador) e Sean Penn (como seu filho perdido em indagações no deserto da vida) o interesse cresce ainda mais! Adicione a isso a Palma de Ouro em Cannes, os elogios e as expectativas sobre um filme que não tem medo de falar sobre o sentido a vida e o equilíbrio do universo que e a coisa beira o assustador! Agora, para ficar assustado mesmo, quantas vezes um ganhador da Palma de Ouro estreou por aqui duas semanas depois de ser premiado no Festival? Merece ou não o topo da lista? 

PREMIADOS EM CANNES2011


Árvore da Vida: Pitt sem prêmio, mas ainda no páreo.

Hoje encerrou o Festival de Cannes onde muitas promessas para 2011 surgiram (comento sobre elas em breve) e polêmicas se estenderam mais do que o desejado (Lars Von Trier tropeçando na própria língua e quase estragando a repercussão de seu filme Melancholia), não foi novidade alguma quando Árvore da Vida ganhou o Palma de Ouro do Festival. O filme de Terrence Mallick se confirma como o grande papa-prêmios do ano e promete ter uma carreira muito bem sucedida. O filme estrelado por Brad Pitt e Sean Penn  deve estrear no Brasil na próxima semana.

Palma de Ouro
‘A Árvore da Vida’ de Terrence Malick

Grand Prémio
‘Le gamin au vélo’ de Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne
‘Once Upon a time in Anatolia’ de Nuri Bilge Ceylan

Melhor Atriz
Kirsten Dunst por ‘Melancholia’ de Lars von Trier

Melhor Actor
Jean Dujardin por ‘The Artist’ de Michel Hazanavicius

Melhor Realizador
Nicolas Winding Refn por ‘Drive’.

Melhor Argumento
‘Footnote’ de Joseph Cedar.

Câmara de Ouro
‘Las Acacias’ de Pablo Giorgelli.

Prémio do Júri
‘Polisse’ de Maïwenn Le Besco

Palma de Ouro para Melhor Curta-Metragem
‘Cross’ de Maryna Vroda

Prémio do Júri para Melhor Curta-Metragem
‘Badpakje 46′ de Wannes Destoop

Melhor Realizador Un Certain Regard
‘Be Omid é didar’ de Mohammad Rasoulof

Prêmio Especial do Júri Un Certain Regard
‘Elena’ de Andrey Zvyagintsev

Prêmio de Un Certain Regard
‘Arirang’ de Kim Ki-Duk

Prémio da Quinzena dos realizadores
‘Les géants' de Bouli Lanners

domingo, 22 de maio de 2011

FILMED+: A Vida dos Outros


Mühe: um anjo da guarda inusitado.

Aproveitando que O Turista com Angelina Jolie e Johny Depp está chegando nas locadoras vale a dica de ignorar um dos filmes mais sem graça do ano passado e procurar na locadora A Vida dos Outros, que por incrível que pareça tem o mesmo diretor da presepada estrelada por Jolie/Depp. Florian Henckel Von Donnersmarck ganhou o mundo com este filme alemão que retrata a tensão e a vigilância dos últimos anos da separação alemã, o filme foi logo alçado ao posto de querido da crítica (que o elegeu como o melhor de 2006 e o National Review o considerou o melhor do último 25 anos), do público (o filme custou dois milhões de dólares e arrecadou quase cem milhões ao redor do mundo) e das premiações (ganhou o Globo de Ouro e o Oscar de filme estrangeiro). O segredo para tanto sucesso? O somatório de vários talentos. A começar pelo roteiro primoroso escrito pelo próprio diretor que conta a história de um agente da Stasi (a polícia política da Alemanha Oriental) que recebe a missão de espionar um dramaturgo que é suspeito de ter comportamento perigoso para o regime comunista. O agente especialista Gerd Wisler (o ótimo Ulrich Mühe, que faleceu no ano seguinte ao lançamento do filme) começa a trabalhar com escutas clandestinas na casa de Georg Dreyman (Sebastian Koch) e não demora muito para simpatizar com a vida deste escritor. A intimidade de Dreyman con a namorada, a atriz Christa Maria Seiland (Martina Gedeck), só aumenta a identtificação do solitário Wisler com o seu vigiado. No início, Donnersmarck deixa os diálogos do casal cheio de ambigüidades, a partir da interferência do governo na direção da última peça de Dreyman. Mas é com um desentendimento entre o casal que Wisler começa a se arriscar cada vez mais em sua relação com o casal. Ironicamente é deste ponto em diante que o dramaturgo começa a se arriscar cada vez mais em atitudes contra o regime de seu país - o que dá cada vez mais trabalho para Wisler, que vive o dilema de entregá-lo ou encobrir as provas que possam ser usadas contra ele. É essa relação de  espião/anjo da guarda que aumenta cada vez mais a tensão do filme, que não perde de vista a sensação de insegurança dos personagens de ser alvos da vigilância governamental - podendo se tornar um inimigo do Estado de uma hora para a outra. Além do excelente trabalho de roteiro, o diretor soube escolher muito bem seu trio de protagonistas. Koch ganha nossa simpatia em suas primeiras cenas, conseguindo construir um intelectual sem pose ou glamour (o que contrasta com seus amigos no filme) e que tem sua dimensão humana cada vez mais ressaltada pelo seu romance com a bela e insegura Christa, numa atuação cheia de ambiguidades de Martina Gedeck. Mas quem costura mesmo as relações estabelecidas é a expressão de tensão constante estampada no rosto de  Ulrich Mühe, que consegue prender nosso fôlego em várias cenas onde o perigo é eminente. Ao fim da sessão o diretor se dá ao luxo de estender a narrativa por vários anos, alcançando o fim de seus personagens no mundo sem o Muro de Berlim. O que seria um risco, mostra-se muito valioso quando a narrativa muda seu ponto de vista para o de Dreyman, que nos faz sentir na pele a sensação do horror de ser vigiado sem se dar conta, mas ao mesmo tempo nos faz sentir a grata suspresa de ter um amigo secreto que nos ajudou nos momentos mais cruciais. Espero que Donnersmarck coloque suas ideias no lugar em breve, precisamos de mais filmes que consiga nos transportar para outro tempo e espaço com tanta competência. 

