sábado, 31 de agosto de 2024

HIGH FI✌E: Agosto

Cinco produções assistidas durante o mês que merecem destaque:

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NªTV: Palm Royale

Kristen Wiig: o preço da riqueza.

Nos anos 1960, Maxine Simmons (Kristen Wiig) é uma mulher que sonha em ter um lugar ao sol da alta sociedade de Palm Beach. Um dos seus maiores desejos é poder frequentar o clube que dá nome à série, um local frequentado somente pela elite local e que parece um daqueles lugares tão fora da realidade que beira a fantasia. Só que para isso ela ela precisa da indicação de três sócias. Ela acredita que sua vida irá melhorar muito quando conseguir conviver com aquele bando de gente tão endinheirada quanto esnobe, mas desde o primeiro episódio ela percebe que não será uma tarefa fácil e, mais do que isso, ao longo dos nove episódios que compõem a primeira temporada na AppleTV+, a sensação é que ela vê o sonho se tornar um pesadelo. Bem, se a personagem não descobre isso, o público tem cada vez mais certeza. Cheia de humor, deboche e ironias, a série se constrói a partir das trapalhadas de Maxine em ganhar respeito em mundo à qual não pertence  e  acaba gastando mais do que tem para conseguir sustentar uma imagem que não é a dela. Eu nunca havia pensado em como ser rico é algo caro, não apenas com os gastos para uma vida de ostentação, mas também para manter os gastos com as festas e os bailes de caridade, doações e tudo mais em que você não pode ficar para trás. Enquanto a personagem gasta uma fortuna para manter uma imagem de luxo (realizando até alguns crimes pelo caminho), toda a imagem de perfeição daquele mundo se desconstrói com arranjos, traições e corrupções. O melhor de Palm Royale fica para para os primeiros episódios em que acompanhamos com surpresa os fatos surpreendentes que pairam sobre a personagem, como a história em que é esposa de um grande herdeiro e suas visitas constantes à uma senhora presa imóvel à uma cama que não sabemos ao certo quem é. Se o programa começa em uma expectativa crescente do espectador, ampliando e conferindo cada vez mais complexidade aos personagens, conforme avança para além de sua metade, ela perde o fôlego e ganha cada vez mais um ar de novela, sem evitar cair na repetição de sempre fazer sua protagonista quebrar a cara. Me atrevo a dizer que Kristen Wiig tem aqui o papel de uma vida, embora tenha realizado bons trabalhos no cinema, eu sempre tinha a impressão que ela poderia fazer muito mais nos projetos em que aparecia. Aqui, a atriz consegue sustentar nossa torcida por uma personagem que é totalmente equivocada em suas ambições,  basta ver os encontros com o grupo feminista liderado por Laura Dern, que aos poucos, se torna sua amiga. Falando em Kristen e Laura, o elenco é um verdadeiro triunfo, afinal ainda conta com Allison Janney como a ricaça megera mor do pedaço, a venerada veterana Carol Burnett em um papel cheio de surpresas e até Kaia Gerber (a filha de Cindy Crawford) em um papel bastante promissor. Para além do estelar elenco feminino, temos Ricky Martin numa performance bastante reveladora de seu talento como ator, vivendo um funcionário do hotel cheio de segredos e nuances diferentes do que você imagina, torna-se outro personagem que ganha nossa torcida. Renovada para uma segunda temporada, a série é bastante animada e cheia de acontecimentos, mas por vezes peca pela repetição que ao final deixa um gosto de que funcionaria melhor como minissérie. No entanto, reúne os talentos necessários para funcionar como uma saborosa crônica sobre o american way of life

Palm Royale (EUA-2024) de Abe Sylvia com Kristen Wiig, Ricky Martin, Carol Burnett, Laura Dern, Allison Janney, Josh Lucas, Leslie Bibb, Kaia Gerber, Julia Duffy, Claudia Ferri e Jordan Bridges. ☻☻☻

PL►Y: O Corvo (1994)

Brandon Lee: morre uma estrela.

Podem me chamar de chato e conservador, mas está para nascer alguém que me justifique fazer o remake de um filme que já era bom o suficiente dentro de sua proposta. Não vejo nada demais em refazer um filme que não cumpriu o que prometia, mas mexer numa ideia que já surpreendia o público com suas qualidades inesperadas me soa como um tiro no pé. É verdade que em Hollywood existe a ideia de que o lançamento baseado em uma ideia já testada e aprovada tem mais possibilidade de fazer sucesso nas telas. Não vou dizer que já vimos essa teoria naufragar um milhão de vezes, mas (como diria meu primogênito) fazer o quê? O que posso fazer é ver na semana em que estreou a nova versão de O Corvo o clássico cult lançado em 1994 baseado na graphic novel de James O'Barr lançada em 1981. Barr se inspirou na morte de sua namorada para criar a trama sobre a morte não ser o fim para quem deseja vingança. Banhada em um misto de raiva e melancolia, a trama segue a história de Eric Draven, que retorna do mundo dos mortos para perseguir os criminosos que assassinaram ele e a namorada, Shelly. Em 1994 as adaptações de quadrinhos ainda eram poucas e viam no Batman (1989) de Tim Burton uma referência a ser seguida. Provavelmente a versão para as telonas de O Corvo idealizada por Alex Proyas não teria saído do papel se não fosse o sucesso do homem-morcego. O visual da cidade no filme lembra muito Gotham City, mas a direção de arte apresentada aqui investe ainda mais na atmosfera meio gótica, sombria com um certo verniz punk para sua violência estilizada (algo que o filme de Burton não trazia). A mistura quando estreou impressionou o público que ainda precisou lidar com a curiosidade gerada pelo ator principal que faleceu durante as filmagens. Brandon Lee (filho do Bruce Lee) morreu precocemente por conta de um projétil que estava em uma arma usada durante as filmagens, uma verdadeira tragédia. O filme ainda precisava ser finalizado e foi utilizado um dublê e o uso de efeitos digitais para sua conclusão. Lee está perfeito na pele de Eric Draven e o longa soa como a promessa de um astro que partiu cedo demais (ele recebeu até uma indicação póstuma de melhor ator no MTV Movie Awards que era um parâmetro de popularidade de um filme na época). Ele confere um desamparo ao personagem que traz um diferencial para concretização de sua vingança em tom sobrenatural (dentro e fora da tela). A trama em si não traz novidades, especialmente por conta dos seus vilões unidimensionais perseguidos um a um, mas Proyas confere um ritmo preciso com uma trilha sonora roqueira que fez muito sucesso na época ao som de the Cure, Nine Inch Nails, Stone Temple Pilots e Rage Against the Machine. A mistura de tantos elementos despertou não só a curiosidade do público na época, mas passado tanto tempo, o filme permanece com uma aura incomum. Ainda hoje é muito interessante ver o filme e perceber o somatório que ajudou o longa a fazer sucesso. Se levarmos em conta que a ideia rendeu outros dois filmes (que ninguém faz questão de lembrar), uma série de TV e um remake fadado ao fiasco, a magia em torno do filme se torna ainda mais curiosa. 
 
