sexta-feira, 30 de novembro de 2018

N@ Capa: Nighthawks


Edward Hopper nasceu nos Estados Unidos no ano de 1882 e faleceu em 1967. Em vida ficou famoso como pintor e artista gráfico que se especializou em retratar a solidão da contemporaneidade em suas obras - seja utilizando cenários urbanos e rurais. A obra mais famosa de Hopper, a cultuada Nighthawks (ou "Gaviões da Noite") se tornou uma das obras mais reconhecidas da arte estadounidense. Reza a lenda que Hopper começou a pintá-la logo após o ataque a Pearl Harbor (7 de dezembro de 1941) e a tristeza que sentia ao seu redor foi retratada na obra com rua vazia e algumas pessoas conversando dentro do restaurante, aparentemente desamparados em seus pensamentos. Alguns meses após finalizar a obra, ela foi vendida para o Instituto de Arte de Chicago e permanece lá até hoje. A capa que ilustrou o blog nos meses de outubro e dezembro foi uma espécie de coletânea sobre paródias da obra de forte apelo na cultura pop. Existem inúmeras paródias na internet, vale procurar:


"Nighthawks" de Edward Hooper


Versão Clube dos Cinco.


Se o Flash abrisse uma lanchonete e recebesse a Liga da Justiça?


O pessoal de O Grande Lebowski também curte a noite... 

... e o povo de Star Wars também se confraterniza por lá!


Para onde fogem os coelhos do Império dos Sonhos de David Lynch.

Quando abriram uma filial dentro da U.S. Enterprise.




Dean, Bogart, Marilyn e Elvis se reencontram.


Homer saboreia as últimas rosquinhas do dia!


Onde os robôs bebem o melhor óleo da cidade!

HIGH FI✌E: Outubro / Novembro

Cinco filmes vistos em outubro e novembro que merecem destaque:

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PL►Y: Simplesmente

Lau e Kross: as dificuldades de cada um. 

A cinematografia alemã está entre as mais interessantes do mundo, mas é cada vez mais raro ver uma produção germânica chegar aos cinemas brasileiros. Fica ainda mais difícil no caso de um filme que não fez sucesso em Festivais, premiações ou que a crítica não se importou muito. O despretensioso Simplesmente é um destes casos, ainda que a produção esteja bem longe de ser um filme ruim, ela pertence a um gênero que o os críticos começaram a chamar pejorativamente de feel good movie - aquele tipo de filme que mistura drama e comédia, sem muita surpresa e que você sabe que no final tudo dará certo numa cartilha de realismo fantasioso. O filme conta a história de dois irmãos, o primogênito Ben (Frederick Lau) e o caçula, Simpel (David Kross) que aos vinte e dois anos tem o pensamento de uma criança. Os dois vivem com a mãe doente, mas quando esta falece, Ben considera que irá cuidar do irmão. Ele fica surpreso ao descobrir que não será tão fácil. De acordo com as orientações da mãe, Simpel irá para uma instituição especial e viverá afastado do irmão tendo um acompanhamento "adequado à sua situação". Discordando da recomendação, Ben parte com o irmão pela busca do pai desaparecido, único capaz de modificar a recomendação. Nesta jornada os laços entre os manos se estreitam... mas Ben também percebe que cuidar do irmão será mais complicado do que ele imagina. Simplesmente se torna uma espécie de road movie que faz com que a dupla encontre alguns personagens que os ajudam a lidar com os percalços do caminho. Dirigido por Markus Guller (que também assina o roteiro), o filme opta por uma abordagem leve de uma situação bastante dramática, se ganha nossa simpatia por um lado, por outro, ele se se esquiva de uma densidade que faria muito bem à sua temática. Frederick Lau está confortável como o irmão que tenta ser responsável, mas percebe suas próprias limitações para lidar com a situação, já David Kross (que ficou conhecido como o jovem de O Leitor/2008) faz lembrar um pouco a atuação de Leonardo DiCaprio em Gilbert Grape/1993, mas como o roteiro não ajuda muito, por vezes ele se perde em trejeitos e expressões. É verdade que quando o roteiro exige, Kross consegue ser comovente, embora o filme exagere para arrancar lágrimas da plateia (é de uma crueldade sem tamanho colocar dois golpes emocionais seguidos ao garoto). Como você percebe lá pela metade do filme, o final será previsível - mas sem deixar de colocar um dos pés do chão. Simplesmente não é um filme inesquecível, mas nos faz pensar em como lidamos com a vida e as diferenças que encontramos pelo caminho. 

Simplesmente (Simpel/Alamanha - 2017) de Markus Guller com Frederick Lau, David Kross, Annette Frier, Ludger Pistor e Emilia Schüle. ☻☻☻

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

APOSTAS PARA O OSCAR 2019: Capítulo III

The Green Book
Em 1962 um renomado pianista (Mahershala Ali) precisa de um motorista para leva-lo a uma turnê pelo sul dos Estados Unidos. O músico contrata um segurança ítalo-americano desempregado (Viggo Mortensen) para o serviço e o relacionamento entre os dois rendem momentos bem humorados, mas não afasta a reflexão diante dos acontecimentos que atravessam neste road movie esperto. Considerado um dos filmes mais emocionantes do ano, ele marca o primeiro voo solo de Peter Farrely. 

The Front Runner
Jason Reitman está de volta com este filme protagonizado por Hugh Jackman - que pode ter mais uma indicação ao Oscar em sua carreira. O australiano interpreta Gary Hart, um carismático político do Colorado que se torna o grande candidato do partido democrata às eleições presidenciais americanas de 1988, pelo menos até que um escândalo de sua vida pessoal aparecer. Resta saber se os votantes da Academia irão apreciar esta pegada mais dramática no tenso cenário político atual. 

Vice
Outro filme que bebe na fonte de personagens políticos do Tio Sam é este novo trabalho de Adam McKay sobre Dick Cheney,  considerado por muitos o mais poderoso vice-presidente na história dos Estados Unidos. O vice de George W. Bush ganha caracterização caprichada do galês Christian Bale acompanhado de um elenco que impressiona: Amy Adams (como a senhora Cheney), Sam Rockwell (na pele de George W. Bush) e Steve Carrell (interpretando Donald Rumsfeld). 