A Vida dos Outros (Das Leber der Anderen/Alemanha - 2006) de Florian Henckel Von Donnersmarck com Ulrich Mühe, Sebastian Koch,  Martina Gedeck e Ulrich Tukur. ☻☻☻☻☻

sábado, 21 de maio de 2011

Combo: Rainhas

5 Sua Majestade, Mrs Brown (1997)  Dame Judi Dench era celebrada como a rainha dos palcos ingleses, mas faltava-lhe a devida atenção nos cinemas. Foi com este drama de época na pele da Rainha Victória do Reino Unido (1819-1901) deprimida com a morte de seu esposo Albert, que ela alcançou a projeção de uma das mais brilhantes atrizes do mundo. Por viver um período tão difíccil desta figura histórica (que ficou famosa justamento pelo luto que justificava sua ausência em eventos públicos) e o momento em que encontra a promessa de um novo rumo em John Brown (Billy Connoly). Ele é encarregado de acompanhá-la cotidianamente e tornas-e amigo da rainha - amizade esta provocadora de escândalo na monarquia. Dench ganhou o Globo de Ouro pelo papel e ainda foi indicada ao Oscar por sua atuação. Vale a pena conferir o filme como sequência do recente A Jovem Rainha Victória (2009) com Emily Blunt no papel título. 

4 A Rainha (2006) Helen Mirren já tinha duas indicações ao Oscar quando finalmente levou sua estatueta para casa por sua personificação assustadora da Rainha Elizabeth II da Inglaterra. A semelhança física entre a atriz e a monarca é acentuada com maquiagem e outros recursos, mas o mais impressionante é como Mirren capta a alma da personagem em meio a um de seus maiores desafios: a morte da princesa Diana. Neste momento o filme de Stephen Frears explora as entranhas de Elizabeth, os efeitos de sua educação na sua construção enquanto líder, suas prioridades e sacrifícios para sempre aparentar força e resistência. Ao mesmo tempo explora como incomodava a forma como Lady Di tinha certo desprezo a toda essa estrutura cuidada com tanto zelo. A Rainha pode não ser estéticamente exuberante, mas a atuação de Helen compensa qualquer deslize.  

3 Elizabeth (1998) A australiana Cate Blanchett surgiu para o mundo neste filme dirigido por Shekar Kapur onde os acontecimentos históricos eram misturados e triturados para dar mais agilidade à trama sobre a rainha Elizabeth I (1533-1603) da Inglaterra. O filme retrata as dificuldades da monarca em meio aos preconceitos em torno de sua coroação (era considerada filha bastarda de Henrique VII com Ana Bolena). No trajeto para manter-se firme, muitos interesses amorosos ficaram pelo caminho - assim como boatos sobre a sexualidade da rainha eram constantes (alguns diziam que morreu virgem, outros que era na verdade um homem...). Apesar de bagunçar os fatos históricos, o filme de Kapur consegue imprimir bom ritmo, belo visual  e clima de conspiração durante boa parte da sessão. Nada mal para a biografia de uma mulher que fundamentou o que seria o Império Britânico, inclusive no campo das artes. O filme acabou rendendo uma sequência em 2007 e fala-se de uma terceira parte a ser rodada em breve.


2 Maria Antonieta (2006) A rainha decapitada da França rendeu o terceiro filme de Sofia Coppola e deu o que falar, já que a diretora apelou para deliciosos anacronismos para retratar sua protagonista como o que realmente era: uma adolescente. A austríaca Marie Antoinette (1755-1793) tinha quatorze anos quando se casou com  Luís XVI - e a vida de rainha na França não era muito fácil. Enquanto Coppola capricha no visual de seu filme (tons pastéis, trilha sonora pop, all star entre os sapatinhos), Kirsten Dunst tem a tarefa de mostrar a rainha decapitada na Revolução Francesa como uma deslumbrada pelo universo ao seu redor (com a ajuda do esposo impagável vivido por Jason Schwartzman - primo de Sofia). O filme foi baseado nos estudos da historiadora Antonia Fraser e causou polêmica ao ser exibido em Cannes, rendendo vaias ao filme. Mas esqueça tudo isso e aprecie um dos filmes de época mais estilosos e originais que já foram feitos.

