Spivet (Kyle Catlett): um verdadeiro achado.
Certa vez li em uma revista que o francês Jean-Pierre Jeunet realiza "filmes de confeiteiro", na época achei que era alguma espécie de provocação, já que Jeunet estava nas alturas com o seu filme mais adorado, O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001). Mais de uma década depois (e dois filmes que ficaram bem longe do sucesso esperado), o diretor acertou a mão novamente com Uma Viagem Extraordinária, filme que merece estar entre seus melhores trabalhos. O mais curioso é que o longa já deve ter sido visto por um bom grupo de pessoa antes de entrar no circuito nacional, uma vez que apareceu em vários festivais até que os distribuidores se animassem em exibir essa adaptação do livro ilustrado de Reif Larsen para o cinema. O filme conta a história de um menino chamado T.S. Spivet (o ótimo Kyle Catlett), que vive numa fazenda junto com o pai cowboy (Callum Keith Rennie), a mãe especialista em insetos (Helena Bonhan Carter), a irmã adolescente com pretensões de ser atriz (Niamh Wilson) e o irmão gêmeo que pretende seguir os passos do pai (Jakob Davies). T.S., no entanto parece não ter características especiais, até que envia para um concurso o projeto de uma máquina de movimento perpétuo feita com base em pólos magnéticos (e que ele explicará diversas vezes não ser perpétuo, já que funciona somente 400 anos). Esse é o ponto em que percebemos que o fofo T.S. é um geniozinho, mas não um desses chatinhos que aparecem na TV e no cinema constantemente, Spivet tem uma inteligência natural, sem afetação, esnobismo ou convencimento, o rapaz é simplesmente um menino brilhante - e todo mundo descobrirá isso quando ele tiver que ir para uma renomada universidade receber um prêmio pelo projeto (ainda que tenha que mentir um pouco para chegar lá) com uma mãozinha da cientista G.H. Jibsen (Judy Davis), que verá no menino prodígio toneladas de publicidade gratuita para sua instituição. No entanto, a viagem do título é mais do que a mostrada com belas paisagens de sonho sobre o sul dos EUA, mas uma viagem de Spivet sobre seus dilemas acerca do lugar que ocupa na família que possui, especialmente depois de um acidente ocorrido com seu irmão gêmeo. É nessa inadequação de Spivet com o mundo ao redor que vemos o coração de Jeunet posto na história. Quem conhece sua obra sabe que o moço não curte criar obras realistas, pelo contrário, aprecia doses cavalares de fantasia na trajetória de seus personagens, mas que são capazes de revelar-lhe a alma real de suas histórias. Na viagem de seu pequeno brilhante, Jeunet cria momentos divertidos e outros realmente tocantes, onde Spivet revela-se uma criança como tantas outras diante de um bando de gênios. Portanto, não deixa de ser surpreendente que em meio a duas atrizes renomadas (Carter e Davis), o centro de toda atenção fique por conta do talentoso Kyle Catlett (o menino é realmente um achado)! Ele nunca está fora do tom e sabe lidar com piadas complicadas como o fato de nenhum personagem poder abraçá-lo por conta de um problema com a polícia (mas repare como sua mãe pode abraçá-lo sem que ele sinta dor alguma). Exuberante visualmente, Uma Viagem Extraordinária pode não conquistar a legião de fãs e prêmios de Amélie Poulain, mas com certeza irá conquistar admiradores com sua história aparentemente simples, mas contada com irresistível magnetismo de aventura infanto-juvenil.
Uma Viagem Extraordinária (L'extravagant voyage du jeune et prodigieux T.S. Spivet / França - Austrália - Canadá/ 2013) de Jean Pierre Jeunet, com Kyle Catlett, Helena Bonhan Carter, Judy Davis, Callum Keith Rennie e Dominique Pinon. ☻☻☻☻
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