A nora, o filho e o pai: diferentes paradigmas em questão.
A relação entre pais e filhos costuma gerar filmes memoráveis quanto é bem explorado. Nota de Rodapé é um desses casos. Dirigido por Joseph Cedar (que é nascido em Nova York e criado em Jerusalém desde os cinco anos de idade), o filme foi premiado na categoria de melhor roteiro em Cannes e depois foi indicado ao Oscar de Filme Estrangeiro (além de ter recebido dez prêmios perante a Academia Israelense de Cinema). Todos os prêmios são merecidos. Cedar consegue construir uma narrativa interessante acerca do velado conflito entre pai e filho, utilizando várias vezes um recurso semelhante ao que dá título ao filme. O filme começa com o professor Uriel Shkolnik (Lior Ashkenazi) sendo homenageado pelos seus estudos. Uriel aproveita a oportunidade para homenagear seu pai no discurso, o também professor Eliezer Shkolnik (Shlomo Bar-Aba). Desde o início percebemos o desconforto de Eliezer com a homenagem, só depois descobrimos que sua carreira mergulhou numa espécie de limbo por um desses acasos maldoso do destino. Cedar utiliza digressões para explicar aspectos importantes na relação da dupla de professores. Enquanto Uriel tem suas pesquisas sobre os escritos do Talmude reconhecidas, Eliezer passou vinte anos fazendo pesquisas sobre os textos originais para que suas conclusões fossem esquecidas quando um outro pesquisador, Grossman (Micah Lewensohn), encontrou um texto antigo que comprovava tudo o que Eliezer descobrira explorando vários textos antigos que encontravam-se dispersos. Grossman consegue notoriedade pelo trabalho e Eliezer mergulha no ostracismo, esquecido pelos pesquisadores do Talmude. Com tudo isso, a única homenagem que recebeu foi ser mencionado em uma nota de rodapé no livro de um amigo. As coisas mudam quando após a homenagem recebida pelo filho, Eliezer recebe uma ligação dizendo que será homenageado pelo auspicioso Prêmio Israel por suas pesquisas. Por décadas, Eliezer esperou esse reconhecimento e o prêmio coloca mais uma vez seu nome em evidência, mas Uriel irá descobrir uma informação que poderá mudar o rumo da homenagem. É no desassossego de Uriel e na revanche de Eliezer que o filme se sustenta de forma vigorosa. A trama escrita por Cedar permite várias leituras, seja o que herdamos de nossos pais, o respeito que temos por eles, o reconhecimento que esperamos para agradar a nós mesmos e a eles, ou até aspectos culturais ainda mais complexos como o tradicional e o moderno, o novo e o velho, as quebras de paradigmas, tudo escrito com bastante clareza e com uma preocupação de transformar os personagens em carne e osso que faz toda a diferença. Os cortes são precisos, assim como as atuações, e apesar de tudo caminhar para um grande conflito familiar, a trilha sonora é encarregada de dar um tom cômico aos dilemas dos personagens - mesmo quando à certa altura o bonachão Uriel parece trocar de personalidade com o pai. Além disso, a simpatia que sentimos pelo injustiçado Eliezer aos poucos é ameaçada pelo seu jeito amargo de perceber a vida e a carreira do filho. O longa concorreu ao Oscar com o ótimo Bullhead (da Bélgica) e perdeu para A Separação (do Irã), mas teria mais chances se Cedar não optasse em deixar o desfecho da história por conta do espectador - o que não deixa de ser uma ironia, já que o filme dá mais valor às notas de rodapé que apresenta no caminho do que à conclusão do dilema que se instaura entre pai e filho.
Nota de Rodapé (Hearat Shulayin/Israel-2011) de Joseph Cedar com Lior Ashkenazi, Micah Lewensohn, Aliza Rosen e Alma Zach. ☻☻☻☻
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