1 A Rainha Margot (1994) Nenhum filme sobre rainha conseguiu me tirar do sério como esta cineobiografia realizada por Patrice Chereáu. Tudo no filme me impressiona, do visual realista às atuações impressionantes, o tom de tragédia da narrativa... todos estes elementos colaboram para colocar Rainha Margot entre os filmes mais impressionantes da década de 1990. Na França de 1572, os conflitos religiosos seriam minimizados pelo casamento da católica Marguerite de Valois (Isabelle Adjani, estupenda) e o protestante Henri de Navarre (Daniel Auteil). Mal sabia que seu irmão Carlos IX e sua mãe Catharina de Médici (Virna Lisi, premiada em Cannes) estavam planejando o massacre dos convidados protestantes no dia do casamento. O massacre de mais de três mil pessoas ficou conhecido como A Noite de São Bartolomeu.  Entre intrigas e muita libido, Chereáu nos fascina com uma história de amor, sangue e política.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

DVD: A Jovem Rainha Victória


Albert e Victória: Feitos um para o outro num romance de época.

A história da rainha do Reino Unido Victória foi contada pela última vez nos cinemas na pele de Judy Dench no fim da vida da monarca. O filme de Jean Marc Vallée resolve contar o início de sua coroação, um ponto de vista promissor, já que Victória foi coroada aos 18 anos após o falecimento de seu tio Rei William (Jim Broadbent, num tom bem mais agressivo a que estamos acostumados). Esta jovem Vitória é vivida por Emily Blunt que foi até indicada ao Globo de Ouro pela atuação. Ela tenta se impor aos interesses políticos da época, se dividindo entre os planos da mãe (Miranda Richardson, sempre confiável) e o amante ambicioso desta (Mark Strong).Vitória ainda é auxiliada por um democrata tão galante como manipulador chamado Lorde Melbourne (Paul Bettany), o que acaba atrapalhando a promessa de romance com o contido Príncipe Albert (Rupert Friend, mais emocional do que de costume). Estes personagens são as peças da narrativa calcada no roteiro de Julian Fellowes (premiado pelo roteiro de Gosford Park/2000), pena que sua intenção seja mais construir um romance açucarado do que qualquer outra coisa. Tudo no filme é bem feito, a direção de arte é bem cuidada, os figurinos ganharam o Oscar, a fotografia é caprichada... mas toda a trama é tratada com tanta leveza que fica difícil imaginar porque o reinado de Vitória foi tão significativo para o seu país. Expansionismo britânico? Revolução Industrial? Nada disso, o que importa é que Victória foi a primeira mulher a realeza a escolher com quem se casaria! Embora tenha uma intriga política aqui e outra ali, elas nunca são aprofundadas e acabam servindo de pedra no caminho quando o filme quer se render ao romance pudico entre Albert e a soberana. Apesar do esforço de toda produção o filme não decola e o final é um dos mais mornos dos últimos tempos. Há de se parabenizar o elenco, mas devo admitir que tenho minhas ressalvas com relação à Emily Blunt. Quando ela apareceu para o mundo como a secretária enfezada de O Diabo Veste Prada (2006) todos se deliciaram com sua atuação, mas passado alguns anos a moça merece relaxar na tela. Blunt tem talento, mas sempre está fazendo tipos que parecem carregar todo o peso do mundo nas costas. Este aspecto pode cair bem em Vitória, mas deixa a impressão que Blunt é atriz de um tipo só. A atriz parece personificar ambiguidade do filme com perfeição: está densa demais para ser uma heroína romântica de folhetim. Tenho a impressão que sua Rainha Victória era personagem de outro filme. 

A Jovem Rainha Vitória (The Young Victoria/EUA-Inglaterra/2009) de Jean Marc Vallée com Emily Blunt, Rupert Friend, Paul Bettany, Miranda Richardson, Mark Strong e Jim Broadbent. ☻☻☻

segunda-feira, 16 de maio de 2011

DVD: Enigmas de um Crime


Wood e Hurt: O mundo desencantado dos matemáticos.

O título genérico deste filme lançado direto em DVD não ajuda, mas se olhar com atenção existem nomes nos créditos capazes de atrair cinéfilos dedicados a se arriscar. Pra começar a direção é assinada pelo espanhol Alex de La Iglesia - e quem o viu anos atrás numa impagável entrevista no Programa do Jô sabe o estilo bonachão que o cara tem, suas respostas foram bastante coerentes com a linguagem de seus primeiros filmes entitulados de nomes sugestivos como Perdita Durango de 1997 (estrelado por Rosie Perez e Javier Bardem - só o nome já dá vontade de rir) e O Dia da Besta (1995). O diretor se tornou queridinho da crítica com Crime Ferpeito (2004) e Enigmas de um crime é quase uma consequência deste filme anterior. Além de Iglesia, o elenco conta com nomes interessantes como John Hurt, Elijah Wood, Leonor Waitling e o francês Dominique Pinon tornam os créditos deste suspense atraente. Embora baseado num livro argentino, a trama se passa na renomada universidade de Oxford na Inglaterra  e tem seu ponto de partida quando Simon (Wood), um estudante americano chega à renomada instituição com a intenção de convidar um famoso matemático, Arthur Seldon (Hurt) para orientá-lo no doutorado. Quase sem querer hospeda-se na casa de uma senhora (velha amiga deste professor) que mora com uma sobrinha esquisita.Tudo começa com o pé esquerdo quando assiste a uma palestra ministrada pelo matemático e o desentendimento é inevitável - já que o jovem acredita no universo atuando dentro de uma lógica matemática e o professor despreza essa ideia. Apesar disso os dois ainda vão se encontrar várias vezes quando a velha amiga é encontrada morta. O filme tem a ideia interessante de mostrar dois matemáticos tentando desvendar o assassinato (se você lembrou do seriado Numb3rs, eu também...) que aos poucos parece estar ligado a outros dentro de uma lógica aparentemente indecifrável. Mas enquanto o aluno acredita numa lógica universal que pode ser matematizada, o professor, que era contra essa ideia, acaba caindo em contradição ao seguir pelo mesmo caminho. Desista de ficar entendendo as várias citações filosófico-matemáticas que transbordam do roteiro, tudo parece estar ali para confundir e Iglesia por pouco não padece em motivar que nossas suspeitas caiam sobre cada personagem que aparece na tela - o que envolve até uma bela enfermeira (Waitling) que é cobiçada pela dupla de matemáticos. Apesar das reviravoltas e dos enquadramentos interessantes o filme promete mais do que cumpre. Iglesia sempre foi famoso pelo seu deboche e aqui ele parece engessado, sério demais. Embora o motor de seu filme seja uma crítica contundente ao pensamento da ciência moderna, seu fim mostra claramente que a realidade é menos lógica e mais moldada pelas interações de acordo com a vontade de quem a observa. Essa premissa aparece na primeira cena, num dos melhores momentos do veterano Hurt em cena, mas se perde nos caminhos que o roteiro e o diretor seguem a partir de então. O filme ainda causou certo alvoroço por ter Wood em cenas picantes com Leonor, especialmente por uma falada cena com espaguete -mas esta tem menos erotismo do que humor.  O filme é todo assim, quando deveria ser romântico é cômico, enquanto deveria ter mais suspense, se recheia de curiosidades matemática. Pode até funcionar em alguns momentos, mas depois começa a parecer uma simples tabuada repetida à exaustão quando já aprendemos que dois e dois são quatro.