Poderia Me Perdoar?
O segundo filme dirigido por Marielle Heller traz Melissa McCarthy num papel bem diferente dos que acostumamos a vê-la nas comédias. Ela interpreta a escritora especializada em biografias de celebridades Lee Israel. Lee ficou famosa nos anos 1990 ao entrar em crise quando a editora não aceitar um projeto pessoal elaborado por ela, o episódio acabou revelando uma vocação inusitada da escritora (e bastante controversa). Ao lado de Richard E. Grant, Melissa tem chances de fazer bonito. 

Wild Life
Elogiado desde a exibição no Festival de Cannes, o filme de estreia de Paul Dano na direção conta a história de um garoto de 14 anos que presencia a crise no casamento dos seus pais (Jake Gyllenhaal e Carey Mulligan). Explorando o emaranhado de sensações que o ponto de mudança naquele núcleo familiar sugere, Dano se sai muito bem e tem colhido elogios pela segurança em lidar com sentimentos complicados - além de amparar muito bem o seu elenco, especialmente Carey Mulligan. 

terça-feira, 27 de novembro de 2018

PL►Y: Cardinals

Sheila: enfrentando o passado. 

No dicionário, cardinal significa o número ou quantidade de elementos que constituem um conjunto. Dirigido pela dupla Grayson Moore e Aidan Shipley, o longa canadense Cardinals pode surpreender pela forma como apresenta os elementos em sua premissa. É o tipo de filme que é complicado escrever sobre sem estragar a surpresa que é montar as peças que se juntam conforme o roteiro (assinado por Moore) apresenta seus personagens. O filme começa com cenas curtas um tanto soltas que deixam lacunas propositais para a narrativa. Quando o texto encontra seu foco, conhecemos Valerie (Sheila McCarthy), uma senhora que acaba de sair da prisão. O que poderia ser só mais um filme sobre o retorno para o lar de alguém que passou vários anos atrás das grades começa a mudar de rumo conforme conhecemos melhor a história e seus segredos. Uma visita aqui, a identidade da vítima ali, um relato revelador que precisa ser analisado em seus mínimos detalhes, uma sugestão, as presença de um agente da condicional... aos poucos a verdade sobre o caso se revela bem diferente do que era na época. A suspeita de que Valerie escondia seu alcoolismo da família parece ter fragilizado um pouco os laços com a família após o incidente, mas na verdade tudo é bem mais complicado. A direção do filme opta por uma abordagem lenta, com longos silêncios, flashes pontuais do passado e atuações contidas e funciona. A veterana Sheila McCarthy acerta no tom da personagem, que se recusa a ser a vilã da história, assim como a vítima de uma injustiça, preferindo ficar apenas quieta com as consequências de seus atos. Esta sensação só se amplia quando ela se encontra com o jovem vizinho Mark (Noah Reid) que suspeita que existe algo por trás de toda a confusão que aconteceu na época. Não tem jeito, o destino dos dois está ligado e enfrentar a angústia dele pode ser a tarefa mais difícil. Cardinals complexifica a história e eleva a tensão sem criar guinadas mirabolantes ou cenas gratuitas, tudo é contido, sofrido, misterioso, mas pleno no sentido de que esconde o seu maior segredo. É um trabalho narrativo interessante que prende a atenção e ainda faz pensar sobre a ideia de fazer justiça com as próprias mãos (além das marcas que esta ideia pode deixar). Justiça, vingança, verdades, mentiras e segredos se misturam por toda a história - que também funcionaria muito bem sobre um palco. Modesto em sua concepção, mas engenhoso em sua construção, Cardinals surpreende. 

Cardinals (Canadá/2017) de Grayson Moore e Aidan Shipley com Sheila McCarthy, Noah Reid, Katie Boland, Grace Glowicki, Peter MacNeill e Peter Spence. ☻☻☻☻

Na Tela: O Primeiro Homem

Ryan: fazendo História. 

Desde a primeira cena o diretor Damien Chazelle já demonstra qual será a pegada de seu filme sobre a vida do famoso astronauta Neil Armstrong, o primeiro homem a colocar o pé na Lua. Nos primeiros minutos somos jogados dentro de uma cabine junto ao protagonista, sem entender muito bem o que está acontecendo, numa sensação claustrofóbica, repleta de barulhos e movimentos bruscos do que é ser levado para fora da Terra. Outras experiências parecidas irão acontecer durante o filme e Chazelle, que sempre opta por um olhar bastante particular sobre estes momentos com base na perspectiva interna de Armstrong. A experiência de assistir a O Primeiro Homem é bem diferente do que muita gente imaginava quando o projeto foi anunciado. Não existem cenas repletas de efeitos especiais sobre o lançamento de naves e a vida no espaço, a opção é mais intimista e realista possível. Sendo um recorte sobre a vida de uma pessoa tão famosa e, ao mesmo tempo, com um ofício tão distante da maioria dos mortais, Chazelle não se esquiva de abordar a vida pessoal do personagem e seus dramas pessoais, especialmente no que diz respeito ao relacionamento com a esposa, Janet (Claire Foy) e os dois filhos - além do efeito que a morte da filha pequena tem sobre o casal. Vale ressaltar que com a morte da pequena, existe uma sensação estranha de que a morte ronda o casal. Não é novidade que o trabalho de um astronauta é arriscado, mas não lembro de ter visto um filme que o desglamourizasse com tanto empenho. Dos treinos exaustivos, enjoos, explosões e baixas pelo caminho, o filme se distancia daquela ideia do sonho de um menino e se aproxima de uma espécie de pesadelo profissional - que o diga Janet que fica cada vez mais nervosa com a tensão que se instaura dentro de casa conforme o dia de tudo ir para o espaço se aproxima. O filme ainda explora outros pontos que envolviam a corrida espacial americana, o clima de Guerra Fria, a preocupação com os gastos, os protestos, as coletivas de imprensa repletas de intrigas construindo uma espiral que só alimenta o estresse dos envolvidos. Sobre o elenco, sei que muita gente tem o pé atrás com Ryan Gosling, o consideram robótico, inexpressivo, mas aqui, seu estilo sisudo ajuda muito a projetarmos as emoções sobre ele. Este fato valoriza ainda mais a presença de Claire Foy, que serve de ótimo contraponto, já que ela é uma espécie de âncora humana do personagem com o mundo real, que o conecta com o lar, com os filhos e vizinhos, mesmo que de vez em quando um conflito seja inevitável. Na corrida pelo Oscar, Foy é uma das favoritas ao prêmio de atriz coadjuvante o que é ótimo para uma atriz revelada em uma série da Netflix (The Crown). Dificilmente Chazelle faria um filme tão fora da caixinha de Hollywood se não houvesse recebido seu Oscar de direção pelo seu segundo filme, La La Land/2016  aos 32 anos (o primeiro foi o excelente Whiplash/2014), no entanto, existe aqui uma dificuldade com o ritmo, que pesa bastante na duração do filme (140 minutos), se fosse mais enxuto tornaria a experiência ainda mais imersiva para o espectador. Em vários momentos o filme se arrasta sem necessidade, o que complica sua jornada rumo às premiações de fim de ano, parece que faltou um amigo para dizer ao diretor que ele não precisa ser prolixo para ser maduro. 