O Corvo (The Crow/EUA-1994) de Alex Proyas com Brandon Lee, Ernie Hudson, Rochelle Davis, Michael Wincott, David Patrick Kelly,  Michael Massee e Angel David. ☻☻☻

PL►Y: Furiosa - Uma Saga Mad Max

Joy: trama de flashback.
 
Era natural que depois de Mad Max: Estrada da Fúria (2015) cravar dez indicações ao Oscar (concorrendo para além de categorias técnicas entrou no páreo de melhor filme e direção) e conquistar seis estatuetas (todas técnicas) que o filme seguinte renderia especulações sobre presença em premiações, especialmente por conta de todo o burburinho causado pelo fato da nova aventura estar centrada em Furiosa, a personagem antológica de Charlize Theron (que roubou a cena do Max vivido por Tom Hardy). O hype estava no auge, mas diminuiu quando foi dito que Charlize não voltaria para um novo filme, que deveria contar a origem da personagem. Coloque uma pandemia no meio e uma greve de roteiristas e o que temos é quase dez anos de intervalo entre um filme e outro. Se havia mostra de que os ânimos do público haviam esfriado, a coisa se concretizou quando Furiosa - Uma Saga Mad Max flopou nas bilheterias. Diante do fracasso de um dos filmes que era alardeado como um dos mais aguardados do ano, não faltaram especulações sobre o motivo das pessoas não irem mais aos cinemas. Argumentaram que o gasto é alto (ingresso, estacionamento, lanche, tempo de deslocamento) são postos em um pacote em que o público prefere aguardar alguns meses e vê-lo no streaming. Ok, mas por que o público escolhe aguardar um pouco mais para ver um filme em casa e outros prefere ver no cinema (e o sucesso de Divertida Mente2 - que tem entrada garantida no Disney+ - e o recente Alien: Romulus surpreenderam nas bilheterias)? O que é difícil de admitir é que o próprio filme seja a explicação. O diretor George Miller imprime em Furiosa o mesmo esmero técnico de Estrada da Fúria, são cenas de ação elaboradas, um ritmo frenético, ação, brutalidade estilizada e o que mais fizeram daquele filme um sucesso, só que o sucesso de 2015 ampliava tudo que os filmes anteriores da saga trazia, Furiosa os repete. Por mais de Anya Taylor Joy se esforce como a versão jovem da personagem, ela não é a Furiosa de Charlize Theron e a necessidade do filme rezar a cartilha Mad Max com seus vilões consagrados, seus carros correndo pelo deserto enquanto gangues tentam destruir umas as outras deixam aquela sensação inevitável de que já vimos tudo isso antes. Volte agora a pensar nos gastos do público e você pagaria tanto para ver mais do mesmo? Muita gente decidiu que não. Obviamente que muita gente vai ponderar sobre o discurso anti-lacração, mas então eu lembro de Alien: Romulus (e de toda a saga com Ripley e suas discípulas) e não sei se ele se encaixa por aqui. Sobre o filme cabe dizer que ele não é muito original na criação da origem de sua vigorosa personagem, sendo exatamente o que já imaginamos que fosse. Num mundo em ruínas, quando pequena ela foi sequestrada por uma gangue e foi parar na mão de um sujeito sem escrúpulos, o Dementius (achei péssima escolha colocar Chris Hemsworth no papel, ele parece preso em Thor: Amor e Trovão/2022 até hoje) e come o pão que o apocalipse amassou. Obviamente que ela cresce revoltada e, diante de circunstâncias, que não vale detalhar muito por aqui, cresce com sede de vingança. É sobre isso. A maioria dos personagens me pareceu idiota em toda ação e correria em quase três horas de filme. O ponto alto do filme fica por conta do esforço de Joy e a grata surpresa de ver Tom Burke (geralmente escalado em filmes indies) como parceiro da heroína. Os dois tem uma química inesperada e se torna a maior surpresa do filme, embora o desfecho do romance também siga o caminho da obviedade.  Apesar da sensação de dejá vù que paira sobre o filme, seria demais dizer que Furiosa (orçamento inchado de 180 milhões de dólares e bilheteria aproximada de120 milhões) merecia fracassar, mas as reflexões de sua bilheteria decepcionante poderia fazer Hollywood repensar um pouco sobre seus projetos ambiciosos e flops recentes. 

Furiosa - Uma Saga Mad Max (Furiosa: A Mad Max Saga - 2024/ Austrália - EUA) de George Miller com Anya Taylor-Joy, Crhis Hemsworth,Tom Burke, Alyla Browne,Lachy Hulme, John Howard e Nathan Jones.

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

GRANDE PRÊMIO DO CINEMA BRASILEIRO 2024

Maeve Jinkins em Pedágio: melhor filme, melhor direção e roteiro original.
 