Enigmas de um Crime (The Oxford Murders/França-Espanha-Reino Unido-2008) de Alex de La Iglesia com Elijah Wood, John Hurt, Julie Cox e Leonor Waitling. ☻☻

domingo, 15 de maio de 2011

CATÁLOGO: O Mensageiro


Harrelson e Foster: missão ingrata.

Demorei um bocado para pegar este filme na locadora, mesmo com suas indicações ao Oscar de coadjuvante (Woody Harrelson) e roteiro original, faltava-me um pouco de estado de espírito para ver mais um filme sobre a mal-fadada invasão dos EUA no Afeganistão. O Mensageiro ainda tem em no seu currículo o prêmio de melhor roteiro em Berlim2008 e em algumas premiações independentes. O filme tem como ponto de partida um dos trabalhos mais tristes do mundo: ser mensageiros que comunicam aos parentes mais próximos os falecimentos do front. O roteiro segue dois oficiais responsáveis por esta ingrata tarefa, sendo que além de ter que lidar com o desespero das famílias ainda precisam exorcisar seus próprios fantasmas. Aos poucos descobrimos que o capitão Tony Stone (Woody) tem problemas a vencer com o álcool e que seu parceiro, o sargento Will Montgomery (Ben Foster), precisa lidar com as contradições de seu título de herói de guerra. Will é o verdadeiro protagonista da trama, na sua inadequação na volta para a casa, a necessidade do barulho furioso é compensado com toneladas de rock pesado, mas o noivado de sua antiga namorada (Jena Malone em seu primeiro papel adulto) não ajuda muito. Não bastasse essas mazelas pessoais, Will ainda tem que lidar com a tristeza própria de seu trabalho e seu interesse por uma das viúvas a quem dá a nota de falecimento do esposo - e o fato dela ser feita por Samantha Morton sem medo de parecer normal facilita muito compreender a conexão estabelecida entre os personagens. No entanto, o filme não pretende ser um romance, mas um olhar sobre a vida desses dois oficiais - por isso o diretor abusa de detalhes sobre o procedimento da tarefa, usa muita cena de "câmera na mão" para criar um clima quase documental, cria situações diferentes no momento que as famílias recebem a derradeira notícia e outras cenas que tem como único objetivo mostar que apesar do estranhamento inicial, Tony e Will parecem dois amigos de infância tentando crescer. Apesar do esforço em contar uma história realmente original o roteiro mostra-se muito irregular, tentanto equilibrar fortes simbologias (como a aliança da viúva, a identificação com os parentes das vítimas) com fraquezas ao aprofundar os conflitos éticos de Will ao envolver-se com a mulher fragilizada e desvios nem sempre necessários (a surra nos adolescentes no rio, a brincadeira no estacionamento...). A narrativa sempre acaba tropeçando. O diretor Oren Moverman (que também assinou a escrita de Não Estou Lá com Todd Haynes) tem boas intenções neste olhar diferente sobre a guerra, mas precisa aprender algumas manhas em contar uma história. Ainda assim, vale conferir Harrelson num papel sério depois de tanto tempo em participações especiais em todo quanto é tipo de filme. Desde suas indicações aos prêmios de O  Povo Contra Larry Flynt () ele não abraçava as ambiguidades de um personagem com tanto gosto. Samantha Morton também consegue atribuir uma força grandiosa num papel pequeno, sendo a atriz certa para destacar uma personagem que poderia ser facilmente apagada. A fragilidade acaba sendo Ben Foster, que já provou ser um bom ator, mas que de vez em quando cai no exagero.

O Mensageiro (The Messenger/EUA-2008) de Oren Moverman, com Ben Foster, Woody Harrelson, Samantha Morton, Jena Malone e Steve Buscemi. ☻☻☻   

FILMED+: Minha Vida de Cachorro


Ingemar: "Tem algo errado com esse amiguinho..."