O Primeiro Homem (The First Man / EUA - 2018) de Damien Chazelle com Ryan Gosling, Claire Foy, Jason Clarke, Kyle Chandler, Corey Stoll, Patrick Fugit, Christopher Abbott, Ciarán Hinds, Olivia Hamilton e Pablo Schreiber. ☻☻☻☻ 

4EVER: Stephen Hillenburg

21 de agosto de 1961  26 de novembro de 2018

Stephen McDannell Hilenbourg nasceu na Califórnia e se formou em Biologia Marinha (por influência dos filmes do oceanógrafo francês Jacques Cousteau) com ênfase em estudos sobre esponjas do mar. Seus estudos serviram de base para criar um dos personagens mais populares das últimas décadas, o Bob Esponja. Parte da graça estava justamente em modificar a forma de uma esponja marinha para uma esponja de lavar louça (até a cor era amarela), um detalhe que ajudava a mergulhar na fantasia de um mundo marcado pela amizade, pelo otimismo e muita imaginação. O personagem surgiu em 1984, mas o desenho foi ao ar somente em 1990. Ao longo da carreira, Bob já rendeu quase 250 episódios e foi traduzido para mais de 60 idiomas. Bob Esponja e sua turma ainda protagonizou dois filmes no cinema, o primeiro em 2004 e o segundo em 2015. Stephen faleceu em consequência de Esclerose Lateral Emiotrófica diagnosticada no ano passado. 

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

4ever: Bernardo Bertolucci

16 de março de 1941  26 de novembro de 2018

Nascido em Parma na Itália, Bernardo Bertolucci é um dos diretores que se "ama ou odeia", esta radicalidade deve ser por conta da influência de Pasolini, com quem começou a trabalhar como assistente de direção no início de carreira. Seu primeiro sucesso foi com Antes da Revolução/1962, mas ele ganhou fama em Hollywood com seu roteiro para Era uma Vez no Oeste/1967 de Sérgio Leone. Sua primeira obra-prima foi O Conformista/1970, lançado antes de toda polêmica com O Último Tango em Paris (1972) que até hoje rende controvérsias não apenas pelas suas camadas psicológicas, mas pelo relacionamento com Marlon Brando e Maria Schneider. Depois do ambicioso 1900 (1976), o diretor se rendeu à inspiração oriental. Foi nesta época que ganhou o prêmio de melhor direção com O Último Imperador, que levou nove Oscars. O visual arrebatador ficou para trás quando voltou para Europa e fez filmes mais intimistas, são deste período Beleza Roubada (1996) e O Assédio (1998). Com o triângulo amoroso de Os Sonhadores (2003) ele voltou a polemizar e baixou o tom em sua última obra, Eu e Você (2012). Em seus últimos anos, o diretor voltou sua lente para a juventude que não lhe pertencia mais, sem perder a inspiração na política, no sexo e na psicanálise. 

domingo, 25 de novembro de 2018

Breve: Oitava Série

Elsie Fisher: a dura vida de uma millenial. 

Eight Grade é um filme independente dirigido por Bo Burnham que está indicado em quatro categorias do Independent Spirit Awards por levar para a tela um olhar sincero (e um tanto perturbador) sobre a adolescência dos tempos atuais. A protagonista tem treze anos e está prestes a terminar a oitava série (nosso equivalente ao nono ano) e ir para uma escola de Ensino Médio, mas ao invés de investir nas desventuras de uma jovem do subúrbio americano na escola - como trocentos filmes já fizeram - o filme pretende lançar um olhar diferente sobre a adolescência dos Millenials (os jovens nascidos no século XXI, acostumados à internet desde a infância e que tem o celular como uma extensão do próprio corpo). Em torno de Kayla, Burnham cria um olhar bastante peculiar à grande parcela da juventude que passa o tempo inteiro conectado,  curtindo postagens em rede sociais e gravando vídeos para internet na esperança de ser notado - e ser considerado especial pelos seus pares. No entanto, uma juventude que tem uma dificuldade danada de manter contato social com quem está ao lado. O filme não se esquiva de apresentar como é difícil para estes jovens dialogarem, mas tem uma facilidade impressionante de começarem uma discussão com familiares e colegas sem saber muito bem o motivo - numa tentativa de demonstrar que sabem argumentar mais do que realmente sabem (o comportamento típico do adolescente anabolizado por toneladas de informação consumidas, mas não filtradas, diariamente). Na trajetória de Kayla isto aparece na cena do shopping e em (quase) todas as vezes que o pai (um terno Josh Hamilton) tenta conversar com ela. Como qualquer pessoa, Kayla tem a necessidade de sentir-se especial, mas vive num universo em que ser especial se confunde com ser popular como as garotas mais chatas da escola, mas que ela necessita da companhia para ser notada e, segundo ela, querida. Ela está tão preocupada sobre o que fazer para ser notada que nem percebe como é desgastante criar sua farsa particular, especialmente no mundo virtual. Se na internet seus vídeos dão dicas de comportamento para adolescentes (com toda a sabedoria e ternura que uma adolescente de treze anos é capaz de ter), na vida real, sua rotina tende a caminhar para o oposto. Esta contradição cotidiana é explorada pelo filme em vários elementos, especialmente pela narrativa em off ou da trilha sonora eletrônica um tanto retrô - que tende a dar uma atmosfera mais animada do que a vida de Kayla realmente é. Repleto de teens com celulares nas mãos em todas as cenas, o roteiro reserva à personagem uma caminhada sutil de crescimento ao perceber que talvez os laços mais importantes se anunciem. Elsie Fisher está ótima na pele de Kayla que descobre a necessidade de traçar seus próprios caminhos para além das máscaras tecnológicas. Vale destacar como a escola é uma ambiente que só amplia como o mundo adulto é perigoso - de rotulação explícita de alunos no auditório, passando por treino de ataque com arma de fogo, seja no corredor ou em sala de aula...). Diante do mundo intimidador, a jornada de Kayla lembra um pouco a de Dawn Winner de Bem-Vindo à casa de Bonecas (1995), clássico indie de Todd Solondz - mas aqui ela tem a sorte do diretor Burnham ter um olhar mais carinhoso sobre a protagonista (o que não impede a angústia do espectador durante a sessão). Se equilibrando entre o bom humor e o drama Oitava Série tem personalidade e um olhar bastante astuto (e um pouco ácido) sobre os conflitos adolescentes no mundo de hoje.