Fazia tempo que o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro precisava de um nome mais sonoro para se tornar popular, parece que finalmente isso aconteceu quando assumiram de vez o nome de Troféu Grande Otelo. Fazia tempo que a premiação não me empolgava tanto, provavelmente isso aconteceu pelo retorno dos investimentos no cinema em nosso país e o lançamento de projetos mais diversificados e empolgantes. Eu fiquei muito feliz com a consagração dos filmes premiados, ainda estranho o jeito meio improvisado com que a premiação é transmitida, mas mesmo foi com uma pergunta na cabeça: se a Academia Brasileira de Cinema considera Pedágio o melhor filme do ano, com a melhor direção e melhor roteiro original, por que não o escolheu para disputar uma vaga ao Oscar de filme estrangeiro em 2024? Enfim... antes de Retratos Fantasmas sair daqui com as mãos abanando (perdendo até a categoria de melhor documentário), eu já não entendia a esnobada que o filme de Carolina Markovicz recebeu na época da escolha. Enfim, parabéns Carol! Seguem todos os premiados da noite de ontem:

MELHOR TRILHA SONORA
    Aumenta que É Rock’n’roll
   
MELHOR FIGURINO
    Mussum, o Filmis
   
MELHOR MAQUIAGEM
    Mussum, O Filmis
   
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE
    O Sequestro do Voo 375

MELHOR SOM
    O Sequestro do Voo 375
   
MELHOR EFEITO VISUAL
     O Sequestro do Voo 375
   
MELHOR DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA
    O Rio do Desejo

MELHOR MONTAGEM
     O Sequestro do Voo 375
   
MELHOR CURTA-METRAGEM DOCUMENTÁRIO
   Uma Mulher Pensando

MELHOR SÉRIE BRASILEIRA DOCUMENTÁRIO
   O Caso Escola Base
   
MELHOR LONGA-METRAGEM DE DOCUMENTÁRIO
    Elis & Tom, Só Tinha de Ser Com Você
  
MELHOR CURTA-METRAGEM DE ANIMAÇÃO
    Mulher Vestida de Sol
   
MELHOR SÉRIE BRASILEIRA DE ANIMAÇÃO
    Esquadrão do Mar Azul (TV Rá Tim Bum)
 
MELHOR LONGA-METRAGEM DE ANIMAÇÃO
    Perlimps
   
MELHOR CURTA-METRAGEM DE FICÇÃO

    A Menina e o Mar
   
MELHOR SÉRIE BRASILEIRA FICÇÃO
    Cangaço Novo (Prime Video)
   
MELHOR ATRIZ SÉRIE DE FICÇÃO
    Alice Carvalho (Cangaço Novo)
  
MELHOR ATOR SÉRIE DE FICÇÃO
    Júlio Andrade (Betinho – No Fio da Navalha)
 
MELHOR LONGA METRAGEM INFANTIL

    Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo
   
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
     O Sequestro do Voo 375
   
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
    Pedágio

VOTO POPULAR
    Pérola 

MELHOR LONGA METRAGEM IBERO-AMERICANO
    La Sociedad De La Nieve (Espanha) - Direção: J.A. Bayona

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
    Arlete Salles (Tia Virgínia)
   
MELHOR ATRIZ LONGA-METRAGEM
    Vera Holtz (Tia Virgínia)

MELHOR ATOR COADJUVANTE
    Jorge Paz ( O Sequestro do Voo 375)
   
MELHOR ATOR LONGA-METRAGEM
    Ailton Graça (Mussum, o Filmis)
   
MELHOR PRIMEIRA DIREÇÃO DE LONGA-METRAGEM
    Silvio Guindane (Mussum, o Filmis)

MELHOR DIREÇÃO
    Carolina Markowicz (Pedágio)

LONGA-METRAGEM DE FICÇÃO
        Pedágio

domingo, 25 de agosto de 2024

PL►Y: Às Vezes eu Penso em Sumir

Dave e Daisy: aquela sensação de querer ser invisível.

Fran (Daisy Ridley) é a funcionária de um escritório que passa a maior parte do expediente quieta em seus afazeres. Embora dê conta de seu serviço, várias vezes durante o dia, seu pensamento divaga sobre estar morta. Acontece que por boa parte do seu dia, Fran parece não ter vida. Ela não interage muito com os colegas. Não entra em contato com a família. Não conversa com vizinhos ou parece ter amigos conquistados ao longo da vida. Pode ser um mecanismo de defesa para evitar decepções, mas também um comportamento que instiga o espectador a conhecer um pouco mais daquela personagem que não demonstra ter atitudes suicidas. A esperança de alguma mudança em sua vida parece vir com a chegada de um novo funcionário, Robert (Dave Merhej), que começa a conversar com Fran tirando dúvidas pelo chat da empresa. Os dois começam a se aproximar, pelo menos até uma distância considerada segura por ela. Existem boas ideias neste filme da diretora Rachel Lambert que não faz concessões na condução da narrativa. A protagonista tem poucos diálogos, o ritmo é lento (arrastado mesmo), não existem alívios cômicos óbvios e desperta a estranha sensação de uma certa poesia quando a protagonista imagina a morte. Isolada em seu mundinho, Fran recebe um trabalho bastante intimista de Daisy Ridley que dá conta dos conflitos internos de sua personagem sem maiores problemas, especialmente quando sua personalidade entra em choque com as expectativas de Robert com relação à ela. Ele mal imagina o esforço que ela faz para deixar que ele se aproxime de seu universo particular e, ao mesmo tempo, o filme deixa claro que de nada adianta o mundo se abrir para Fran, se ela permanecer fechada. Esta tentativa de receptividade da personagem existe quando ela aceita o convite para sair e em outros momentos do filme, mas  o oposto também ocorre quando ela percebe que Robert pretende tomar ainda mais espaço em sua vida. Obviamente que ela se sente ameaçada e com isso, algumas de suas atitudes a fazem repensar no seu papel em tudo o que sente. Parece complexo demais? Talvez seja mesmo e Às vezes eu Penso em Sumir termina justamente quando a personagem revela seus maiores segredos, em plena consciência do estranhamento que pode provocar, ela  recebe a cena mais terna do filme. Aposto que durante a confissão ela desejava desaparecer, mas com a resposta recebida, considero que ela sentiu-se grata por existir. Não é um filme para todos os gostos, mas faz pensar sobre a vida e a forma como nos relacionamos com as pessoas que atravessam nosso caminho. Sejam Frans ou Roberts. 

Às Vezes eu Penso em Sumir (Sometimes I Think About Dying / EUA-2023) de Rachel Lambert com Daisy Ridley, Dave Merhej, Parvesh Cheena, Marcia DeBonis, Megan Stalter e Bree Elrod.

PL►Y: Fúria Primitiva

Patel: estreia na marra como diretor.