O Cineasta Lasse Hallström foi descoberto pelo mundo quando lançou Minha Vida de Cachorro, um filme simples e comovente sobre um menino sueco que vai morar com os tios quando a mãe adoece no fim da década de 1950. Toda a graça do filme está na leveza e na forma poética como o diretor trata temas corriqueiros do cotidiano, tudo flui com naturalidade como se fossemos parte daquela cidadezinha em que Ingemar (o irresistível Anton Glanzelius, de 12 anos) vai morar. O roteiro é baseado no livro de Reidar Jonsson) e ganha esse título em português devido as comparações que o menino faz de sua vida com a cachorrinha Laika, que foi mandada para o espaço e acabou morrendo de fome. Perceba  a sensação de solidão e inadequação que esta situação traz e você terá ideia do que o filme realmente trata. Sua mãe aparenta estar cada vez mais nervosa que o recomendável e decide mandar seus dois filhos para casa de parentes diferentes. Ingemar é enviado para a casa dos tios numa cidadezinha bucólica onde tudo parece girar em torno de uma fábrica de vidro.  Obviamente que tudo no filme é contado a partir da ótica de seu pequeno protagonista  e os maiores acontecimentos nas redondezas acabam ficando por conta das brincadeiras que as crianças inventam. Seja o joguinho de futebol com os amigos, as conversas com um velhinho excêntrico que guarda catálogos de lingerie no quarto ou o malfadado experimento espacial preso à uma corda... tudo exala ao mesmo tempo melancolia e alegria. Além do relacinamento de Ingemar com os adultos que o cerca (que além dos tios e do velhinho ainda inclui uma loura que posa para um artista) o pequeno ainda irá descobrir o amor por uma coleguinha andrógina do time de futebol (Melinda Kinnaman) que é uma graça (e que se faz de durona para não ser feita de boba pelos meninos locais. É nesta relação amorosa infantil que o filme consegue alcançar alguns de seus momentos mais delicados e divertidos (como quando duas meninas disputam o coração de Ingemar e ele começa a... latir). Apesar de toda sua leveza e formato irresistível o filme aborda temas complicados, como a morte, a solidão e a descoberta da sexualidade a partir da vida de uma criança que vive refletindo sobre o peso da vida. Hallström teve muita sorte em escolher o elenco certo para defender uma galeria de personagens curiosos que nunca caem na caricatura (como os casal de tios gente boa do menino, cortesia de Tomas von Bromssen e Kicki Rundgren),  além de ter um protagonista irresistível como o pequeno Anton para estrelar esta obra-prima. Pelo olhar terno sobre o cotidiano o filme concorreu ao Oscars de direção e roteiro e serviu para que Hallström carimbasse seu passaporte para Hollywood (e fizesse o irmão direto deste filme: Gilbert Grape/1993) mas sabia que dificilmente repetiria a deliciosa atmosfera deste filme inesquecível que ganhou mais de uma dezena de prêmios internacionais. Para os brasileiros o filme ainda tem um atrativo ainda maior, já que o tio de Ingemar é fã do Brasil (do futebol ao samba).

Minha Vida de Cachorro (Mit liv som hund/Suécia-1985) de Lasse Hallström com Anton Glanzelius, Anki Liden, Manfred Serner, Melinda Kinnaman, Tomas von Bromssen, Ing-Marie Carlsson e Kicki Rundgren. ☻☻☻☻☻

CATÁLOGO: O Vigarista do Ano


Gere e Delpy: roteiro interessante se perde no adultério.