Oitava Série (Eight Grade / EUA -2018) de Bo Burnham com Elise Fisher, Josh Hamilton, Emily Robinson, Daniel Zolghadri e Jake Ryan.
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APOSTAS PARA O OSCAR 2019: Capítulo II

Se a Rua Beale Falasse
Barry Jenkins (Moonlight/2016) está de volta com esta adaptação do famoso romance de James Baldwin sobre uma mulher grávida que luta para provar a inocência do esposo - para que ele esteja em casa antes dela ter o bebê. O filme é valorizado por camadas de subtextos sobre racismo, injustiças e intolerância no desenrolar do caso. É um dos filmes mais elogiados do ano - e a indicação de Regina King ao prêmio de coadjuvante é tida como certa. 

Infiltrado na Klan 
Outro filme com forte contexto racial a ter chances no Oscar é este novo filme do diretor Spike Lee que é saudado por muitos como o seu melhor trabalho. Apesar da atmosfera bem humorada, o filme retrata uma história real e bem séria sobre um policial negro que se infiltrou na Ku Kux Klan para investiga-la por dentro. No entanto, para isso, precisou da parceria de um policial branco para se passar por ele sempre que fosse necessário. O filme já está em cartaz no Brasil. 

O Primeiro Homem
Outro filme dirigido por peso pesado que está na disputa e em cartaz no Brasil é o novo de Damien Chazelle (La La Land/2016) que adapta para as telas a jornada do astronauta Neil Armstrong antes de ir para o espaço. O filme dividiu opiniões por investir numa atmosfera diferente da maioria das ficções científicas, mas se torna envolvente pelo olhar intimista sobre os personagens. No elenco Ryan Gosling disputa mais uma vaga no Oscar, mas é Claire Foy que tem grandes chances. 

Boy Erased
Quem também tem fortes chances de conseguir uma indicação é Nicole Kidman por sua atuação neste novo filme do australiano Joel Edgerton. Ela interpreta a mãe de Lucas Hedges, um adolescente que conta aos pais que é homossexual e é encaminhado para um programa de tratamento para deixar de ser. O filme é uma adaptação no livro de Garrard Conley, que se inspirou em sua própria vida para escrevê-lo. Uma história difícil de ser contada, mas que chega em um momento bastante oportuno. 

Querido Menino
Outro filme que aborda o relacionamento entre pais e filhos é esta adaptação de dois best sellers para o cinema. Pai e filho (David e Nic Scheff) escreveram livros sobre o drama que atravessaram quando rapaz se tornou viciado em metanfetamina e mudou para sempre a rotina da família. O filme mescla o ponto de vista dos dois personagens sobre a situação e conta com atuações inspiradas de Thimotée Chalamet (que deve ser indicado novamente) e Steve Carrell em momentos comoventes. 

PL►Y: Christopher Robin - Um Reencontro Inesqucível

Pooh e Christopher: reencontrando os amigos. 

Christopher Robin - Um Reencontro Inesquecível apareceu em várias listas de filmes mais esperados do ano, afinal, como resistir à uma versão live action do famoso Ursinho Pooh (o antigo Puff) e sua turma? Adicione esta premissa à presença do escocês Ewan McGregor e  a direção de Marc Foster (que quando quer, acerta no alvo) e a expectativa era das melhores quando chegou nos cinemas. O resultado dividiu opiniões, mas a produção mostra-se bastante agradável de se assistir. A trama explora o aconteceu com o menino Christopher depois que ele cresceu e teve que se afastar dos seus brinquedos favoritos - por alguns instantes minha mente pensou estar vendo uma sequência diferente de Toy Story. O filme não gasta muito tempo contando como foi estudar na cidade, se formar, começar a trabalhar, conhecer uma mulher interessante (vivida pela Agente Carter Hayley Atwell), casar e ter uma filha. Diante das responsabilidades da vida adulta, nem precisa dizer que o menino brincalhão se tornou um adulto um tanto sisudo. O que ele não suspeita é que Pooh, Leitão, Tigrão, Bisonho, Can, Abel e seus outros amigos de pelúcia continuam aguardando o seu retorno desde o dia em que saiu de casa. O roteiro investe no reencontro de Christopher com seus brinquedos e, neste momento, mistura fantasia e realidade de uma forma que pode não ser das mais originais, mas que rende alguns momentos divertidos. Esta mistura, faz com que Christopher repense (um pouco) sua forma de encarar a vida e uma série de incidentes preparados pelo roteiro farão com que os brinquedos colaborem para que ele faça algumas escolhas até o final do filme. Embora eficiente, a direção de Foster tem dificuldade para encontrar o tom da narrativa, embora tenha fofura de sobra no texto, existe uma atmosfera de pesada melancolia durante toda a sessão - que torna o humor do filme um tanto sufocado pela tristeza. A melancolia também aparece na fotografia e na criação dos bichinhos, que embora sejam fofos, estão banhados em uma tristeza que por vezes parece sombria. A sorte é que o fato de serem conhecidos do público (desde 1921, quando foram criados por Alan Alexander Milne) já lhes garante uma empatia imediata. Os efeitos especiais que dão vida aos bichos de pelúcia são bastante coerentes, sendo realistas e surreais na medida certa, o que ajuda muito em algumas situações da história. Talvez a ideia fosse que ele fizesse o mesmo que executou em Em Busca da Terra do Nunca (2004), mas a coisa pesou um pouco mais do que devia. No entanto, embora nasça do enorme clichê do homem que cresceu e perdeu o jeito de levar a vida com leveza, Christopher Robin - Um Reencontro Inesquecível está longe de ser uma decepção, mas será melhor apreciado pelos fãs mais crescidos. 

