Craig: de volta às origens.
Antes de se tornar o primeiro James Bond louro da história, Daniel Craig construiu uma sólida carreira nos palcos londrinos e em produções independentes do cinema inglês. Já é famosa a anedota em que ao receber o convite para ser o novo 007 ligou perguntou para Spielberg (que acabara de o dirigir em Munique/) e perguntou se após encarnar o agente ainda teria chance de ser convidado para fazer algum filme spielberguiano. Embora Spielberg dissesse que sim, Craig sabia que ao encarar uma grande produção sua carreira nunca mais seria a mesma. Entre os dois filmes da série Bond, o loiro arranjou tempo para voltar aos velhos tempos e fazer um filme independente, modesto e que mostrasse aos seus novos fãs que era um ator que sabia mais do que distribuir tiros e pancadas. Embora o sucesso de Reflexos da Inocência tenha sido mínimo, o filme serviu de refresco para o ator esquecer a pressão de carregar um blockbuster nas costas. A trama é desenvolvida sem grandes surpresas, às vezes abusa dos clichês e do melodrama, mas é um filme a que se assiste sem esforço e com alguma simpatia. Craig é Joe Scott, um ator hollywoodiano em decadência e em meio à tríade sexo, álcool e drogas parece ter esquecido o que um ator tem que fazer. Fora isso, os efeitos do tempo começam a comprometer a sua estampa de galã. Essa parte é uma clichezada só, mas Craig faz tudo direitinho, especialmente depois que descobre que seu melhor amigo de infância faleceu e sua vida parece ganhar um enorme ponto de interrogação em que se pergunta em que momento as coisas saíram do eixo. Então o filme segue pelo convencional caminho do flashback e o verdadeiro protagonista aparece, o jovem ator Harry Eden (que mesmo visivelmente tingido deve se parecer um bocado com o astro quando era jovem). Em suas desventuras juvenis ao lado do amigo Boots (Max Deacon), seu flerte com uma mulher casada e com uma adolescente (que curte cultura pop tanto quanto ele) é onde o filme se concentra com maior vigor. As coisas caminham de forma previsível (tirando uma luta com Boots em que eu pensava que Joe levaria a melhor) até que uma tragédia muda a vida de Joe Scott, ao ponto dele abandonar aquele vilarejo à beira da praia e procurar novos rumos. Craig volta na última parte para amarrar algumas pontas que ainda ficaram pendentes no destino de seu personagem - sendo auxiliado mais uma vez pelo bom elenco de apoio que conta com Claire Forlani e Olivia Williams (que interpreta sua mãe em ambos os tempos) e embora não seja memorável (e me lembre um bocado uma dezena de outros filmes) é um filme bem feitinho, sem ousadias (menos com algumas cenas de sexo desavergonhadas aqui e ali), com trilha sonora nostálgica (que abusa de Roxy Music) e que com certeza teria uma carreira ainda mais modesta sem o apoio do agente 007 - que alcança mais uma atuação convincente, quando poderia se acomodar e ser apenas mais um brucutu de filmes de ação.
Reflexos da Inocência (Flashbacks of a fool/Reino Unido-2008) de Baillie Walsh com Daniel Craig, Harry Eden, Olivia Williams, Mark Strong e Claire Forlani. ☻☻