Sempre acho interessante quando um ator quer sair do nicho em que Hollywood tentou o colocar e consegue enveredar por outros ares. Isso acontece com Dev Patel, o ator britânico de 34 anos se tornou conhecido com a série Skins (2007-2013), mas chegou aos cinemas com Quem Quer Ser Um Milionário (2008) de Danny Boyle. Embora o filme tenha agradado a Academia e recebido oito Oscars (incluindo filme e direção), sua primeira indicação ao prêmio só veio como ator coadjuvante em Lion (2017). Desde então o ator tem investido em produções diferentes e desafiadoras (como A Lenda do Cavaleiro Verde/2021), mas, não satisfeito, resolveu se aplicar como diretor, produtor e roteirista. No recente Fúria Primitiva ele assume os três serviços atrás das câmeras e também atua, numa verdadeira prova de que o moço é capaz de muito mais do que esperavam dele. No longa ele interpreta o protagonista que ganha a vida em lutas clandestinas, em que se esconde por trás de uma máscara de macaco (daí o nome original do filme Monkey Man). Na primeiras cenas de ringue já temos uma amostra do que o filme irá nos apresentar: lutas sujas, violência, sangue e edição frenética. Mas a vida do rapaz tem mais do que ser pago para perder todas as noites.  Seu passado é marcado por uma tragédia, que fermenta nele um desejo de vingança que o fará desafiar pessoas tão poderosas quanto perigosas. Não vale falar muito mais do que isso para não estragar as surpresas que o filme reserva, mas também, em termos de sinopse, não existe mais do que isso. O que torna a estreia de Dev na direção um projeto impressionante é a sua desenvoltura em construir cenas de ação vertiginosas que bebem diretamente na inspiração em John Wick. A diferença está na ambientação em uma Índia impregnada de problemas sociais, tráfico sexual, religiosidade e tudo mais que você possa imaginar. Patel utiliza estes elementos para construir a identidade do seu filme e também de seu protagonista e não tem medo de banhar tudo com cores fortes e sanguinolentas. Essa mistureba toda fez com que a Netflix temesse o lançamento do filme diretamente em seu catálogo, mesmo após investir cerca de 30 milhões de dólares no projeto, mas embora o resultado careça de uma costura mais firme entre todos os elementos que apresenta, a produção funciona bem ao elevar a adrenalina da plateia. Resta dizer que o filme chamou até dos amantes de filme de ação, o que carimba de forma positiva a estreia de Patel como cineasta e acho que nem precisa dizer que ele está muito bem no papel principal (embora tenha quebrado uma mão, dois dentes, deslocado o ombro e conseguido uma infecção no olho), confesso que nunca teria o imaginado protagonizando um filme feito esse, e, acho que por pessoas feito eu, que resolveu bancar o projeto. Grata surpresa. 

Fúria Primitiva (Monkey Man / EUA - Canadá - Singapura - Índia / 2024) de Dev Patel com Dev Patel, Sharlto Copley, Pitobash, Jatin Malik, Sikandar Kher, Sobbhita Dhulipala e Ashwini Kalsekar. ☻☻

MOMENTO ROB GORDON: Mulheres vs Alien

A franquia Alien é uma das mais queridas entre o público cinéfilo. A longevidade das ideias presentes nos filmes ficam ainda mais impressionantes quando lembramos que o primeiro filme (Alien: O Oitavo Passageiro) foi lançado há 45 anos!!! É verdade que ao longo do tempo houve tanto sucesso quanto irregularidades, muito por conta da mudança de diretores e seus embates com os estúdios (David Fincher que o diga), mas outra marca dos longas do monstrengo é a presença do protagonismo feminino em cenas de ação muito antes de começarem a falar de lacração por aí. Este Momento Rob Gordon é para lembrar de cinco personagens femininas que ajudaram a fazer a história da franquia entre os altos e baixos da carreira do xenomorfo nas telonas:

Daniels (Katherine Waterston)

Ainda que seja dirigido por Ridley Scott, Alien: Covenant (2017) é um filme desconjuntado. Queria dar prosseguimento às reflexões propostas de Prometheus (2012), mas diante de toda a controvérsia gerada pelo, resolveu ter mais cenas com o monstrengo xenomorfo em um roteiro menos truncado. Quem sofreu com tudo isso, foram os novos personagens apresentados, especialmente a Daniels (Katherine Waterston) que pouca gente lembra até do nome. Katherine Waterston estava em ascensão em Hollywood e o filme era sua grande chance de tornar-se mais conhecida. Embora tenha se esforçado na personagem que enfrenta os planos do androide David (Michael Fassbender, roubando o filme) e suas criações, a personagem não empolgou e perdeu a chance de protagonizar um terceiro filme dessa pegada "origin" proposta pelo diretor. 

Call (Winona Ryder)
 
Ok, ok... muita gente dirá que Call (Winona Ryder) não é uma mulher, mas uma androide enviada para ajudar um clone da Tenente Ripley e um grupo de piratas espaciais para impedir que o xenomorfo chegue à Terra. Apesar do filme do francês Jean Pierre Jeunet ter fracassado em sua missão de revigorar a franquia, a personagem de Winona Ryder é lembrada com bastante carinho pelos fãs, especialmente pelo fato de ser a primeira androide feminina a ganhar destaque em uma trama, além disso, ela ainda conta com aqueles olhos magnéticos da atriz. Todo mundo sabe como Ripley é traumatizada com androides à bordo e já sabe como a treta começa... mas a dinâmica entre as duas evolui durante a narrativa e houve até torcida para uma indicação ao Oscar de coadjuvante para a atriz. Dizem que Winona é tão fã da franquia que se ofereceu para fazer qualquer papel assim que soube que Alien: A Ressurreição (1997) seria feito.

Rain (Cailee Spaeny)

 
Quase coloquei a protagonista de Alien: Romulus (2024) em um lugar mais alto do pódio, mas ainda estou ponderando se não seria o efeito da empolgação de ter assistido Alien: Romulus recentemente. O fato é que Cailee Spaeny impressiona mais uma vez pela sua capacidade de demonstrar a fragilidade de uma personagem, até que deixe toda sua força tomar conta. Ela é a única da lista que não teve qualquer forma de treinamento para enfrentar um desafio como o que surge durante o filme, mas ela não decepciona em momento algum. A jovem mineradora, filha de mineradores nascida em um planeta distante ganhou o público e a torcida para que o diretor Fede Alvarez utilize a personagem em novos filmes. Se acontecer, Cailee tem chances de se tornar um novo ícone dentro da franquia - e o grande sucesso do filme só ajuda. 
 