O sueco Lasse Hallström é reponsável por alguns dos filmes mais bonitos que eu já assisti (Minha Vida de Cachorro/1985, Gilbert Grape/1993, Regras da Vida/1999), mas nos últimos anos tem se dedicado a filmes menores que o seu talento (Sempre ao seu lado/2009, Querido John/2010). Seu último lampejo dos velhos tempos está neste O Vigarista do Ano, que poderia ter  figurado nas grandes premiações se a coisa não fosse se tornando cada vez mais aguada pelo meio do caminho. A premissa é muito promissora ao contar a história real de um escritor, Clifford Irving (a melhor atuação de Richard Gere) que  em meados da década de 1970 tenta se consolidar no mercado editorial com um livro que todos querem vender: a biografia do milionário excêntrico Howard Hughes (aquele mesmo que Leo DiCaprio fez em O Aviador de Scorsese). O grande problema é que  o livro não existe. Clifford se aproveita do fato de Hughes viver isolado do mundo com seu transtorno obsessivo compulsivo e não se comunicar com ninguém para forjar sua obra. No início o filme é muito bem resolvido, mostrando o momento em que Clifford vê brotar em sua mente a ideia do livro além da pesquisa que faz para realizá-lo da forma mais autêntica possível - para driblar os desconfiados, simula entrevistas com o milionário e aumenta sua mentira gradativamente com a ajuda do amigo Duck Suskind (o sempre confiável Alfred Molina, com quem o diretor já trabalhara em Chocolate/2000). O roteiro espertamente apresenta as diferenças entre os dois a partir de seus projetos, enquanto o de Clifford é uma farsa, Suskind pretende escrever a biografia de Ricardo Coração de Leão para crianças. Comprometido com a realidade dos fatos, Suskind sabe até o que fazer com a violência da história, mas tem problemas na parte da sodomia da História... Enquanto Clifford e Suskind se metem em enrascadas para conseguir material para o livro, a narrativa segue num ritmo crescente de tensão e ironia com a suspeita cada vez maior de que Cliff é um vigarista. O problema é que quando o filme chega em sua metade tudo vai perdendo o ritmo e a energia - justamente na parte que o filme poderia destrinchar sua alma: o fato de acreditar-se tanto numa mentira que ela acaba se tornando uma verdade. Quanto mais mergulha na vida do milionário excêntrico, o próprio Clifford parece estar ficando louco ao contruir para si uma afinidade com Hughes que na verdade é uma ilusão. Cliff ainda Julga ser  perseguido por agentes de Hughes que pedem para que coloque em sua obra revelações sobre o financiamento da campanha de Nixon, mas será que isso é verdade? E a repercussão que isso traria? Neste ponto, ao invés de mergulhar nas paranóias de seu protagonista, o filme começa a explorar cada vez mais a vida adúltera de Clifford. Hallström começa a perder cada vez mais tempo com a relação do personagem com sua esposa (uma Marcia Gay Haden loura) e a amante (a francesa Julie Delpy, num papel que perde cada vez mais a graça) e esquece do que mais interessa ao seu roteiro. Quando volta seu foco para o que importa já estamos desanimados e não importa o esforço de Gere (que poderia até ter sido lembrado nas premiações por sua performance) e seus editores vividos por Hope Davis e Stanley Tucci, o filme já desandou. Quando o escândalo se instaura a tensão já desapareceu e só nos resta ver a previsível punição de Clifford - não só com a justiça, mas também com as pessoas que se relacionavam com ele. No fim das contas Hallström entrega um filme pior do que o prometido, mas que ainda possui lampejos do poder de sua força narrativa. Jamais pensei em dizer isso, mas o filme vale mesmo pela atuação de Gere com o cabelo mais infeliz de sua carreira.     

O Vigarista do Ano (The Hoax/EUA-2006) de Lasse Hallstöm com Richard Gere, Alfred Molina, Hope Davis, Stanley Tucci, Marcia Gay Haden e Julie Delpy. ☻☻

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Ladies & Gentlemen: Maggie Gyllenhaal


Margareth Ruth Gyllenhaal nasceu em 1977 na cidade de Nova York e se consolida cada vez mais como uma das atrizes mais carismáticas do repertório de Hollywood. Além de ser filha do diretor Stephen Gyllenhaal  e da roteirista/produtora Naomi Foner, também é a irmã de Jake Gyllenhall. Mesmo assim, a moça deve ter achado que havia poucos talentos na família e acabou casando com o ator Peter Sarsgaard em 2006. Apesar de ter participado de grandes produções nos últimos anos, foi no cinema independente que Maggie conseguiu seus melhores papéis. Ela estreou no cinema aos quinze anos e participou de algumas produções televisivas. As coisas começaram a melhorar depois que participou da comédia Cecil Bem Demente (2000) do papa trash John Waters. O papel era pequeno, assim como de seu filme lançado no mesmo ano seguinte, Os Garotos de Minha Vida (2001) estrelado por Drew Barrymore. Destaque mesmo recebeu quando interpretou a irmã mais velha de seu mano Jake no cult Donnie Darko (2001) de Richard Kelly. Embora os papéis pequenos continuassem aparecendo, os convites começaram a vir das mãos de diretores importantes como Spike Jonze (Adaptação/2002) e George Clooney (Confissões de uma Mente Perigosa/2002). Diante de tantos personagens simpáticos, foi uma grande surpresa quando aquela atriz de sorriso meigo e olhos grandes apareceu na pele da masoquista Lee Halloway em Secretária (2002), filme que lhe rendeu uma indicação ao Globo de Ouro e convites para papéis mais expressivos. O papel era tão complexo (e incômodo) que sua atuação no ano seguinte em O Sorriso de Mona Lisa (2003) - estrelado por Julia Roberts - parecia claramente um desperdício. Foi depois das ousadias do filme de Stephen Shainberg que apareceram os papéis no engenhosos Mais Estranho que a Ficção (2005) de Marc Foster e como a autora de livros infantis em crise de relacionamento em Totalmente Apaixonados (2005). Talvez pelos papéis de moças comportadas ela precisasse estravazar seu lado mais obscuro em SherryBaby (2006). O filme permanece inédito no Brasil com a história de uma ex-presidiária que tenta reconquistar a filha enquanto lida com sua vida sexual conturbada e as drogas. Se o filme tinha tudo para descambar para o melodrama, Maggie consegue fazer do filme algo comovente e honesto com mais uma atuação indicada ao Globo de Ouro. Depois de participar de um dos episódios de Paris, eu te amo (2006), dublar a babysitter de A Casa Monstro (2006) e enfeitar As Torres Gêmeas (2006) de Oliver Stone, a atriz substituiu Katie Holmes como a amada de Batman em O Cavaleiro das Trevas (2008). Em 2009 ela topou o papel que lhe rendeu a primeira indicação ao Oscar de sua carreira. Em Coração Louco (2009) ela é Jean Caddock, jovem jornalista que arrisca um romance com um cantor de música country que tenta colocar a vida nos eixos. Sua parceria com Jeff Bridges foi lembrada pela Academia na categoria de coadjuvante. Neste ano ainda teve uma pequena participação no filme mais ignorado de Sam Mendes, o curioso Distante Nós Vamos, que mostra um retrato dos EUA a partir de um casal que pretende comprar uma casa.   Ano passado Maggie apareceu nas tela como a mãe interiorana dos pirralhos de Nanny McPhee e as Lições Mágicas (2010). Mas depois de tantos papéis caretas ela cavou uma vaguinha no filme sobre a criação acidental dos... vibradores! O filme deve estrear ainda neste ano com o sugestivo nome de Hysteria.  