Pooh e seus amigos: fofura melancólica. 

Christopher Robin - Um Reencontro Inesquecível (EUA/2018) de Marc Foster com Ewan McGregor, Bronte Carmichael, Hayley Atwell, Mark Gatiss, John Dagleish e Amanda Lawrence. ☻☻☻

sábado, 24 de novembro de 2018

FILMED+: Três Estranhos Idênticos

Robert, David e Eddy: estranhos mistérios. 

Em 1980 um rapaz de dezenove anos foi para uma faculdade nos Estados Unidos e ficou surpreso com a receptividade dos colegas que nunca o viram antes. Bastou uma pessoa chamá-lo por um nome que não era dele para ter certeza de que estava sendo confundido com outra pessoa. No entanto, não se tratava de um incidente qualquer. Levado por um colega, que ficou impressionado com a semelhança entre os dois, a um telefone, o mesmo ficou impressionado que do outro da linha houvesse uma voz igual a dele. As semelhanças não pararam por aí, os dois haviam nascido na mesma data e na mesma cidade, não restava dúvida: os dois eram gêmeos. O assunto ganhou atenção da mídia e a surpresa só aumentou quando um terceiro irmão surgiu na história. A alegria foi imediata, assim como a conexão entre os três, que começaram a se complementarem como irmãos de toda uma vida. A semelhança entre eles extrapolava a aparência, os gostos eram parecidos e até a estrutura familiar era semelhante - embora a situação financeira delas fosse diferente. O trio virou celebridade, aparecendo até no cinema (sim, fizeram uma pontinha em Procura-se Susan Desesperadamente/1985), abriram um restaurante de sucesso e tudo poderia ser uma grande alegria se o fato de trigêmeos separados no nascimento já não fosse o ponto de partida de uma história bem mais sombria. Diante de um material destes, o documentarista Tim Wardle constrói uma narrativa que é um primor! Juntando cenas de arquivo, entrevistas e reconstituições com atores, o filme mergulha numa estranha história que concilia suspense e drama de uma história real. É na segunda parte do filme (justamente depois da criação do tal restaurante) que o filme se torna mais sombrio ao abordar o que havia por trás daquela história - que era muito mais do que um centro de adoção desalmado que separou três irmãos. O que se revela é uma história que beira o inacreditável, que oferece marghem para especulações infinitas sobre aquela situação surreal. O filme oferece uma reflexão bastante interessante sobre o comportamento humano (será que existe mesmo um equilíbrio entre a base biológica e a influência do meio na construção da personalidade? Até que ponto temos livre arbítrio sobre os rumos de nossas vidas? Qual a importância da educação realizada pelos pais? Até que ponto o convívio com os irmãos influencia nosso comportamento? E por aí vai...). Em alguns pontos esta história real lembra o fictício Predestinados/2018 (e acho que esta afirmação já diz mais do que o necessário), mas revela-se cada vez mais assustadora por deixar pontos ainda obscuros sobre a história dos irmãos separados quando tinham apenas seis meses de idade. Ainda que o mistério persista (e ainda persistirá por muito tempo, conforme o filme aponta) existe uma série de ponderações que podem ser bastante fiéis aos objetivos por trás do que assistimos. Três Estranhos Idênticos é um dos filmes mais impressionantes que assisti neste ano e permanecerá comigo por um bom tempo (e não duvido que em breve irá gerar um filme "baseado em fatos reais"). 

Três Estranhos Idênticos (Three Identical Strangers / Reino Unido - 2018) de Tim Wardle, com Eddy Galland, David Kellman, Robert Shafran, Andrew Lovesey e David Straus. ☻☻☻☻☻

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

PL►Y: Benzinho

Karine e Sarris: a quase ausência. 

Lançado em agosto nos cinemas brasileiros, Benzinho foi logo aclamado como um dos filmes mais ternos do cinema nacional. Fica fácil perceber o motivo quando se assiste ao novo filme de Gustavo Pizzi, já que ele envereda por um caminho diferente da maioria dos filmes brasileiros recentes. Ele não constrói uma trama marcada por criminalidade, não investe em cenas polêmicas ou num humor bobo que apela para a vulgaridade. Na verdade, ele vai num caminho contrário a tudo isso e causa até um estranhamento por investir em movimentos mais abstratos de serem retratados. O filme poderia ser somente sobre o amor de uma mãe pelo filho, mas ele se amplia de tal forma que fica até difícil apontar se ele é sobre isto ou aquilo. No centro da história está Irene (Karine Telles), esposa, mãe e mulher que batalha ao lado do marido para criar quatro filhos. Não é acaso que na primeira cena, por conta de um problema na porta, a mãe fica presa dentro de casa com os filhos - e desde então, todos precisam sair por uma janela ao longo do filme. A situação financeira da família não está fácil! A obra na casa nova vive parada e o pequeno negócio do marido (Otávio Muller numa composição bem mais contida do que estamos acostumados) não vai bem, mas Irene faz o que pode para colocar dinheiro dentro de casa: vende roupas de cama, prepara quentinhas, produz sacolés... na certeza que que pode conseguir algo melhor, ela também está prestes a se formar no Ensino Médio. Nesta estrutura familiar cabe até a irmã Sonia (Adriana Esteves) que diante dos problemas com o esposo agressivo leva até o filho para viver na casa de Irene. No entanto, diante de tantas situações, o que tira mesmo Irene do eixo é quando seu filho mais velho, Fernando (Konstantinos Sarris, não é impressão sua, o garoto nasceu na Grécia mesmo) recebe uma proposta para ir jogar handebol na Alemanha. Dali em diante, existe uma luta de sentimentos ambíguos em Irene. Ela tem consciência de que é uma grande oportunidade para o filho, mas embora considere que ele possa ajudar nas despesas da casa, ela silenciosamente, preferia que ele ficasse ao lado dela. O filme poderia até enveredar pela ideia de que ele é o filho que mais participa do cuidado com os irmãos e com a casa, mas o roteiro prefere deixar isso de forma quase invisível, preferindo explorar  a dificuldade daquela mãe cortar o cordão umbilical com seu primogênito. É uma história que se desenvolve nas entrelinhas e mistura sentimentos diversos que são muito bem trabalhados por sua protagonista Karine Telles. Telles (que também assina o roteiro e ficou famosa como a patroa de Que Horas Ela Volta?/2015) está brilhante em cena, em seus silêncios os olhos e expressões revelam todas as emoções complicadas que vivencia. O medo do desconhecido, a necessidade de proteger o filho, a saudade que sentirá com a distância, ao mesmo tempo existe uma pitada de egoísmo e  insatisfação para o que o futuro revela. Tudo se mistura na personagem, que  nunca diz o que está realmente sentindo (mesmo quando ela parece dar uma surtada ao se dar conta de que o filho irá embora de verdade ela foge por uma tangente). A história de Benzinho se revela nas sutilezas do relacionamento daqueles personagens, um recorte que é tão espontâneo que se assemelha ao olhar sobre pessoas que moram na casa ao lado. É um filme bastante diferente, com humor sutil e sensibilidade para se tornar universal em seu retrato de como o amor pode ser cheio de ambiguidades. Não é uma tarefa fácil conduzir um filme assim - e ele bem que merecia ser o candidato brasileiro à uma vaga no Oscar de Filme Estrangeiro do ano que vem. Benzinho é tão simples e terno que chega a ser surpreendente.