Shaw tinha tudo para se tornar a nova protagonista de uma série de filmes sobre o xenomorfo. Tinha garra, vigor, inteligência, complexidade e uma atriz talentosa para dar conta de tudo isso... pena que diante de todos os questionamentos perante a proposta apresentada em Prometheus (2012) de Ridley Scott (que conta a origem do xenomorfo com base na origem da própria humanidade) a sequência passou por uma reformulação que deixou a doutora Shaw de fora. Ou melhor, após este aqui, seu destino acabou sendo explicado em uma cena curtinha no filme seguinte e decepcionou a todos. Triste imaginar que todo potencial da personagem foi desperdiçado por conta de divergências criativas. Por conta disso, ela quase perdeu o segundo lugar desta lista, mas chegamos à conclusão que ela foi uma vítima nessa história toda. 
 

Acho que não precisa explicar o motivo da Tenente Ellen Ripley estar em primeiro lugar, acho que basta enumerar os motivos para ela ser celebrada como uma das grandes heroínas da história do cinema. Ripley tem coragem de sobra e depois de todo o estrago que o xenomorfo fez em sua nave Nostromo, a coisa virou pessoal mesmo. Ela voltou para enfrenta o monstrengo em outros três filmes (e em um deles, mesmo depois de morta, ela retorna para dar cabo do bicho). Além disso, a personagem rendeu uma indicação ao Oscar para Sigourney Weaver pelo segundo filme da franquia (Aliens/1986) que a consolidou de vez como um ícone do gênero. Ridley Scott mencionou que no roteiro original, Ripley era um personagem masculino, mas ao ver o teste de elenco da atriz percebeu que ela traria camadas surpreendentes para a trama. Ele estava mais do que certo. Reza a lenda que existe um roteiro engavetado (Alien5) que traria a heroína de volta à saga. Será que um dia o projeto sai do papel?

Na Tela: Alien - Romulus

Cailee e seu algoz: herdeira respeitosa de Ripley

Tenho a impressão que a franquia Alien estava desacreditada. Depois da decepção de Prometheus/2012 (que eu adoro e com o tempo passou a ser reavaliado por público e crítica) e do fracasso comercial de Alien Covenant (2017), a pegada diferentona impressa por Ridley Scott à saga foi para a gaveta. Embora ele tenha ideias para um terceiro filme (que ainda possa ser feito algum dia) o estúdio resolveu que a franquia voltasse às suas origens, remetendo diretamente aos dois primeiros longas da série. Considerando que o interesse pelo monstrengo era incerto, resolveram que uma nova produção seria feita diretamente para o streaming (lembrando que no meio de tudo isso existiu o projeto cancelado de Alien5 de Neill Blomkamp que traria até Sigourney Weaver de volta). Convidaram o uruguaio Fede Alvarez para capitanear o novo episódio e deixaram o rapaz desenvolver sua ideia ambientada entre os filmes Alien (que é ambientado em 2122) e Aliens (que ocorre em 2179), assim nasceu Alien: Romulus (que acontece em 2142). É a primeira vez que os protagonistas não são astronautas treinados, mas um grupo de jovens nascidos e criados em um planeta colonizado para mineração e, assim como seus pais, percebem ter grandes chances de morrer ali. Essa sensação é exemplificada por Rain (Cailee Spaeny), que descobre que sua permissão para sair daquele planeta cinzento acaba de ser adiada por vários anos. Rain compartilha seu sonho de sair daquele lugar com o irmão, Andy (David Jonsson), que na realidade é um androide que tem como principal diretriz proteger a irmã. Eis que Rain é convidada por um grupo de jovens mineradores a participar de uma fuga rumo ao planeta dos seus sonhos. Para isso, eles precisam roubar uma nave abandonada utilizando as funcionalidades de Andy. O problema é que nenhum deles imagina o que os aguarda naquela nave perdida. O diretor é um sujeito esperto e sabe que para o filme ampliar seu apelo perante ao público, ele precisa de personagens que provoquem identificação e faz isso muito bem. Para além da relação entre Rain e Andy, insere todos em uma situação de opressão que motiva suas ações mais arriscadas, além disso, também estabelecemos relações (de um jeito ou de outro) com Tyler (Archie Renaux), Navarro (Aileen Wu), Bjorn (Spike Fearn) e Ray (Isabela Merced) e cria-se a tensão quando vemos que cada um deles está em risco. Acredito que sem este laço, o apelo de todos os sustos, gelecas e ambientação industrial sombria (típica dos primeiros filmes) teriam menos impacto. Não satisfeito com isso, o diretor evoca diretamente vários elementos da franquia, assim, o integra naquele universo e resgata aspectos que pareciam esquecidos após tantos anos (como o sangue ácido do monstrengo), assim como utiliza ângulos e cenas que se tornaram clássicas na saga. Porém, o filme não se torna uma colcha de retalhos, afinla tem ideias próprias e uma plena consciência de onde quer chegar, especialmente quando insere o dilema de Andy (realçado pelo excelente trabalho de David Jonsson em fazer muito com tão pouco em suas expressões) entre zelar por Rain ou pela empresa que o construiu (e neste ponto existe um personagem que faz referência direta ao primeiro filme que nem vou citar). Falando em Rain, acho importante ressaltar a ótima performance de Cailee Spaeny, que ganhou destaque ao viver Priscilla Presley (em um longa radicalmente diferente deste aqui que lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza), curiosamente ela exibia naquele papel o que vemos novamente aqui: a capacidade de expressar vulnerabilidade e força ao desenvolver uma personagem. Aos 26 anos, ela vive uma herdeira da Tenente Ripley com honras e espero que, se houver uma continuação, não façam com ela o mesmo destino desonroso que deram para Elizabeth Shaw (Noomi Rapace) de Prometheus. No fim das contas, o estúdio gostou tanto do resultado (simples, direto e bem realizado) que resolveu lançar no cinema e... o longa se tornou o atual filme mais assistido ao redor do mundo. Esperado com baixas expectativas e revelando ser uma grata surpresa, Alien - Romulus promete dar novo fôlego à série (o que deve ajudar muito no sucesso da série Alien Earth que deve estrear em breve com acontecimentos que precedem tudo que vimos até aqui), Alvarez já está cheio de novas ideias, fala-se até de um novo encontro com Predador, o que eu acho péssimo, mas diante do que o moço fez aqui, pode ser até interessante. O moço ganhou crédito, algo que somente James Cameron (diretor de Aliens: O Resgate) conseguiu ao se deparar com o monstrengo xenomorfo do universo de Ridley Scott. 