SherryBaby: segunda indicação ao Globo de Ouro.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Catálogo: Secretária


Spader e Maggie: o amor entre uma masoquista e seu chefe sádico.

Chega a ser estranho saber que a doce Maggie Gyllenhall chegou ao estrelato com um filme independente tão esquisito como Secretária. O filme de estreia de Steven Shainberg é uma ode a uma espécie de amor incomum que prefere ficar escondido a ser tratado como perversão. Devo admitir que é preciso um bocado de coragem para escrever e dirigir um filme sobre o romance entre uma masoquista e um sádico, especialmente se você notar que quem gosta de sofrer é a mulher enquanto o homem é o dominante na relação. Mas quem tiver um olhar atento a esta ousadia verá que a relação que descreve está longe de ser tão linear ou simples - mas afinal de contas, qual relacionamento amoroso consegue ser simples? Apesar de muitos considerarem Secretária uma comédia romântica, ele está milhas longe de ser igual a todos os outros filmes que você já viu (e por isso mesmo, merece ser conferido). Desde o início sabemos que a jovem Lee (Maggie Gyllenhaal, indicada ao Globo de Ouro de Melhor Atriz) esconde por debaixo de todo seu visual conservador alguns segredos. Sua primeira cena é saindo de uma instituição psiquiátrica e nas seguintes parece apenas uma sombra dentro de sua própria família. Desajeitada e com roupas que cobrem todo o seu corpo, Lee guarda seus segredos dentro de um estojo de primeiros socorros, que ironicamente utiliza para se ferir. É como se a dor a fizesse se sentir viva por alguns instantes (tal como os machos que se esfolam em Clube da Luta de David Fincher). Até que ela resolve procurar emprego e consegue trabalho no escritório de um advogado exigente, E. Edward Grey (James Spader) que prefere que seus documentos sejam datilografados e não digitados. Não demora muito para que este mostre seu lado tirano sobre os erros de Lee e aos poucos testa os limites da mocinha - que logo exibe seus segredos quase que acidentalmente. A estranheza do filme de Shainberg brota justamente no momento em que o romance se instaura entre o casal. Nada de beijinhos e declarações de amor, pelo menos não da forma convencional. Conforme Grant percebe que sua secretária de olhos meigos e sorriso tímido sente prazer na dor, começa a liberar cada vez mais seu lado sádico. Mas enquanto ele se envergonha, Lee se mostra cada vez mais confiante do que quer para si. Apesar de Shainberg exagerar nas cores de seus filme (os cenários e as roupas são meio cafonas e em alguns momentos tudo parece meio pateta demais) ele acerta justamento no mais difícil: a identificação complementar entre o casal principal. Para isso, Shainberg utiliza jogos de sedução bizarros (uma carta de amor para ele - que é na verdade uma minhoca -, as cartas com erros de datilografia emolduradas pelo escritório, dias de desprezo do amado ou greve de fome por ele...) que não chamam mais atenção do que outras simbologias muito mais interessantes (a mudança no visual de Lee, a compulsão de Grant por exercícios físicos quando fica excitado,  o excesso de zelo por parte da mãe de Lee...). Até o momento em que Lee tem que decidir entre a vidinha normal com seu noivo (Jeremy Davies) - que menciona também ter problemas nervosos, mas que está tão empenhado em ser um bom moço que na melhor das hipóteses consegue ser apenas chato - e uma vida de realização ao lado de um homem que realmente a entende (e vice-versa). Maggie personifica as angústias de sua personagem de forma magistral, com os ombros curvados e a expressão de quem está cada vez mais disposta a desafiar o desconhecido.  Talvez os maiores elogios tenham sido para a triz por que este é o terceiro papel de gostos sexuais diferentes feito por Spader, o ator com cara de bom moço já filmou suas parceiras em Sexo, mentiras e Video Tape (1988) e teve fetiche por acidentados de carro em Crash - Estranhos Prazeres (1996). Nesse gosto por desejos diferentes ele tem identificação com Shainberg, que explorou outro amor diferente em A Pele (2006) que não conseguiu metade da projeção alcançada com este aqui. Talvez porque mesmo num filme sobre sadomasoquismo ele consiga alcançar momentos de puro romance.  

Secretária (Secretary/EUA-2002) de Steve Shainberg com Maggie Gyllenhall, James Spader, Jeremy Davies e Amy Locane. ☻☻☻

domingo, 8 de maio de 2011

Nada a Declarar: Nicole Kidman

Já está em cartaz nos cinemas do Brasil o drama Rabbit Hole, ou melhor Reencontrando a Felicidade (outro nome vergonhoso!) que colocou Nicole Kidman novamente no páreo das premiações após anos de desprezo. Sei de todas as críticas que Nicole recebeu por conta de seu uso de botox, mas sempre considerei que a loura se empenhou a fazer filmes interessantes, pena que nenhum deles fizeram sucesso desde que ganhou o Oscar por As Horas. Depois de viver Virginia Woolf uma maldição parece ter caído sobre Nic, nenhum de seus filmes alcançou sucesso de bilheteria (nem Rabbit Hole, que custou cerca de 5 milhões e não arrecadou nem 3 milhões), mas sinceramente eu não fico medindo a qualidade de filmes pelos dólares que rendem aos seus produtores. Acho que esse também é o lema de Kidman e por isso lhe dedico esta singela homenagem aos filmes que estrelou nos últimos anos:

Cold Mountain: indicada ao Globo de Ouro

Os ambiciosos: Depois do Oscar Nicole Kidman foi convidada para projetos ambiciosos que almejavam concorrer aos maiores prêmios do cinema. Infelizmente não foi bem assim, Cold Mountain (2003) por exemplo era o favorito ao Globo de Ouro e esperava fazer bonito no Oscar, mas teve que se contentar em ver os maiores elogios indo para Renée Zellwegger por seu papel de tagarela do interior americano. Nic ainda teve que driblar os boatos de que teve um caso com Jude Law durante as filmagens. A coisa não foi muito diferente com Revelações (2003) onde aparece desglamourizada tendo um caso de amor com Anthony Hopkins sob a batuta ilustre de Robert Benton e o musical Nine (2009) que é cheio de estrelas (Kidman, Sophia Loren, Judy Dench, Penelope Cruz, Daniel Day Lewis, Kate Hudson...) mas é desinteressante até o osso. Outro filme que se encaixa aqui é Austrália (2008) de Baz Luhrman que não encontrou seu público ao contar um romance em meio a fatos históricos importantes da história do país.

Dogville: comendo o pão que Lars Von Trier amassou.

Os audaciosos: Nicole não tem medo de se arriscar, sendo assim depois do Oscar por As Horas topou sofrer nas mãos e Lars Von Trier em Dogville (2003), onde interpreta a misteriosa Grace que se esconde numa cidade miserável no interior dos Estados Unidos e sofre todo tipo de agressões físicas e psicológicas. Mas na cidade do cachorro chamado Moisés quem morde por último morde pior. Além do trabalho ousado com Trier, Kidman se rendeu à estética de Johnatan Glazer para viver a viúva Anna que é perturbada com o assédio de um menino que diz possuir o espírito de seu marido em Reencarnação (2004). Pelo papel foi merecidamente indicada ao Globo de Ouro.  Nicole ainda topou encarar o humor negro de Noah Baumbach como a (perfeita) irmã antipática de Margot e o Casamento (2007) e encarou as bizarrices de  Steven Shainberg em A Pele (2006) onde fez par com Robert Downey Jr - numa biografia fantasiosa da fotógrafa Diane Arbuss. Rabbit Hole (2010) se encaixa aqui ao ser uma adaptação da prestigiada peça ganhadora do Pulitzer (mas desta vez foi Nic que escalou o perigoso John Cameron Mitchell para dirigir). Nesta categoria que se encontra os melhores filmes da atriz que utilizou seu prestígio para dar projeção a projetos difíceis para o grande público. 

A Feiticeira: feitiço sem química com Ferrell.

As pipocas: Nicole não deu sorte nem quando se rendeu aos filmes comerciais. Acho que os diretores confiaram tanto no taco da atriz que esqueceram de lapidar melhor os seus projetos. Um exemplo é A Feiticeira (2005), uma comédia romântica baseada no delicioso seriado e que teria forte apelo entre a mulherada se não tivesse Will Ferrell (feioso e bobo, assumindo o papel que era de Tom Hanks!!!) como par romântico. Só Norah Ephron deve achar o cara interessante para o papel de galã. Antes ela teve o tropeço de Mulheres Perfeitas (2004) do expert em comédias Frank Oz que não soube o que fazer com o bom material que tinha nas mãos e depois caiu outra vez com A Intérprete (2004) dirigido por Sidney Pollack e estrelado ao lado de Sean Penn, dizem que o roteiro teve problemas desde o início e isso é visível na tela.  As coisas não foram melhores na enésima versão de Invasores de Corpos, agora batizado somente de Invasores (2006) e a adaptação de A Bússola de Ouro (2007) que teve a trilogia cancelada por conta do fiasco nas bilheterias. Nem o Oscar de efeitos especiais ajudou.

Winslet em O Leitor: "Valeu Nic!"

Ficaram pelo caminho: Com tantos problemas na bilheteria Nicole deixou para trás algumas propostas que fizeram sucesso nas bilheterias e que até renderam prêmios para quem ocupou seu posto nos créditos. Em Carne Viva (2003) rendeu os últimos elogios da carreira de Meg Ryan, já que Nicole desistiu de atuar como a professora solitária que é asseadiada por um psicopata. A amiga Naomi Watts foi premiada em Veneza e indicada ao Oscar quando aceitou o papel por indicação de Nicole no 21 Gramas (2003) de Alejandro Gonzalez Iñarritú. Cate Blanchett também deve ter agradecido quando Nicole largou o papel de Katharine Hepburn em O Aviador (2004) para pagar mico em Mulheres Perfeitas. Blanchett acabou ganhando o Oscar de coadjuvante pelo papel. A melhor mesmo levou Kate Winslet, que foi para casa com o Oscar de atriz por O Leitor (2009) - depois que Nicole deixou o papel de analfabeta nazista porque estava grávida.  Mas nem tudo foi ruim nessas desitências, depois do Oscar por As Horas, Nicole foi convidada para ser Mulher Gato (2004) e quem acabou pagando mico foi Halle Berry.