Benzinho (Brasil/2018) de Gustavoi Pizzi com Karine Telles, Otávio Müller, Konstantinos Sarris, Adriana Esteves, César Troncoso e Mateus Solano. ☻☻☻☻

terça-feira, 20 de novembro de 2018

10+ Dia da Consciência Negra

Neste vinte de novembro resolvi fazer uma lista com dez filmes (premiados e comentados aqui no blog) que contam com personagens negros em tramas que considero bastante relevantes - sejam verídicas ou ficcionais sobre racismo, tolerância, luta pela igualdade e respeito.
A lista  ficou assim (em ordem alfabética):

Antes de virar série da Netflix, conheci este filme ao ganhar o prêmio de melhor roteiro de estreia no Independent Spirit Awards. A ideia não poderia ser mais contemporânea: um grupo de alunos negros numa conservadora universidade americana. A ideia é puro pretexto para uma bem articulada (e bem humorada) discussão sobre os disfarces que os preconceitos podem ter. De namoros interraciais, brigas por poder e uma festa blackface, o roteiro é esperto o suficiente para triturar tudo de forma bastante articulada. 

Ganhador do Oscar de roteiro orginal, este filme ainda foi indicado em outras três categorias (filme, diretor e ator para Daniel Kaluuya) e surpreendeu muita gente quando estreou. No início parecia só uma revisita à surrada história do rapaz negro que vai visitar a família da namorada branca. O que a plateia não esperava é que o filme envereda pelo terror (desde a primeira cena) e o surrealismo para abordar temas bastante atuais. O comediante Jordan Peele fez uma ótima estreia na direção. 

Enquanto a escravidão é tema de inúmeras novelas das seis no Brasil, nos EUA nunca houve uma tradição de produções sobre o tema. Assim, podemos perceber a importância deste filme que foi indicado a nove Oscars e levou três (Filme, roteiro adaptado e atriz coadjuvante - para  a matadora atuação de Lupita Nyong'o). O filme é sobre a história real de Solomon Northup (o ótimo Chiwetel Ejiofor), um homem livre que é escravizado nos EUA pré-Guerra Civil. Um filme obrigatório. 

O novaiorquino Melfi já deixou claro que é o tipo de diretor que tem grande carinho pelos personagens - mesmo quando insere humor em situações dramáticas. O resultado é uma simpatia imediata com seus protagonistas. Aqui, a junção da história bem amarrada com o elenco brilhante lhe rendeu sucesso de público, crítica e três indicações ao Oscar (incluindo melhor filme). Ao contar a história de três cientistas negras importantes na NASA o filme fez história - e levou para casa o prêmio máximo do Sindicato de Atores: melhor elenco. 

Este filme está na lista de filmes dos mais arrepiantes que já assisti. Deve ter se tornado o documentário mais premiado em seu ano de lançamento (levou para casa vários prêmios, incluindo o BAFTA, mas perdeu o Oscar), talvez seu maior mérito é a sintonia perfeita entre imagens e narrativa baseada nos textos do escritor James Baldwin (com voz de Samuel L. Jackson). O resultado realmente impressiona! Eu Não Sou seu Negro é uma profunda reflexão sobre a situação dos afro-americanos no mundo contemporâneo. 

Nos Estados Unidos dos anos 1960, a luta pelos direitos civis estava fervilhando e este filme conta histórias de pessoas comuns que sofriam na pele  segregação na Terra do Tio Sam, no caso, se tratava de um grupo de empregadas domésticas negras que tinham muito a contar sobre o que acontecia dentro das confortáveis casas do subúrbio sulista americano. O filme alçou a brilhante Viola Davis a outro patamar em sua carreira e oscarizou Octavia Spencer como coadjuvante, além de ter comovido muita gente ao redor do mundo. 

Dá para acreditar que o casamento interracial era crime no estado da Vírginia? Esta é pergunta que serve de ponto de partida para a história do casal  Mildred (a magistral Ruth Negga, que foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz e ao Globo de Ouro) e Richard Loving (Joel Edgerton) que mantem um relacionamento fora da lei no ano de 1958. Perseguidos, presos e afastados do convívio de suas famílias num verdadeiro exílio, a história de Loving parece inacreditável, mas aconteceu de verdade e merece ser conhecida. 

O Mississipi deve ser o estado que mais serviu de cenário para histórias sobre segregação racial em todos os tempos (e não por acaso é até citado em Corra!). Mesmo indicado a três Oscars, poucas pessoas deram o devido valor a este filme que foi comprado pela Netflix e foi lançado nos cinemas antes de ir para o streaming. A história de uma família branca que cruza seus caminhos com uma família negra tem um dos desenvolvimentos mais contundentes do cinema recente - e o trabalho da cineasta Dee Rees é de uma maturidade impressionante em cada cena. 

Não ficarei surpreso se o filme se tornar a primeiro produção de super-herói a ser indicado a Melhor Filme no Oscar do ano que vem. Sucesso nas bilheterias, o filme estrelado pelo herói da Marvel quebrou paradigmas ao oferecer uma visão moderna, ao mesmo tempo cheia de tradições sobre o continente africano e a cultura pop. Um super-herói negro em conflitos com o seu papel no mundo atual rende um filme marcante - além de ter um elenco impressionante. No MTV Movie Awards foi lembrado em sete categorias e levou quatro: filme, herói, vilão e performance em um filme. 