Alien: Romulus (EUA-2024) de Fede Alvarez com Cailee Spaeny, David Jonsson, Archie Renaux, Isabela Merced e Spike Fearn. ☻☻☻

sábado, 24 de agosto de 2024

PL►Y: Nosso Verão Daria um Filme

Yorgos e Andreas: amigos sob o sol da Grécia.

Faz um tempo que Demosthenes (Yorgos Tsiantoulas) resolveu abandonar a carreira de ator, talvez tenha se cansado da incerteza de aparecer bons projetos. Agora ele trabalha num escritório. Se a vida profissional parece sob controle, a amorosa está complicada. Ele manteve por anos um relacionamento com Panos (Nikolaos Mihas), mas agora lhe restou apenas a simpática cadelinha Carmen, que o ex-parceiro estava prestes a deixar em um abrigo. Embora Demosthenes esteja saindo com outros homens, sem procurar nada sério, existe um certo desconforto nos rumos que seu coração está tomando. Quando o amigo Nikitas (Andreas Labropoulos) lhe diz que está prestes a conseguir financiamento para seu primeiro filme, os dois resolvem criar o roteiro juntos. Cogitam adaptar uma peça que criaram a um tempo atrás, mas depois consideram escrever um pouco sobre as angústias do ex-ator e, conforme lidam com as limitações do orçamento, as cenas do roteiro começam a dividir a tela com a realidade dos amigos que vivem em uma paradisíaca praia da Grécia. Nosso Verão Daria um Filme é uma comédia queer bastante despojada e lida com bastante naturalidade com a nudez masculina e as cenas de sexo enquanto faz graça com a busca pelo namoro perfeito e a estrutura de um filme. Existe aqui um exercício de metalinguística o tempo inteiro (como a cena em que os amigos descobrem que o uso de animais aumenta o custo de produção e resolvem diminuir as cenas do pet em cena - e passamos a ouvir somente os latidos do bicho), este jogo narrativo deixa o filme mais divertido que a maioria. Há também uma certa ironia em apresentar Demosthenes como um verdadeiro deus grego, objetificando despudoradamente o físico do ator Yorgos Tsiantoulas em contraste com suas inseguranças em se relacionar com o mundo, seja com o pai, com os parceiros, com a cadelinha e até com  suas ambições. Assim como o roteiro dos amigos, a vida do moço parece não avançar muito durante a sessão. Se para o protagonista a coisa já está assim, ela piora um tantinho mais quando vemos que Nikitas recebe menos profundidade, sendo quase um narrador dos  pontos que ditam o rumo da narrativa - e que deve obedecer para construir seu filme. Apesar do tom de brincadeira misturada a alguma ousadia (se  você ainda considera nudez masculina e cenas tórridas entre dois homens algo ousado), o que mais chama atenção no filme são as paisagens praianas valorizadas pela fotografia belíssima. Se você é cinéfilo, o filme também chama atenção para um tipo de cinema feito na terra de Platão que é mais convencional do que a chamada Estranha Onda Grega que se tornou referência mundial para o cinema produzido naquele país nos últimos anos. Este aqui é solar e bem humorado, poderia ser feito em qualquer lugar do mundo, embora nem todo lugar tenha aquelas paisagens de cartão postal. No fim das contas, o filme parece uma variação mais sóbria do caótico Rotting in the Sun (2023).

Nosso Verão Daria um Filme (To Kalokairi tis Karmen / Grécia - 2024) de Zacharias Mavroeidis com Yorgos Tsiantoulas, Andreas Labropoulos, Nikolaus Mihas, Roubini Vasilakopoulou e Vasilis Tsigristaris.☻☻

PL►Y: A Geração do Futuro

O casal e o casulo: isso é tão Black Mirror...

Se você considera que a série Black Mirror precisa de alguém para dar novas ideias às futuras temporadas, participe da campanha para que a diretora e roteirista Sophie Bartes participe da equipe criativa nas próximas temporadas. A francesa tem apenas três filmes no currículo e dois deles partem de ideias interessantes que nascem de nossa relação com a tecnologia gerando tramas interessantes de ficção científica. A diretora chamou atenção com o excelente Almas à Venda (2009), em que Paul Giamatti, em crise existencial, resolve extrair a alma e comprar a de um poeta russo para dar conta de um novo papel. Agora, a diretora imagina como poderá ser a gestação de um bebê no futuro. Aqui, uma empresa aluga um útero artificial em formato de ovo (feito de uma membrana porosa) para que o embrião se desenvolva até o dia do parto. Assim, conforme o material promocional da empresa propaga, "todo o desconforto físico da mãe é evitado e o pai poderá interagir mais com todo o processo de gestação". É com certo receio que o casal Rachel (Emilia Clarke) e Alvy (Chiwetel Ejiofor) se envolvem nesta experiência de alto custo após serem selecionados dentre uma longa fila de interessados. Alvy é o que mais demora para se acostumar com a ideia, professor de Botânica, ele visivelmente considera que a humanidade se tornou obcecada pela tecnologia, a associando à um certo fetiche de que toda tecnologia gera algo bom associado ao bem estar. Alvy traz uma certa nostalgia dos tempos em que a relação da humanidade com a natureza (e consigo mesma) era mais próxima. Já Rachel é mais aberta às novas tecnologias e considera inevitável que a vida avance cada vez mais rumo a novas descobertas. Existe um tanto de crítica a este mundo no texto de Bartes, não sendo poucas às vezes em que as Inteligências Artificiais com que os personagens interagem deixem clara uma certa exaustão dos protagonistas em interagir com a tecnologia o tempo inteiro, da mesma forma, conforme o bebê é gerado, existe a sensação de que aquela família se tornou cobaia de um experimento. É obviamente uma via de mão dupla, existe o interesse do casal em ter um filho, mas também o interesse da empresa em aprimorar sua obra e gerar cada vez mais lucro. Toda esta parte de deslumbramento com a tecnologia se equilibrando a um certo estranhamento garante o interesse pelo filme, mas o filme se arrasta um bocado ao evitar se aprofundar em polêmicas sobre a situação. É interessante a forma como Alvy se aproxima cada vez mais do casulo e gera algum ciúme na esposa, da mesma forma, conforme ela se aproxima mais do casulo, se dá conta de como todo aquele processo beira o bizarro com  as mediações de uma empresa, no entanto se fosse um episódio de Black Mirror, a duração seria menor e a ideia não pareceria tão esticada na tela, deixando menos evidente os pontos que o roteiro deixa de tocar para ficar em cima do muro (não se fala sobre casais homoafetivos aderindo ao serviço, os perigos do serviço ou o custo de ludibriar uma empresa milionária). Chiwetel e Emilia se esforçam em cena, mas seus personagens são visivelmente sem graça durante todo o processo, até mesmo o ato de rebeldia do casal rumo ao desfecho não chega a empolgar.  A ideia do filme é genial, mas o resultado beira o insosso perante a baixa voltagem impressa à toda situação, faltou ser um filme redondinho, algo que a diretora já se mostrou capaz em Almas à Venda, que talvez já possa ser considerado sua obra-prima.

 A Geração do Futuro (The Pod Generation / Bélgica - França - Reino Unido /2023 ) de Sophie Bartes com Chiwetel Ejiofor, Emilia Clarke, Rosalie Craig, Vinette Robinson, Megan Mackzo e Jelle de Beulle. 

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

PL►Y: Instinto Materno

Jessica e Anne: amigas até a página dois. 

Alice (Jessica Chastain) e Céline (Anne Hathaway) são vizinhas e amigas. Vivem numa tranquila vizinhança dos anos 1960, seus maridos também são próximos e seus filhos são os melhores amigos. Tudo aqui é perfeito numa verdadeira celebração do American Way of Life. Não sei se é proposital, mas o diretor estreante Benoît Delhome faz questão de apresentar esta casca de bem estar com bastante artificialidade, beirando o surreal. Tudo é tão perfeito que a maior ameaça que paira sobre as personagens é a alergia que o filho de Alice, Theo (Eamon O'Connell) apresenta. Porém, se tudo seguisse a cartilha da perfeição absoluta não haveria filme, surge então um terrível acidente envolvendo o filho de Céline, Max (Baylen D. Bielitz) e o relacionamento entre as duas amigas desanda. De início imaginamos que é devido ao processo de luto atravessado por Alice e o esposo, ou pelo sentimento de culpa envolvendo Alice que se cobra por não ter evitado que o pior acontecesse. Então... o comportamento de Céline começa a se tornar cada vez mais estranho e algumas situações suspeitas começam a deixar a vizinha desconfiada de que algo de muito ruim está prestes a acontecer. Estrelado por duas atrizes oscarizadas, Instinto Materno é na verdade uma refilmagem de um filme Belga de 2018 que foi bastante premiado em seu país de origem, mas que provavelmente perdeu algo em sua transposição para Hollywood. O cineasta Benoît Delhome era diretor de fotografia antes de assumir o comando deste filme, se por um lado ele capricha no visual, por outro ele demonstra uma certa ansiedade para desenrolar a trama, o que torna-se bastante prejudicial quando sua intenção é fazer suspense com a história que tem em mãos. A montagem do filme é um tanto atrapalhada em lidar com as sugestões do roteiro, deixando pouco tempo para o espectador imaginar o que acontecerá a seguir. Por conta disso, algumas situações envolvendo os personagens acabam não sendo plenamente desenvolvidas, como a postura do esposo de Céline, Damian (Josh Charles) ou a sugestão de que a sensação de paranoia de Alice teria relação com alguns problemas vividos por ela no passado. Um dos trunfos do filme seria a dubiedade do que vemos na tela, a possibilidade de enriquecer a narrativa com incertezas logo se dissolve nas  mãos do diretor e deixa tudo por conta do talento das atrizes para que a coisa funcione. O final me fez questionar a capacidade de qualquer investigador em lidar com os fatos que estão diante do seu nariz, enfim, já disse que existe algo de surreal (ainda que involuntário) no que vemos aqui. Serve para passar o tempo se não exigir muito.

Instinto Materno (Mothers's Instinct/ EUA-2024) de Benoît Delhome com Jessica Chastain, Anne Hathaway, Josh Charles, Anders Danielsen Lee, Bailey D. Bielitz, Eamon O'Connell e Caroline Lagerfelt. ☻☻

domingo, 18 de agosto de 2024

4EVER: Alain Delon

15 de novembro de 1957 ✰ 18 de agosto de 2024

O francês Alain Fabien Maurice Marcel Delon, nasceu em Sceaux, região da Borgonha, perto de Paris. Devido a uma vida familiar atribulada, Delon chegou a ser expulso de várias escolas e parou de estudar aos 15 anos. Dois anos depois alistou-se na marinha francesa. Em 1956 foi viver em Paris e trabalhou como porteiro, garçom e vendedor. Em 1957 foi ao Festival de Cannes e chamou atenção por sua aparência, recebendo convite para atuar em seu primeiro filme, Uma Tal Condessa (1957). Depois, recebeu destaque em eu trabalho como Tom Ripley em O Sol por Testemunha (1959) e no ano seguinte foi dirigido por Luchino Visconti em Rocco e Seus Irmãos (1960), com quem trabalhou novamente em no clássico O Leopardo (1963). Ainda que sua beleza tenha motivado o início de sua carreira, Alain Delon provou ser um grande ator em vários filmes que se tornaram clássicos que o tornaram um ícone do cinema. Em 1997, aos 62 anos, o astro anunciou sua aposentadoria devido à decepção com os rumos do cinema francês. Em 2019, enquanto lidava com os efeitos de um AVC e o tratamento de um linfoma, o ator recebeu uma Palma de Ouro honorária no Festival de Cannes e declarou que era "uma espécie de homenagem póstuma, mas em vida", disse ele na ocasião. O ator faleceu em casa com a família e a causa não foi revelada. 