Embora tenha algumas licenças históricas, este filme prende a atenção sobre a histórica marcha da cidade de Selma para Montgomery em nome dos direitos civis em 1965. Também ajuda muito a atuação de David Oyelowo absolutamente magnética como Martin Luther King (com uma autenticidade impressionante mesmo nas complicadas cenas de discurso). Indicado ao Oscar de Melhor Filme e ganhador do prêmio de Melhor Canção (para Glory de John Legend e Common), o filme merecia muito mais. 

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

PL►Y: Legítimo Rei

Pine e seus aliados: Coração Valente parte 2?

Até a Netflix guarda seus filmes de maior prestígio para o final do ano (e parece que neste ano a empresa investiu pesado para conseguir espaço nas premiações que se aproximam). Um caso interessante aconteceu com Legítimo Rei de David Mackenzie (A Qualquer Custo/2017), que foi exibido no Festival de Cinema de Toronto e depois de sofrer críticas recebeu um novo corte - mais enxuto com vinte minutos a menos (e o diretor ainda afirmou que tinha ideias para um filme de quase quatro horas). Curiosamente a ideia de ter um novo corte gerou comentários inusitados por conta da tal cena de nudez frontal do astro Chris Pine (é verdade, fãs ficaram com medo da cena ser cortada),  mas ciente de que a cena renderia maior audiência para o filme, ela permanece intacta (eu acho). O filme é uma espécie de sequência do que vimos no filme Coração Valente (1995) de (e com) Mel Gibson. Legítimo Rei é sobre o que aconteceu posteriormente ao final daquele filme, vale ressaltar que não se trata de uma continuação direta, mas um prosseguimento da História bista anteriormente. Embora o roteiro não traga muitas novidades para o gênero épico, Mackenzie é um bom diretor e consegue dar uma atmosfera bastante crua para o filme. Existem cenas de batalhas que impressionam e personagens vilanescos que provocam realmente ojeriza. No meio disso tudo, temos um herói bastante sereno perante o mundo que o cerca, ele é o Robert The Bruce (Pine), personagem fundamental para a independência da Escócia no século XIV para fora dos domínios ingleses. Entre as batalhas o filme conta um pouco da vida pessoal de Robert, destaca sua vida familiar (esposa falecida no parto, filha pequena e um novo enlace que demora para se consumar), além da sua pendenga com o Rei Edward (Stephen Dillane, um ótimo ator que recebe pouco espaço aqui) e seu sanguinário filho (Billy Howle). Não sei se foi impressão minha, mas por mais que Mackenzie se esforce (o plano sequência inicial é sensacional), a narrativa parece estar com a roda presa, encontrando dificuldades para se desenvolver plenamente. É visível o esforço de Pine para viver um rei bem intencionado, mas não sei se ele convenceria as pessoas de que é um bom líder guerreiro, talvez uma abordagem mais bruta do personagem ajudasse nestes momentos. Pine já demonstrou ser um ator interessante A Qualquer Custo, mas aqui ele parece tocar uma nota só a maior parte do tempo - acho que seu olhar pesaroso combina muito mais no clima romântico com Florence Pugh (a atriz revelação de Lady Macbeth/2017). Legítimo Rei não atinge todas as notas que deseja, mas pode cair no gosto de quem é fã do gênero e se tornar um sucesso no serviço de streaming. Quanto a ter destaque nas premiações, o parentesco com o clássico oscarizado de Mel Gibson não ajuda muito com as comparações que possa gerar. 

Legítimo Rei (Outlaw King / EUA - Reino Unido / 2018) de David Mackenzie com Chris Pine, Stephen Dillane, Billy Howe, Florence Pugh e Aaron Taylor-Johnson. 

PL►Y: The Ballad of Buster Scruggs

Seis histórias: o faroeste segundo os manos Coen. 

Produzindo cada vez mais material próprio, a Netflix percebeu que ter material feito por pessoas renomadas lhe rende prestígio e assinantes. Foi assim que os irmãos Ethan e Joel Coen foram parar no serviço de streaming para produzir uma série de antologia de seis episódios sobre o velho oeste. Até imagino quando os envolvidos assistiram os episódios e imaginaram que se todos fossem montados no formato de um filme a Netflix teria chance de aparecer nas grandes premiações. Por conta desta estratégia, The Ballad of Buster Scruggs saiu do Festival de Veneza com o prêmio de melhor roteiro -  muito merecido, já que os irmãos mais descolados de Hollywood oferecem, em pouco mais de duas horas, um olhar bastante particular para aquele universo um tanto saturado por clássicos e obras de gosto duvidoso. Não é novidade que os Coen amam o cinemão clássico e que já faz algum tempo que o faroeste tem sido o gênero da vez nas mãos deles, aqui eles dão sua voz a seis histórias que só poderiam ter sido imaginadas por eles, seja em suas ironias, dramas ou sutilezas e o resultado é interessantíssimo. O filme se apresenta como se fosse um livro de contos, o primeiro deles é o que dá nome ao filme e conta a história de um violeiro que cavalga pelo deserto, mas que se revela um pistoleiro bastante habilidoso entre uma canção e outra. É uma boa escolha para introduzir o espectador ao universo do filme, já que existe humor, violência, elementos absurdos e clichês revirados como só os dois são capazes de fazer. Ao final da história nos deparamos com um elemento que perpassa todas as histórias: a morte. Talvez ela seja o elemento principal da história do ladrão vivido por James Franco, que em uma sucessão de trapalhadas (de um colete a prova de balas improvisado inacreditável,  um cavalo que insiste em comer capim quando você está com a corda no pescoço e o "é sua primeira vez" com um sentido nunca ouvido antes). O humor negro dá o tom desta história que apresenta Franco em um dos seus melhores momentos, pena que dura pouco. Depois é a vez de Liam Neeson aparecer na história mais melancólica do filme, especialmente pela excelente atuação de Harry Melling, como um artista sem os membros que atravessa o país como atração de circo. Com poucos diálogos e um senso se tragédia anunciada, talvez seja uma das melhores narrativas já construída pelos dois irmãos, principalmente pelas inúmeras analogias que é capaz de proporcionar (e o final é de partir o coração). Neeson tira de letra o tom intimista da história que tem em mãos, mas é Melling que realmente impressiona - curiosamente é um ator que fez pouco cinema, tirando a saga Harry Potter (em que - pasmem - interpretava o primo insuportável do bruxinho) ele fez Z: A Cidade Perdida/2017 e... só! Um ator para se ficar de olho. Os Coen ainda nos dão a honra de assistir Tom Waits voltando ao cinema como um garimpeiro na história mais contemplativa de todo o filme. Mais uma vez o roteiro tem poucos diálogos, afinal, Waits carrega o episódio sozinho quase o tempo inteiro (embora acompanhado por um grupo de animais, com destaque para uma expressiva coruja). O episódio só destaca ainda mais o cuidado técnico da produção com a edição, a fotografia e o ritmo preciso impresso pelos irmãos. No penúltimo episódio Zoe Kazan se junta à uma diligência para encontrar o marido arranjado pelo irmão um tanto... confuso. Esta é a história romântica do filme, embora o romance apareça de forma inusitada - desde que Bill Heck aparece descabelado, barbudo, sujo, suado e com olhos brilhantes ao lado da donzela indefesa você já imagina o que irá acontecer entre os dois... ou quase. Talvez seja a história mais convencional que compõe o filme, mas ainda é um verdadeiro deleite a sensação de que algo imprevisível está à espreita. Para terminar, os Coen investem numa atmosfera surrealista, que parece um despretensioso conflito entre passageiros de uma carruagem - e eles nem fazem ideia para onde estão indo (e todos os atores estão impecáveis brincando com o texto) -, mas este arremate só poderia sair da mente  de uma das duplas mais criativas de Hollywood. Algumas pessoas podem considerar que o formato episódico (que revela-se um passeio por diversos gêneros cinematográficos, algo que o faroeste serve muito bem) seja um problema para o filme, mas faz tempo que não vejo um trabalho tão coerente neste modelo de estrutura narrativa. Além disso, a Netflix foi bastante esperta, já que o espectador pode ver o filme por episódios ou inteiro que em nada prejudica o programa. Só espero que os Coen continuem com o desejo de contar novas histórias em uma nova temporada - ou novo filme. 