sábado, 17 de agosto de 2024

4EVER: Silvio Santos

12 de dezembro de 1930 17 de agosto de 2024

Senor Abravanel nasceu no bairro da Lapa na cidade do Rio de Janeiro, primogênito de uma família de imigrantes judeus, Senor trabalhou como camelô e vendedor até iniciar sua carreira como comunicador profissional no rádio. Sua estreia na televisão foi nos anos 1960 na TV Paulista. Adotando o nome artístico de Silvio Santos, seu apelo perante ao público foi crescente, ao ponto de tornar-se um dos rostos mais famosos da televisão brasileira. Silvio fundou o Grupo Silvio Santos, um conglomerado de empresas que inclui o SBT (o Sistema Brasileiro de Televisão inaugurado em 1981), Liderança Capitalização e Jequiti. O apresentador se tornou uma referência da programação dominical na TV com seu programa de variedades e ao longo da carreira acumulou um patrimônio de mais de um bilhão de reais. Embora seus posicionamentos políticos e comentários politicamente incorretos o envolvesse em polêmicas, sua popularidade permanecia intacta ao longo de toda carreira. Silvio de afastou da televisão em 2022 e passou o comando de sua emissora para suas filhas. A vida de Silvio inspirou a série O Rei da TV (Disney+) e o filme Silvio estrelado por Rodrigo Faro que entrará em cartaz em breve. O apresentador faleceu em decorrência de broncopneumonia.

quinta-feira, 15 de agosto de 2024

PL►Y: Borgman

Bijvoet: o caos encarnado. 

De vez em quando alguém sugeria que eu assistisse o filme Borgman do qual eu não lembrava de ter escutado qualquer comentário na mídia sobre seu lançamento. Geralmente as pessoas ressaltam que é um filme estranho, mas nada que atiçava muito minha curiosidade. O que realmente me motivou ver o filme foi quando descobri que o diretor é Alex Van Warmerdan, o qual conheci quando o Max era o canal da HBO que passava filmes difíceis de encontrar, como o instigante Os Últimos Dias de Emma Blank (2010), assinado por ele. Borgman foi lançado três anos depois e manteve a linha provocativa do cineasta. O filme permite várias leituras e pode até se encaixar em uma gênero que entrou na moda um tempo depois, o folk horror. Isso se deve ao fato do misterioso protagonista proporcionar duas leituras durante a sessão, a primeira (a realista) seria a de um sem teto que invade o cotidiano de uma família e à leva à ruína. A segunda (a fantasiosa?) seria a de que Borgman e seus companheiros são criaturas que vivem no subterrâneo da floresta até que passam a interagir com pessoas comuns da superfície com segundas intenções. Esta segunda leitura é reforçada com a frase bíblica que abre o filme como um SPOILER do que veremos ao longo da sessão ("e eles desceram sobre a terra para fortalecer suas fileiras") assim como o primeiro ato,  que apresenta um grupo de pessoas (entre elas, um padre) que parte para expulsar r aqueles seres que vivem no subterrâneo da floresta. Sem ter para onde ir, Camiel Borgman (Jan Bijvoet) se encaminha então para a casa de Richard (Jeroen Perceval) e Marina (Hadewych Minis), que vive em uma casa confortável junto com os filhos pequenos. Borgman pede permissão para tomar banho naquela casa, mas durante a conversa diz conhecer Marina, que não faz a mínima ideia de quem ele seja. Começa então uma verdadeira rotina de suspeitas, desconfianças e segredos entre o casal - que vai totalmente contra a aparência de perfeição que ostentam. Resta dizer que aquele homem desconhecido começa a ser cada vez mais presente na rotina da família e, aos poucos, sua presença começa a inserir seus companheiros nas redondezas, rendendo acontecimentos estranhos e assustadores que deixam aquela impressão que as famílias permitiram que o mal se revelasse em suas casas. Alex Van Warmerdan conduz o filme em ritmo lento, instigando o estranhamento do espectador e também o seu interesse pelos acontecimentos surpreendentes que se anunciam. Existe algo de sobrenatural  sobre a origem de Borgman o que tempera o filme com uma espécie de horror sutil que é ampliado ainda mais pelo senso humor sinistro que perpassa toda a narrativa. Talvez o grande trunfo do filme seja nunca deixar claro as intenções do personagem título enquanto caminha para o seu desconfortável desfecho.  Não é o tipo de filme que verei novamente, mas considero notável a forma como ele trabalha as dicotomias entre ordem e caos, bem e mal graças à habilidade do diretor em lidar com alegorias em suas narrativas. 

Borgman (Holanda / 2013) de Alex Van Warmerdan com Jan Bijvoet, Jeroen Perceval, Hadewych Minis, Alex Van Warmerdam e Tom Dewispeleare.  ☻☻

quarta-feira, 14 de agosto de 2024

4EVER: Gena Rowlands

19 de junho de 193014 de agosto de 2024

Virginia Cathryn Rowlands graduou-se na Universidade de Winsconsin em 1950 e começou a atuar em 1956 quando mudou-se para Nova Iorque para estudar na Academia Americana de Arte Dramática, foi lá que conheceu o futuro esposo John Cassavetes, com quem realizou vários filmes que se tornariam clássicos do cinema. Entre 1963 e 1984 o casal realizou dez filmes juntos, entre eles Uma Mulher Sob Influência (1974) e Gloria (1980), que  renderam indicações ao Oscar de melhor atriz para ela. Gena foi eleita a melhor atriz do Festival de Berlim em 1978 por outro trabalho com Cassavetes, o cult Noite de Estreia (1977). Ela também foi dirigida pelo filho, Nick Cassavetes, no fofo De Bem com a Vida (1996) e no sucesso Diário de Uma Paixão (2004). Ao longo da carreira, a atriz participou de mais de cem produções e recebeu mais de trinta prêmios. Em 2016 a atriz recebeu um Oscar honorário pelo conjunto da carreira, mas em 2019 a artista foi diagnosticada com Alzheimer. A causa de sua morte não foi informada.