The Ballad of Buster Scruggs (EUA-2018) de Joel e Ethan Coen com Tim Blake Nelson, James Franco, Liam Neeson, Harry Melling, Zoe Kazan, Bill Heck, Jonjo O'Neill, Brendan Gleeson, Saul Rubinek e Tyne Daly.
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sábado, 17 de novembro de 2018

APOSTAS PARA O OSCAR 2019: Capítulo I

Sim meus amigos, a temporada de ouro já chegou e as especulações para as premiações já estão a todo vapor! Com algumas listas e premiações aparecendo por aí, a dúvida é quem tem fôlego para encarar a temporada de pesos pesados e manter o fôlego até a divulgação dos indicados ao maior prêmio do cinema americano. Alguns filmes que já estrearam por aqui tem chances de serem lembrados - sobretudo os recentes Nasce uma Estrela e Bohemian Rhapsody, dois filmes de quatro palpites que tem a música correndo nas veias nesta temporada. A animação Os Incríveis 2 tem como maior oponente o genial Ilha dos Cachorros que poderá dar a Wes Anderson seu primeiro Oscar! Também não podemos esquecer de Charlize Theron (e o roteiro) de Tully, o sucesso Pantera Negra e os arrepiantes Um Lugar Silencioso e Hereditário (é verdade que a Academia não é muito chegada a filme de super-herói ou terror, mas vai que...). A partir de hoje destacarei aqui no blog os filmes que despontam como favoritos ao careca dourado mais cobiçado do mundo:

Roma 
O oscarizado Alfonso Cuarón (Gravidade) corre sério risco de ser novamente premiado por ter feito o filme mais elogiado do ano. Premiado no Festival de Veneza e produzido pela Netflix, Roma é um verdadeiro passeio pelas memórias de infância do diretor e o resultado é dotado de uma atmosfera que tem encantado espectadores por todo o mundo. Ambientado na Cidade do México em 1970, não sei se a Academia premiaria um filme falado em espanhol na categoria principal, mas o Oscar de filme estrangeiro já tem mãos certas. 

 As Viúvas
Fosse dirigido por um cineasta mais convencional, este filme faria boas bilheterias colheria alguns elogios e ficaria por isto mesmo. Sorte que o estúdio teve o bom senso de querer fazer algo mais e convidou o autoral Steve McQueen para fazer bonito. No elenco,  Viola Davis, Michelle Rodriguez, Elizabeth Debicki e Cynthia Erivo são as personagens do título que juntam forças para superar as dificuldades financeiras deixadas pelos maridos criminosos. Misturando drama, suspense e ação, o filme é um dos mais elogiados do ano. 

A Favorita
Este é outro filme aclamado no Festival de Veneza deste ano - saiu com os prêmios de melhor atriz (a ótima Olivia Colman) e grande prêmio do júri. O filme conta um inusitado triângulo amoroso no século XVIII que acontece em paralelo à guerra entre Inglaterra e França. Existe uma batalha muito particular entre duas mulheres (Rachel Weisz e Emma Stone) que disputam o posto de pessoa mais influente na corte da rainha (Colman). O mais curioso desta comédia que capricha no humor negro é que se trata do primeiro filme do grego (e denso) Yorgos Lanthimos sem um roteiro feito por ele. 

Vox Lux
Parece que Natalie Portman está de volta ao páreo. Depois de ser indicada ao Oscar por viver uma stripper, ganhar um Oscar por sua performance como bailarina transtornada e concorrer novamente como uma icônica primeira-dama americana, Natalie agora vive uma estrela do mundo pop que tem uma boa cota de fantasmas para exorcizar. Dirigido por Brady Corbet, o filme oferece um olhar bastante ácido para o mundo pop - que é capaz de transformar até a experiência mais traumatizante em algo capaz de produzir fama e dinheiro.

A Esposa 
Falando em voltar ao páreo, não seria ótimo ver uma atriz tão magnífica como Glenn Close ganhando seu merecido Oscar pela primeira vez. A atriz veterana já foi indicada seis vezes à estatueta e nunca foi premiada! Ao que parece sua elogiada atuação neste filme do sueco Björn Runge pode lhe fazer justiça. Ela vive a discreta Joan Castleman que acompanha o esposo, Joe Castleman (Jonathan Pryce) para receber o Nobel de Literatura. Em quarenta anos de casamento muitos dos seus sonhos e ambições ficaram para trás e... as frustrações ganham força durante o filme.